Rafael Campagnol
Doutor em Fitotecnia e professor – Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
rafael.campagnol@ufmt.br
Renes Rossi Pinheiro
Doutor em Fitotecnia e bolsista de pós-doutorado do CNPq
renespinheiro@hotmail.com
Vinícius Gasparetto Penariol
Engenheiro agrônomo – Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
viniciusgpenariol@gmail.com
A produção anual de tomate é de aproximadamente 4,0 milhões de toneladas de frutos frescos, com área plantada acima de 50 mil hectares e produtividade média próxima de 70 toneladas de frutos por hectare.
No Brasil, onde as condições climáticas são propícias ao desenvolvimento de diversos organismos fitopatogênicos, problemas fitossanitários são mais intensos e frequentes, resultando em perdas significativas em rendimento e qualidade.
Complexidade da tomaticultura
O cultivo do tomateiro é uma atividade complexa e de alto risco, exigindo grande atenção e conhecimentos técnicos do produtor e demais envolvidos. A qualidade dos materiais propagativos utilizados é ponto-chave para o sucesso do cultivo.
Devido à sua grande suscetibilidade a pragas e doenças, o uso de mudas sadias e de qualidade é essencial. Mudas contaminadas podem servir como “reservatórios de patógenos”, introduzindo problemas fitossanitários graves nos campos de produção.
Além disso, mudas de baixa qualidade podem apresentar crescimento desuniforme e menor resistência a estresses bióticos e abióticos, impactando diretamente a produtividade e a rentabilidade do negócio agrícola.
Devido à grande importância do uso de mudas de qualidade para iniciar uma lavoura de tomate, recomenda-se que a aquisição seja feita de empresas especializadas na sua produção. Caso o produtor decida produzir suas próprias mudas, é essencial fazê-lo de forma adequada e buscar orientação técnica necessária.
Ambiente de cultivo
O uso de estruturas de proteção, como estufas agrícolas, é fundamental para evitar ou reduzir a incidência de pragas e doenças nas mudas. Impedir o molhamento das folhas pela água da chuva é crucial para reduzir a incidência de doenças fúngicas e bacterianas.
Um bom dimensionamento do ambiente, especialmente em relação à altura do pé-direito (preferencialmente maiores que quatro metros), auxilia na manutenção da temperatura adequada ao cultivo e reduz o aquecimento excessivo do ambiente.
A instalação de antecâmara e o fechamento das laterais das estufas com telas antiafídeos é muito importante para reduzir a entrada de insetos, especialmente vetores de viroses, como pulgões, tripes e moscas-brancas.
Qualidade da água
A qualidade da água é fundamental para o desenvolvimento saudável das mudas de tomate, especialmente em sistemas sem solo que utilizam substratos. É recomendado o uso de água subterrânea de poços semi-artesianos em vez de fontes superficiais, devido ao menor risco de contaminação.
Parâmetros importantes a serem monitorados incluem salinidade, pH, condutividade elétrica e concentrações de íons e nutrientes. Medidas de tratamento, como filtragem e cloração, são essenciais para remover contaminantes físicos e biológicos.
A manutenção de água de boa qualidade é crucial para evitar problemas como o entupimento de emissores de irrigação e assegurar uma distribuição uniforme de água e nutrientes, promovendo o sucesso na produção de mudas de tomate.
Substratos
A qualidade do substrato é essencial para o sucesso na produção de mudas de tomate, devendo apresentar boas características físicas e químicas. Substratos devem permitir adequada retenção de água e aeração, com pH ideal entre 5,6 e 6,2 e condutividade elétrica adequada.
Materiais como fibra de coco e casca de pinus são comuns, sendo enriquecidos com turfa, vermiculita e fertilizantes para melhorar suas propriedades. A estabilidade e a ausência de patógenos, sementes de plantas daninhas e substâncias inibidoras são cruciais para garantir o desenvolvimento saudável das mudas.
Atualmente, há várias opções de substratos desenvolvidos especificamente para a produção de mudas de hortaliças. Um ponto importante, entretanto, é que o manejo hídrico e nutricional das mudas seja ajustado em função das características do substrato escolhido.
Sementes
A qualidade das sementes é fundamental para a produção de mudas de tomate e, consequentemente, para o sucesso do empreendimento. Devem ser adquiridas de empresas idôneas e selecionadas de acordo com o interesse do produtor, as condições climáticas do local de cultivo e a incidência de pragas e doenças frequentes na região de produção.
Sementes de alta qualidade devem apresentar elevadas taxas de germinação e emergência de plântulas normais, com estruturas bem formadas. Sementes contaminadas por patógenos, como fungos e bactérias, podem trazer sérios problemas ao campo de produção, sendo difícil a detecção e prevenção desses contaminantes.
A uniformidade das mudas está diretamente relacionada à qualidade das sementes, com lotes de baixa qualidade apresentando problemas desde a germinação. O controle rigoroso e a análise contínua das sementes são essenciais para garantir a saúde das mudas e o sucesso na produção.
Bandejas
Na produção de mudas de tomate, a utilização de bandejas multicelulares é amplamente adotada pelos viveiros especializados e produtores, devido à maior facilidade de obtenção de lotes de mudas de alta qualidade.
As bandejas mais utilizadas variam em número de células, entre 200 e 128, e devem ser, preferencialmente, de plástico rígido ou flexível. Há, também, a opção da produção de mudões, que exigem um recipiente intermediário, com volume de 200 a 400 ml.
O tipo de bandeja impacta diretamente nas quantidades de insumos utilizados e de mudas produzidas. Viveiros que reutilizam bandejas geralmente possuem estruturas próprias de limpeza e desinfecção para evitar a introdução de pragas e doenças.
Alternativamente, muitos viveiristas optam por bandejas descartáveis para eliminar o risco de contaminação, economizando mão de obra, tempo e água.
Monitoramento e controle fitossanitário
O monitoramento e controle fitossanitário na produção de mudas de tomate são essenciais para prevenir a entrada e disseminação de patógenos e pragas. Inspeções semanais detalhadas devem ser realizadas com o uso de ferramentas de diagnóstico, como lupas e câmeras macro, para detectar precocemente sinais de doenças e pragas.
Manter registros detalhados e históricos de inspeção é fundamental para identificar padrões e ajustar práticas de manejo. Ações imediatas, como a remoção de plantas afetadas e aplicação de tratamentos pontuais, são cruciais para conter problemas.
Medidas preventivas incluem a restrição de acesso às áreas de produção, uso de sementes e substratos livres de patógenos, desinfecção de ferramentas e bandejas, e utilização de água de boa qualidade.
Adicionalmente, a instalação de telas antiafídeos, eliminação de plantas daninhas e higienização das ferramentas e mãos dos trabalhadores são práticas importantes. O uso de produtos biológicos, como fungos e bactérias benéficas, complementa o controle químico, promovendo um manejo integrado e sustentável para garantir a saúde e desenvolvimento robusto das mudas.
Controle químico
Devido ao seu efeito mais imediato, os defensivos químicos são frequentemente utilizados quando uma doença ou praga já está presente e as medidas preventivas não foram suficientes.
A rotação de produtos, alternando diferentes modos de ação e ingredientes ativos, é essencial para evitar a indução de resistências e a consequente perda de eficácia no controle. Muitos produtores, diante desse cenário, têm adotado o uso racional, que combina defensivos químicos com produtos biológicos.
Estes últimos têm ganhado destaque no cultivo do tomateiro nos últimos anos, devido à possibilidade de registro para alvos específicos, rápida degradação, baixa toxicidade, ação eficiente e o mais importante, reduzindo o uso de agroquímicos e deixando os cultivos mais racionais e sustentáveis.
Controle biológico
A produção de mudas de tomate depende de práticas fitossanitárias eficazes e o controle biológico tem sido usado cada vez mais como alternativa sustentável aos métodos químicos. Exemplos de produtos amplamente adotados em viveiros incluem o fungo Trichoderma spp., utilizado para controle biológico de patógenos responsáveis pelo tombamento de mudas (damping-off), como Rhizoctonia, Pythium, Fusarium e Sclerotinia.
Parasitoides de ovos do gênero Trichogramma e a bactéria Bacillus thuringiensis podem ser usados no controle de lagartas. Outros Bacillus, como B. subtilis, B. pumilus e B. amyloliquefaciens, são utilizados para controle de diversas doenças foliares e radiculares do tomateiro.
Beauveria bassiana é eficaz contra diversos insetos, e ácaros predadores, como Stratiolaelaps scimitus, são aplicados junto ao material de cobertura das bandejas para controlar fungus gnats (Bradysia spp.).
“Vacinação das mudas de tomate”
O termo “vacinação de mudas de tomate” se refere ao processo de tratar as mudas com agentes biológicos ou químicos que conferem resistência contra pragas e doenças. Este procedimento é uma prática preventiva que tem como objetivo fortalecer as plantas jovens antes de serem transplantadas para o campo.
A principal forma de vacinação das mudas de tomate é pela aplicação de defensivos químicos, fungicidas, inseticidas ou bactericidas específicos, os quais protegem as plantas contra infecções iniciais.
Mais recentemente, agentes biológicos (Trichoderma spp, Bacillus subtilis e Bacillus thuringiensis) e indutores de resistências (ácido salicílico, ácido jasmônico e outros produtos comerciais que induzem a resistência sistêmica adquirida nas plantas) estão sendo usados no processo de vacinação das mudas.
Uso de porta-enxertos
A enxertia de mudas de tomate é uma prática eficaz de manejo fitossanitário, que consiste em unir duas plantas distintas: um porta-enxerto resistente a doenças de solo e pragas e um enxerto produtivo de alta qualidade.
Esta técnica oferece vantagens significativas, como a redução do uso de defensivos químicos, ao conferir resistência natural a patógenos como fusariose, verticilose e nematoides.
Além disso, as plantas enxertadas apresentam maior vigor e produtividade, suportando melhor as condições adversas e estresses ambientais. A escolha de porta-enxertos específicos, adaptados às condições locais e aos desafios fitossanitários da região, é crucial para o sucesso da enxertia, garantindo uma produção mais saudável e sustentável de tomates.
Educação e treinamento
Capacitar a equipe é crucial para um manejo fitossanitário eficaz. Treinar os trabalhadores do viveiro para reconhecer sinais iniciais de doenças e pragas, aumentando a conscientização e habilidades de identificação, melhora significativamente a eficácia das inspeções.
Criar protocolos operacionais padrões de boas práticas de higiene na prevenção da disseminação de patógenos, incentivando a limpeza regular das mãos, ferramentas e equipamentos e implementar programas de treinamento contínuo e avaliações periódicas garante que a equipe esteja sempre atualizada e preparada para manter a saúde das mudas.
Fotos usadas nesse texto: Vivati