Como promover maior crescimento na soja?

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Foto: Shutterstock

Fabrício Custódio de Moura Gonçalves

Doutor em Agronomia/Horticultura – UNESP, FCA, Botucatu

fabricio-moura-07@hotmail.com

 O termo bactéria promotora de crescimento em planta (BPCP) foi introduzido por Kloepper e Schroth em 1978 e agrupa bactérias não simbióticas presentes no solo, que colonizam raízes e tecidos vegetais e podem estimular o crescimento de plantas, além de serem capazes de multiplicar-se e competir com a microbiota autóctone.

Mais tarde, passou-se a utilizar o termo para bactérias da rizosfera que podem crescer dentro, sobre ou em torno de tecidos vegetais e incitar o crescimento vegetal por múltiplos mecanismos.

Enfim, bactérias promotoras de crescimento podem ser definidas como microrganismos benéficos às plantas, devido às interações harmônicas que realizam com as mesmas, podendo modular seu metabolismo e estimular a produtividade vegetal. 

As principais BPCP são encontradas entre as Pseudomonas spp. não fluorescentes e fluorescentes; espécies de Bacillus, Streptomyces, Rhizobium, Bradyrhizobium, Acetobacter e Herbaspirilu; Agrobacterium radiobacter, Enterobacter cloacae e Burkholderia cepacia, entre outras.

Pesquisas

Os primeiros trabalhos realizados em BPCP no Brasil (Stein, 1988; Freitas, 1989) testaram Pseudomonas fluorescentes para aumentar o crescimento de plântulas de tomateiro e cafeeiro em condições de casa de vegetação. Desde então, vários estudos têm avaliado o efeito benéfico da utilização dessas bactérias.

Atualmente, existe uma crescente busca por tecnologias que incrementem a produtividade da cultura da soja, minimizem danos por estresses abióticos e ofereçam maior resistência a fitopatógenos, causando o menor impacto ambiental possível. Desta forma, as bactérias promotoras de crescimento de plantas surgem como uma alternativa frente aos problemas apontados.

Não confunda

As bactérias endofíticas são combinações do microrganismo e planta que vivem sistematicamente no interior das plantas, sem causar dano aparente aos seus hospedeiros. A associação bactérias endofíticas-planta consiste numa interação íntima, na qual a planta fornece os nutrientes e habitat, enquanto a bactéria irá promover o crescimento e sanidade da planta.

São distintos dos microrganismos epifíticos, que são aqueles que habitam a superfície vegetal, e, ambas as bactérias (epífitas e endofíticas) não causam danos ao hospedeiro.

As bactérias endofíticas não aparecem dessa maneira no vegetal, mas se tornam endofíticas ao longo de seu ciclo de vida. Por isso, podemos dizer que uma bactéria endofítica é aquela que vive pelo menos uma parte de seu ciclo de vida no interior das plantas.

Uma bactéria endofítica pode ser, portanto, epífita ou da rizosfera que invadiu o vegetal e instalou-se em algum de seus órgãos, como a própria raiz, o caule ou as folhas. Os microrganismos endofíticos podem penetrar nas plantas por aberturas e feridas, como aquelas existentes na emergência de raízes secundárias laterais ou nas abrasões geradas pelo crescimento das raízes, penetrando no solo.

Bactérias endofíticas também podem invadir o vegetal através dos estômatos e hidatódios, de aberturas causadas por inseto, assim como por feridas deixadas em plantas onde ocorre a colheita de frutos. Os endofíticos são capazes de adentrar o hospedeiro ativamente, pela produção de enzimas.

Bactérias amigáveis

Normalmente, as BPCP são nativas nos solos, mas podem se associar às raízes das plantas, compondo a comunidade microbiana e não são fitopatogênicas, não interferindo no equilíbrio ecológico e, portanto, enquadrando-se plenamente na realidade da agricultura orgânica e sustentável.

São bactérias da rizosfera que podem crescer dentro, sobre ou em torno de tecidos vegetais e incitar o crescimento vegetal por múltiplos mecanismos, ou seja, são microrganismos benéficos às plantas, devido às interações harmônicas que realizam com as mesmas, podendo modular seu metabolismo e estimular a produtividade vegetal.

Essas interações harmônicas ocorrem pela simbiose, por exemplo, entre bactérias do gênero Bradyrhizobium e as plantas de soja. A partir dessa relação são formados os nódulos radiculares, nos quais as bactérias se abrigam e recebem da planta hospedeira proteção e alimento.

Em troca, Bradyrhizobium captura o nitrogênio atmosférico (N2) e o transforma em compostos nitrogenados, que são exportados para a planta hospedeira e a beneficiam.

Relação com a produtividade

Estudos têm sido realizados visando à aplicação de BPCP na agricultura e seus efeitos benéficos sobre a produção vegetal têm sido descritos em culturas de interesse agronômico.

As BPCP representam uma das maneiras de alcançarmos o objetivo de manter a alta produção com o menor impacto possível, uma vez que suas habilidades permitem que a planta se desenvolva em um processo cada vez menos industrializado, já que todo o recurso se encontra disponível na natureza.

Dessa maneira, as principais culturas mundiais podem ser afetadas positivamente pelo aumento na utilização de BPCP. Podemos citar a cultura da soja. Para a melhoria da produção com menor impacto ambiental, é possível citar as bactérias dos gêneros Pseudomonas, Burkholderia, Azospirillum e Bacillus como promotoras de crescimento vegetal, beneficiando a soja na fixação do nitrogênio, solubilização do fósforo e na produção de ácido indolacético.

Eficiência comprovada

As BPCP são conhecidas e comercializadas como bactérias que aumentam a produtividade desde 1987 em larga escala, em 48 diferentes culturas, atingindo 3,35 milhões de hectares.

São diversos resultados de pesquisas que comprovam a eficiência das bactérias promotoras do crescimento em soja. Hungria et al. (2015) verificaram que a coinoculação com Bradyrhizobium japonicum e Azospirillum brasilense na cultura da soja em quatro locais diferentes do Brasil tiveram a produtividade incrementada cerca de 7,5% em Londrina, 18,5% em Ponta Grossa, 6,5% em Rio Verde e 5,48% em Cachoeira Dourada.

Estudos revelam que a inoculação de sementes de soja com as bactérias Bradyrhizobium tiveram um aumento médio de 1,8 saca por hectare. Já as propriedades que empregaram a coinoculação (formulação das bactérias Bradyrhizobium + Azospirillum) observaram aumento de 5,6 sacas/ha. Esses resultados indicam resposta positiva consistente da integração dessas práticas e enfatizam a importância da sua adoção.

Os estresses abióticos

BPCP podem, ainda, influenciar na redução da incidência e severidade de doenças pelo estímulo da resposta de defesa vegetal. Du et al (2016) observaram mudanças no proteoma de plantas de pepino após a inoculação com Paenibacillus polymyxa.

Entre as principais mudanças observadas nesse trabalho, cita-se o estímulo à síntese de proteínas relacionadas ao estresse oxidativo (superóxido desmutase, peroxidase, ascorbato peroxidase), estímulo ao metabolismo energético (provavelmente para estímulo do crescimento vegetal e resistência ao patógeno), aumento da quantidade de aminoácidos expressos e estímulo à síntese de jasmonato, normalmente relacionado à resposta de defesa das plantas quando interagem com fitopatógenos.

Os mesmos autores ainda observaram mudanças proteômicas relacionadas ao aumento de tolerância das plantas a situações de estresse ambiental, como alta salinidade, altas temperaturas e estresse hipóxico.

Estímulo às plantas

O estímulo da resposta de defesa das plantas também foi evidenciado em experimentos de Quecine et al (2012), nos quais foi observada a síntese de enzimas quitinases e endoglucanases por tecidos radiculares de plantas após a inoculação com BPCP, provavelmente relacionadas às enzimas hidrolíticas produzidas pelas bactérias no momento da infecção do tecido vegetal, as quais são reconhecidas pelas plantas e incitam a resposta de defesa, além de estimularem a defesa vegetal e a tolerância ao estresse ambiental, como baixa fertilidade de solos ou a seca.

A remoção de contaminantes do solo, que normalmente induzem respostas ao estresse das plantas e inibem o crescimento das plantas pelas BPCP também pode ajuda-las a crescerem melhor.

A inoculação de bactérias do gênero Serratia capaz de produzir ácido indolacético e sideróforos permitiu significante crescimento de plantas sob condições de contaminação com cádmio, o que evidencia o potencial dessa bactéria em incitar a tolerância de plantas a solos contaminados.

Trabalhando com trigo, Mishra et al. (2016) observaram melhora da tolerância das plantas a condições de seca após a inoculação de bactérias dos gêneros Flavobacterium e Enterobacter, o que foi evidenciado pela melhora de parâmetros como integridade da membrana plasmática, acúmulo de sais e atenuação da expressão de genes relacionados ao estresse hídrico.

Mais respostas

Em geral, em situações de estresse as plantas produzem mais etileno, o que pode causar queda das folhas e danos às células vegetais. As BPCP são capazes de inibir a via bioquímica produtora de etileno e, consequentemente, diminuir os níveis de etileno no vegetal.

As BPCP são capazes de fixar nitrogênio, incitar resposta metabólica da planta, destacando-se para o aumento dos níveis de manitol e trealose, carboidratos normalmente associados à respostas de defesa vegetal.

As BPCP são capazes de induzir diferentes rotas metabólicas e respostas das plantas devido ao grande número de metabólitos químicos e fisiologicamente diferentes afetados pela inoculação.

Resistência a fitopatógenos

O controle de patógenos e parasitas de plantas na agricultura atual ainda é realizado, em sua maioria, pela aplicação de agrotóxicos em altas quantidades, o que tem diversos impactos ambientais, além de aumentar o custo de produção de alimentos.

Portanto, estudos têm sido dedicados à busca por formas alternativas de controle de patógenos e parasitas de plantas. Alguns microrganismos que interagem com plantas possuem capacidade de controle biológico de fitopatógenos, como Pseudomonas, Burkholderia, Bacillus, Bradyrhizobium, Rhizobium, Gluconacetobacter, Herbaspirillum e Azozpirillum.

Nesse contexto, BPCP tem apresentado potencial de aplicação na produção agrícola, em especial porque esses microrganismos mostram capacidade de estimular o crescimento de plantas pela síntese de fitormônios (ácido jasmônico, etileno e ácido salicílico), fixação biológica de nitrogênio, solubilização de fosfato e controle biológico de fitopatógenos.

Em geral, esses microrganismos podem controlar fitopatógenos por diferentes mecanismos, os quais envolvem produção de b-1,3-glucanase, quitinase, celulase e pectinase, ácido cianídrico, além de antibióticos e outros metabólitos antifúngicos.

Custo-benefício

Produtores de soja que utilizam BPCP relatam lucro líquido do uso com inoculação de R$ 126,60 por hectare e o da coinoculação, R$ 390,00/ha, tendo como base o valor da saca de soja de R$ 72,00, o custo da dose do inoculante à base de Bradyrhizobium R$ 3,00/ha, e o inoculante à base de Bradyrhizobium + Azospirillum, R$ 12,00/ha.

O interessante é que os ganhos de produtividade promovem melhores rentabilidades e a tecnologia é de baixo custo.

As pesquisas revelam que mesmo em áreas frequentemente cultivadas com soja, a inoculação anual com BPCP, a cada safra, traz benefícios econômicos. O ganho médio da inoculação anual da soja com Bradyrhizobium em áreas tradicionais de cultivo é de 8%, ou seja, um grande retorno frente ao baixo custo da dose do inoculante.

Além disso, as BPCP são fontes potenciais para atingir a produção agrícola sustentável, apresentando mecanismos diretos e indiretos para a promoção do crescimento vegetal, além de serem nativos dos solos ou plantas a serem utilizados e, portanto, enquadrando-se na descrição de agricultura orgânica e sustentável (Lei de Agricultura orgânica nº10831).

São amplos seus usos, incluindo tratamento de sementes, mudas micropropagadas, incorporação diretamente ao substrato de plantio, tratamento de estacas, tubérculos e raízes, pulverizações na parte aérea (incluindo folhagem, flores e frutos) e em pós-colheita. Essas bactérias atuam ainda suprindo diretamente a demanda vegetal por nutrientes (P, K, Fe) e água, por meio de mecanismos diretos de promoção do crescimento, ou atuando no aumento da resistência e tolerância das plantas contra estresses bióticos e abióticos. Atuam, também, como agentes de biocontrole e na indução de resistência sistêmica.

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