Por Anna Carolina de Oliveira, advogada especialista em direito ambiental com atuação no agronegócio.
Nos últimos anos, houve uma significativa conscientização sobre a importância da sustentabilidade no agronegócio brasileiro, posicionando-o como protagonista no cumprimento da agenda ambiental mundial.
Apesar dos avanços e esforços em direção à sustentabilidade, os produtores rurais brasileiros têm enfrentado muitos desafios. Eles são constantemente pressionados a adotar práticas mais sustentáveis, o que pode gerar um ônus adicional em suas atividades diárias. Além disso, muitas vezes são alvos de críticas e julgamentos injustos.
Nesse contexto, a edição 2023/2024 do Plano Safra foi utilizada como instrumento para fomentar os aspectos socioambientais da atividade agropecuária, impulsionando não só a produtividade, mas também a regularização ambiental das propriedades e o fortalecimento dos sistemas de produção sustentável.
Se bem orientado, o Produtor Rural poderá utilizar estrategicamente os recursos do Plano Safra, não só para fomentar sua atividade, mas também como ferramenta para apoiá-lo nessa jornada de adaptação às exigências ambientais do mercado, assegurando que seus esforços sejam reconhecidos e valorizados.
Premiação para o Cadastro Ambiental Rural (CAR): oportunidades e desafios
A edição 2023/2024 do Plano Safra estabeleceu uma premiação, consistente na redução de 0,5% na taxa de juros de custeio, para o Cadastro Ambiental Rural (CAR) analisado em uma das seguintes condições:
1) Programa de Regularização Ambiental (PRA);
2) Ausência de passivo ambiental;
3) Passíveis de emissão de cota de reserva ambiental.
Não é novidade que o CAR é um registro público obrigatório para todos os imóveis rurais no Brasil. Para que o CAR seja aprovado, as áreas de reserva legal (ARL) e áreas de preservação permanente (APP) precisam estar em conformidade com as exigências legais, e se o imóvel rural tiver passivos ambientais, todos eles deverão ser regularizados.
Dessa forma, a redução na taxa de custeio quanto aos critérios relativos ao CAR, veio não só para estimular o produtor a fazer a inscrição, mas também para incentivar a regularização dos passivos ambientais.
Por outro lado, merece destaque o incentivo ao produtor rural para emitir cotas de reserva ambiental CRA no âmbito do CAR.
A CRA é um título que pode ser comercializado em bolsas mercantis e sua emissão é uma grande oportunidade para os proprietários que possuem excedentes florestais de monetizar e lucrar com essas áreas, pois as CRAs poderão ser vendidas aos proprietários que possuem déficit de reserva legal e querem compensá-las.
Desafios
O CAR é baseado em autodeclaração, o que significa que os proprietários ou seus representantes legais são responsáveis por fornecer as informações sobre a propriedade.
Ocorre que, em quase todos os estados brasileiros, não há exigência de que o CAR seja preenchido por profissional com expertise ambiental, o que tem levado à inclusão de dados incorretos e/ou inconsistentes no sistema.
Além disso, a análise do CAR está atrasada em quase todo país, devido aos problemas com integração de dados no sistema, número insuficiente de servidores nos órgãos ambientais para fazer as análises, procedimentos burocráticos, etc.
Portanto, os produtores rurais podem ter dificuldade tanto para analisar, quanto para aprovar o CAR, prejudicando o recebimento da premiação que fora prevista no Plano Safra 2023/2024. Nesse sentido, é importante que o produtor tenha o auxílio de um advogado não para fazer a inscrição ou correção do CAR, mas também para garantir o seu direito de análise do CAR pelo órgão ambiental.
Premiação para a adoção de práticas sustentáveis
Uma das inovações mais significativas do Plano Safra 2023/2024 é a premiação, com a mesma redução de 0,5% na taxa de juros nas operações de custeio, ao produtor que adote práticas sustentáveis no desempenho de suas atividades, tais como:
- Utilização de bioinsumos;
- tratamento de dejetos na suinocultura;
- uso de pó de rocha e de calcário no solo;
- utilização de energia renovável na avicultura;
- rebanho bovino rastreado e certificação de sustentabilidade;
- produção orgânica ou agroecológica, etc.
Acerca do critério de produção agroecológica, vislumbro que muitos produtores de grãos poderão ser beneficiados com a referida redução, uma vez que é crescente a utilização dos sistemas de plantio direto e rotação de culturas, que são consideradas técnicas agrícolas sustentáveis.
A inclusão do rastreamento bovino como requisito para a premiação também merece destaque, pois o rastreamento é um mecanismo que oferece vantagens significativas ao produtor que vão muito além das questões ambientais, tais como: controle de qualidade da produção, certificação de origem, acesso a mercados internacionais, eficiência no manejo, valorização do produto, etc.
Registre-se que a redução de 0,5% na taxa de juros nas operações de custeio é acumulativa e pode atingir até 1%.
Linhas de crédito para incentivar as ações sustentáveis
O Plano Safra 2013/2024 também contempla programas de investimentos que oferecem financiamentos com taxas de juros e prazos diferenciados, impulsionando tanto a inovação e a modernização, quanto a sustentabilidade do agronegócio.
O programa RenovAgro foi destinado a financiar os sistemas de produção agropecuária sustentáveis, tendo sido previstas diversas modalidades, dentre as quais merecem destaque:
- RenovAgro Recuperação e Conversão: para a recuperação de pastagens degradadas,
- RenovAgro Ambiental; para adequação ou regularização das propriedades rurais frente à legislação ambiental, inclusive recuperação da reserva legal (RL), áreas de preservação permanente (APP), aquisição de CRAs, entre outros.
- RenovAgro Sistema Plantio Direto, para a implantação e melhoramento de sistemas de plantio direto “na palha” de grãos, cana-de-açúcar e hortaliças;
- RenovAgro Bioinsumos, para uso de bioinsumos;
- RenovAgro Manejo de Resíduos: para implantação/ melhoramento de sistemas de manejo de resíduos oriundos da produção animal para a geração de energia e compostagem
- RenovAgro Manejo dos Solos; para adoção de práticas conservacionistas de manejo do solo, incluindo correção da acidez e fertilidade.
Verifica-se que as práticas sustentáveis apoiadas pelo RenovAgro são semelhantes às práticas que poderão ser premiadas com a redução de 0,5% na taxa de juros nas operações de custeio, tornando-se uma alternativa interessante para o produtor fazer as adequações ambientais de sua propriedade e atividades.
Por sua vez, o programa Inovagro, destinado a financiar novas tecnologias, também é interessante sob o aspecto da sustentabilidade, oferecendo recursos para financiar, por exemplo, a implantação de sistemas de energia renovável (energia solar, biomassa e eólica), aquisição de equipamentos e serviços de pecuária e agricultura de precisão, entre outros.
Sem dúvidas, a edição 2023/2024 do Plano Safra foi projetada não só para promover a produtividade, mas também para incentivar os produtores rurais no cumprimento das exigências ambientais feitas pelo mercado nacional e mundial.
Os programas de investimentos podem ser muito úteis ao produtor rural, que precisa ficar atento aos itens financiáveis, às regras e aos requisitos para obtenção do crédito e das premiações.
Dessa forma, para melhor aproveitamento do Plano Safra, é aconselhável que o produtor rural busque a orientação de um profissional na área ambiental, que poderá oferecer insights sobre as melhores práticas sustentáveis e estratégias para maximizar o uso dos recursos disponíveis, garantindo assim o sucesso de suas operações.