Cientistas do Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR), do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), do Brasil, estudam bactérias que promovem o crescimento das plantas. Por estes microrganismos terem sido isolados do solo, possuem potencial para uso como biofertilizantes, sem contaminar a água ou causar alterações que prejudiquem o próprio solo, como pode ocorrer com fertilizantes químicos.
Este estudo foi coordenado por Juliana Velasco, pesquisadora do LNBR/CNPEM, que explica sobre seu objetivo: “Depois de isolar as bactérias do solo, nossa equipe começou a identificar os chamados compostos orgânicos voláteis (COVs), produtos derivados do metabolismo de bactérias que promovem o crescimento vegetal. Estas pequenas moléculas sinalizadoras são interessantes, pois podem induzir o crescimento das plantas mesmo em baixas concentrações, e elas podem difundir facilmente pelo solo, não havendo a necessidade de colonizar a rizosfera ou raiz da planta. O objetivo agora é investigar e entender como o metabolismo vegetal é alterado por causa dessas moléculas de sinalização”, diz a pesquisadora.
Durante a primeira fase do trabalho, foram utilizadas duas espécies de plantas modelo, Arabidopsis thaliana e Setaria viridis. Os pesquisadores selecionaram as cepas bacterianas que mais contribuíram para o crescimento dessas plantas e agora estão testando-as no arroz, mesmo em laboratório. “Sabemos que é impossível substituir completamente os fertilizantes químicos. Mas, certamente podemos reduzir significativamente o seu uso por meio da aplicação de produtos biológicos”, diz Bruno Henrique, mestrando no LNBR/CNPEM orientado pela Dra Juliana Velasco.
O que se viu
Os resultados in vitro mostram um aumento da biomassa das plantas em mais de 500%. “Estes resultados foram obtidos em laboratório, e com plantas modelos, e há grandes desafios em reproduzir no campo os resultados obtidos em laboratório, sob condições controladas, uma vez que nossas bactérias de interesse irão competir com outras já estabelecidas naquele determinado solo, além de estarem expostas a condições de crescimento não ideais e muitas vezes até adversas. A vantagem é que as bactérias que estamos utilizando foram isoladas do solo e, portanto, aumentam nossas chances de serem capazes de voltar a se estabelecer em seu habitat natural. Entretanto, em um cenário hipotético, se conseguirmos que estas bactérias aumentem em cerca de 10% a produtividade da cana-de-açúcar, isso representaria uma atividade econômica adicional da ordem de 4,8 bilhões no setor sucroenergético”, calcula Juliana Velasco.
Plantas beneficiadas
A relação bactéria-planta muitas vezes é específica, ou seja, uma bactéria poderá causar um efeito positivo em uma espécie de planta, mas não na outra. Por exemplo, as cepas que são utilizadas na cultura da soja para fixação biológica de nitrogênio não funcionam em cana-de-açúcar.
O que Juliana Velasco fez para tentar ‘minimizar’ este problema foi a seleção de cepas utilizando duas espécies de plantas modelo que possuem sistema fotossintéticos distintos. Como resultado, encontrou bactérias que promovem uma espécie, mas não outra. “Mas também tivemos a sorte de selecionar bactérias capazes de promover o crescimento de ambas as espécies. Isso pode ser um indício de que os voláteis produzidos por estas cepas podem atuar de forma similar no metabolismo destas plantas. Se estes mesmos mecanismos forem conservados em culturas agrícolas, a chance de sucesso é maior. Acontece que muito pouco é sabido sobre os mecanismos moleculares da planta que são modificados ou ligados por estes voláteis. Então só poderíamos responder esta questão testando as cepas selecionadas com as culturas desejadas, infelizmente”, justifica.
Mas, pensando nisso, o grupo liderado por Juliana vem trabalhando no desenvolvimento de métodos de seleção destas cepas já utilizando culturas de interesse agrícola e importantes para o Brasil, como a cana-de-açúcar, o milho e o arroz. Isso pode aumentar as chances de obter bons resultados em campo.
Bactérias x fertilizantes químicos
As bactérias podem substituir os fertilizantes químicos de diversas formas. A mais conhecida é a fixação biológica de nitrogênio, um caso de grande sucesso na cultura da soja. Uma vez que se utiliza bactérias que são capazes de captar para a planta o nitrogênio que está na atmosfera, não é necessário fazer a adição deste nutriente na cultura ou, pelo menos, reduzir consideravelmente seu uso. O mesmo é válido para bactérias capazes de solubilizar fósforo.
“No nosso caso específico, os voláteis microbianos induzem um melhor crescimento das plantas, o que pode ser consequência de um metabolismo otimizado e o melhor aproveitamento dos nutrientes. Neste caso, é impossível dizer que não será necessário o uso de fertilizantes químicos. Mas por área-plantada, podemos obter uma maior produtividade, sem o uso adicional destes produtos químicos. Em adição, vimos que uma destas cepas tem potencial para solubilizar fosforo in vitro, mas temos que testar para ver se ela pode fazê-lo no solo. Um objetivo mais ambicioso do nosso grupo é conseguir uma cepa com uma gama de propriedades benéficas às plantas”, pontua Juliana Velasco.
Ao final, este grupo de pesquisa do LNBR/CNPEM espera desenvolver um bioproduto.. Tecnologias similares são utilizadas com sucesso para fixação de nitrogênio. O grupo também busca entender os mecanismos pelos quais estes voláteis atuam, com aprofundamento científico a nível celular e molecular.