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Irrigar o café pode até dobrar a produção

Pesquisas conduzidas em Lavras e Viçosa (Minas Gerais) apontam ganhos de até 50% na produtividade se o cafezal for irrigado

André Luís Teixeira Fernandes
Pró-Reitor – Universidade de Uberaba (UNIUBE) e sócio proprietário da C3 Consultoria e Pesquisa
andre.fernandes@uniube.br

A falta de água durante as fases fenológicas críticas do café, como floração e granação, prejudicam muito a lavoura e, dependendo da intensidade do déficit hídrico, até mesmo nos anos subsequentes.

Irrigação via pivô central com 100% de área molhada

Observa-se que as mudanças climáticas estão alterando o clima, tornando as chuvas irregulares e mais intensas, colocando em risco todo o investimento feito para formar uma lavoura e produzir café. Para evitar que a lavoura fique tão vulnerável, a estratégia ideal é irrigar o cafezal.

No Brasil, 450 mil hectares, equivalentes a 22% da área plantada de café, são irrigados por diferentes sistemas de irrigação, como aspersão, pivô central, gotejamento, etc. Em Minas Gerais, onde a área plantada já supera um milhão de hectares, em cada oito hectares, um é irrigado.

Por que irrigar?

A irrigação tem sido utilizada mesmo em regiões consideradas tradicionais para o cafeeiro, como o sul de Minas Gerais, Zona da Mata de Minas Gerais, Mogiana Paulista, Espírito Santo, com resultados excepcionais de produtividade.

Pesquisas conduzidas em Lavras e Viçosa (Minas Gerais) apontam ganhos de até 50% na produtividade se o cafezal for irrigado. Em áreas de temperaturas mais elevadas e com maior déficit hídrico, os ganhos de produtividade são ainda maiores.

Existem diferentes sistemas de irrigação capazes de irrigar o cafezal e a escolha de um ou outro depende do tipo de solo, da topografia, do tamanho da área, dos fatores climáticos, dos fatores relacionados ao manejo da cultura, do déficit hídrico, do custo do sistema de irrigação e da capacidade de investimento do produtor.

Sistemas disponíveis

Entre os sistemas utilizados para irrigação, destacam-se o pivô central e o gotejamento. Convém salientar que o pivô central aproveita cerca de 80% da área, já que o círculo irrigado não preenche totalmente se o plantio for feito em uma área quadrada.

O investimento em pivô central pode ser alto se a área irrigada for menor que 30 hectares; porém, em áreas maiores, seu custo de implantação e manutenção são menores que o sistema de gotejamento.

Posições de irrigação possíveis no emissor tipo LEPA

Quando plantado em círculos concêntricos, a irrigação por pivô também pode ser feita em apenas parte do solo, caracterizando-se assim como irrigação localizada, como já ocorre quando se emprega o gotejamento.

O fato de molhar apenas parte do solo resulta em economia de água. A aspersão convencional também é bastante empregada em áreas menores, embora seja bastante afetada pela ocorrência de ventos com velocidades superiores a 10 km/h, já que para lançar água em maiores distâncias, o jato alcança alturas em que a deriva (arraste da água pelo vento) é muito comum.

Outro sistema empregado, principalmente no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, é o tubo perfurado, muito conhecido como tripa. Trata-se de um tubo de polietileno de cerca de 40 mm de diâmetro que possui pequenos orifícios (0,1 mm) que esguicham a água, porém, de forma menos eficiente e uniforme, se comparada ao gotejamento.

Já o gotejamento apresenta detalhes operacionais que requerem rigoroso dimensionamento hidráulico e procedimentos de operação e manutenção.

Investimento na irrigação

Para irrigar a lavoura, o produtor tem opções que variam de US$ 1.500,00 a US$ 3.200,00/ha (Figura 1) e o custo operacional é de 5 a 6% do custo de produção. O custo da irrigação varia conforme o projeto, pois é muito influenciado pelo desnível e mesmo pela fonte de energia utilizada.

O uso da energia elétrica implica, em média, em um custo de R$ 1,00 a R$ 3,00 por milímetro aplicado em cada hectare, sendo que o emprego de óleo diesel pode resultar em custos quatro vezes superiores ao da energia elétrica.

Embora a busca por sistemas de irrigação seja expressiva em todas as regiões cafeeiras do Brasil em decorrência dos ganhos de produtividade e dos problemas ocasionados pelas variações climáticas, o investimento necessário tem sido maior que os valores apontados anteriormente.

Figura 1: Custos para a implantação de sistemas de irrigação para o cafeeiro. Valores de agosto de 2023 (dólar = R$ 5,00)

Comparado ao valor médio da saca de café, o investimento necessário para irrigar um hectare fica em torno de 15 sacas de café (ao preço atual de US$ 200,00/saca), mas dependendo da região onde o projeto é instalado, este investimento se paga muito rápido.

Pivô central

No Brasil, existem fábricas subsidiárias de grandes fabricantes internacionais de pivôs, sendo as americanas Valmont (marca Valley) em Uberaba (MG) e a Lindsay (marca Zimmatic) em Mogi Mirim (SP), enquanto a Austríaca Bauer situa-se em São João da Boa Vista (SP).

Além deles, existem fabricantes nacionais como Krebs, Focckink, Irrigabras, Nevada e outros. Estima-se que o mercado brasileiro seja em torno de 1.000 unidades por ano e que existam mais de 20 mil pivôs em funcionamento no Brasil.

Os primeiros pivôs centrais utilizados para café foram adaptados de outras lavouras, com irrigação em área total, ou seja, tanto nas linhas de café quanto nas entrelinhas. Apesar de viabilizar a cafeicultura empresarial nas regiões de cerrado, o sistema pivô central “convencional” ainda apresentava o inconveniente da aplicação de grandes volumes de água e com irrigação das entrelinhas do café, exigindo controle mais intensivo do mato.

Inovação

A partir dessas dificuldades, surgiu uma inovação, adaptada da irrigação de pomares de citros nos Estados Unidos, com emissores capazes de irrigar somente a faixa de absorção radicular das plantas.

A partir desta tecnologia, pesquisadores e consultores brasileiros desenvolveram uma técnica extremamente interessante para a irrigação do cafeeiro com o pivô central, com plantio realizado em círculo e emissores localizados sobre as linhas de café, denominados LEPA, sigla que representa, em inglês, Low Energy Precision Aplication, ou seja: aplicação precisa de água com baixo consumo de energia, já que a pressão requerida é menor.

Neste sistema de plantio circular, é comum observar em áreas quentes, de alta insolação, que na direção sudoeste-nordeste pode ocorrer escaldadura de parte da folhagem, devendo o produtor garantir que as exigências da cultura (nutrição, tratos fitossanitários e culturais) estão sendo cumpridas.

A ocorrência da escaldadura é esperada, considerando-se que o tempo de exposição da face das plantas ao sol durante a tarde seja inferior à metade do período de insolação, já que à tarde as temperaturas são mais elevadas.

Em termos práticos, em locais com altas temperaturas, principalmente no mês de outubro, a direção apropriada para as linhas de plantio deva ser de sudeste para noroeste. Verifica-se, portanto, que no plantio em círculos concêntricos, apropriado para o pivô equipado com bocal LEPA, esta recomendação não seria possível.

Por essa razão, em plantios concêntricos é possível observar maturação diferenciada dos grãos, conforme o lado e direção de plantio. De fato, Custódio et al. (2014) verificaram ocorrência diferenciada em ferrugem e cercóspora em cafeeiro conforme a face de exposição das plantas.

Aspersão convencional e em malha

Existem diferentes tipos de sistema de aspersão quanto à disposição de seus componentes (tubos, conexões e aspersores), sendo eles: portátil, semi-fixo e fixo. Uma inovação que tem apresentado bons resultados na irrigação do cafeeiro é uma adaptação no sistema convencional de aspersão, designada aspersão em malha (os ramais são conectados em sua extremidade para aumentar a uniformidade da pressão na rede hidráulica).

Inicialmente utilizado para irrigação de pastagens na região do Vale do Rio Doce (MG), o sistema tem como características principais: a) a utilização de tubos de PVC de baixo diâmetro, que constituem as linhas laterais, que se ligam “em malha” e são enterradas;
b) baixo consumo de energia, de 0,6 a 1,10 CV/ha;
c) adaptação a qualquer formato de terreno;
d) possibilidade de divisão da área em várias subáreas;
e) facilidade de operação e manutenção;
f) possibilidade de fertirrigação;
g) baixo custo de instalação e manutenção.

Como limitações, este sistema apresenta:
a) dificuldade de automação;
b) maior dependência de mão de obra;
c) abertura de grande número de valetas para acondicionamento dos tubos em malha.

Autopropelido convencional

Consiste num aspersor tipo canhão montado em um veículo equipado com mecanismo autopropulsor que, por meio da movimentação hidráulica de um carretel, enrola um cabo de aço capaz de deslocar o sistema ao longo da faixa de solo a ser irrigada.

Carretel enrolador

Mais moderno que o anterior, irriga uma faixa de terra continuamente, pelo deslocamento de um canhão hidráulico montado sobre rodas, conectado na extremidade de uma mangueira.

Neste equipamento, apenas a mangueira é movimentada. Cabe destacar que a turbina existente para recolher a mangueira, requer pressão extra significativa da água para seu funcionamento (em geral mais de 30 mca).

Tubos perfurados a laser ou “tripa”

Trata-se de uma combinação de aspersão convencional com irrigação localizada, onde jatos de água oriundos de pequenos orifícios (menores que 1,0 mm e perfurados a laser na mangueira), irrigam as faixas de solo.

As “tripas” são colocadas próximas às saias dos cafeeiros (com apenas um orifício de saída) ou no meio da entrelinha (dois orifícios de saída).

Devido ao seu baixo custo de implantação, esse sistema tem sido largamente utilizado em algumas regiões do Brasil, como Araguari, no Triângulo Mineiro. O maior inconveniente desse sistema, apesar do baixo custo de implantação, é a manutenção, pois a grande maioria dos projetos é feita com “tripas móveis”, que requerem uma reposição anual da ordem de 30%.

Alguns cafeicultores, para reduzirem esses custos, optaram por sistemas fixos (mangueiras disponíveis em toda área irrigada), mesmo com o maior custo de implantação.

Gotejamento

O sistema de irrigação por gotejamento se desenvolveu em função da escassez de água. Este sistema aplica água em apenas parte da área, reduzindo assim a superfície do solo que fica molhada, exposta às perdas por evaporação. Com isto, a eficiência de aplicação é bem maior e o consumo de água menor. O gotejamento envolve vários componentes, conforme descrito a seguir.

Os principais componentes de um sistema de gotejamento são:

•          Emissores (gotejadores ou microsprayers);

•          Laterais (tubos de polietileno que suportam os emissores);

•          Ramais (tubulação em geral de PVC 35, 50, 75 ou 100 mm);

•          Filtragem (filtros separadores, tela, disco ou areia);

•          Automação (controladores, solenoides e válvulas);

•          Válvulas de segurança (controladora de bomba, ventosa, anti-vácuo);

•          Fertirrigação (reservatórios, injetores, agitadores);

•          Bombeamento (motor, bomba, transformador, etc.).

Os gotejadores podem ser do tipo “on line”, que compreendem os gotejadores que são acoplados à tubulação de polietileno após perfurar a mangueira. São utilizados apenas em áreas muito pequenas.

Os gotejadores “in line” são emissores que já vêm inseridos na tubulação de polietileno. Qualquer que seja o tipo, eles podem ser normais ou autoreguláveis (gotejadores cuja vazão varia muito pouco se a pressão variar).

O mercado já oferece também gotejadores anti-drenantes, que gotejam somente quando a pressão da água estiver acima de um determinado valor mínimo, por exemplo 8,0 mca (metros de coluna de água).

Esta característica é muito interessante, pois ao ligar o sistema as pressões se equilibram rapidamente, o que contribui muito para a uniformidade de aplicação de água.

Outro tipo de irrigação por gotejamento é o gotejamento subsuperficial, com linhas de emissores enterradas sem uma profundidade superior a 10 cm. Também existe um caso específico do gotejamento enterrado, designado gotejamento encoberto, em que o tubogotejador é instalado a uma profundidade inferior a 10 cm.

Para preservar o funcionamento do gotejador, é preciso considerar a injeção de algum herbicida para controlar a intrusão radicular. O herbicida mais comum é a Trifluralina (TFN), com mobilidade muito reduzida em função de sua alta adsorção às partículas de argila ou à matéria orgânica.

Detalhes importantes

O sistema de gotejamento efetua a irrigação sobre o solo, na área de maior absorção das raízes do cafeeiro, com gotejadores de pequena vazão (1,0 a 10 litros/hora); porém, capazes de irrigar com alta frequência (até mesmo várias vezes ao dia), mantendo a umidade do solo na zona radicular próxima à capacidade de campo, condição que facilita a absorção de água pelo cafeeiro.

A água é pressurizada pelo sistema de bombeamento, e antes que chegue aos gotejadores, passa por um sistema de filtragem, prática essencial para o bom funcionamento desse sistema.

Apresenta como principais vantagens: a) alta uniformidade de aplicação de água, de 90 a 95%; b) redução de gastos de água, energia e mão de obra; c) aplicação eficiente de defensivos e fertilizantes; d) possibilidade de automação total do sistema.

Como desvantagens, apresenta: a) alto custo de implantação; b) riscos de entupimento de emissores se mal manejados; c) concentração do sistema radicular em apenas parte do solo, onde se forma o “bulbo molhado” do gotejador; d) possíveis danos e avarias das linhas laterais por trabalhadores (enxadas) e animais (roedores).

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