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Nanocelulose de pinus e eucalipto: Novo espessante para fabricação de álcool em gel

A nanocelulose do tipo microfibrilada (conhecida como MFC) de pinus e de eucalipto pode atuar como espessante e emulsificante eficaz no preparo de álcool antisséptico e álcool em gel

Pesquisadores da Embrapa Florestas (PR) demonstraram que a nanocelulose do tipo microfibrilada (conhecida como MFC) de pinus e de eucalipto pode atuar como espessante e emulsificante eficaz no preparo de álcool antisséptico e álcool em gel, produtos utilizados na linha de frente dos cuidados para evitar a contaminação pelo coronavírus e com grande procura pelo mercado consumidor.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), com a pandemia do coronavírus, a demanda global por álcool em gel cresceu dez vezes em relação ao registrado em 2019. Isso resultou na falta do principal espessante usado na sua fabricação: o carbopol.

O problema levou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a flexibilizar as normas para a fabricação de álcool em gel e diversas instituições têm atuado na produção e disponibilização do produto.

Washington Magalhães, pesquisador da Embrapa Florestas, explica que o grupo da Tecnologia da Madeira da Embrapa Florestas trabalha com a produção e aplicação de nanocelulose há muito tempo, sempre focando nos três pilares da sustentabilidade: o social, ambiental e econômico. “Felizmente, quando o problema da falta de espessante surgiu, já tínhamos expertise suficiente para propor esta inovação. Foi algo natural para o grupo, mas respaldado em muitos anos de trabalho prévio. Uma das aplicações promissoras para a nanocelulose é relacionada à modificação de propriedades de gelificação de substâncias e facilidade de aspersão por spray”, relata.

A tecnologia

 O Laboratório da Tecnologia da Madeira da Embrapa Florestas tem trabalhado em diferentes formulações para elaboração do álcool 70% usando nanocelulose de pinus e de eucalipto como espessante, em substituição ao carbopol.

A celulose branqueada passa por um processo de desfibrilação mecânica, que resulta na suspensão aquosa de nanocelulose, que tem propriedades de um gel e é capaz de substituir o carbopol na emulsificação.

“Começamos com a polpa branqueada de pinus porque ela dá origem a uma suspensão de nanocelulose com maior viscosidade que a de eucalipto. Mas, logo em seguida testamos a polpa de eucalipto e adaptamos formulações”, conta Washington Magalhães. A formulação desenvolvida foi publicada em um comunicado técnico.

A MFC foi produzida com a colaboração da área de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa Klabin, que conta com uma planta-piloto de produção de MFC capaz de obter um grau de desfibrilação adequado à produção do álcool em gel. “Essa equipe está focada no desenvolvimento de novos produtos e processos”, conta Carlos Augusto Santos, gerente corporativo de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Klabin.

Entenda melhor

A madeira e qualquer outro vegetal é formado por três grupos principais de moléculas, que são chamadas de celulose (componente majoritário), lignina e hemicelulose. No Brasil, as fábricas de celulose têm uma das melhores tecnologias para a produção de celulose a partir de plantios florestais. “E os plantios que usamos são de pinus e eucalipto”, detalha o pesquisador da Embrapa.

“O Brasil é muito eficiente nesse plantio, e dominamos com maestria toda a silvicultura envolvida, assim como aproveitamos a melhor tecnologia industrial para o cozimento da madeira e remoção da celulose. O processo que usamos chama-se kraft, e é o que apresenta melhores resultados econômicos, temos no país um enorme investimento com muitas fábricas instaladas. Estamos entre os três maiores produtores mundiais de polpa de celulose e exportamos um bom volume”, esclarece Washington Magalhães.

Esta celulose é a principal matéria-prima para a fabricação do papel e papelão. Mas não apenas isso, a celulose também pode ser usada na produção de celofane, fios para produção de tecidos, tintas, etc. Uma das atividades que desenvolvidas pela equipe da Embrapa é aumentar o campo de aplicação de produtos florestais visando melhorar a lucratividade da área, de maneira sustentável.

O álcool em gel

O álcool em gel foi desenvolvido para ter uma evaporação mais lenta, quando espalhado em superfícies, e aumentar a segurança contra acidentes. A evaporação mais lenta significa que os microrganismos de uma superfície sejam inativados com maior eficiência – é preciso um tempo mínimo de contato do álcool com os patógenos que se quer evitar.

E se o álcool for gelificado, Washington Magalhães ressalta que também evitamos que em um acidente ele se espalhe em demasia, espalhando uma eventual chama de maneira descontrolada. “Ocorre que, durante períodos de epidemia, ou como agora, de pandemia, a procura por álcool em gel aumentou em proporção muito maior do que as indústrias poderiam fabricar, um fenômeno mundial, não apenas nacional”.

 O gelificante chamado de carbômero ou carbopol é o que a ANVISA já tinha autorização de uso atendendo a todos os requisitos exigidos – uma pena que este produto não seja ainda fabricado no Brasil e que seja de origem fóssil. Assim, com a falta do gelificante convencional, temos a oportunidade de desenvolver uma tecnologia sustentável, a celulose em substituição ao produto importado.

“Os primeiros produtos que fizemos, adicionamos a mesma quantidade de celulose que se empregava normalmente com o gelificante convencional, concentração em torno de 0,5% em peso no álcool 70% (o melhor usa o “grau”). Mas, estamos mudando a formulação, modificando a nanocelulose e propondo um aumento nessa concentração. É um desenvolvimento em andamento para melhorar ainda mais o que já atingimos”, acrescenta o pesquisador.

Produto usado por fiscais em postos de fronteira

Na primeira fase, 100 litros de álcool antisséptico 70% foram enviados à Vigilância Sanitária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), para uso especialmente em postos de fronteira do Paraná e de Santa Catarina.

“Nossa equipe já testou a formulação em relação à efetividade e estamos seguros da qualidade do produto, pois todos os ingredientes fazem parte do Formulário Nacional da Farmacopeia Brasileira”, esclarece Magalhães. O pesquisador ressalta que o álcool usado é o 92,8 GL, proveniente de fabricantes tradicionais, e que o trabalho consistiu em transformá-lo em gel antisséptico 70%.

Em paralelo, o trabalho continua com a definição de outras “formulações” para fabricação de álcool em gel, utilizando diferentes nanoceluloses. “A parceria com a Klabin vai ampliar nossa capacidade de produção e de distribuição neste momento de pandemia, além de fortalecer a contribuição técnica entre os times”, explica o cientista da Embrapa. “Ainda é feito em pequena escala, pois nossos laboratórios não estão preparados para grandes produções.”

Aperfeiçoamento coletivo na rede da Embrapa

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Para isso, a MFC será distribuída para outras unidades da Embrapa em todo o Brasil, com instruções para a preparação de álcool antisséptico em gel, de forma que cada uma delas possa manipular o produto e usá-lo no seu dia a dia. Uma vantagem é que esse repasse permitirá que outros laboratórios experimentem e sugiram aperfeiçoamentos de formulação.

Como se trata de uso experimental, neste momento os produtos terão distribuição dirigida e controlada, seguindo normas e protocolos de segurança. “Entendemos que a agilidade é imperativa neste momento, mas precisamos fazer com segurança”, pondera o cientista.

A nanocelulose utilizada na pesquisa provém de polpa de celulose branqueada, que também é matéria-prima na fabricação de papel, papelão ondulado e fraldas descartáveis, por exemplo. “Esse é mais um uso para a matéria-prima de plantios florestais”, declara Magalhães. “São produtos presentes no dia a dia, que a população em geral nem faz ideia que vêm de árvores plantadas com fins produtivos, de forma renovável e sustentável”.

A MFC

A MFC é um dos produtos que se pode obter, dependendo do processo usado de nanoestruturação da celulose. A celulose nanoestruturada pode ser obtida de diversas maneiras: por meio de processos químicos, como a hidrólise ácida controlada, que produz cristais de nanocelulose (CNC, “cellulose nanocrystals”); ou por processos mecânicos de desfibrilação da celulose.

Os processos mecânicos podem ser feitos após ou simultaneamente a tratamentos químicos, que originam a chamada celulose nanofibrilada (NFC, “nanofibrillated cellulose”). Também podem ser realizados sem uso de nenhum reagente, apenas água, que originam a celulose microfibrilada, também chamada de MFC (“microfibrillated cellulose”) e utilizada nesse processo desenvolvido pela Embrapa.

Material versátil para múltiplos usos

A nanocelulose tem potencial de uso em diversos setores: cosméticos, fármacos e alimentos, com a função de controlar a viscosidade e estabilizar a suspensão de óleos. Na área de alimentação é empregada em revestimentos comestíveis e embalagens. Existem canetas japonesas com tintas contendo NFC.

Pode-se fazer, ainda, membranas para curativos ou para ultra e nanofiltração; aditivos em cimentos, entre outros. A maior aplicação em volume, possivelmente, será no reforço em papelão e papel-cartão dentro das próprias indústrias de papel e celulose.

O segundo mercado consumidor da MFC, em volume, poderá ser o agronegócio, com o desenvolvimento de fertilizantes de liberação lenta e agroquímicos, como agente antideriva, e também no revestimento de frutas.


•          Principal espessante do mercado usado para o álcool, carbopol, está ficando escasso devido ao aumento da procura

•          Feito em parceria entre a Embrapa e a Klabin, novo espessante está sendo produzido em escala  de laboratório

•          Produto já é usado por fiscais do Ministério da Agricultura em postos de fronteira

•          Aperfeiçoamento se dará nas Unidades de pesquisa da Embrapa

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