Autora
Mariangela Hungria
Pesquisadora da Embrapa Soja
Existem alguns mitos que, atualmente, representam uma grande ameaça aos benefícios da fixação biológica do nitrogênio à cultura da soja, resultantes de décadas de pesquisa. Dentre os principais mitos, têm-se:
Não é preciso inocular “áreas velhas”, tradicionalmente cultivadas com soja e que já receberam inoculantes: não é verdade, pois mais de 300 ensaios de pesquisa demonstraram que, em média, a reinoculação anual resulta em um incremento médio de 8%, o que significa muito lucro para o agricultor;
As bactérias não conseguem suprir as necessidades de genótipos altamente produtivos, sendo necessário aplicar N-fertilizante: isso não é verdade, pois a pesquisa tem demonstrado, em todas as situações investigadas (diferentes sistemas de preparo do solo, rotação de culturas, ciclos de planta, hábitos de crescimento, genótipos transgênicos e convencionais) que as bactérias disponíveis nos inoculantes conseguem suprir todo o N necessário para altos rendimentos, não havendo resposta aos fertilizantes nitrogenados. Mas, é claro, lembrando que o agricultor precisa fazer a reinoculação anual, de maneira adequada;
Posso economizar fazendo meu próprio inoculante: de maneira nenhuma, pois o inoculante, embora seja um insumo barato, requer alta tecnologia e ambiente estéril para ser produzido. Nas análises que temos realizado de “inoculantes caseiros”, observamos que, inclusive, existe risco à saúde, pois vários patógenos humanos têm sido detectados, além de outros contaminantes e, em geral, poucos ou nenhum rizóbio;
Não vale a pena inocular, porque existe incompatibilidade com agroquímicos e eu tenho que tratar minhas sementes com agrotóxicos e micronutrientes: isso pode ser verdade, mas não inocular vai levar a prejuízos. As alternativas já confirmadas pela pesquisa são a de usar concentração elevada de bactérias e semear o mais depressa possível, ou inoculação no sulco, com 2,5 a três vezes a dose recomendada para as sementes. Em relação ao cobalto (Co) e molibdênio (Mo), eles podem ser aplicados via foliar, na mesma concentração que seriam aplicados nas sementes, desde que até no máximo 30 dias após a emergência
Contribuições para a soja
Talvez o problema mais sério que a FBN enfrenta é o do crescimento do tratamento industrial e “on farm” de sementes, com tempo de armazenamento longo. Infelizmente, todos os testes que temos feito indicam morte acentuada das bactérias a partir de 5-10 dias.
Em nenhum caso encontramos boa sobrevivência em períodos superiores a isso. Em prazos maiores, de 30, 45 dias, com frequência temos observado zero de sobrevivência.
Mais que vantagens
Hoje, os benefícios dos microrganismos vão muito além da inoculação da soja. Atualmente já há pesquisa e estirpes de bactérias para outras culturas. A principal é o Azospirillum brasilense, e nas estirpes utilizadas nos inoculantes brasileiros o principal mecanismo é o de produção de fitormônios.
Grandes incrementos no rendimento estão comprovados para as culturas do milho, trigo e braquiárias pelo uso de Azospirillum. E, desde 2014, o uso da coinoculação da soja com Bradyrhizobium e Azospirillum têm tido grande sucesso.
Se o incremento médio pela reinoculação anual da soja é de 8%, com a coinoculação esse valor sobe para 16%, um grande “micro” sucesso.