O Pacto Verde Europeu tem gerado preocupações no Brasil, especialmente no setor agroindustrial, devido às medidas ambientais e propostas pela União Europeia (EU). Para entender melhor as recomendações desse acordo para o país, Ingo Plöger, vice-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) e especialista em relações internacionais esclareceu alguns pontos.
“O acordo, estabelecido inicialmente para os países membros da UE, busca unificar os esforços em prol do clima até 2050. Após a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 26) em Glasgow, a UE estendeu essas metas aos seus parceiros comerciais internacionais, impondo critérios semelhantes aos produtos importados. No entanto, a aplicação desses critérios pode representar um desvio de propósitos, uma vez que o clima tropical do Brasil tem características diferentes do clima temperado europeu”, esclarece.
Segundo Plöger, o Pacto Verde Europeu pode afetar setores importantes da economia brasileira. Produtos agroindustriais, como carnes, proteínas vegetais, soja, milho, cacau, café e produtos derivados da madeira podem ser impactados pelas medidas europeias. Isso ocorre porque a UE estabeleceu critérios rigorosos em relação ao controle e outros fatores considerados críticos.
E agora?
Diante dessas mudanças, a importância da diplomacia e das relações internacionais entre os mercados se torna evidente. Plöger ressalta que a diplomacia brasileira precisa agir tanto diretamente com os países que impõem restrições quanto em conjunto com países aliados que também são afetados pelas mesmas políticas.
Além disso, é fundamental atuar em instituições internacionais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a UE, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e os bancos de desenvolvimento, para mostrar a incoerência dessas medidas.
“É necessário mostrar à população europeia a incoerência dessas medidas e como elas podem encarecer os produtos essenciais na Europa”, afirma Plöger. Ele destaca que o Pacto Verde Europeu, embora tenha boas intenções para o combate ao aquecimento global, pode ser pouco efetivo e resultar em um aumento de preços de produtos básicos na Europa.
Em relação às oportunidades e desafios para o Brasil, Plöger acredita que o país irá se adequar às exigências de seus clientes europeus. No entanto, é importante demonstrar as consequências do encarecimento desses produtos e questionar as políticas equivocadas adotadas pelo Parlamento Europeu, que já elevaram os custos de energia e alimentos na região devido à Guerra na Ucrânia.
Por outro lado, o Brasil também pode encontrar oportunidades em outros mercados da América Latina que buscam suprir a demanda europeia.
Com o debate em curso sobre as engenharias do Pacto Verde Europeu para o Brasil, a diplomacia e a busca por soluções equilibradas se tornam cruciais para garantir o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental do país. O diálogo entre as partes envolvidas é fundamental para encontrar um equilíbrio entre as necessidades ambientais e as demandas do setor produtivo.
O Green Deal
Na busca por soluções sustentáveis e preservação do meio ambiente, a União Europeia tem implementado medidas abrangentes conhecidas como Green Deal, visando reduzir as emissões de carbono e promover a transição para uma economia mais verde.
Plöger destaca os enormes esforços da sociedade brasileira no enfrentamento das questões ambientais, mencionando a criação do Código Florestal e outras medidas correspondentes.
Além disso, ele destaca as inovações brasileiras, como a utilização de combustíveis flexíveis, que demonstraram os avanços do país na redução da emissão de gases de efeito estufa. O Brasil também é elogiado por suas matrizes energéticas limpas e pela matriz de energia elétrica, que é mais de 90% sustentável.
Quanto às possíveis medidas que o Brasil pode adotar para se alinhar com as diretrizes do Pacto Verde Europeu, o especialista ressalta que o país tem o direito de solicitar a reciprocidade nas medidas adotadas pela União Europeia. Ele sugere que as medidas de desmatamento zero aplicadas ao Brasil também poderiam ser aplicadas à União Europeia, levando em consideração os desmatamentos ilegais de florestas centenárias na Europa, como os ocorridos na Romênia e na Finlândia para a fabricação de paletes.
Plöger também menciona a necessidade de esclarecimentos em relação aos direitos humanos, sugerindo a certificação de produtos que utilizam mão de obra de imigrantes ilegais na União Europeia e destaca que ações recíprocas também poderiam ser aplicadas às queimadas e ao confinamento de animais durante meses no inverno na Europa.
Por aqui
Quanto às perspectivas para a cooperação entre a União Europeia e o Brasil no contexto do Green Deal, Plöger ressalta que não estamos sozinhos na contraofensiva, mencionando que dezenas de países estão acompanhando atentamente as medidas tomadas pelo Brasil.
“O país possui outras opções de mercado e está comprometido em cultivar princípios de sustentabilidade e humanismo. O Brasil tem defendido, desde a Rio 92, que a sustentabilidade envolve não apenas a economia e a questão ambiental, mas também a dimensão social. Um mundo ambientalmente melhor não pode ser alcançado em 2050 se não for abordado nas questões de desigualdade crescente e protecionismo”, avalia.
Em relação ao impacto do Pacto Verde Europeu nas políticas ambientais e climáticas do Brasil, Plöger destaca a ambiguidade e incoerência da União Europeia. Ele menciona que a predominância da agenda verde, que se torna cada vez mais dogmática, pode não oferecer soluções recompensadoras para o cidadão europeu, especialmente diante da crise energética e alimentar.
O especialista acredita que, à medida que os europeus percebem as consequências dessas medidas, poderá ocorrer uma mudança de voto e uma busca por soluções mais racionais e equitativas.
Ele ressalta que é importante para o Brasil continuar trabalhando para promover a sustentabilidade social e ambiental, combater o desmatamento ilegal e a pirataria. “O Brasil é visto como parte da solução e tem se consolidado como uma potência na cadeia alimentar global e nas energias renováveis”, acrescenta.
Cooperação do Brasil
Em um cenário global em busca de soluções sustentáveis, a cooperação entre o Brasil e a União Europeia no contexto do Green Deal é fundamental para a promoção de um desenvolvimento econômico sustentável e a preservação do meio ambiente.
“O Brasil tem desafios e oportunidades importantes pela frente, e a posição diplomática adotada pelo país pode ser restringida na minimização dos negativos do Green Deal em sua economia”, conclui Plöger.