Os produtores já
haviam observado que as flores do melão são pouco atrativas para as abelhas,
comparadas às da vegetação que margeia as plantações. Agora cientistas
descobriram que a abelha melífera (Apis mellifera) faz distinção entre flores
de diferentes tipos de melão. Mais: preferem não visitar as flores de alguns
deles, o que é um problema para os plantios comerciais, já que o meloeiro é
altamente dependente da polinização das abelhas para frutificar.
A resposta para esse comportamento está na variação dos compostos voláteis
exalados pelas flores. Cada tipo de melão apresenta um bouquet diferente,
incluindo compostos atraentes ou repelentes. A presença do volátil relacionado
à repelência é determinante no comportamento das abelhas, mesmo quando há
compostos atrativos.
Pesquisadores da Embrapa Agroindústria Tropical (CE) e da Universidade Federal
do Ceará (UFC) estudaram o comportamento das abelhas nas flores dos cinco
principais tipos de meloeiro cultivados no Brasil: Amarelo, Cantaloupe,
Charentais, Gália e Pele de Sapo. Os cientistas associaram as visitas aos
compostos voláteis emanados. Eles observaram correlações positivas entre o
número de visitas e a quantidade de D-Limoneno e Benzaldeído e correlações
negativas com α-Pinene.
“O composto volátil mais comum na flor do melão está correlacionado com a não
visita”, conta o pesquisador da Embrapa Fernando Aragão, que desenvolve um
trabalho com melhoramento genético do melão e há nove anos estuda, em parceria
com a UFC, a polinização na cultura.
O pesquisador Guilherme Zocolo, que trabalhou com a identificação dos compostos
voláteis no Laboratório Multiusuário de Química de Produtos Naturais da
Embrapa, explica que pode parecer estranha a presença de um composto repelente
nas flores do melão, mas a substância funciona para proteger as plantas de
insetos fitófagos, comedores de flores e folhas. “É uma defesa da planta para
afastar insetos-praga”, esclarece.
O experimento
Nos plantios comerciais, um tipo só de meloeiro ocupa grandes áreas, por isso,
é difícil associar variações no comportamento das abelhas aos diferentes tipos
de melão. Para realizar o estudo, foram instaladas quarenta parcelas, sendo
oito repetições de cada tipo de meloeiro, em uma mesma área, por dois anos
consecutivos.
Os pesquisadores acompanharam todo forrageio das abelhas. Coletaram também
dados sobre as características da flor, do néctar, do pólen e sobre os
compostos voláteis exalados. Cruzaram todas as informações para observar os
fatores que influenciavam na visitação e avaliaram os efeitos na produção e qualidade
do fruto.
O professor Breno Freitas, coordenador do Grupo de Pesquisa com Abelhas da UFC,
conta que durante os estudos, os pesquisadores perceberam que o melão
cantaloupe, que foi significativamente mais visitado que os demais, apresentava
apenas um composto repelente e em pequena quantidade, o α-Pinene, e vários
compostos atrativos. O melão amarelo tem alguns compostos atrativos, mas em uma
quantidade menor que o cantaloupe, e apresenta apenas um repelente, mas em uma
quantidade bem maior. “O charentais tem um atrativo em pequena quantidade e o
resto repelente, alguns em grande quantidade. Isso explica por que a abelha
visita menos as flores desse tipo de meloeiro.”
Abelha é responsável por 80% da produção
“Ficou demonstrado que é necessário fazer um manejo de polinização ajustado
para cada tipo de meloeiro”, conclui Freitas. Para o professor, o estudo é
importante porque a polinização com Apis mellifera é responsável por 80% da
produção de melão. “Os produtores de melão usam colônias de abelhas na área
porque, sem elas, não conseguem cobrir nem os custos de produção”, revela.
Além de auxiliar no manejo das abelhas na polinização dos cultivos, o resultado
do estudo será útil para programas de melhoramento genético do meloeiro. “Com o
melhoramento genético é possível aumentar a concentração dos componentes que
atraem a abelha, para que ela visite mais as flores do meloeiro”, afirma
Aragão.
A ideia, segundo ele, é começar a identificar os genótipos que apresentem maior
concentração dos componentes mais atraentes ou menor concentração dos compostos
menos atraentes ou repelentes. “Por meio de biologia molecular, com marcadores,
poderemos identificar genes que estão associados à produção dos compostos
interessantes e começar a trabalhar no sentido de fixar esses genes nas novas
populações”, completa.
Aragão salienta que a maioria das culturas atualmente cultivadas é produto de
programas de melhoramento genético de plantas, realizados para selecionar
características desejadas, mas, de modo geral, não houve preocupação com
características florais relacionadas à atração de polinizadores. Com base nos
resultados do estudo, outra possibilidade é produzir uma formulação comercial
utilizando as moléculas envolvidas na atração da abelha para auxiliar no
processo de polinização.
Freitas salienta que a melhoria da eficiência da polinização é uma forma de
aumentar a produtividade agrícola, ou seja, aumentar a produção na área já
cultivada sem a necessidade de expandir o cultivo para novas áreas. “É uma das
maneiras de atender ao aumento da população e à necessidade de produção de
alimento com menor impacto ambiental”, declara.