Capim-amargoso em algodão: problemas de matocompetição

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Jéssica Cursino Presoto
jessica.cursino_02@hotmail.com
Jeisiane de Fátima Andrade
jeisiane.eng.agronomica@gmail.com
Engenheiras agrônomas, mestras e doutorandas em Fitotecnia – ESALQ/USP
Acácio Gonçalves Netto
acaciogn@agronomo.eng.br
Marcelo Nicolai
mnicolai2009@gmail.com
Engenheiros agrônomos, doutores e especialistas – Agro do Mato Soluções Agronômicas

Crédito: Elevagro

A espécie Digitaria insularis, popularmente conhecida como capim-amargoso, é uma planta daninha da família Poaceae, nativa de regiões tropicais e subtropicais da América, de ciclo perene, podendo atingir até 1,5 metro de altura.

Tem capacidade de formação de touceiras a partir de curtos rizomas que, juntamente com o grande número de sementes produzidas, são responsáveis por facilitar a propagação desta espécie, uma vez que suas sementes são revestidas por muitos pelos, auxiliando sua dispersão por longas distâncias.

Infestação

O capim-amargoso é uma planta de metabolismo fotossintético do tipo C4, o que é extremamente favorável ao seu desenvolvimento em ambientes quentes e/ou com menor disponibilidade hídrica, garantindo, ainda, capacidade de germinar, crescer e se desenvolver praticamente o ano inteiro.

Embora possua crescimento inicial lento, dos 45 aos 105 dias após a emergência, o seu crescimento é rápido, com aumento exponencial de matéria seca. Nessa fase, principalmente a formação dos rizomas favorece o incremento de massa das plantas.

Estas características fazem do capim-amargoso uma planta de alto nível competitivo com as culturas agrícolas, como o algodão, onde a matocompetição pode ocasionar perdas na produtividade em cerca de 90% ou mais, dependendo do nível de infestação e o período de convivência com a cultura.

Neste caso, além de competir por água, luz, nutrientes e espaço, a presença desta planta daninha em áreas algodoeiras pode servir de hospedeira para doenças e insetos-pragas e, ainda, reduzir a qualidade do produto a ser industrializado, ou seja, a qualidade da fibra.

Resistência a herbicidas

Outro ponto importante acerca da problemática com esta planta daninha é a resistência a herbicidas, principalmente ao glifosato, a qual hoje está amplamente distribuída no território brasileiro, sendo considerada um problema sério na agricultura.

O uso repetitivo da mesma molécula herbicida, como por exemplo, o glifosato, oferece condições favoráveis para que algum biótipo que carregue um gene de resistência cresça, se desenvolva e gere descendentes na área.

Esse processo se repete ano após ano, até que aquela molécula perca totalmente sua eficácia, quando a resistência já está instalada na área.

Os mecanismos que conferem resistência a uma planta daninha são diversos e muito estudados atualmente para auxiliar pesquisadores a compreender o manejo. Atualmente, os mecanismos relatados na literatura são:

– Mutação no sítio de ação, alterando o local onde o herbicida atua;

– Amplificação genética, conferindo à planta a habilidade de produzir maior quantidade de enzima do que o herbicida é capaz de inibir;

– Metabolização diferencial do herbicida, ou seja, a planta tem a habilidade de transformar a molécula do herbicida em substâncias menos tóxicas e/ou não tóxicas antes do herbicida atingir seu sítio de ação;

– Absorção e/ou translocação reduzida.

Impacto da resistência ao glifosato

Atualmente, no Brasil, existem biótipos de capim-amargoso resistentes não somente ao glifosato, mas também aos herbicidas inibidores da enzima ACCase, haloxyfop e fenoxaprop, trazendo complexidade e aumento nos custos do manejo.

O impacto da resistência ao glifosato tem sido de grandes proporções, já que é considerado um herbicida de importância mundial, devido à sua adoção em culturas transgênicas tolerantes, à necessidade de dessecação em áreas de plantio direto e à facilidade de seu uso.

Além disso, trata-se de uma molécula de amplo espectro de ação, ou seja, uma única aplicação atinge espécies tanto monocotiledôneas como dicotiledôneas.

Seu mecanismo de ação é bastante singular, pois é o único herbicida capaz de inibir especificamente a enzima 5- enolpiruvil-chiquimato-3-fosfato-sintase (EPSPs), que catalisa a condensação do ácido chiquímico e do fosfo-enol-piruvato, evitando, assim, a síntese de três aminoácidos aromáticos essenciais para a sobrevivência das plantas – triptofano (precursor do ácido indolacético), fenilalanina (precursora de fenóis envolvidos na defesa da planta) e tirosina (precursora da clorofila).

O que se vê

Os sintomas comuns observados nas plantas tratadas pelo glifosato desenvolvem-se lentamente e caracterizam-se por cloroses nas regiões meristemáticas ou nas folhas mais jovens, seguidas de necrose foliar entre uma ou três semanas após a aplicação, de acordo com a suscetibilidade da espécie.

A folhagem às vezes torna-se roxo-avermelhada em algumas espécies. Outros sintomas foliares comuns são: enrugamento ou má-formação (especialmente nas áreas de rebrotamento), assim como necrose de meristemas e também de rizomas e estolões de plantas perenes.

Manejo do capim-amargoso no algodão

Para assegurar altas produtividades, mantendo a boa qualidade final do produto, o manejo eficaz de plantas daninhas é essencial. O período crítico de interferência na cultura de algodão, ou seja, em que se deve manter a cultura no limpo, pode variar dependendo de diversos fatores, como por exemplo, a cultivar ou o espaçamento adotado, mas, de forma geral, este período compreende dos 15 dias após a emergência até cerca de 60 dias, momento em que o algodão fecha seu dossel, atuando por si próprio na supressão de plantas daninhas, como o capim-amargoso.

Além disso, o controle de plantas de capim-amargoso, quando proveniente de sementes, é mais eficaz do que quando as plantas estão adultas, com touceiras perenizadas e presença de rizomas. Isso porque a reserva de amido acumulada pode ser responsável pela maior dificuldade em controlar touceiras com o herbicida glyphosate, por dificultar a translocação da molécula até os rizomas e permitir rápida rebrota da parte aérea após aplicação do herbicida, uma vez que o amido atua como uma reserva de alimento para a planta.

No caso da resistência, o tempo de uso de um mesmo herbicida aumenta a probabilidade da resistência se estabelecer na área, sendo extremamente importante a utilização de outros herbicidas com outros mecanismos de ação para reduzir essa probabilidade, o que chamamos de rotação de mecanismos de ação.

Herbicidas recomendados

Para o manejo de capim-amargoso em algodão existem herbicidas registrados no mercado para condições de pré-emergência ou de pós-emergência ao longo do ciclo da cultura. A escolha da molécula, bem como da dose utilizada, vai variar com a realidade de cada área, principalmente pensando em aspectos relacionados às condições ambientais.

Além do glifosato, existem opções em pós-emergência com moléculas inibidoras da enzima ACCase (como o cletodim, fluazifope, haloxifope e fenoxaprope) e inibidora da enzima glutamina sintetase (amônio glufosinato).

No caso do glifosato e do amônio glufosinato, a utilização ao longo do ciclo da cultura somente será possibilitada com cultivares tolerantes, ou, para cultivares que não sejam tolerantes, somente em jato dirigido.

Já para os herbicidas inibidores da ACCase, a utilização não contém restrições, uma vez que se trata de um grupo de graminicidas, sendo seletivo ao algodão.Pulo do gato

Vale ressaltar que, mesmo a resistência ao glifosato estando estabelecida na área, sua utilização em associação com outras moléculas, que atuarão na espécie resistente em questão, ainda é uma opção interessante no sistema de manejo, uma vez que o glifosato agirá nas demais espécies. Seu amplo espectro de ação e a rotação de princípios ativos ainda estará garantida com a associação às outras moléculas.

Outra opção para o manejo é a utilização de herbicidas em pré-emergência, os quais foram um pouco esquecidos após o advento da transgenia e que contribuem significativamente na prevenção e contenção da resistência, além de garantir a dianteira competitiva da cultura.

As opções incluem herbicidas inibidores da biossíntese de carotenos (como clomazone e isoxaflutole), inibidores da biossíntese de ácidos graxos de cadeia longa (como alacloro e s-metolachloro), inibidores do fotossistema II (diurom) e inibidores da biossíntese de microtúbulos (trifluralina).

Para estes herbicidas, é fundamental compreender suas interações com as condições ambientes para o sucesso da aplicação.

Alternativas

No entanto, o manejo de capim-amargoso não se limita apenas ao controle químico, existem outras técnicas que compõem o sistema de manejo integrado, como o controle mecânico e cultural.

Se a resistência do capim-amargoso ao glifosato é uma realidade em sua área e está roubando sua produtividade, procure um profissional capacitado para auxiliar nas estratégias que se enquadrem a sua realidade e sejam capazes de conter a resistência.

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