Fábio Olivieri de Nobile
Professor titular do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos (UNIFEB)
Maria Gabriela Anunciação
Engenheira agrônoma – Unifeb
A reação química é uma característica importante do solo, decorrente da sensibilidade dos microrganismos e vegetais superiores ao ambiente. Há muito tempo vem se dedicando grande atenção a essas reações químicas e aos fatores a elas associados, que são três: acidez, neutralidade e alcalinidade.
A acidez é comum em todas as regiões em que a precipitação pluvial seja suficientemente alta para lixiviar quantidades apreciáveis de bases permutáveis do solo. Entretanto, pode-se considerar que a precipitação e o material de origem determinam, até certo ponto, a reação do solo; isto é, o material de origem pode chegar a equilibrar a situação, pois, pela decomposição de minerais primários e secundários, as bases são, em parte, repostas.
Contudo, solos altamente intemperizados (tropicais) não dispõem mais desses minerais, fontes de bases.
Além da ocorrência natural da acidez do solo, o próprio cultivo tende a acentuar o problema, principalmente devido à absorção de cátions pelas raízes das plantas, deixando em seus lugares quantidades equivalentes de íons de hidrogênio.
Também a atividade biológica, com a produção de ácidos, e a aplicação no solo de fertilizantes acidificantes, nitrato e sulfato de amônio resultam na acidificação do solo, devido à acumulação de HNO3 e/ou H2SO4, apresentando, para aqueles fertilizantes, índices de acidez, respectivamente, de 62 a 110.
Assim, a acidificação do solo é um processo natural e inevitável, que exige correções periódicas pela aplicação de materiais corretivos para que a produção agrícola se mantenha em níveis adequados.
Solução
Para tornar estes solos aptos ao cultivo e incorporá-los ao processo produtivo, a correção destes fatores é fundamental e a prática mais simples para atingir este objetivo é com o uso do calcário. A calagem é uma das práticas mais importantes para o aumento da eficiência dos adubos, consequentemente, para o aumento da produtividade agropecuária.
Como o calcário tem pouca mobilidade no solo, as camadas mais subsuperficiais, abaixo da camada arável do solo, necessitam ser corrigidas, principalmente com relação ao alumínio, com o objetivo de permitir que as raízes se aprofundem no perfil do solo, e nesse caso usamos o gesso agrícola.
Recentemente, com o desenvolvimento dos conceitos de agricultura de precisão, associado a equipamentos capazes de medir a variabilidade (monitor de colheita) e aplicação de insumos (fertilizantes, herbicidas, sementes, etc.) a taxas variáveis, há possibilidade de se reverter os antigos modos de recomendações e aplicações de doses dos corretivos e condicionadores, possibilitando, assim, o manejo dos solos e culturas de modo mais específico.
Taxas variáveis
A aplicação a taxa variável de calcário e gesso apresenta potencial de uso nas condições de acidez, principalmente para correção do solo, devido às maiores doses necessárias, com maior potencial de utilização, principalmente se considerarmos os aspectos econômico e ambiental.
Neste contexto, o primeiro passo é identificar a variabilidade espacial dos indicadores da fertilidade do solo e, dependendo da magnitude e da estrutura espacial dessa variabilidade, estabelecer zonas uniformes de manejo.
Se a variabilidade não apresenta estrutura espacial, ou seja, se ela ocorre ao acaso em áreas muito pequenas, impossível de ser manejada, a melhor estimativa de qualquer parâmetro obtido da área é o valor médio, e a melhor maneira de manejá-la é usando os conceitos da agricultura convencional, por meio de manejo uniforme.
Pesquisas
Para exemplificar os conceitos, apresenta na Figura 1, o mapa da variabilidade espacial da percentagem de saturação de alumínio da CTC efetiva de uma área de aproximadamente 25 ha, utilizada no cultivo do milho, em sistema de plantio direto.
O solo é um Latossolo Vermelho, textura muito argilosa, sob vários anos de cultivo. A variabilidade na saturação de alumínio é relativamente alta, com valores variando de 0 a 44% com média de 10% (±12%), na profundidade de 0 a 20 cm.
Com base no mapa da variabilidade espacial da saturação de alumínio (Figura1) é possível definir duas zonas de manejo, com potencial para aplicação de doses de calcário à taxa variável. Na zona de manejo B a percentagem de saturação de alumínio é superior a 25%, considerada limitante para o cultivo do milho.
Tomando por base os valores médios dos resultados das análises de solo, há uma necessidade de calcário da ordem de 1,47 t/ha. Esta quantidade é insuficiente para a zona de manejo B, cuja necessidade de calcário é duas vezes maior. Assim, utilizando o conceito de aplicação diferenciada de calcário há uma melhor distribuição espacial das doses de calcário, refletindo na melhoria da uniformização da qualidade do solo e produtividade da cultura na área como um todo.
Economia de insumos
Com relação às pesquisas relacionadas às taxas de aplicações variáveis de calcário e gesso, os resultados têm demonstrado uma geração de economia de insumos de até 20% com esse modo de distribuição. Além disso, com o aumento da eficiência no uso dos insumos, deixando menos residual, observa-se aumentos de produtividade média de 6%.
No entanto, com o crescimento do uso da agricultura de precisão, percebe-se com frequência a ocorrência de problemas que comprometem a eficiência técnica da tecnologia aplicada à correção de solos em taxa variável. Os principais erros cometidos em cada etapa são descritos a seguir:
Amostragem de solo
Local de amostragem: dependendo da cultura (anual, perene ou semi-perene), existe o local correto para coleta de solo, que deve ser respeitado para melhor representar a área.
Contaminação: isso ocorre quando a amostra é coletada em vários perfis (0-20 cm e 20-40 cm). Cuidado com a mistura de amostras e limpeza do equipamento de coleta.
Número de amostras: a quantidade de solo coletada por amostra simples deve seguir um padrão mínimo para garantir a qualidade da análise.
Identificação incorreta dos saquinhos onde são armazenadas as amostras para enviar para o laboratório: a sequência dos saquinhos deve ser respeitada e é importante ter uma planilha numerada com informações essenciais (cidade, produtor, propriedade, lavoura, parâmetros a serem analisados).
Laboratório
Erros laboratoriais podem acontecer, por isso é importante o laboratório fazer uma filtragem dos resultados antes de liberá-los para o cliente. Além disso, também podem ocorrer erros de digitação na hora de liberar os resultados.
Interpretação dos dados
É comum aparecerem valores discrepantes (muito altos ou muito baixos) nos relatórios de amostragem e, se o profissional envolvido não souber avaliar corretamente a informação, esses dados poderão distorcer o resultado da análise. Neste caso, o engenheiro agrônomo poderá repetir a análise do solo nesses pontos ou eliminá-los do relatório, de acordo do cruzamento com outras fontes de dados.
Produção dos relatórios
Nota-se o uso incorreto das metodologias de recomendação de corretivos e adubação. Existem diversas fórmulas para interpretação dos dados, algumas de domínio público e outras de propriedade de especialistas da área. Incoerência nas legendas dos mapas pode causar confusão na interpretação dos resultados.
Produção dos mapas de aplicação
Nomear os arquivos incorretamente pode confundir os clientes e levar à troca dos mapas no momento da aplicação. É importante, também, saber qual controlador o cliente irá utilizar para enviar o arquivo na extensão correta.
Custo
A regulagem incorreta dos implementos que serão utilizados para aplicação em taxa variada, como largura de aplicação, pode comprometer todo o trabalho realizado antes. É importante, também, calibrar os equipamentos corretamente.
Para a adoção e contratação do serviço de agricultura de precisão o empresário rural tem os seguintes gastos: amostragem de solo R$ 10,30/ha-1, análise de solo R$ 10,70/ha-1, elaboração dos mapas R$ 9,00/ha-1, totalizando R$ 30,00/ha-1. Já para a agricultura convencional o empresário rural teve os seguintes gastos: cinco análises de solo de R$ 57,00 cada.
Os custos dos insumos mais frete foram de R$ 230,00/t de calcário e de R$ 240,00/t de gesso agrícola. Os valores referenciais, admitidos nessa simulação foram, para a distribuição dos corretivos foram de R$ 38,00/ha-1 por insumo distribuído em taxa variável com equipamento específico e de R$ 33,30/ha-1 e por insumo distribuído em taxa fixa com distribuidor de fertilizantes e corretivos convencional (Tabela 1).
Tabela 1. Demonstrativo do valor de cada insumo e serviços.
Estimou-se que, em relação ao calcário, o custo da aplicação em taxa variável em área de 55,4 ha foi de R$ 2.067,20 e o custo total do calcário distribuído,76.884,59 kg (valor obtido através do programa de simulação) foi de R$ 17.683,32. Em relação ao gesso agrícola, o custo da aplicação em taxa variável em área de 55,4 ha foi de R$ 2.105,20 e o custo total do gesso agrícola distribuído, 43.592,75 kg (valor obtido através do programa de simulação) foi de R$ 10.462,20.
Em relação a agricultura convencional estimou-se o custo da aplicação em taxa fixa de calcário em 55,4 ha de R$ 1.290,82 e o custo total do calcário distribuído, 83.100 kg (valor obtido através do programa de simulação) seria de R$ 19.113,00 e em relação ao gesso agrícola o custo da aplicação em taxa fixa em área de 55,4 ha seria de R$ 1.290,82 e o custo total do gesso agrícola distribuído, 99.720 kg (valor obtido através do programa de simulação) seria de R$ 23.932,80.
Tabela 2. Análise agro-econômica comparativa entre a aplicação de corretivos em taxa variável e taxa fixa
Prosseguindo na análise econômica apresentada, observa-se um custo total da agricultura de precisão de R$ 42.163,62e o da agricultura convencional de R$ 56.274,89. Ainda pode-se ver que a quantidade de calcário para o sistema de aplicação em taxa fixa é de 83.100,00 kg e para o sistema aplicação de taxa variável é de 76.884,59 kg existindo assim uma diferença de 6.215,41 kg, para o gesso a quantidade no sistema de taxa fixa é de 99.720,00 kg e para o sistema taxa variável é de 43.592,75 kg existindo assim uma diferença de 56.127,25 kg.
Nesta análise econômica podemos observar que o custo anual por hectare no sistema convencional ficará em R$ 187,05 e o custo anual do sistema precisão ficará em R$ 147,72 existindo assim uma diferença de R$ 39,33/ha/ano, com redução na quantidade de insumos adquiridos e a serem distribuídos, comparado ao manejo tradicional.
Referência
OLIVEIRA, L. R. V. Estudo comparativo da viabilidade agro-econômica da agricultura de precisão em relação à agricultura convencional no cerrado. 47p. 2014