Silvino Moreira
Doutor em Solos e Nutrição de Plantas e professor associado – Universidade Federal de Lavras (UFLA)
silvinomoreira@ufla.br
Quando ocorrem os veranicos, há uma falta temporária de água, que inicia na camada superficial do solo, ou seja, há uma redução da disponibilidade hídrica de cima para baixo. Desta forma, quanto mais profundo for o sistema radicular da planta, menos as plantas irão sofrer pela falta de chuva.
Assim, devemos corrigir uma camada cada vez mais profunda do “perfil do solo”, para permitir um enraizamento profundo pelas plantas, a fim de se tornarem mais resilientes aos problemas climáticas.
Deve ser lembrado que o impedimento ao crescimento das raízes em profundidade pode ser causado tanto pela falta de correção do solo (altos teores de Al tóxico ou baixos teores de cálcio, fósforo e boro, dentre outros nutrientes), como também por alguma limitação física do solo, como a compactação.
Limitação ao enraizamento
Fatores físicos, como a compactação ou adensamento do solo, fatores químicos, devido à falta de correção de solo, bem como problemas com nematoides que atacam o sistema radicular.
A correção do solo com calcário fornecerá cálcio e magnésio, neutralizará o alumínio tóxico e aumentará o pH do solo. Primeiramente, o fornecimento de Ca é fundamental para o crescimento das raízes, pois o elemento é diretamente envolvido com a formação das paredes celulares das células vegetais para a constituição dos tecidos novos, ou seja, dos órgãos de crescimento.
Além disso, com a neutralização do Al, reduz o impedimento químico para o crescimento das raízes. Quando se tem um sistema radicular bastante desenvolvido em profundidade, aumenta a capacidade das plantas de explorar um maior volume de solo e, consequentemente, de absorção de água e de nutrientes, principalmente daqueles mais móveis no solo, como nitrogênio, potássio e boro, que possam ter sido lixiviados.
Um outro objetivo da correção do solo é alcançar valores de pH em água por volta de 6,5. Nesta situação, há maior disponibilidade de todos os nutrientes. Assim, pode-se afirmar que a correção da acidez do solo melhora o aproveitamento dos nutrientes pelas plantas, bem como aumenta a eficiência das adubações.
Ainda um desafio
Quando se pensa em correção mais profunda por volta de 30 a 40 cm de profundidade, ao invés da atual camada de 0 a 20 cm, aumenta-se a quantidade de calcário por hectare, bem como os custos da incorporação.
No entanto, deve-se lembrar que a correção profunda de uma gleba não é realizada todas as safras, sendo normalmente recomendada para aberturas de áreas, quando se transforma, por exemplo, uma área de pastagens degradadas em cultivo de grãos.
Dicas importantes
Para uma boa distribuição de calcário e gesso, deve-se utilizar equipamentos bem regulados e com distribuição adequada. No caso do boro, há dificuldade de aplicação em função das baixas quantidades a serem aplicadas por hectare, comparado a outros corretivos.
Já sobre calcário e gesso, falamos em tonelada por hectare, e no caso do boro, em alguns quilos por hectare. Desta forma, para o boro, atualmente, há bons produtos no mercado em que o elemento vem como “acompanhante”, como o enxofre pastilhado com 0,5 a 1% de B; cloreto de potássio, com cerca de 0,5 % de B; além de adubos de semeadura com todos os micro e macronutrientes no mesmo grânulo.
O objetivo de todos eles é melhorar a qualidade da distribuição, dentre outras, as fontes em que o boro apresenta baixa solubilidade em água, como a ulexita, em que é possível se trabalhar com uma dose um pouco maior.
Além das correções químicas e físicas do solo, deve-se pensar na melhoria da saúde do solo, trabalhando para melhoria da biologia do perfil, quer seja com adoção de rotação de culturas ou com culturas de cobertura.
A natureza a favor do solo
Plantas como crotalárias spectabilis, crotalária ocroleuca, dentre outras, ainda são ferramentas pouco usadas pelos produtores para redução da população de nematoides e poderiam contribuir muito para que as plantas não perdessem suas capacidades de absorção de água e nutrientes.
Por outro lado, logo após as aberturas de áreas, a utilização de gramíneas, como braquiária e milheto, seria importante, devido às altas produtividades de massa seca e enraizamento profundo.
Tais plantas poderiam contribuir muito para dar um “choque de carbono”, após as correções químicas, e contribuir no longo prazo com o aumento de matéria orgânica, da capacidade de troca de cátions (CTC do solo), bem como para aumentar a retenção de água dos solos.
Alumínio tóxico
Em áreas com altos teores de alumínio trocável (Al3+), o elemento pode substituir o cálcio (Ca2+) na composição da parede celular, formando o pectato de alumínio ao invés do pectado de Ca.
Com isso, as raízes cessam o crescimento, engrossam, escurecem e morrem. Em situações mais drásticas, em que os teores de Al3+ são muito elevados, ocorre a morte das plantas.
O alumínio trocável (Al3+) também reduz a disponibilidade de fósforo e sua absorção pelas plantas, pois quando um adubo fosfatado solúvel (ex.: DAP, MAP, super fosfato simples, super fosfato triplo) é aplicado num solo com alta disponibilidade de Al3+, ocorre a formação de fosfato de alumínio.
Neste caso, trata-se de um precipitado em que a planta não consegue absorver mais o fósforo aplicado.
Manejo acertado
Fazendo uma análise de solo estratificada, o produtor poderia saber se há necessidade ou não de alguma interferência na área, a fim de evitar riscos. Por exemplo, se após um diagnóstico detalhado ele perceber que há acúmulo de nutrientes apenas na camada de 0 a 10 cm, com altos teores de Al nas camadas inferiores (10 a 20, 20 a 40 e 40 a 60 cm), o produtor teria certeza de que após a semeadura, o maior enraizamento das plantas iria ocorrer na camada superficial.
Haveria poucas raízes abaixo de 10 cm de profundidade no exemplo hipotético. Assim, se houvesse algum veranico, a sua lavoura estaria muito suscetível a grandes perdas de produtividade.
Desta forma, poderia discutir com seu técnico a necessidade de correção mais profunda com calcário, utilização de gesso, associação de gesso e calcário, dentre outras práticas, antes da semeadura.