Uma nova técnica de extração da zeína (proteína do milho) a
partir dos resíduos oriundos dos grãos do milho permitirá no Brasil a inserção
de bioplásticos que utilizam o composto como matéria-prima. Atualmente, os
métodos utilizados no país para extrair a proteína dos resíduos não conseguem
remover nem metade dela, o que desmotiva empresas a investirem no seu uso. No
entanto, com a nova estratégia proposta por um pesquisador do Instituto de
Química de São Carlos (IQSC) da USP, a zeína poderá ser totalmente retirada,
permitindo que usinas interessadas em extraí-la para venda ou indústrias que
pensam em produzir bioplásticos sustentáveis e biodegradáveis possam obter um
lucro de pelo menos 200%. Um pedido de “patente verde” da nova técnica já foi
submetido ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
“Além de ser mais eficiente, nossa técnica é mais barata, simples e rápida que
as utilizadas atualmente para extrair zeína dos resíduos dos grãos de milho”,
conta Sérgio A. Yoshioka, autor do trabalho e professor do IQSC. A técnica
convencional para obtenção da proteína utiliza os resíduos dos grãos de milho
misturados com etanol comum, que passa por processos de evaporação e
solubilização para permitir que a zeína seja extraída. Já no método idealizado
pelo docente, o procedimento é basicamente o mesmo, mas o etanol tem sua acidez
ou alcalinidade alterada, gerando reações químicas que possibilitam a extração
de uma quantidade maior da substância (próximo a 100%).
A partir da zeína extraída com a nova técnica, o pesquisador produziu alguns
biomateriais 100% biodegradáveis, comestíveis, compostáveis e recicláveis, como
saboneteira e canudos. Pelo fato da proteína do milho também poder ser
utilizada como filme para revestir alimentos e evitar a invasão de bactérias,
aumentando o tempo de prateleira dos produtos, o docente aproveitou a
matéria-prima obtida para revestir um queijo e ilustrar sua aplicação. No
Brasil, não há bioplásticos fabricados com zeína devido à baixa eficiência dos
atuais processos de extração da proteína, o que pode ser ainda mais lamentado
tendo em vista que o país é o quarto maior produtor de grãos de milho do mundo,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os bioplásticos vendidos atualmente usam como matéria-prima
o amido de milho ou o da mandioca, compostos menos resistentes à umidade que a
Zeína, que acaba sendo mais durável. Já com relação aos filmes para o
revestimento de alimentos, hoje em dia eles geralmente são feitos a partir de
pectina ou quitosana, substâncias que possuem menor resistência mecânica que a
zeína quando estão em ambientes com alta umidade. Inicialmente, a ideia do
pesquisador do IQSC é utilizar a proteína do milho para revestir doces e
produzir canudos comestíveis. Por se tratar de um produto altamente proteico e
seguro, a zeína pode ser consumida sem nenhum problema.
Uma fábrica piloto já está sendo montada em Criciúma (SC) para incorporar a
nova técnica de extração da zeína dos resíduos dos grãos de milho a fim de
desenvolver e patentear novos processos e produtos com o uso da proteína. A
expectativa é de que ainda este ano a indústria produza toneladas do composto
por dia. Segundo o professor Sérgio, se o valor da zeína se mantiver por volta
de R$ 40,00/kg e a saca dos grãos de milho não ultrapassar os R$ 90,00/saca, as
usinas de álcool de milho poderão inovar com a tecnologia e ter um lucro de
pelo menos três vezes na comercialização de zeína, além, claro, de se tornarem
empresas muito mais sustentáveis e renováveis. Na ponta final dessa cadeia
produtiva estão os consumidores, que, por sua vez, terão uma nova opção para
comprar produtos que não agridam o meio ambiente, como os bioplásticos que
serão produzidos a partir da matéria-prima obtida dos grãos do milho.
Um dos objetivos do professor Sérgio, assim como o de todos
os pesquisadores que trabalham com o desenvolvimento de diferentes tipos de
bioplásticos, é proporcionar novas alternativas ao plástico comum, de origem do
petróleo, que pode levar até 100 anos para se degradar e causar graves impactos
ao meio ambiente, como a contaminação de rios e intoxicações ou mortes de
animais que corriqueiramente ingerem produtos descartados de forma incorreta,
como é o caso das tartarugas marinhas e baleias. Diversas cidades brasileiras,
inclusive, têm proibido o uso ou distribuição de plásticos descartáveis, como
talheres, copos, pratos, marmitex, canudos de sucos, entre outros. Os
bioplásticos feitos com a zeína poderão se decompor em cerca de três meses.
O trabalho desenvolvido pelo pesquisador da USP foi uma consultoria para a
startup GreenB Biological Solutions, que é a responsável pela montagem da
fábrica piloto em Criciúma. O projeto conta com financiamento do Programa
Centelha-SC, oferecido em parceria pela Fundação de Apoio à Pesquisa e Inovação
do Estado de Santa Catarina (FAPESC), pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), pela Financiadora de Estudos e Projetos
(FINEP) e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI).
Por Henrique Fontes,
da Assessoria de Comunicação do IQSC/USP