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Goiaba da roça e futuro

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Por Coriolano Xavier
Professor e Coordenador adjunto do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM — Escola Superior de Propaganda e Marketing, Diretor Geral da MCA – Marketing e Comunicação.

Tempo irrequieto o que vivemos: pandemia ainda no ar, economia em recuperação, guerra na Ucrânia com impactos em nossas vidas e um ano eleitoral que até agora só oferece mais do mesmo e poucas soluções. Momento propício para se refletir sobre os portos em que o país quer chegar, na travessia dessa década.

Para enriquecer essa reflexão, que tal buscar inspiração em pensadores brasileiros do agro? Ney Bittencourt de Araújo foi uma dessas mentes relevantes. Agrônomo, empresário, líder setorial, fundador da ABAG e uma espécie de cidadão do agronegócio mundial. Precocemente nos deixou (1996). Mas o seu olhar agudo sobre a realidade do país traz indagações essenciais. Veja algumas de suas visões*.

Modernidade do Brasil

“Muito se fala da modernidade e da necessidade de o Brasil viver dentro de seu tempo (…). Mas acontece que a economia de mercado foi consequência e não causa. Não foi com base no mercado que a Europa e os Estados Unidos fizeram seu desenvolvimento. A base foi um Estado de Direito forte, um sistema jurídico forte e a culpa cristã.

A construção de uma sociedade moderna passa naturalmente por um choque de mercado. Mas também é preciso reconstruir o Estado, o sistema jurídico, desenvolver o espírito empresarial e criar mecanismos adequados de distribuição de renda (…).”

Valores compartilhados

“Crescemos rápido, feito goiaba da roça: meio madura, meio verde, meio podre. Na vertigem, perdemos o conceito de nação. Não pode haver nação sem ganho coletivo, sem valores compartilhados. Misturamos o velho e o novo sem conseguir melhor resultante. Ficou um amálgama incerto, informe, um estado febril. O ajustamento do mundo está em processo (…). Mas, como nas sociedades que estão à nossa frente, nosso ajustamento será penoso, lento e exigirá sacrifícios (…).”

Agricultura e estabilidade social

“Uma agricultura forte e estável é o melhor agende de estabilização social nas cidades, pois garantiria a todos os níveis da população uma alimentação adequada, transformando-se assim em um mecanismo distribuidor de renda (…). Uma espécie de solvente que dissolveria os conflitos entre o crescimento econômico de longo prazo e o impacto deste processo no bem-estar social, a curto prazo (…).”

Gestão estratégica de negócios

“Nada ou ninguém é intocável em um processo de racionalização, em uma empresa. Apenas duas coisas não podem ser modificadas: o conceito de qualidade dos produtos e serviços e, principalmente, a pesquisa tecnológica para desenvolvimento de novos produtos. Qualquer decisão em diminuir o ritmo de P&D, hoje, pode colocar uma empresa em posição muito difícil amanhã.

Outra área também sem espaço para reduções é a área de atendimento e relacionamento com clientes. Numa época de resistência dos consumidores, além de investir em ciência e tecnologia, temos que fazer um esforço mercadológico ainda maior (…).”

Ecologia e imperialismo

“(…) Apesar de liderar o grande movimento de reversão do desastre ecológico, são os países desenvolvidos do Primeiro Mundo grandes poluidores. O volume de informação, o conhecimento das técnicas de comunicação, mais os recursos disponíveis, criam hoje forças ideológicas muito mais competentes (mas não necessariamente verdadeiras), que estabelecem as prioridades do Primeiro Mundo como as prioridades da humanidade inteira.

Isso só não será terrivelmente perigoso para nós, países pobres, se o processo de diálogo sobre a proteção do meio ambiente ganhar contornos de uma discussão ética e humanitária, em vez de reproduzir uma nova forma de imperialismo – o imperialismo ideológico (…).”

Prioridade é o brasileiro

“(…) Nosso problema ecológico deve estar sempre relacionado ao problema do nosso homem. O critério de nossas prioridades tem de ser estabelecido por nós, antes de discuti-lo com os países do Primeiro Mundo. Podemos negociar as condições de compatibilizá-lo com os dos países ricos, sempre e quando a distribuição dos sacrifícios seja, no mínimo, razoavelmente balanceada.”

(*) Pensamentos extraídos do livro “Ney Bittencourt de Araújo, o Dínamo do Agribusiness”, organizado por Roberto Rodrigues.

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