No último dia 8, na Universidade Federal do Maranhão – UFMA, foi realizado evento de encerramento do projeto “Cadeias Sustentáveis de Valor da Soja e do Babaçu no Maranhão”, viabilizado pela agência de cooperação alemã – GIZ e executado em parceria pela Rede ILPF e Embrapa, com apoio do governo do Estado do Maranhão. A iniciativa tem a marca da inovação. Contou com a participação direta de comunidades extrativistas, quilombolas, assentados de reforma agrária e produtores de soja e ainda a parceria com agentes de ciência e tecnologia, como UFMA, Universidade Estadual do Maranhão- UEMA, Instituto Federal do Maranhão – IFMA, Universidade Federal do Ceará – UFC, iniciativa privada, organizações não-governamentais e agentes das cadeias de valor. Durante um ano e meio, o projeto trabalhou pelo desenvolvimento sustentável da cadeia extrativista do babaçu e da cadeia produtiva da soja, mas também transformou vidas por meio do conhecimento, profissionalização, empreendedorismo e geração de renda.
Para Marco Bomfim, chefe-geral da Embrapa Cocais, esse é um exemplo de aliança pela inovação no Maranhão em que as pessoas representantes de várias instituições parceiras são o elemento crucial, conectadas de forma interdependente para o desenvolvimento econômico e social sustentável do Maranhão. “Hoje celebramos a união do conhecimento tradicional com o científico e tecnológico. O protagonismo é dessas mulheres, nós somos os facilitadores. Mais do que agregação de valor ao babaçu e aos produtos da palmeira e geração de renda e qualidade de vida, é a ressignificação do extrativismo praticado pelas quebradeiras por meio da inovação social, pioneirismo da Embrapa Cocais. Os frutos foram colhidos por todos. É dessa rede que vem a força transformadora da ciência, aliada ao poder público, setor produtivo – representado por produtores, agroindustriais, extrativistas – e sociedade civil para formar o ambiente propício para a inovação”.
Isabel Ferreira, diretora Executiva da Rede ILPF, destacou que “a agricultura sustentável com segurança alimentar e nutricional é o nosso DNA. Estamos reunidos para celebrar os resultados de um grande projeto feito com um conjunto de esforços, especialmente das cadeias produtivas da soja e do babaçu”. O reitor da UFMA, Natalino Salgado Filho, chamou a atenção para o poder da união das instituições em rede para produzir produtos com agregação de valor e preservação ambiental. Segundo André Machado, assessor técnico da GIZ, há muitas oportunidades para o Maranhão, grande fronteira agrícola com produção de soja em crescimento e uma riqueza de biodiversidade. A sustentabilidade e a inclusão social e o respeito às tradições históricas e culturais das comunidades é parte do processo de desenvolvimento.
Confira aqui o vídeo “Mulheres do babaçu” e do caso de sucesso da Fazenda Barbosa.
Resultados com babaçu
A pesquisadora Guilhermina Cayres, chefe de transferência de tecnologia da Embrapa Cocais e líder o projeto, falou sobre os novos alimentos à base do coco babaçu, desenvolvidos e reformulados no decorrer da pesquisa a partir da união do conhecimento tradicional e o científico. Segundo ela, o objetivo foi agregar valor ao produto da palmeira e ao trabalho das comunidades quilombolas e das famílias agroextrativistas que trabalham e geram renda com o babaçu.
Foram desenvolvidas novas formulações para o biscoito e o gelado de babaçu e novos produtos alimentícios, como a bebida tipo leite, o análogo de queijo, o tipo hambúrguer e a farinha da amêndoa, além do pão vegano feito com a farinha da amêndoa. Os produtos atendem diferentes exigências do mercado de alimentos – nutrição, saúde, boas práticas de qualidade, segurança alimentar, padronização e valorização dos produtos da culinária e cultura regionais e comercialização – e passam por testes de análise sensorial.
“Com o projeto mostramos que é possível fazer tecnologia com as comunidades extrativistas e dissociar a relação do babaçu com pobreza, miséria e sofrimento e apresentar novas alternativas com produtos, processos e negócios de impacto social, que valorizam o trabalho das quebradeiras de coco e de suas famílias. Para multiplicar os conhecimentos gerados no processo de inovação social, as mulheres recebem capacitação e treinam outras comunidades quilombolas na produção dos novos alimentos do babaçu para promover o empreendedorismo e a autonomia transformadoras. Esse é um ganho, resultado, não mensurável, mas perceptível e fortalecido durante o processo”.
Os professores da UFMA envolvidos na pesquisa sobre os alimentos com babaçu também falaram sobre as soluções desenvolvidas a partir das demandas e desafios propostos. Maria da Glória Bandeira falou sobre a importância das boas práticas das agroindústrias familiares, das capacitações e análises microbiológica, sensorial e nutricional para os produtos desenvolvidos. Harvey Villa enfatizou o empreendimento e inovação dos alimentos à base de babaçu. “Fizemos o caminho inverso. Começou nas comunidades e veio para os laboratórios. Essa foi a grande diferença. Hoje temos três comunidades empreendedoras com produtos que são sucesso de venda, garantindo renda e desenvolvimento social”.
As protagonistas, as quebradeiras de coco emocionaram a todos com suas falas. Alana Mirela Lica, da Cooperativa Mista dos Agricultores do Vinagre – Coomavi, em Itapecuru-MA disse que sempre se questionou sobre o motivo de as quebradeiras de coco não serem valorizadas. “Hoje estamos ocupando nosso lugar que é de direito há muito tempo e estamos felizes por estarmos empreendendo e chegando onde queremos com o nosso trabalho, nos tornando autônomas, independentes, chefes de família, e exercendo nossa cidadania”.
Antonia Vieira, quebradeira de coco da comunidade Pedrinhas Clube de Mães, também em Itapecuru-MA, agradeceu às instituições pela parceria que permitiu chegar à vitória. “Todos aqui são doutores, nós também somos doutoras, doutoras em babaçu. Fomos ouvidas em nossas demandas, contribuímos com o nosso conhecimento para o desenvolvimento dos produtos e é dignificante esse reconhecimento do nosso papel histórico, cultural e social”.
Gracilene de Jesus Cardoso, quebradeira de coco do Assentamento Canto do Ferreira, em Chapadinha-MA, não conteve o choro. “O choro é de felicidade. Somos reconhecidas e valorizadas. Nós nos orgulhamos do que somos e da riqueza do babaçu. Antes nós só catávamos e quebrávamos coco, agora nós o transformamos em queijo, leite, sorvete, hambúrguer etc. Juntos podemos mais”.
Para finalizar a manhã, o pesquisador Joaquim Costa, chefe de pesquisa e desenvolvimento, falou do babaçu como componente florestal na Integracao Lavoura Pecuária Floresta – ILPF. Segundo ele, além dos ganhos ambientais e econômicos, já se sabe que a presença da palmeira nativa e a manutenção do extrativismo do babaçu em áreas de pastagem agrega valor a todo o sistema produtivo e aos coprodutos do babaçu. “É alto o impacto social e econômico na vida das comunidades de quebradeiras de coco ao gerar mais renda para as famílias. O produtor se beneficia com impactos agronômicos e zootécnicos positivos para a pecuária. As raízes do babaçu absorvem nutrientes das camadas mais profundas do solo e recicla tais nutrientes quando as folhas já caídas servem como palhada dos cultivos e se decompõem para nutrir a pastagem e o gado que se alimenta dela. A sombra das palmeiras favorece a produtividade de carne e leite. A floresta em pé, a mata de cocais, ainda pode gerar serviços ambientais em benefício de quebradeiras e produtores, como créditos de carbono e carne e leite carbono neutro com a captação de gases de efeito estufa pelas palmeiras.
Outro tema abordado pelo pesquisador foi a ração animal feita com a torta de babaçu. A Embrapa no Maranhão e parceiros vêm desenvolvendo rações balanceadas para caprinos e ovinos com o resíduo da extração do óleo – chamado de torta da amêndoa do coco babaçu – em substituição parcial a ingredientes tradicionais, como milho e soja. Animais que foram alimentados com a dieta contendo a torta de babaçu apresentaram melhor desempenho produtivo, qualidade e perfil de ácidos graxos da carne.
“Os ácidos graxos dão sabor e suculência à carne, agregando valor ao produto. Além disso, são gorduras saudáveis e essenciais para o corpo humano que agem como reguladores da coagulação e saúde do sangue, da pressão arterial e da produção de hormônios e anticorpos e ainda como inibidores de inflamações, lesões e infecções”, explicou. Entre os impactos futuros da pesquisa, a melhoria de renda e qualidade de vida das quebradeiras de coco, fornecedoras da torta de babaçu; a redução do custo da ração feita com matéria-prima abundante na região e o incentivo à cadeia de consumo de carne de pequenos ruminantes no estado. Para os consumidores, mais saúde e variedade de alimentação.
O corpo técnico do projeto – professor José Cutrim, do IFMA; Marcílio Frota, da Embrapa Caprinos e Ovinos; Michelle Parente, da Universidade Federal do Piauí; e Valéria Apolinário, da UEMA – também falaram sobre o papel de cada um nas pesquisas. Cutrim lembrou que a criação de uma identidade para o novo produto – o cabriçu – deverá fortalecer a cadeia produtiva dos ovinos e caprinos.
O produtor rural Nonato Coalhada falou sobre a importância do conhecimento para alavancar a bioeconomia e a produção da agricultura e pecuária. “É necessário nos manter juntos para que cada um possa se apoiar e cumprir nosso papel de produtores de alimentos”. Também apresentaram suas contribuições representantes da Secretaria de Estado da Agricultura Familiar – SAF e outras secretarias estaduais. Além de bolsistas dos projetos, que também mostraram os resultados dos seus estudos.
Resultados da soja
No período da tarde, o foco foi a cadeia da soja. Estiveram presentes o analista Marcos Teixeira, da Embrapa Meio Norte, contando a história da soja no leste maranhense. Ele falou sobre a tropicalização da soja, o programa de melhoramento e desenvolvimento de novas cultivares adaptadas às condições locais e a mudança para o sistema de produção sustentável.
Também foi citado o papel da ILPF, tecnologia de produção que busca a diversidade, rotação, sucessão e consorciação de culturas, plantio direto, entre outras técnicas que têm revolucionado a produção com sustentabilidade. Segundo explicou, a transformação dos solos da região – naturalmente de baixa fertilidade natural – em solos aptos para a produção mecanizada de grãos foi resultado do investimento em ciência e tecnologia.
Também falaram o professor Gregori Ferrão, da UFMA, que abordou os impactos na sustentabilidade do agronegócio no leste maranhense e o produtor Luis Fernando Devicari, que contou sobre a experiência da Fazenda Barbosa, no municipio de Brejo-MA, com os sistemas integrados. Também relataram sua experiência representantes da iniciativa privada, como Aprosoja, e da Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Pesca – Sagrima e bolsistas dos projetos.