Arthur Gabriel Caldas Lopes
Doutorando em Engenharia Agrícola (FCA/Unesp)
Paulo Roberto Arbex Silva
Professor e coordenador do Grupo de Plantio Direto (FCA/Unesp)
arbex@fca.unesp.br
Aldir Carpes Marques Filho
Professor de Mecanização e Máquinas Agrícolas (DEA/UFLA)
aldir@ufla.br
Wesley Matheus Cordeiro Fulgêncio Taveira
Mestrando em Engenharia Agrícola (FCA/Unesp)
A cultura do feijão possui grande importância econômica e social no cenário do agronegócio brasileiro e os cuidados durante a semeadura são de extrema importância para definir o potencial produtivo da lavoura.
Além disso, os custos envolvidos durante a implantação da cultura representam significativa parcela do custo total de produção. Desta forma, operadores, técnicos e produtores devem estar atentos às regulagens do conjunto trator-semeadora, visando não apenas a eficiência operacional, mas também a qualidade de deposição de sementes durante a operação.
O aumento da área plantada, acompanhada da intenção em produzir a “safrinha” em um cenário de janela operacional cada vez mais incerta, tem influenciado no aumento da velocidade de semeadura visando maior capacidade operacional (área plantada/hora).
A velocidade do conjunto mecanizado é umas das condições mais relevantes no momento da semeadura, e seu acréscimo desordenado reduz o número de espaçamentos aceitáveis (ideais), aumentando as duplas e falhas na lavoura e incrementando perdas em produtividade.
A tal plantabilidade
A “plantabilidade” preconiza que sejam seguidas as boas práticas operacionais de semeadura, de forma que a velocidade de operação e a qualidade de distribuição de sementes são fatores inversamente proporcionais.
Ou seja, à medida que se aumenta a velocidade, a qualidade de distribuição é prejudicada, desde a singulação até a profundidade e espaçamento entre sementes. Entretanto, mesmo sendo de conhecimento amplo que a velocidade afeta a qualidade de semeadura, métodos de avaliação da qualidade de deposição de sementes tornam-se importantes para a correta determinação dos efeitos destes problemas na cultura do feijão.
São escassas as informações técnicas e científicas a respeito da velocidade crítica para a semeadura do feijão. Desta forma, o Grupo de Plantio Direto (GPD) da Unesp/Botucatu-SP, que possui expertise na realização de ensaios e simulações de semeadura, avaliou o efeito da velocidade operacional na distribuição longitudinal de sementes de feijão.
Pesquisa
O experimento foi realizado na Faculdade de Ciências Agronômicas, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp), no Laboratório de Semeadura do Núcleo de Ensaios de Máquinas e Pneus Agroflorestais.
Para o ensaio foram utilizadas sementes de feijão da cultivar IAC Imperador, categoria S2, uma esteira simuladora de bancada (Figura 1) e as sementes depositadas em quatro velocidades de semeadura: 4, 5, 6 e 7 km h-1 e um dosador mecânico da marca comercial Jassy, modelo Titanium, que foi equipado com disco rampflow de 50 alvéolos, de fileira dupla e anel com rebaixo de 1,5 mm.
O conjunto foi previamente regulado para distribuir 12 sementes por metro.
Para coleta de dados, foram contabilizados os espaçamentos entre sementes por dois metros consecutivos, e realizadas vinte coletas (repetições), resultando em 40 metros lineares avaliados.
Os espaçamentos foram coletados com trena de precisão e posteriormente classificados como aceitáveis, duplos e falhos, de acordo com a Tabela 1.
Tabela 1. Intervalo de referência para classificação dos espaçamentos.
Classificação dos espaçamentos |
Aceitáveis = 5 a 15 cm |
Duplos < 5 cm |
Falhos >15 cm |
A partir da coleta dos espaçamentos, também foi calculado o coeficiente de variação (CV%) nas diferentes velocidades, que permite avaliar a uniformidade dos espaçamentos obtidos.
Quanto menor seu valor, mais regular se encontra a distribuição de sementes e maior a qualidade de semeadura. Esse coeficiente é calculado a partir do desvio padrão dos espaçamentos, e seu valor, dividido pela média dos mesmos, conforme a equação 1.
Equação 1. Coeficiente de variação
Cv= s/X
Em que:
Cv = Coeficiente de variação (%),
s = Desvio padrão dos espaçamentos,
X = Média dos espaçamentos.
Resultados
Os resultados demonstraram que o aumento da velocidade de semeadura provocou redução na porcentagem de espaçamentos aceitáveis e aumento nos valores de espaçamentos duplos, falhos e coeficiente de variação.
Os gráficos mostraram que o aumento de velocidade causou desequilíbrio no processo de deposição e dosagem de sementes, sobrecarregando os mecanismos dosadores e causando turbulência nos condutores de sementes.
Os espaçamentos aceitáveis, duplos e falhos obtidos em cada velocidade operacional podem ser observados nas Figuras 2, 3 e 4 respectivamente.
Problemas assinalados
O aumento da velocidade provoca dois problemas durante a distibuição de sementes. O primeiro está relacionado à dificuldade do dosador em distribuir as sementes, pois o aumento na velocidade de rotação do disco alveolado reduz o tempo que as sementes têm para se alojar em cada alvéolo, aumentando o número de falhas.
O segundo problema ocorre quando as sementes são lançadas com elevada energia cinética no tubo condutor, ocasionando alto índice de ricocheteamento, prejudicando a trajetória, alterando o tempo necessário para chegar ao solo e, consequentemente, depositando-se desuniformemente no sulco de semeadura.
Exceto pelos espaçamentos duplos, que apresentaram baixa variação entre as velocidades analisadas, o índice de aceitáveis e duplas apresentaram diferenças mais expressivas.
Para espaçamentos aceitáveis, foi constatada diferença de 8,8% ao elevar a velocidade em 4,0 km h-1, enquanto ao elevar da velocidade mínima para a máxima houve decréscimo de 17,5%. Assumindo que 80% é o limite mínimo para o índice de espaçamentos aceitáveis em um dosador mecânico, neste ensaio, a velocidade crítica para a semeadura de feijão foi de 5,0 km h-1.
Considerando os espaçamentos falhos, que ocorrem quando duas plantas estão espaçadas a uma distância equivalente a 1,5 vez o espaçamento de referência no sulco de semeadura, temos um dos mais graves problemas da semeadura, já que reduzem a população final de plantas e o potencial produtivo da lavoura.
Constatações
Nossos resultados mostraram que, mesmo na menor velocidade operacional (4,0 km h-1), ocorreu elevado índice de espaçamentos falhos (10,7%), valor este que saltou para 18,1 e 20,1% nas velocidades de 5,0 e 6,0 km h-1, apresentando o maior e mais expressivo valor na maior velocidade (7,0 km h-1), atingindo falhas em aproximadamente um terço (27%) das sementes distribuídas.
Na Figura 5, o coeficiente de variação (CV%) é o resultado que pode resumir a qualidade de deposição de sementes e espaçamentos, de forma que, quanto maior é o coeficiente, maior é a quantidade de espaçamentos que se distanciam do espaçamento referência.
Este dado pode ser utilizado como parâmetro para definir a qualidade da distribuição, entretanto, a literatura científica não dispõe de um valor fixo para a cultura do feijão, podendo ser utilizados como referência os dados da cultura da soja, em que o coeficiente de variação máximo aceitável é de 50%.
Comparando-se o coeficiente de variação de semeadura para o feijão neste experimento com os valores de referência, verifica-se que não foram atingidos os limites críticos máximos, mesmo em condição de maior velocidade operacional.
Tal fato pode ter ocorrido em função das condições controladas de ensaio e qualidade mecânica do dosador de sementes. Dosadores de sementes mais simplificados ou mais antigos podem apresentar performance inferior na distribuição de sementes, de forma que a influência da velocidade operacional pode ser mais severa na qualidade de distribuição destas.
Os resultados indicam a necessidade de atenção para o aumento da velocidade de semeadura com o uso de dosador horizontal para a cultura do feijão, principalmente em velocidades superiores a 5,0 km h-1, visto que os dados são oriundos de esteira simuladora que promove condições operacionais “ideais”.
Assim, deve-se aumentar o nível de atenção na semeadura a campo, em que fatores como: corte da palha, abertura e fechamento do sulco de semeadura, controle da profundidade e compactação dos sulcos de semeadura podem afetar a distribuição e qualidade de estabelecimento da lavoura.