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Governança fundiária: o papel da inteligência artificial

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Richard Torsiano
Especialista internacional em governança e administração de terras, diretor executivo da R.Torsiano Consultoria Agrária, Ambiental e Fundiária e mestre em Cadastro e Ordenamento Territorial pela Universidade de Jaén, Espanha

O papel da inteligência artificial na governança fundiária é uma questão que parte primeiro do problema e então temos uma solução encaixada pela inteligência artificial. Nós temos um país com dimensões continentais de 850 milhões de hectares e um histórico de sistemas de gestão, governança e cadastro de terras muito precários.

Além disso, são escassos os serviços de registro de imóveis em várias regiões do país. Não é possível governar um território que não se conhece efetivamente.

E, para conhecer o território e desenvolvê-lo para os agricultores e produtores rurais terem segurança jurídica sobre esse território, garantirem segurança para os investidores de que terão segurança nos investimentos em terras, compra e venda de propriedades, no mercado de terras, juntas instituições financeiras, nas operações de crédito e operações de financiamento, é fundamental conhecer as propriedades do país.

É importante conhecer as áreas, onde elas estão, como elas estão, quem são os proprietários, quem está arrendando, como está arrendando, se ela está produzindo ou não. Para isso, é fundamental ter plataformas que tenham inteligência de terras embarcadas para promover um sistema de administração de terras adequado, que sirva o governo, mas também sirva o mercado, os proprietários, as empresas que lidam com o agronegócio, os bancos e os cartórios de imóveis.

Com a ferramenta da inteligência artificial se tende, de fato, há uma governança fundiária ambiental para conhecer a realidade, inclusive do ponto de vista de uso e ocupação da terra e a questão ambiental.

Não é possível ter um monitoramento efetivo sobre essas propriedades, tratar de questões como Agenda ESG, compliance, instrumentos de rastreabilidade da origem de produtos, para evitar que a indústria embarque em financiamento ou compra de produtos oriundos de áreas desmatadas ilegalmente, sem a utilização desse rastreamento e monitoramento com plataformas robustas de inteligência artificial.

Tecnologia da informação como solução

Não se tem gestão adequada de um território se o município não tiver informações adequadas em relação às ruas, estradas e propriedades. Não há plataforma que traga um registro desta realidade estática.

Por isso, é importante a utilização de uma inteligência artificial que possua algoritmos embarcados que consigam fazer análises sobre a dinâmica territorial. E, com isso, as instituições e autoridades consigam acompanhar essa dinâmica e tenham uma leitura da situação territorial de uso e ocupação, como por exemplo, expansão de ocupações irregulares nas zonas urbanas, para garantir também maior segurança jurídica como IPTU ou ITR  (Impostos Territorial Rural).

Além disso, uma inteligência artificial que consiga cruzar os dados territoriais com outros de caráter econômico e social para entender aquela ocupação territorial e o perfil das ocupações naquele território, assim contribuindo para formulação de políticas públicas.

Para regularização fundiária é necessário que primeiro se tenha dados qualificados sobre o uso e ocupação da terra, ter condições de enxergar a cronologia de ocupação daquele espaço e verificar as condições de exploração. Atualmente, esses elementos podem ser obtidos por meio da utilização da inteligência artificial. 

Desafios

O grande desafio do governo vem, justamente, da ausência de inteligência territorial que contribui para a falta de informações adequadas e dificulta o processo de acompanhamento da dinâmica de ocupação do território, seja rural ou urbano.

Se existisse um processo de acompanhamento remoto com base em imagem e satélite que conseguisse ter alertas sobre as ocupações irregulares em cima de terra pública, o  Estado conseguiria acompanhar essa dinâmica, retirar as ocupações que fossem ilegais de má fé, ou promover um processo de ocupação ordenado a partir de programas de habitação em áreas que sejam propícias para isso.

A precariedade nas ferramentas de inteligência artificial disponíveis e utilizadas pelo governo atualmente e a falta de investimento histórico nesse processo, prejudica muito o país, por exemplo, os estados da Amazônia não sabem onde estão as terras devolutas.

Não há um cadastro de terras com um mosaico sobre as áreas e as propriedades públicas e privadas que tem no estado. Caso existisse uma plataforma em que fosse possível definir onde é que estão as terras devolutas, poderia ser possível promover um programa de revolução fundiária direcionado para as áreas que efetivamente são áreas devolutas, onde o governo possa arrecadar essas terras, depois destinar esses territórios. E, com a inteligência artificial, seria possível uma aceleração desse processo de regularização.

Houve avanços no Incra, especialmente depois do ano de 2009, com a aprovação do Programa Terra Legal, teve também o desenvolvimento de plataformas importantes como o SIGEF (Sistema de Gestão Fundiária) e o SIGEF Titulação, que é o processo automatizado de titulação de terras para acompanhar o processo de titulação.

Mas, ainda precisamos avançar muito com inteligência territorial, usando a inteligência artificial para fazer essas análises remotas para organizar as políticas públicas, com base em inteligência territorial, e depois executar as ações de regulação fundiária.

Sustentabilidade ambiental

Os produtores rurais precisam ter segurança e saber qual é a realidade das áreas, principalmente, das novas fronteiras agrícolas do país. Necessitam de clareza de onde os produtores e investidores estão produzindo e investindo para que façam investimentos seguros.

Além disso, os agricultores familiares, as comunidades tradicionais também precisam ter dados e informações sobre a sua realidade territorial para terem noção da situação real e prospecção futura sobre o que pode ocorrer naquele território.

A inteligência artificial e territorial tem, necessariamente, embarcado muita informação geoespacial e de geoprocessamento e utilizando plataformas que podem realizar análises com dados geoespaciais. No âmbito da sustentabilidade ambiental, essas plataformas são necessárias.

Grandes empresas já estão utilizando isso para se enquadrarem na Agenda ESG e na Compliance, onde as empresas do agronegócio estão se instalando. A agricultura de precisão aborda bastante também essa perspectiva de sustentabilidade, para fazer o uso racional e adequado da terra, para que os estados e municípios tenham um planejamento e monitoramento sobre o uso e ocupação, a partir da definição do Código Florestal, áreas de reserva legal e áreas de preservação permanente.

É importante ter os instrumentos e ferramentas para acompanhar essa dinâmica de uso e ocupação para evitar que haja um processo de exploração e depredação do meio ambiente. Isso é viável por meio de plataformas que consigam jogar na tela para os gestores, investidores, produtores rurais e para o agronegócio informações do território que consigam demonstrar uma retrospectiva, mostrar o cenário atual e também fazer leituras prospectivas daquele território.

Oportunidades e desafios

O mundo está trazendo essa oportunidade, ou seja, a Agenda ESG tem exigido do mercado, do agronegócio e dos produtores rurais um enquadramento numa realidade enquadrada nas leis nacionais, que exigem um padrão de comportamento, caráter socioambiental e uma governança efetiva dos produtores e das empresas do agronegócio sobre os seus ativos, fornecedores e produtores que estão fornecendo os seus insumos para as empresas do Agro.

O mercado internacional tem demonstrado há muito tempo uma preocupação em adquirir produtos agrícolas de outros países que não sejam oriundos de áreas de conflitos, áreas de desmatamento ilegal, áreas que tenham algum problema.

Então essa realidade global dentro do mercado fortalece as exigências por rastreamento e rastreabilidade dos produtos, cumprimento da legislação ambiental, produção mais sustentável e respeito ao meio ambiente.

Este fator tem exigido que as empresas tenham uma capacidade, cada vez maior, de olhar para essas propriedades e enxergar o seu histórico e monitorar a origem dos produtos. E isso exige muita inteligência artificial embarcada, de novo, com agregação muito forte de informações de caráter geoespacial e de processamento.

Quando falamos de Brasil é importante saber ler as propriedades rurais, especialmente porque o nosso país possui dimensões continentais, com mais de 300 milhões de áreas produzindo, mais de 800 milhões de território e 500 milhões de hectares na Amazônia. Então, para o mercado, investir no Brasil é algo que está evidente.

Do ponto de vista da governança, por parte, principalmente, das instituições públicas, tá dado que vários países aqui da América Latina e no Caribe têm demonstrado que não se avança com o processo de gestão do território, regularização fundiária, formulação e execução efetiva de políticas públicas de desenvolvimento por meio rural, sem que tenha informações qualificadas sobre o meio rural.

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