Nilton Cesar Fiedler
Engenheiro florestal, mestre e doutor em Ciência Florestal e professor – Universidade Federal do Espírito Santo
nilton.fiedler@ufes.br
Ricardo Pinheiro Cabral
Engenheiro florestal, mestre e doutorando em Ciências Florestais (UFES)
ricardopinheirocabral@gmail.com
Amanda Magda Almeida Santos
Engenheira florestal e mestranda em Ciências Florestais (UFES)
amandamgd@gmail.com
No Brasil, é comum o cultivo do café a pleno sol, especialmente porque esse método garante alta produtividade. No entanto, poucas pessoas sabem que o cafeeiro é uma planta originária das florestas sombreadas da Etiópia e do Sudão, onde crescia sob a proteção das árvores.
Historicamente, os primeiros produtores brasileiros aplicaram técnicas de cultivo semelhantes às usadas em outras culturas, como a cana-de-açúcar, desmatando grandes áreas e cultivando o café sob sol intenso.
Estudos mais recentes, porém, indicam que o cultivo sob sombreamento pode ser benéfico, ajudando a estabilizar a produção e prolongando a vida útil dos cafeeiros, ao imitar melhor as condições naturais da planta.
Solução sustentável
Os Sistemas Agroflorestais Florestais (SAFs) são uma solução sustentável que pode integrar o cultivo de café com outras culturas arbóreas, criando um ambiente diversificado e mais resiliente.
Os SAFs podem variar desde consórcios simples com uma ou duas culturas até sistemas mais complexos, como os propostos na agricultura sintrópica de Ernst Götsch, onde os processos naturais são replicados nas práticas agrícolas, tanto em termos de forma, função e dinâmica, promovendo uma interação mais harmoniosa entre os componentes do ecossistema.
Para os produtores de café, isso significa maior proteção contra adversidades climáticas, melhorias na qualidade do solo e diversificação de renda, tornando a produção mais estável a longo prazo.
Dicas para começar
A implementação de SAFs em cafezais pode trazer benefícios ambientais, como maior retenção de água no solo, redução da erosão e melhoria da biodiversidade local. A diversificação de culturas no sistema contribui para o sequestro de carbono e para a melhoria da fertilidade do solo.
Os SAFs ajudam os cafezais a se adaptarem às mudanças climáticas, protegendo-os de eventos extremos, como secas, ao criar um microclima mais favorável e aumentando a biodiversidade no entorno.
Além disso, também há benefícios econômicos, pois os produtores podem aumentar sua renda com a venda de produtos madeireiros, frutas e outros itens resultantes das culturas consorciadas, reduzindo a dependência exclusiva do café.
O que entra na consorciação?
Ao escolher as espécies para consorciar com os cafeeiros, o produtor deve recorrer à ajuda de um profissional capacitado. As espécies devem ser compatíveis com o ciclo de cultivo do café, oferecer benefícios adicionais ao solo e garantir um sombreamento adequado, sem prejudicar a produção.
Critérios como a capacidade de fixação de nitrogênio e adaptação climática também devem ser considerados.
Algumas espécies utilizadas em SAFs baseados em cafés já possuem mercados consolidados. No entanto, outras espécies ainda carecem de um mercado mais desenvolvido e necessitam de maior incentivo econômico para se tornarem financeiramente viáveis em larga escala.
Sem orientação, nada feito
Para garantir o sucesso do cultivo consorciado, é essencial que o produtor, com o apoio de assistência técnica, estude detalhadamente o mercado local, a aptidão agrícola da região e da propriedade, além da disponibilidade de mão de obra para as culturas escolhidas.
Essa análise permitirá identificar as melhores oportunidades, maximizando a viabilidade econômica e o retorno financeiro do consórcio de espécies madeireiras e frutíferas com o café.
As árvores podem criar um microclima mais favorável para o crescimento do café, reduzindo a evaporação da água do solo e melhorando a retenção de nutrientes, resultando em um aumento da produtividade.
Algumas espécies ajudam no controle de pragas e melhoram a qualidade do solo. Outras árvores proporcionam sombreamento adequado, que é essencial para o equilíbrio hídrico do café.
Obstáculos
A principal dificuldade para implementar sistemas agroflorestais em áreas de cultivo de café está na gestão técnica, que exige conhecimento específico para balancear o crescimento das árvores e garantir que o café continue a receber luz solar suficiente. O manejo das árvores também pode demandar mais mão de obra e planejamento.
O consórcio de café com madeiras e frutíferas requer um manejo cuidadoso para garantir que as árvores não prejudiquem o café, evitando competição por nutrientes e luz. Poda e controle da densidade de plantio são essenciais para manter esse equilíbrio.
As espécies alternativas incluídas nos consórcios com cafés podem influenciar tanto o ciclo produtivo quanto a qualidade do café, mas essa influência tende a ser positiva quando o consórcio é bem manejado.
Embora possa haver uma leve diminuição no volume de produção devido ao sombreamento, isso é compensado pelo aumento da qualidade dos grãos, resultando em um café com maior valor agregado.
Passos importantes
A gestão eficaz do consórcio inclui o controle cuidadoso do sombreamento e a poda regular das árvores, garantindo que a quantidade de luz recebida pelos cafeeiros seja adequada para não comprometer seu desenvolvimento. Dessa forma, o consórcio pode melhorar tanto a sustentabilidade da produção quanto o valor comercial da colheita.
Ainda são poucos os incentivos e políticas públicas que apoiam os produtores na adoção de sistemas agroflorestais (SAFs). Porém, um bom exemplo no Brasil é o Programa Reflorestar, do governo do Espírito Santo, considerado o maior programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) do país.
O Reflorestar oferece incentivos financeiros para a implementação de várias modalidades de restauração ambiental, incluindo diferentes arranjos de SAFs. Por meio do programa, os agricultores são remunerados pelos serviços ambientais prestados, como a recuperação de áreas degradadas e a proteção dos recursos hídricos.
Dentre os SAFs incentivados, destacam-se aqueles que integram o cultivo de café com espécies frutíferas e a silvicultura de nativas, proporcionando tanto sustentabilidade ambiental quanto diversificação da renda. Esses incentivos são importantes para tornar viável a transição para práticas agroflorestais, garantindo a compensação pelos benefícios ambientais gerados pelos produtores.
Segundo consultores do programa Reflorestar no sul do Espírito Santo, mais de 1000 famílias rurais da região do Caparaó Capixaba participam do programa, recuperando mais de 3.100 hectares, tendo os SAFs como o principal incentivo para a participação dos produtores no programa.
Na prática
Os produtores envolvidos em SAFs relataram benefícios como aumento da resiliência climática, melhoria da qualidade do café produzido, proporcionando aumento do valor agregado e diversificação de renda da família.
Para ampliar a implantação de sistemas agroflorestais em café, é necessário promover capacitação técnica, esclarecer mitos e divulgar amplamente os benefícios dos SAFs, como a diversificação de renda e a melhoria da qualidade do café.
A criação de cooperativas específicas para produtos agroflorestais pode facilitar o acesso ao mercado, fortalecendo os produtores. Além disso, políticas públicas de incentivo, como créditos rurais e programas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), são fundamentais para viabilizar economicamente esses sistemas, seguindo o exemplo do Programa Reflorestar no Espírito Santo.
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