Mirtilos: os detalhes do manejo de cultivo

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Crédito Tatiana Cantuarias

Fabrício Custódio de Moura Gonçalves

Doutor e professor de Agronomia – Universidade Estadual do Piauí (UESPI), Campus de Uruçuí, PI

fabriciocustodiodemouragoncalves@urc.uespi.br

Também chamada de blueberry, a fruta do mirtilo possui substâncias com poder medicinal, tem mercado crescente e ainda é pouco cultivada no Brasil. De meados de outubro a metade de novembro é o período das melhores oportunidades de exportação de mirtilo, com valores que podem chegar a US$ 50 a embalagem de 2,0 kg. Nos demais meses, o mercado internacional comprador paga de US$ 20 a US$ 24 pelo mesmo volume.

A produção mundial de mirtilo tem crescido a cada ano, devido principalmente às suas propriedades funcionais e nutracêuticas. Estima-se que o volume de produção mundial gire em torno de 331 mil toneladas em uma área de 74 mil hectares.

Destaque para os Estados Unidos e Canadá que, juntos, respondem por aproximadamente 83% da produção e também para a Alemanha e a Polônia, na Europa, e Chile e Argentina, na América do Sul.

No Brasil 

O mirtilo (Vaccinium spp.) tem ganhado cada vez mais apreciadores ao longo dos tempos, quer pelo seu sabor, quem pelas suas propriedades. Suas bagas são ricas em substâncias antioxidantes, e por essa razão, ajudam a retardar o envelhecimento.

O fruto contém antocianinas e polifenóis, antioxidantes naturais que auxiliam na prevenção do câncer, doenças cardiovasculares, doenças da visão, como cataratas e degeneração macular, além de promover melhorias na circulação sanguínea e, consequentemente, em problemas como hemorroidas, varizes, edemas e feridas. Por suas propriedades, o mirtilo é também conhecido como a fruta da “longevidade”. 

Embora o Brasil importe 90% dos mirtilos que consome, possui um grande potencial de crescimento, principalmente por produzir na entressafra do Hemisfério Norte, o que garante a rentabilidade dos produtores que buscam diversificar seus pomares. Estatísticas oficiais da área plantada, produção e consumo estimam que a área plantada no Brasil seja superior a 100 hectares, localizadas no Estado de Rio Grande do Sul (Vacaria, Caxias do Sul, Bento Gonçalves e Farroupilha), Santa Catarina (Itá), Paraná, São Paulo (Campos do Jordão e São Bento de Sapucaí) e Minas Gerais (Barbacena).

As plantações, na maioria das vezes, são menores que dois hectares, utilizam irrigação localizada e grande parte dos tratos culturais é realizada pelos membros da família do produtor.

Variedades

A introdução de variedades do grupo Southern highbush: Star, Jewel, Emerald, Millenia, Primadonna e Snowchaser obtidas do Programa de Melhoramento Genético da Universidade da Flórida, com menor exigência em frio e colheita precoce, entre os meses de outubro e novembro, vêm sendo introduzidas no Brasil com o objetivo de substituir gradativamente o cultivo das variedades antigas.

A principal vantagem destas variedades é que sua produção é possível em locais de baixa incidência de frio hibernal, o que permite ampliar as regiões de cultivo de mirtilos no Brasil. Além disso, podem garantir melhores preços de mercado, por não haver, nesse período, oferta de fruta de outros países do Hemisfério Sul.

Principais regiões produtoras

No Brasil, o mirtilo é produzido principalmente no Estados do Rio Grande do Sul, sobretudo nos Campos de Cima da Serra (Vacaria) e região de Pelotas, além dos Estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Minas Gerais. Embora não haja dados oficiais, estima-se que a área plantada seja de 250 hectares, com plantações pequenas, menores que dois hectares.

Formas de cultivo

O cultivo do mirtilo é amplamente explorado em condição de campo. Pode ser cultivado em casa vegetação, no entanto, são poucas informações de cultivo sob essa condição. A casa de vegetação é mais indicada nas fases iniciais de cultivo, sobretudo pelo enraizamento e emissão de brotações.

A propagação de mirtilo pode se dar por sementes (propagação sexuada), por enxertia ou estaquia (propagação assexuada). A forma mais utilizada de propagação do mirtilo é a estaquia.

Dessa forma, descrevemos com mais detalhes o método, que consiste em enraizar partes da planta, principalmente ramos, retirados de uma planta matriz que represente a variedade em termos de potencial produtivo e boa sanidade. Utilizam-se estacas herbáceas de 10 a 15 cm, que possuam tecidos tenros e de coloração verde e que são retiradas da parte apical dos ramos no período de primavera/verão, épocas em que ocorrem fluxos de crescimento vegetativo.

Como esse material é muito sensível à desidratação, faz-se a coleta preferencialmente na parte da manhã, deixando-se pelo menos um par de folhas, que será responsável pela continuação do processo fotossintético que fornecerá fotoassimilados tanto para a manutenção da estaca quanto para a formação das raízes.

Dicas importantes

Estacas semilenhosas e lenhosas também podem ser utilizadas na produção de mudas de mirtilo, devendo ser obtidas de ramos parcialmente ou totalmente lignificados. Recomenda-se retirar essas estacas no período de repouso vegetativo, sendo obtidas do material descartado pela realização da poda de inverno. Apenas as estacas semilenhosas devem permanecer com um par de folhas.

Reguladores vegetais, principalmente as auxinas sintéticas, são muito utilizados para auxiliar o enraizamento e, por apresentarem difícil diluição em água, podem ser dissolvidos em solução de álcool ou de hidróxido de potássio para serem aplicados na forma líquida ou misturados em talco para aplicação em pó. Estacas herbáceas de mirtilo devem ser tratadas com ácido indolbutírico (AIB) na concentração de 2.000 mg/l a 2.500mg/l.

Do plantio à colheita

Dentre os dois grupos de mirtilo plantados no Brasil, as variedades mais cultivadas são o’neal, misty, aliceblue, clímax e delite, que podem atingir 20 toneladas por hectare. Elas podem ser compradas de viveiristas, sobretudo daqueles com recomendação, como os instalados na região de Campos do Jordão (SP).

Os melhores solos para plantar mirtilo são os areno-argilosos, ricos em matéria orgânica e levemente ácidos, entre 4,5 e 5,5. Para obter mudas, deve-se coletar estacas do caule da planta. Em seguida, aquecer o substrato para haver maior enraizamento. Em torno de 70 dias, as estacas devem estar bem enraizadas, prontas para serem transferidas para sacolas plásticas com substrato rico em matéria orgânica. Somente depois de oito meses as mudas podem ser levadas para o campo.

De porte arbustivo, a planta do mirtilo necessita de covas com dimensões de 40 x 40 x 40 cm, com aplicação de calcário e matéria orgânica. Deixe entre as plantas o espaçamento de 1,0 a 1,5 x 3,0 metros.

O mirtilo se adapta às mais variadas condições climáticas, mas seu plantio vai bem principalmente em locais frios, com temperaturas baixas no inverno e amenas no verão.

Fitossanidade

As principais doenças que atacam o mirtilo são causadas pelos fungos Botrytis, Colletotrichum e Aspergillus. Evite sua incidência fazendo o tratamento de inverno e pulverizações com produtos à base de cobre.

Em períodos de umidade elevada, é indicado pulverizar a planta somente após a colheita dos frutos ou logo depois da floração. A poda estimula a floração e aumenta a produção de bagas.

Colheita

A primeira produção ocorre após dois anos do plantio e a colheita dos frutos azulados deve ser feita manualmente. As frutas podem ser colhidas ao longo de 40 dias, entre os meses de dezembro e janeiro.

 Como o mirtilo é delicado e bastante perecível, cuidados devem ser redobrados para evitar danos durante a execução da colheita.

Investimento x retorno

O custo de implantação do pomar é bem elevado. Todavia, estima-se que dentro de três anos recupera-se o investimento. Dessa forma, o alto custo de implantação na produção de mirtilo e o longo tempo de produção dessa plantação exigem um projeto de implantação que avalie diversos fatores de vital importância para garantir o alcance dos resultados econômicos propostos.

Estes devem incluir o conhecimento das condições edafoclimáticas do local onde o plantio é planejado, disponibilidade próxima de mão de obra para as tarefas de manejo e colheita, conhecimento da área plantada com esta cultura nos arredores ou outras plantações de frutas que podem competir com o tempo de colheita, etc.

O projeto também deve indicar as variedades a serem plantadas em função da finalidade da produção: apenas para uso fresco ou para uso dual, incluindo a possibilidade de congelamento.

Recomenda-se que produtores de mirtilo se organizem em associações, visando facilitar o trabalho de colheita, embalagem e transporte adequados para que a produção chegue aos mercados. O mirtilo pode ser inserido em várias receitas do dia a dia, contribuindo para uma alimentação mais saudável.

Comercialização e rentabilidade

O mercado para o mirtilo está em crescimento em todo o mundo. No Brasil não é diferente – com o aumento do poder aquisitivo das pessoas e a busca dos consumidores por alimentos que tragam benefícios à saúde, tem havido grande estímulo ao consumo.

Desta forma, como a oferta ainda é pequena, o preço pago ao produtor é relativamente alto. Estima-se valor pago ao quilo de mirtilo, pelo consumidor, na Ceasa de Porto Alegre, entre R$ 18,00 a R$ 52,00.

O preço é alto no início da safra, cai durante a colheita e permanece baixo ainda durante aproximadamente um mês após o final da safra. O preço relativamente baixo no primeiro mês após a safra pode ser explicado pelo volume da produção que permanece armazenado em câmara fria.

Quando realizada diretamente pelos produtores, a venda da fruta é feita em mercados locais, embaladas em cumbucas de 100 gramas a um preço entre R$ 2,00 e R$ 3,00, que equivale de R$ 20,00 a R$ 30,00/kg de fruta fresca.

Uma grande porcentagem da colheita, entre 40 a 60%, é vendida congelada para a indústria de sucos e geleias, recebendo entre R$ 9,00 e R$ 15,00/kg. No caso em que os produtores negociam sua produção com as empresas comercializadoras, recebem entre R$ 10,00 a R$ 15,00/kg de fruta fresca, dependendo do local, qualidade, quantidade da fruta e época de colheita.

Mercados interno e externo

Essas empresas estão empenhadas em desenvolver o mercado nacional interno, inicialmente em São Paulo e Rio de Janeiro, e exportar para os mercados da Europa. As exportações têm sido em baixa quantidade e principalmente para Itália (70%) e Holanda (15%); com preços FOB superiores a US$ 10/kg.

Em geral, os brasileiros ainda não exploram todo o potencial dessa fruta, que é menor que a uva e da cor da jabuticaba, mas com sabor único. Como as demais frutas vermelhas, o mirtilo é ótima matéria-prima para a elaboração caseira de geleias, sucos, doces em pasta ou cristalizados, tortas e bolos, além de ser utilizado na indústria de polpas, frutas congeladas, iogurtes e sorvetes.

Cadeia agroindustrial

Em comparação aos países vizinhos, a cadeia agroindustrial do mirtilo no Brasil está apenas começando e com muitos desafios pela frente, sobretudo na produção de mudas, tecnologia de produção, assistência técnica, sistemas de proteção contra granizo e geada, manejo pós-colheita dos frutos, logística de armazenamento e distribuição da fruta e promoção das qualidades nutracêuticas do mirtilo.

Contudo, empresas internacionais líderes na produção e comercialização de mirtilo enxergam no Brasil um mercado com muitos consumidores potenciais, e uma região com possibilidades de colher entre setembro e outubro, época na qual a oferta mundial de fruta é menor.

A introdução de cultivares sob diferentes condições de clima no Brasil modificaria completamente a cadeia agroindustrial do mirtilo, uma vez que seu cultivo poderia se estender a regiões de climas amenos, como São Paulo.

Igualmente, menciona-se que essas cultivares apresentam menor período de colheita, aproximadamente de quatro semanas, o que reduziria os custos com mão-de-obra na colheita. Além do mais, os mercados, cada dia mais sofisticados, pagam preços mais elevados por frutas dessas cultivares.

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