José Rafael da Silva
Engenheiro agrônomo e mestre em Melhoramento Genético – Universidade Federal de Viçosa (UFV)
rafael@viveiroflorabrasil.com.br
Victor Hugo Graça Silva
Engenheiro agrônomo e mestre em Produção Vegetal – Instituto Federal do Triângulo Mineiro
Paulo Luís da Silva Neto
Projetos – Viveiro Flora Brasil
Renata Crista Graça Araújo
Administradora – Viveiros Flora Brasil
A cultura do maracujazeiro ganhou importância econômica no Brasil desde meados dos anos 1970, principalmente devido à exportação do suco. No entanto, no mercado interno, já fazia relativo sucesso nas mesas dos brasileiros, principalmente na forma de sucos, mousses e sorvetes.
Ao adquirir status econômico, a passicultura passou a receber maior atenção dos pesquisadores brasileiros, surgindo inúmeros estudos em diversas áreas, principalmente controle de pragas e doenças, melhoramento genético e manejo cultural.
Entre as mais de 400 espécies do gênero Passiflora, cerca de 150 são nativas do Brasil e destas, apenas cinco espécies têm, por enquanto, exploração comercial devido ao seu valor alimentício ou medicinal, e outras três espécies são aproveitadas como ornamentais.
Uma das principais características destas espécies é a autoincompatibilidade. Desta forma, uma planta que apresenta este fenômeno precisa de outras plantas para produzir frutos. Além da autoincompatibilidade, a principal espécie explorada do gênero, o Passiflora edulis (maracujá amarelo ou azedo), apresenta também, em diferentes graus de severidade, a incompatibilidade cruzada, ou seja, mesmo tendo mais de uma planta, pode não ocorrer a produção de frutos.
Polinização
Assim, a polinização cruzada é um dos processos mais importantes para a produtividade do maracujazeiro. Na natureza, ela é feita por insetos conhecidos popularmente como mamangavas (Xylocopa spp, Centris spp), atualmente existentes em pequeno número e insuficientes para proporcionar boas produtividades. Portanto, exige a polinização manual.
A polinização manual é uma atividade extremamente simples e consiste em passar pólen de uma flor para outra com o uso dos dedos, sendo que atualmente existem pequenos instrumentos desenvolvidos para facilitar esta atividade. Portanto, seu custo chega a representar até 40% do custeio de um pomar e existe escassez de mão de obra.
Desta forma, a revitalização da cultura, entre outras coisas, demanda uma solução para a questão da polinização manual, o que significa, diretamente, melhorar a produtividade.
Fitossanidade
Outros fatores de grande importância para o cultivo do maracujazeiro são as pragas, principalmente ácaros e mosca do botão floral, e doenças, notadamente as viroses e doenças fúngicas e/ou bacterianas.
Entre as doenças fúngicas, a fusariose tem sido limitante para a expansão ou continuidade da cultura em algumas regiões. Já no caso das viroses, a principal ocorrência tem sido o CABMV (Cowpea aphid-borne mosaic virus), o qual causa o endurecimento dos frutos, reduz a emissão de flores, o vingamento de frutos e seu valor comercial.
Estes fatores contribuem para elevação do custo de produção, chegando, em alguns casos, a inviabilizar a passicultura numa região.
Inovações
Visando contribuir para a solução destes e de outros problemas da cultura, vários pesquisadores têm se dedicado a desenvolver variedades, técnicas ou metodologias para a passicultura.
Desta forma, um grupo de pesquisadores, tendo à frente a professora Maria Lúcia Carneiro Vieira, do Departamento de Genética da Esalq/USP, contando também com a colaboração da Unesp, UFPE, Unicamp e do Instituto Francês de Pesquisas Agronômicas, finalizou o sequenciamento do genoma de uma espécie silvestre de maracujá (Passiflora organensis).
Também na China, foi publicado o sequenciamento do genoma de uma variedade de maracujá de casca roxa, possibilitando comparar os dois.
Concluída a primeira parte, os trabalhos foram imediatamente direcionados para o estudo do maracujazeiro amarelo/azedo (Passiflora edulis) e também para o maracujá-doce (Passiflora alata), já bastante avançados e publicados. Estes estudos serão fundamentais para toda a cadeia de produção do maracujazeiro.
Visão microscópica
A definição clássica de sequenciamento genômico, facilmente encontrada em sites especializados, diz que é a técnica que permite identificar, na ordem correta, a sequência de nucleotídeos de uma molécula de DNA ou RNA, visando conhecer a informação genética contida nesta estrutura.
Esta técnica se constitui em importante ferramenta para a melhoria do desempenho agronômico da cultura do maracujazeiro, tornando possível o desenvolvimento de cultivares autocompatíveis e com resistência às principais pragas da cultura, pois permite conhecer as sequências gênicas responsáveis por uma dada característica.
De modo bem simples, mas lembrando que é uma ferramenta do mais alto nível tecnológico disponível, trata-se de cortar, editar ou substituir uma sequência gênica conhecida e responsável por determinada característica não desejável por outra desejável, tornando, assim, possível produzir uma planta autocompatível e com resistência ao vírus, por exemplo.
Logicamente que esta é uma tarefa que demanda alto investimento financeiro, tempo e pessoas altamente qualificadas, sendo possível obter resultados num período relativamente curto ou muito menor que os exigidos pelos métodos tradicionais de melhoramento, os quais facilmente demandavam mais de 10 anos para os primeiros resultados.
Resultados
Os efeitos de uma variedade resistente a qualquer praga ou doença são facilmente mensuráveis, quer seja na redução do custo de produção, tanto pelo menor gasto quanto pelo aumento da produtividade, quer seja nos benefícios ao meio ambiente e na saúde humana.
Já no caso do desenvolvimento de uma variedade de maracujazeiro autocompatível, teríamos o benefício imediato da melhoria na eficiência da mão de obra e, consequentemente, da produtividade, podendo, diretamente, reduzir a quantidade de pessoas envolvidas na atividade de polinização manual ou mesmo torná-la desnecessária, sendo possível, também, obter ganhos no rendimento de suco e uniformidade dos frutos.
Enfim, embora o trabalho de uso da ferramenta ainda esteja em seu início, apresenta um futuro muito promissor, sendo muito aguardado pelos fruticultores e demais agentes da cadeia da passicultura.
Os artigos já publicados podem ser visualizados no endereço.