Alessandra Marieli Vacari
Doutora em Entomologia, docente e pesquisadora – Universidade de Franca (Unifran)
Gustavo Pincerato Figueiredo
Engenheiro agrônomo e doutorando no Programa de Pós-graduação em Ciências – Unifran
Enes Pereira Barbosa
Engenheiro agrônomo e mestrando no Programa de Pós-graduação em Ciência Animal – Unifran
Josy Aparecida dos Santos
Bióloga e mestranda no Programa de Pós-graduação em Ciências – Unifran
Estudos sobre a diversidade de ácaros em seringueiras [Hevea brasiliensis (Willd. ex Adr. de Juss.) Muell-Arg.] no Estado de São Paulo, mencionaram 38 espécies encontradas nessa cultura. Mas, existem relatos de 41 espécies de ácaros observadas em áreas de seringueira no Estado do Mato Grosso.
Calacarus heveae Feres (Acari: Eriophyidae) e Tenuipalpus heveae Baker (Acari: Tenuipalpidae) foram relatadas como as principais pragas da seringueira em São Paulo. Essas espécies registradas em pequena abundância em seringueiras nativas na Floresta Amazônica podem atingir grandes populações nos monocultivos dos Estados de São Paulo e Mato Grosso.
Nas inspeções que são realizadas nos seringais, é comum a observação de ácaros predadores e de fungos, evidenciando a possibilidade do controle biológico dessas espécies de ácaros-pragas.
Ciclo de vida e reprodução
A espécie T. heveae apresenta duração média do período pré-imaginal de 30 dias e o tempo médio de uma geração, ou seja, de ovo a adulto, cerca de 45 dias. Com relação à reprodução de T. heveae, uma fêmea pode colocar 1,4 ovo por fêmea por dia e total durante a fase adulta de cerca de 34 ovos.
A espécie C. heveae apresenta período médio de ovo a adulto de 9,3 dias e período médio de oviposição de 6,1 dias. A média diária de oviposição é de 2,3 ovos por fêmea e a fecundidade média de 16,2 ovos por fêmea. Esses dados foram obtidos em temperatura de 25±1°C.
Danos causados por ácaros à seringueira
Nas intensivas plantações de monocultura de seringueira no Brasil, a infestação de ácaros fitófagos ocorrem nas faces adaxial e abaxial de folhas, sendo que as espécies T. heveae e C. heveae podem causar severa desfolha devido à queda prematura das folhas e, em consequência, perdas significativas de produção de látex.
C. heveae ocorre principalmente na superfície adaxial das folhas, causando minúsculos pontos amarelados e o bronzeamento progressivo das folhas, seguido pela queda prematura das folhas. T. heveae tem preferência pela superfície abaxial, induz ferrugem nos folíolos e pode causar desfolha severa nas plantações quando em altas populações.
Condições favoráveis
Os maiores níveis populacionais dos ácaros-praga C. heveae e T. heveae ocorrem no final da estação chuvosa e início da seca, principalmente de janeiro a junho, quando podem atingir altas populações, com aumento significativo a partir de fevereiro. Picos populacionais podem ocorrer a partir de abril, quando foram encontrados até 24,7 ácaros por parcela de 12 m2.
O período de ocorrência de T. heveae pode coincidir com o de maior produção de látex. A produção na cultura da seringueira segue um padrão sazonal no Estado de São Paulo, com aumento a partir de setembro e maior produção de janeiro a julho, com pico em maio e junho.
Nesse período de alta produção, as folhas devem estar em grande atividade fotossintética, produzindo os assimilados necessários e, dessa forma, provavelmente apresentam condições nutricionais adequadas ao desenvolvimento dos ácaros.
Assim, a ocorrência do ácaro T. heveae coincide com a demanda de produtos fotossintetizados pelas folhas, que pode ser comprometida pelo intenso desfolhamento que esta espécie-praga pode provocar.
Ácaros predadores
Fitoseídeos têm sido extensivamente estudados como agentes de controle biológico de insetos e ácaros-praga em diversos cultivos. Os predadores mais abundantes em áreas de seringueiras geralmente são Metaseiulus camelliae (Chant & Yoshida-Shaul), Amblyseius compositus Denmark & Muma e Euseius citrifolius Denmark & Muma.
Os predadores não conseguiram evitar o aumento populacional de C. heveae e T. heveae a partir de março. No entanto, a presença daqueles predadores pode ter evitado o surgimento mais precoce e níveis ainda maiores daqueles ácaros-praga.
Além disso, Agistemus floridanus Gonzalez é um predador da família Stigmaeidae encontrado em altas populações, geralmente associado a T. heveae e C. heveae em seringueira. Os resultados obtidos para a oviposição média diária indicam que A. floridanus pode ser o predador mais importante no controle de C. heveae e T. heveae.
Devido à dificuldade de conseguir grandes populações de A. floridanus para realizar liberações inundativas, a melhor estratégia seria a liberação inoculativa ou a definição de estratégias para conservar esta espécie nos ambientes.
Atualmente, as espécies de ácaros predadores registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que podem ser comercializadas são Neoseiulus californicus (McGregor), Phytoseiulus macropilis (Banks) (Acari: Phytoseiidae) e Stratiolaelaps scimitus (Womersley) (Acari: Laelapidae).
Fungos que controlam ácaros em eucalipto
O fungo Hirsutella thompsonii pode ocorrer naturalmente em cultivos de seringueira nas espécies de ácaros C. heveae, Phyllocoptruta seringueirae Feres (Acari: Eriophyidae) e T. heveae.
A ocorrência do fungo H. thompsonii foi relatada pela primeira vez no ano 2000 no município de Itiquira (MT), causando considerável mortalidade dos ácaros em cultivo de seringueira. Fatores como o vento podem atuar na dispersão dos conídios, além da água da chuva e do orvalho, que podem atuar como importantes agentes físicos de disseminação dos fungos patogênicos.
Os maiores níveis de infecção de H. thompsonii em ácaros-pragas em cultivos de seringueira ocorrem de novembro a fevereiro na estação chuvosa. Na estação seca, os níveis de infecção ficam geralmente abaixo de 5%. Além disso, existem dois produtos registrados no MAPA que contêm como ingrediente ativo o fungo H. thompsonii, podendo ser adquiridos pelos produtores para aplicações em campo.
A utilização de patógenos naturais em sistemas de Manejo Integrado de Pragas (MIP) depende da adoção de técnicas que possam promover o desenvolvimento epizoótico, como a redução da aplicação de produtos químicos sintéticos.
Os agentes de controle natural podem levar à diminuição significativa do número de aplicações de acaricidas químicos, com benefícios como o menor impacto ambiental e menor pressão de seleção sobre as populações de pragas.
FAZER ARTE
Manejo
Estratégias de manejo de C. heveae e T. heveae na cultura da seringueira devem incluir a adoção de medidas de controle com base nos níveis populacionais da espécie, monitorados por meio de amostragens periódicas.
No estabelecimento de um plano de amostragem que possa ser efetivamente adotado pelos produtores, é importante que o monitoramento seja realizado com a utilização de lupas de bolso (30x), permitindo agilidade e eficiência na realização de amostragens em campo.
Devido aos ácaros C. heveae e T. heveae apresentarem distribuição espacial agregada, ou seja, ocorrem em reboleiras, as amostragens devem ser realizadas em vários pontos da cultura. O tamanho mínimo da amostra, para estimar a densidade populacional de ácaros-pragas na cultura da seringueira, é de 50 folhas, coletadas aleatoriamente na cultura.
Assim, dentro de um programa de MIP, as aplicações visando o controle dos ácaros devem ser realizadas no início da infestação, quando no monitoramento forem observadas as primeiras formas de desenvolvimento dos ácaros.
É importante frisar que acaricidas seletivos são frequentemente necessários principalmente nos primeiros anos da cultura da seringueira, para que ocorra o estabelecimento de populações de predadores, particularmente os ácaros da família Phytoseiidae.
No entanto, nem todos os acaricidas são seletivos e, dependendo do produto utilizado, pode impedir a colonização de ácaros predadores. No MAPA existem três acaricidas registrados para o controle de T. heveae.
Os três produtos são formulados utilizando o ingrediente ativo espirodiclofeno, que pertence ao grupo químico cetoenol. Esses acaricidas pertencem ao grupo 23, cujo mecanismo de ação são inibidores da acetil CoA carboxilase.
Espirodiclofeno, dependendo da concentração, pode permitir a sobrevivência e a eclosão de ácaros predadores, sendo considerado seletivo a esses inimigos naturais. Além disso, a espécie de ácaro predador Amblyseius womersleyi Schicha (Acari: Phytoseiidae) apresentou desenvolvimento normal dos imaturos, quando consumiu presas tratadas com espirodiclofeno.
Atenção
Portanto, em um programa de MIP para a cultura da seringueira, a ênfase deve ser no monitoramento tanto de ácaros-pragas como de ácaros predadores, em que a presença de predadores indica a necessidade de utilização de acaricidas seletivos para a preservação desses inimigos naturais na área.
A integração efetiva do controle químico e biológico é importante para a implementação de programas de MIP, que só é possível com a utilização de produtos fitossanitários seletivos.