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Ações de recuperação para o pós-crise do agronegócio

Autor

Djalma Teixeira de Lima FilhoCEO | Partner da Agsusdjalma@agsus.com.br
José Fratari COO | Partner da Agsusfratari@agsus.com.br
Lorraynne SpirandelliAnalista de Marketing e Branding da Agsuslorraynne@agsus.com.br

Embora inicialmente não sendo a principal preocupação, muito mais enfocada no aspecto de contágio epidemiológico, a consequente crise financeira poderá adquirir características sistêmicas de abrangência global. Mais de um terço da população mundial está vivenciando algum tipo de quarentena, e segundo a ONU, a pandemia da Covid-19 é a pior crise global desde a Segunda Guerra Mundial. Milhares de pessoas tiveram que paralisar seus comércios, fechar as portas de lojas, fábricas e escritórios para ficarem em casa, a fim de evitar o risco de contágio.

Se para as grandes empresas, pausar o trabalho é uma situação caótica e desafiadora, para as pequenas e médias organizações e empreendedores autônomos foi a concretização de um pesadelo temido.

Infelizmente, já foram milhões de demissões e muitos estabelecimentos e famílias com dificuldades para cumprir com seus compromissos. Essa é uma triste combinação, de uma doença que é uma ameaça para todos no mundo, e um colapso econômico que trará uma recessão sem precedentes na história recente.

Governos em todo o mundo estão priorizando medidas que limitem a propagação da doença e salvem vidas, porém, o desafio maior está por vir, com a busca do melhor modelo de retomada paulatina das atividades laborais e de soluções que mitiguem o risco de um colapso econômico em vários países do mundo, buscando uma adaptação a essa nova normalidade que vai se instaurar no pós-crise.

Desta vez é realmente diferente

A Covid-19 mudou a vida das pessoas. Não somente pela alteração da rotina nesses dias de isolamento, mas por mudanças mais profundas e transformações que devem moldar a realidade à qual todos estavam habituados. Mas, como será depois que tudo voltar ao “normal”?

Que cenários prováveis já começam a emergir e devem se impor no mundo pós-pandemia? Existe uma forma de prever ou mensurar os prejuízos? Embora as pandemias sejam comparativamente raras e as mais graves mais raras ainda, não há um episódio histórico que possa fornecer qualquer insight sobre as prováveis consequências econômicas da crise global do coronavírus.

O mundo pós-pandemia será diferente, e devemos estar preparados para encará-lo. Mas, como isso poderá ocorrer? Nessa realidade de grandes incertezas e complexidade, o certo é que a Covid-19 perturbou a ordem mundial como a conhecemos até agora.

Os efeitos mundiais incluíram a instabilidade social e econômica, corridas às compras, pânico com a disseminação de informações falsas e teorias da conspiração sobre o vírus, fechamento de escolas e universidades, além de paralisação de fábricas e do comércio em geral, afetando importantes canais de consumo.

O Fundo Monetário Internacional projeta que, como resultado da pandemia, a economia mundial se contrairá 3% em 2020, a maior desde 1930. O impacto será maior nas economias avançadas (-6,1%) do que nas economias em desenvolvimento (-1%). A Ásia emergente é a única região para a qual o fundo espera um crescimento positivo de 1%, embora ainda seja cinco pontos abaixo da sua média na última década. Os países mais afetados serão Itália (-9,1%), Espanha (-8%), Grécia (-10%), Portugal (-8%), França (-7,2%), Alemanha (-7%), Reino Unido (-6,5%) e Estados Unidos (-5,9%). No Brasil, a contração estimada até esse momento é entre -5 a -6%, com uma taxa de desemprego na ordem de 15%.

No entanto, todas estas previsões apontadas pelo FMI, assim como de outros especialistas pelo mundo, estão fortemente carregadas por uma grande carga de imprevisibilidade, já que dependem da interação de vários fatores, como a eficácia das medidas de controle e a evolução da pandemia, avanço nas pesquisas de medicamentos, mudança de comportamento das pessoas e até de articulações políticas.

Impactos no agronegócio brasileiro

Enquanto a grande paralisação, como está sendo chamada a pandemia, aterroriza as cidades, no campo a situação é um pouco diferente. O campo não parou e segue trabalhando intensamente, embora com alguns canais de consumo de produtos do agro paralisados nas cidades, prejudicando principalmente pequenos produtores.

A safra de grãos em fase final de colheita promete atingir uma produção de 251,8 milhões de toneladas, 4% superior à obtida na safra anterior, segundo dados do 7º levantamento de safra da CONAB.

As exportações brasileiras do agronegócio somaram US$ 21,39 bilhões no primeiro trimestre, com destaque para a soja, que mesmo com os preços em baixa no mercado futuro, os valores em reais seguiram em alta, com a forte valorização do dólar, alcançando, somente no mês de março, 11,6 milhões de toneladas exportadas, segundo dados do Ministério da Agricultura.

Além disso, as demandas por produtos agrícolas brasileiros estão crescendo, com vários países preocupados com possíveis desabastecimentos pós-pandemia, como China e Egito, entre outros. Soja, carne bovina, frango e algodão são os mais demandados, com a carne bovina batendo novo recorde de exportação no mês de abril.

Mas nem tudo é otimismo. As fortes quedas nos preços mundiais do petróleo geraram impactos negativos no setor sucroalcooleiro, obrigando a uma alteração no mix de produção em favor do açúcar em detrimento ao etanol, o que levará a um aumento de oferta mundial, pressionando para baixo os preços internacionais do açúcar e comprometendo as margens e fluxo de caixa das usinas.

Problemas de logística para coleta de leite, aliado a uma redução no consumo de lácteos e derivados, afetaram as indústrias de laticínios e produtores de leite. Considerando ainda aspectos logísticos, tiveram grandes perdas os exportadores de frutas, devido à redução e suspensão de voos, já que grande volume destas exportações se dá por via aérea.

Outros produtos também tiveram perdas na exportação por falta de contêineres. As indústrias de máquinas e implementos agrícolas sofreram reduções e paralisações de suas atividades, já que dependem também da China para o fornecimento de peças e componentes eletrônicos para seguir produzindo.

O setor de flores e plantas ornamentais projetam prejuízos gigantescos, devido à grande redução da demanda com o fechamento do comércio e cancelamento dos eventos sociais. No setor cafeeiro, a preocupação está voltada à disponibilidade de mão de obra e às medidas de controle de contágio, já que grande parte destes trabalhadores migram de outras regiões para as regiões produtoras.

Em linhas gerais, estes são apenas alguns reflexos imediatos causados pela doença, e embora não tenhamos muito claro todos os impactos que esta pandemia pode gerar para o setor, a tendência, segundo a maioria dos especialistas, é de que o agronegócio deverá sofrer menores perdas do que os outros setores, tendo, inclusive, quem acredite que será o único a crescer em 2020.

A recuperação na nova normalidade

A nova condição de normalidade, provavelmente nunca vista antes, será composta de mudanças profundas no comportamento de consumidores, na gestão da cadeia de suprimentos em praticamente todos os setores da economia, em temas regulatórios relacionados à saúde pública, nas relações trabalhistas e sindicais, no comércio internacional, entre outros, e finalmente na configuração das atividades empresariais, desde protocolos e procedimentos internos ao modelo de contratação, passando pelo ambiente físico de trabalho.

Diante de uma situação tão catastrófica, a preocupação, além do controle e prevenção do contágio, passou a ser também a definição de quando e como poderemos vislumbrar a flexibilização do isolamento social e uma retomada dos diversos setores da economia.

De acordo com a consultoria internacional McKinsey, pesquisas e experiências mostram que aqueles que agem com uma mentalidade de ciclo longo estarão mais bem posicionados para acelerar a crise. Nas recessões de 2007/08, que afetaram severamente alguns setores da economia, 20% das empresas de melhor performance estavam à frente de seus pares em cerca de 20 pontos percentuais, à medida que avançavam na recuperação em termos de retorno total acumulado aos acionistas (TRS).

Oito anos depois, sua liderança havia crescido para mais de 150 pontos percentuais. Uma das principais lições dessa experiência é que as empresas em geral, de todas as magnitudes, que se movem cedo e decisivamente em uma crise se saem melhor.

Aceleração da era digital

Dentro desses movimentos, não importa se estamos nos referindo a uma propriedade rural, uma agroindústria ou a um distribuidor ou varejista do agribusiness, a transformação digital e estratégica terá um papel de protagonismo no processo de recuperação econômica no pós-crise.

De igual maneira, acreditamos que a crise do Covid-19 provavelmente acelere significativamente a mudança para o digital e agite fundamentalmente o cenário dos negócios. Mesmo antes do Covid-19 chegar, segundo a consultoria McKinsey, 92% das empresas pensavam que seus modelos de negócios precisariam mudar com a digitalização, o que seguramente no novo cenário se torna mandatório.

Para isso, algumas capacidades e competências serão fundamentais nessa nova modalidade, cabendo aos executivos e empresários uma análise de seu ambiente de trabalho e de seu entorno empresarial, procurando criar ou aprimorar os seguintes aspectos:

þ Agilidade: a velocidade com que a mudança nos atingiu pegou a todos desprevenidos. Tornou-se óbvio que especialistas técnicos que detinham a exclusividade da informação e sistemas entrincheirados que suportam negócios há anos – tecnologias e sistemas isolados, pilhas de relatórios desconectados e processos altamente complexos – não são páreo para a fluidez dinâmica da crise atual. A tomada de decisão descentralizada, baseada em desenvolvimento de competências e delegação de autoridade clara, deverá ser o novo padrão. Agilidade não significa necessariamente velocidade, mas sim a conjugação de adaptabilidade e assertividade.

þ Ações ousadas, apoiadas por um sólido entendimento de risco: a escalada da crise precisa ser acompanhada de ousadia em resposta. É improvável que mudanças incrementais e meias medidas ofereçam às empresas a potência econômica necessária para enfrentar a tempestade e sair da crise em uma posição forte. A ousadia da ação deve ser temperada com uma apreciação completa do risco, buscando, com essa reflexão, a geração de cenários e de suas respectivas ações de mitigação.

þ Compromisso com uma abordagem holística: a crise expôs as fraquezas sistêmicas e organizacionais. Essas debilidades impõem a necessidade de garantir que as iniciativas de gestão, em um primeiro momento, promovam a geração de resiliência no curto prazo, suportada por ações de impacto na preservação do caixa e na revisão dos processos de comercialização, complementadas posteriormente por movimentos de transformação estratégica e digital que levem em conta a gama completa de dependências das ferramentas e mecanismos multifuncionais que integram sistemas, pessoas e processos nos negócios.

Hora de agir

Apesar dos imensos desafios que os líderes e empresários rurais estão enfrentando hoje, agora é a hora de agir. Dada a rapidez com que as mudanças estão acontecendo, esperar até que você veja sinais de recuperação poderá ser tarde demais.

Não há qualquer dúvida que o principal movimento na continuidade operacional é a proteção da vida e da saúde dos colaboradores, principal ativo de todas as organizações, desde uma pequena propriedade rural até uma grande multinacional do agribusiness global.

Cumpridos os protocolos recomendados pela Organização Mundial da Saúde e os critérios específicos definidos pelas respectivas autoridades nacionais e regionais, cuja análise não é objeto deste texto, vemos assim, neste cenário, duas grandes linhas de ação, distribuídas entre o curto e o médio prazo, que terão um papel protagonista no processo de recuperação de resultados, que trataremos a seguir.

Área financeira e gestão do caixa voltam a ser o centro das atenções

Em empresas bem geridas, se observa como regra geral que a área financeira e a gestão de caixa, seja em uma agroindústria, uma cooperativa, uma empresa ou propriedade rural, sempre tiveram um papel de grande importância, pois são responsáveis pelo controle de todos os recursos monetários do negócio, fornecendo uma análise bastante precisa sobre sua saúde financeira, sua rentabilidade e estabilidade. Porém, com o advento da pandemia do Covid-19, mais do que nunca, o controle financeiro se faz necessário.

Segundo a PwC, há vários problemas provocados por esta situação de pandemia, que podem afetar consideravelmente a área financeira e gestão de caixa de uma empresa:

ð Diminuição da receita: desafios para manter o fluxo de caixa, capital de giro e problemas contratuais; impacto nas estratégias de cobertura e classificação de crédito e incerteza junto a clientes, fornecedores, acionistas e demais stakeholders (públicos de interesse) sobre a capacidade de resposta da organização.

ð Força de trabalho: problemas de disponibilidade de funcionários para lidar com as atividades de negócios; dificuldade organizacional em se adaptar ao teletrabalho e garantir acesso remoto aos sistemas.

ð Operações e cadeia de suprimentos: circunstâncias de demanda descontinuadas e possível inatividade comercial; falhas na cadeia de suprimentos e quebras de estoque; impedimentos e dificuldades em manter a continuidade operacional dos processos e do modelo organizacional.

ð Regulamentação e outros riscos: violação dos termos de acordos, levando a dificuldades como acesso ao financiamento; suspensão ou rescisão antecipada de contratos; respostas regulatórias que impactam em questões trabalhistas ou tributárias.

Portanto, ações imediatas de preservação do caixa, como um forte e estruturado programa de gestão de custos e despesas, gestão de carteira e de riscos e captura de mercados de maior valor agregado serão fundamentais em qualquer modelo de gestão dentro do cenário da nova normalidade econômica e empresarial.

Transformação estratégica e digital

Nesse aspecto, chegou a hora de tirar do papel os planos para um uso mais estratégico de modelos e plataformas digitais para tomada de decisões rápidas e precisas, revisão de modelos e canais de compras, que tendem a um uso intensivo de marketplaces do agronegócio, acesso mais direto aos diferentes mercados potenciais suportado por conceitos de gestão de riscos e utilização de novos conceitos de gestão relacionados à indústria e agricultura 4.0. Todos estes temas serão determinantes no sucesso do plano de recuperação econômica pós-Covid-19.

Essa visão poderia ser consolidada em quatro grandes tendências pragmáticas no agronegócio, em relação à transformação digital:

a) Inovação e agilidade como fatores de rentabilidade: a aplicação de tecnologias convergentes, segundo especialistas do agronegócio, tem um potencial de incremento de até 30% em produtividade, pela utilização massiva de informações geradas em campo (big data), por meio dos sistemas de agricultura de precisão, monitoramento em tempo real e pela análise de sistemas preditivos, não apenas na produção em campo, mas também na logística interna e externa de transporte e armazenamento.

Também a rastreabilidade adquire relevância, à medida em que cada dia mais os clientes querem ter uma garantia de origem, conceito que pode aplicar-se para garantir que a soja foi produzida fora de áreas de preservação ou que a uva utilizada na produção de um vinho ou o grão de café sendo processado provêm de um terroir específico, agregando com isso valor ao produto final e à sua cadeia produtiva.

Finalmente, não podemos deixar de citar os sistemas integrados de gestão ou ERPs, os quais já se tornaram mandatórios em grandes empresas, porém, ainda necessitam de versões simplificadas que possam atender necessidades específicas de propriedades rurais e empresas de pequeno e médio porte.

As informações transacionais geradas nesses sistemas devem alimentar os dashboards, interface de informação e gestão customizável e em tempo real que resume todas as métricas essenciais no processo de tomada de decisão. Mais que gerar a informação, o mais importante é fazer com que a informação gerada promova ações e decisões mais assertivas e que gerem valor aos diferentes participantes da cadeia.

b) Reconexão com o cliente: este tópico trata do tradicional conceito do marketing contextualizado ao atual momento das tecnologias digitais, aplicativos e marketplaces, referindo-se em última instância ao processo de geração de valor aos clientes.

É importante o entendimento de que marketing não é só publicidade, e especialmente no agronegócio a geração de valor pode estar concentrada na prestação de serviços, na solução de problemas, na oferta de conteúdo, na conveniência ou na experiência do cliente (CX – customer experience).

O suporte pós-venda é também uma das importantes estratégias utilizadas quando se compreende que a satisfação do cliente vai muito além do processo de compra do produto/serviço, sendo intensificada por um suporte técnico, uma ação de relacionamento ou ainda um treinamento específico para otimizar o nível de aproveitamento.

Portanto, produtos e serviços são apenas os veículos da proposta de valor sendo adquirida, que nesse cenário de intensa volatilidade necessita estar otimizada através do conceito de proatividade, ou seja, desenhada para antecipar as mudanças de mercado, não apenas para suprir expectativas, desejos e necessidades declarados. Este será o grande desafio.

Novos modelos de negócios

O modelo de negócio define a forma com a qual a empresa ou empresário geram valor a seus clientes e são reconhecidos por este fato. Em períodos de turbulência e como resultado da mudança de hábitos e do contexto de mercado onde está inserida a empresa, torna-se necessária uma contínua revisão e aprimoramento do modelo de negócio inicialmente definido.

Essa ação pode se dar por meio de produtos e serviços complementares, estabelecimento de novas parcerias dentro do setor de atuação, geração de experiências agregadas a produtos ou serviços, ou ainda da venda de produtos como serviços, entre outros, sempre buscando o resultado final esperado na entrega da proposta de valor.

A palavra de ordem é a disrupção, buscando continuamente o que é valioso ao seu cliente e o que pode diferenciar uma empresa de seus concorrentes.

Mindset de flexibilidade e inovação

As novas gerações de empresários rurais e executivos, que já iniciam a vida profissional em um ambiente de negócios baseado na tecnologia e na internet, promovem as mudanças com mais facilidade em relação às anteriores gerações.

A cultura organizacional é um pré-requisito para qualquer tipo de transformação em qualquer negócio, incluindo a transformação digital, sendo definida como o conjunto de crenças e valores, aplicado tanto a uma grande multinacional quanto a uma pequena empresa rural.

A mudança para um novo modelo mental (mindset) é importante no processo de aceitação de conceitos inovadores, entre os quais o de Ativos Alavancados e Staff sob Demanda, definidos por Salim Ismail no livro Organizações Exponenciais.

O primeiro é definido como a crescente tendência à terceirização, não somente de atividades e equipamentos de baixa criticidade, mas também de equipamentos estratégicos, exceto em situações de baixa disponibilidade de mercado.

A tecnologia permite que as organizações e produtores rurais, por exemplo, facilmente compartilhem em base local e inclusive em maior amplitude geográfica, os ativos necessários às suas atividades produtivas. O conceito de staff sob demanda é uma característica necessária à funcionalidade e velocidade em um mundo em constante transformação.

Conhecimentos e habilidades já não necessitam ser exclusivos ou proprietários, especialmente em situações nas quais não sejam necessários em tempo integral ou que possam ser com certa facilidade obsoletados. Nesse conceito, também está mudando o formato de remuneração, cada dia mais vinculado a resultados em substituição a horas dispendidas. Estas visões estão muito vinculadas às startups do agronegócio (agritechs), que contribuirão decisivamente no processo de recuperação da economia no pós-crise.

Desafios do Agro

O grande desafio para os produtores rurais, empresários e executivos das agroindústrias e da cadeia de distribuição e comercialização do agronegócio reside em como identificar o seu atual estágio evolutivo em termos de estratégias digitais, definir prioridades conforme as características e necessidades de sua atividade e conectar as diversas tecnologias, de maneira a permitir uma visão holística dos diversos fatores que impactam em seus resultados de caixa e econômico, traduzidos em indicadores de rentabilidade facilmente compreensíveis, que em última instância é o que efetivamente importa.

Adicionalmente, é importante administrar a avalanche de dados e empresas de tecnologia, que quase em base diária batem à porta oferecendo um diferente sistema ou aplicativo que pode em teoria resolver um problema pontual.

A Agsus trabalha dentro de um conceito que permite uma avaliação diagnóstica de maneira transparente e independente, composta de processos sequenciais que em primeira instância buscam reforçar os fundamentos e resultados do negócio atual, gerando as condições necessárias em termos de recursos financeiros e de tempo, para promover o processo de transformação da propriedade ou da empresa, o que, mais do que um processo tecnológico, tem a ver com estratégias claras e com pessoas. Conforme define Brian Solis, um futurista americano, “transformação digital é uma história de pessoas”.

Um fator de fundamental importância neste contexto é a independência, de maneira que a empresa ou produtor rural possam desenvolver e implementar o conceito com uma abordagem holística e integrada, adaptado às suas reais necessidades e prioridades, sem vincular-se exclusivamente para isso com um único fabricante, desenvolvedor ou marketplace, o que poderia gerar futuramente uma excessiva dependência e, consequentemente, maiores riscos ao seu negócio.

O modelo de trabalho que sugerimos, baseado em conceitos da Organização Exponencial, considera os seguintes passos:

Fonte: Agsus Agrifunding baseado em Driving Digital Strategy

Conclusão

Não é novidade que o agronegócio brasileiro vem sendo, nos últimos anos, uma referência global em produtividade e inovação em diversas cadeias produtivas do setor, assim como é certo que o mundo estabeleceu o coronavírus como uma nova referência de tempo e um marco para importantes transformações que marcarão o século XXI.

Se antes já tínhamos caracterizado um mundo VUCA, sigla que representa as características de intensa volatilidade, incertezas, complexidade e ambiguidade, a crise global vai intensificar este processo de mudanças, onde a transformação digital já não será uma tendência ou expectativa futura, mas sim uma realidade imprescindível ao processo de recuperação e otimização de resultados.

As empresas e propriedades rurais de sucesso no futuro próximo serão aquelas que conseguirem conciliar os fundamentos de gestão que caracterizam as melhores práticas de mercado com a agilidade, decisão rápida e inovação das startups. Esteja atento também você, empresário, executivo ou proprietário rural, conectando-se com esse novo mundo de soluções disruptivas e fantásticas oportunidades.


O rompante digital do campo

Cintia LeitãoHead de agronegócio da Senior Sistemas

Este é um momento ímpar da história da humanidade. Não temos precedentes que nos facilitem tomar um rumo certeiro para o futuro, já que são algumas as incertezas que nos norteiam. Completamente diferente de outras crises existentes, esta trouxe proporções globais, afetou e interditou fronteiras, se proliferou em uma velocidade avassaladora e ainda não possui nenhum horizonte de controle, vacina ou cura.

Vivemos apreensivos esperando o desenrolar dos próximos capítulos. Entretanto, no meio dessas dúvidas há algo certo: o mundo não será mais o mesmo. E este não é um clichê.

As crises sempre foram as responsáveis por impulsionar grandes movimentos da humanidade, alguns deles disruptivos, outros que ainda engatinhavam e que pegaram carona e aproveitam o efeito catalisador destas mudanças. Neste caso, é unânime em afirmar que o mundo se tornou digital. Quem tinha receio desta mudança viu-se engolido por uma onda que não deixou escolhas e que só se fortalecerá daqui pra frente.

O caminho

Para começar a falar sobre a transformação digital no agronegócio, precisamos entender como o agronegócio brasileiro tem se comportado entre o analógico e o digital ao longo dos anos. É preciso desmistificar algumas crenças.

Em primeiro lugar, para se considerar a adoção de qualquer tipo de tecnologia, e isso vale para qualquer segmento, é necessário que se avalie as condições de infraestrutura e conectividade, fundamentais para conexão, trânsito e armazenamento de dados. Este ainda é um desafio para a maioria dos agricultores e empresários do segmento.

Segundo o último Censo Agropecuário do IBGE (2017), no Brasil existem mais de cinco milhões de estabelecimentos agropecuários e mais de 15 milhões de pessoas que trabalham no segmento. A faixa etária varia, predominantemente entre 35 a 74 anos, de um público em sua grande maioria masculino (81%). Apenas 5,58% destes têm formação superior.

Grande parte dos negócios ainda é de origem familiar (73% das pessoas têm parentesco entre si) e, sobre a conectividade nas propriedades rurais, 41% têm acesso à internet. Dos produtores entrevistados, 63% afirmam se conectar via celular, porém, 21% deles afirmam que não se conectam em virtude da indisponibilidade de redes.

A falta de infraestrutura e conectividade têm os mesmos impactos negativos que a falta de infraestrutura logística proporciona ao País. Em um novo mundo de relações digitais, a conectividade de qualidade é fator-chave para que a transformação digital funcione efetivamente. Quase metade (41%) das propriedades rurais ainda não possui conexão. Se não houver investimento na infraestrutura tecnológica para essas conexões, não passaremos do discurso da vanguarda da transformação digital.

Uma luz no fim do túnel

Neste campo, parece que há luz no fim do túnel. Em agosto do ano passado o MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) e o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) assinaram um acordo de cooperação técnica com o objetivo de promover ações para expansão da internet no campo incentivando o fomento e a adoção de novas tecnologias e serviços inovadores.

Ambos têm a ambição de posicionar o Brasil como um exportador de soluções de IoT (internet das coisas) para a agricultura. Descomplicando o termo IoT, nada mais é do que conectar objetos do cotidiano, sejam das fazendas ou empresas.

Por exemplo, conectar máquinas agrícolas, pivôs de irrigação, colocar sensores em silos para monitorar volume e umidade, e unir todos estes dados, transformando-os em informação. Este é o outro ponto que trataremos adiante: a necessidade de descomplicar o que são e para que servem as tecnologias para o campo ou negócios agropecuários.

Obstáculos

São muitas as ofertas e o “techniquês”. Muitas vezes essa enxurrada de ofertas e informações pode gerar certa resistência ou intolerância sobre a necessidade ou não do ingresso no mundo digital. Segundo o resultado do estudo Radar AgTech, realizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e divulgado no ano passado, o País tem 1.125 empresas de tecnologia ligadas ao agronegócio. Imagino o quanto você, leitor do segmento, não é bombardeado com informações e deve ficar desnorteado com tantas opções.

Ainda sobre o acordo de cooperação firmado acima, criou-se também a Câmara do Agro 4.0, órgão que tem como objetivo a promoção de debates sobre o tema de fazendas conectadas e interativas com entidades do governo e setor privado. Outra ação que teve uma diretriz similar foi a aprovação do PLC 79, texto que modernizou a Lei Geral de Telecomunicações e preconiza a massificação da internet de banda larga no País, um importante marco para a evolução da conectividade nas áreas rurais. Alguns passos foram dados, mas há, ainda, um longo caminho a ser percorrido.

Infraestrutura e conexões são fundamentais, mas não menos importante que elas são as crenças arraigadas no agronegócio brasileiro, que permitem ou não, aos empreendedores, tomarem decisões sobre tecnologias.

Segundo a visão do jornalista Jorge Caldeira, no livro “História da Riqueza do Brasil”, o agronegócio foi desde sempre a principal economia no País. Um embrião oriundo das relações de troca entre os colonizadores europeus com os nativos brasileiros. Negócios que, historicamente, foram sendo passados de geração em geração.

Das velhas cadernetas de nota, das compras fiadas feitas nos armazéns, às cadernetas que controlavam (e ainda controlam) as despesas dos insumos agrícolas adquiridos de uma safra para outra. Foi lá, naquela época, que nasceu o escambo que até hoje predomina como forte moeda de troca no agronegócio. Agora, em uma roupagem mais moderna e americanizada, batizado de barter.

De lá para cá

A gestão, de geração em geração, criou tradições e receitas que, por anos, só eram rompidas com o espiar curioso sobre a qualidade e performance da safra do vizinho. Mesmo assim, as receitas das cadernetas eram quase que imaculadas, até serem assoladas pelo advento das tecnologias modernas de produção: a biotecnologia.

Fortemente balizadas na qualidade da produção e no aumento da produtividade por hectare, não demorou muito para que a biotecnologia caísse nas graças dos agricultores brasileiros e os fizessem alcançar 81% da área plantada do País (Fonte USDA, 2018). Com a adoção destas tecnologias, o Brasil chegou ao topo da produção de vários cultivos, como soja, café, açúcar e algodão.

Receita de sucesso

É fato, e já se sabe, que biotecnologia e agricultura de precisão trazem resultados precisos na correção, nutrição do solo e desenvolvimento das plantas; que os pivôs de irrigação podem ser controlados à distância; que as máquinas inteligentes podem operar sozinhas; que ferramentas tecnológicas permitem o monitoramento remoto do desempenho das máquinas e que, todas estas tecnologias reunidas, trazem maior produtividade, eficiência e, por consequência, rentabilidade.

O agronegócio virou um negócio de desempenho, onde a competitividade é altíssima e qualquer centavo ganho pode se transformar em milhões. Errar, em contrapartida, pode custar uma safra.

Quais seriam, então, as dicas que poderiam ser compartilhadas com quem ainda não decidiu por qual caminho seguir ou que deseja iniciar um planejamento estratégico de seu negócio agropecuário? Em primeiro lugar, não há mais escolha! É preciso ter consciência, como falamos anteriormente, que o digital é o novo meio e veículo das relações. Mas, calma, porque esta é uma boa notícia!

Ecossistema

Foi falado aqui sobre os vários benefícios das tecnologias dentro das fazendas, mas é preciso pensar no agronegócio como um todo, um ecossistema. Seja o seu negócio uma fazenda, loja de insumos, armazém, agroindústria ou prestação de serviços, para qualquer negócio, é necessário mapear todos os processos de condução do trabalho, desde a negociação com fornecedores, o recebimento das notas fiscais, dos produtos químicos, sementes, EPIs e assim por diante.

De que forma hoje você faz registro de dados e transações do seu negócio? Como planeja pagamentos e recebimentos? Como paga os impostos e tributos? Ainda em planilhas de Excel? Não há problema. Vá mapeando cada passo.

Se você é comerciante, mapeie toda a cadeia do seu relacionamento com seus clientes. Dentro das fazendas, o processo é similar. Escreva o passo a passo do controle dos insumos, das aplicações, os registros das datas, os contratos de vendas de grãos, a previsibilidade de produção e assim por diante. Uma possibilidade para quem tenha dificuldade é contar com o auxílio de um consultor especialista.

Com estes processos claramente definidos, será possível enxergar o que de fato é necessário para seguir adiante com tudo o que a tecnologia tem a oferecer e como performar o negócio da forma mais produtiva e sustentável possível.

Dica

Uma dica importante para iniciar esse processo de transformação digital é investir em um bom sistema de ERP. Este nome é dado ao sistema de gestão (software) que conectará todos os dados de um negócio e propiciará a gestão de backoffice.

Para uma fazenda, a recomendação é a mesma: ter um bom ERP e outro software que se integre a ele e que seja capaz de colher os dados do campo e gerar a integração de todas essas informações. Esta integração dará acesso a todas as informações do negócio e permitirá que extraia relatórios de custos e de receita para a tomada de decisão de forma clara e eficiente.

Quem tem funcionários, também pode adotar um sistema que faça a gestão de todo o seu pessoal, desde o controle da folha de pagamento, gestão do ponto e desempenho deles frente às metas traçadas.

Há sistemas para controlar tudo. Basta entender as necessidades e utilizar a tecnologia em benefício. A transformação digital é uma jornada. Será experimentando que será possível saber qual solução é a ideal. Acredite no poder transformador de decisões digitais para o agronegócio.

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