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Relação do fosfito com as pulverizações agrícolas

Saiba os insights sobre o papel crucial do fósforo nas plantas e como os fosfitos podem beneficiar os cultivos

Crédito: Jacto

Roberta Camargos de Oliveira
Engenheira agrônoma, doutora em Fitotecnia e professora – IF Goiano
roberta.camargos@ifgoiano.edu.br

O fósforo (P) é um elemento requerido em grandes quantidades pelos seres vivos, sendo constituinte de até 0,2% do peso seco das plantas. O P participa do metabolismo e faz parte de moléculas importantes, como o material genético, importantes proteínas, enzimas e compostos ricos em energia (ATP e NADP).

O papel crucial deste macronutriente na proteção celular, defesa e ativação gênica destaca os rendimentos das lavouras refletidos pelo seu fornecimento, que são majoritariamente realizados na forma de fosfato (Pi), extraído de reservas não renováveis.

Reação no solo

O P é muito reativo, combinando com outros elementos, especialmente hidrogênio (H) e oxigênio (O), formando compostos com diferentes estados de oxidação. Na natureza, além do Pi como fonte de P, descobriu-se que a presença de outros elementos contendo P, como os fosfitos (Phi), traziam efeitos benéficos às plantas, podendo também ser uma fonte complementar de P, devido à liberação a longo prazo do P, sendo considerado supostamente uma fonte mais econômica de P para plantas.

A diferença entre o Pi e o Phi é um átomo a menos de O na molécula de fosfito. Embora muito similares (Figura 1), a ausência de um O implica em alterações importantes nas propriedades, em consequência, das ações e interações que as moléculas podem exercer.

Figura 1. Estruturas químicas tridimensionais de fosfato (Pi) e fosfito (Phi), formando estruturas tetraédricas. Adaptado de: Atividade bioestimulante do fosfito na horticultura, F.C. Gómez-Merino, L.I. Trejo-Téllez / Scientia Horticulturae 196 (2015) 82–90.

O processo

O Phi é armazenado nos vacúolos celulares das plantas, semelhante ao Pi, porém, só pode ser metabolizado como fonte de P após passar por processos de oxidação, processo que não ocorre naturalmente no interior das plantas, mas sim pela ação da vida microbiana presente nos solos.

Os Phi são geralmente mais solúveis e reagem menos com os componentes do solo. Cerca de 90% do P presente nos solos (Pi) está indisponível (associado a cátions ou formas orgânicas indisponíveis), o que faz com que as plantas invistam muita energia, formando radicelas e pelos radiculares, buscando aumentar a área de superfície de absorção das raízes, na tentativa de capturar o P.

Além disso, secretam enzimas para liberar Pi ligado organicamente a outros componentes e ativam genes ligados à expressão de proteínas de alta afinidade a Pi, o que sobrecarrega o metabolismo e gera desvios de ATP.

Dessa forma, estima-se que o Phi pode gerar grande economia aos cultivos, pela maior disponibilidade de P após ser transformado pela microbiota em fonte assimilável pelas plantas.

Absorção

Uma característica extremamente relevante dos Phi é serem absorvidos rapidamente após sua aplicação, com maior taxa de aproveitamento tanto pelas raízes quanto pelas folhas, participando ativamente na fisiologia vegetal.

Os Phi apresentam alto grau de mobilidade. A translocação no interior das plantas ocorre pelas proteínas presentes na membrana plasmática que transportam o Pi. A translocação ocorre nos vasos do xilema (seiva bruta) e vasos do floema (seiva elaborada).

A ação quelatizante (estabilizante) do Phi possibilita a absorção e translocação dos compostos entre os órgãos da planta, fornecendo as condições favoráveis ao ótimo funcionamento do metabolismo vegetal, tornando as plantas mais eficientes em produção.

O efeito quelante do Phi é favorável pelo melhor aproveitamento dos elementos e compostos que circulam na planta (fazem parte do metabolismo ou apresentam alguma função importante).

Os compostos se associam ao Phi e translocam de forma mais rápida do que se estivessem em suas formas iônicas e livres em solução, passíveis, inclusive, de sofrerem transformações, ao participarem de reações químicas, possivelmente perdendo-se da finalidade para o qual foi o objetivo da aplicação. Portanto, o Phi possibilita um papel protetor, evitando desperdício de insumos.

Relação com o metabolismo das plantas

Nas plantas, o Phi age na biossíntese de metabólitos secundários, no metabolismo energético (carbono), metabolismo de aminoácidos, carboidratos, lipídeos, cofatores enzimáticos e vitaminas, interferindo na regulação de uma ampla gama de substâncias importantes, num curto intervalo de tempo (0 a 96 horas) a depender da via metabólica que irá atuar.

Crédito: Biotrigo

Vias lipídicas são afetadas principalmente por volta de 24 e 48 h, coenzimas e vitaminas, ao redor de 6 h. Já interferências em expressão de hormônios vegetais e transdução de sinal ocorrem por volta de 96 h e ‘interação planta-patógeno’: 72 h.

O Phi pode atuar também no estresse abiótico gerado pelo ambiente de cultivo. Dentre eles, sabe-se do efeito positivo contra estresse gerado pelo calor, seca, salinidade e variações do pH do solo.

Pesquisas revelaram que o Phi ativa vias de sinalização que protegem as plantas contra o estresse oxidativo causado por UV-B, ajustando e ativando a produção dos componentes que agem diretamente na fotossíntese, garantindo a produção das características agronomicamente importantes (produção de grãos de qualidade) e melhoria na saúde vegetal, e consequentemente, saúde humana. 

Cuidados

Apesar de todas as ações benéficas do Phi acima levantadas, é importante destacar que a dose deve ser cuidadosamente recomendada e em associação com a nutrição adequada de P na forma de Pi.

Em caso de deficiência de P, a ação de Phi é negativa, promovendo um desbalanço/distúrbio no metabolismo, que pode gerar severa inibição do crescimento radicular, inclusive em níveis baixos de Phi.

As fontes mais comuns de fosfito no mercado estão associadas a outros elementos, sendo os mais amplamente encontrados o fosfito de potássio e o fosfito de alumínio. De acordo com a literatura, encontramos informações associadas à ação de fertilizante (fosfito), fungicida, fertilizante, estimulador de defesa da planta e fungicida sistêmico (fosfito de potássio) e fungicida (fosfito de alumínio) (Figura 2).

Figura 2. Estruturas químicas tridimensionais de fosfito; fosfito de potássio e fosfito de alumínio. Adaptado de: Fosfito: um novo fertilizante fosfatado para manejo de ervas daninhas e controle de patógenos. Achary et al. Plant Biotechnology Journal 15 (2017) 1493–1508.

Opções em fosfitos

Várias empresas brasileiras têm investido nos fosfitos e apresentam opções em seu portfólio. As linhas destes produtos estão voltadas para o uso além da nutrição vegetal, promovendo ativação de vias metabólicas que produzem compostos que agem no controle e prevenção de doenças, sendo os íons fosfito também capazes de atuar como agentes complexantes e, com isso, facilitar e acelerar a absorção de outros elementos e substâncias.

É relevante destacar que as diferenças entre os produtos se referem à composição geral e completa dos fertilizantes, em especial quanto à presença e concentração de componentes que garantam a estabilidade e pronta assimilação do produto, formulação balanceada, presença de antioxidantes e estabilizantes que gerem bom equilíbrio da solução.

As particularidades das formulações dos Phi interferem diretamente na interação com outros eventuais produtos que possam estar no tanque de pulverização e devem ser criteriosamente avaliados pelo profissional técnico responsável pela recomendação de aplicação.

De forma geral, é recomendado que se faça a aplicação em pulverizadores adequadamente regulados, para que se obtenha a correta cobertura uniforme das plantas; evitar aplicações em momentos do dia com condições climáticas desfavoráveis (vento, temperatura e umidade), de preferência com vazões superiores a 200 L ha-1, e armazenar o produto em local fresco, seco, ventilado, sem incidência de raios solares.

Os efeitos dos diferentes produtos disponíveis no mercado são controversos, o que pode ser entendido pela interação entre os Phi, a condição nutricional das plantas de trigo, as condições climáticas antes, durante e após a aplicação, bem como a interação com os outros aspectos de manejo aplicados na propriedade.

Agente fitossanitário

A pulverização foliar de Phi reduz a severidade de diversas doenças, em diversas culturas, tanto na horticultura quanto no setor de cereais e grandes culturas. Na literatura há registros de efeitos benéficos até mesmo em espécies nativas, com efeitos diretos e indiretos: podem provocar ruptura de hifas e inibir o crescimento micelial, apresentar ação de toxicidade promovida pela inibição de algumas reações do metabolismo de P (ex: fosforilação) em fungos, ação em enzimas específicas e síntese de compostos que agem sobre os microrganismos patogênicos (indução de defesa).

O oídio, causado por Erysiphe graminis, ferrugem da folha do trigo (Puccinia triticina), mancha marrom (Bipolaris sorokiniana), mancha amarela (Dreschlera triticirepentis) e brusone (Pyricularia grisea) ocorrem de forma frequente em regiões tritícolas.

Os danos decorrentes da incidência dessas doenças variam de acordo com o estádio fenológico das plantas, suscetibilidade da cultivar, virulência da raça fisiológica e das condições ambientais.

Os Phi podem ser associados com indutores de resistência, como o acibenzolarS-metil e com fungicidas, visando melhorias no controle das principais doenças do trigo e favorecer o desenvolvimento das plantas.

A aplicação isolada de Phi gerou menor uso e eficiência do N em plantas de trigo, independentemente do clima, o que resultou em diminuição acentuada no rendimento de grãos. Portanto, não se recomenda a substituição total de fungicidas por Phi, visando controle de doenças no trigo.

Santos et al (2011) observaram que a aplicação de diferentes fontes de fosfito de forma isolada não apresentou controle da ferrugem da folha, do oídio e das manchas amarela e marrom do trigo.

Entretanto, a aplicação de fungicida de forma isolada ou associada ao fosfito e indutor de resistência proporcionaram controle sobre essas doenças, inclusive, observou-se aumento de produtividade.

Crédito: Carmelo Beloni

De acordo com Paiva et al. (2018), trigo pulverizado com fungicida + fosfito apresentou eficiente controle da severidade da ferrugem da folha do trigo, com aumento de produtividade. Quando aplicado após o fungicida, o fosfito de potássio mantém o controle da severidade da ferrugem da folha e os níveis de produtividade, podendo substituir uma segunda aplicação de fungicida por uma aplicação de Phi.

Testados

É importante que os produtores, ao entenderem a gama de atribuições favoráveis relacionadas aos Phi, que façam o teste dos produtos disponíveis no mercado, nas condições de manejo de sua propriedade para observarem quais as melhores opções permitem alcançar resultados satisfatórios, identificando quais os Phi garantem o efeito bioestimulador, com sua devida melhoria do rendimento, qualidade dos grãos e resistência das plantas aos estresses abióticos que possam vir a ocorrer.

Algumas espécies de plantas são incapazes de utilizar Phi como fonte de P, tendo o Phi efeito de herbicida. Espécies como Brachiaria plantaginea e Amaranthus hybridus podem ser controladas pela aplicação do Phi, ao passo que outras plantas de ocorrência espontâneas têm retardo no crescimento, como Portulaca oleracea.

Plantas de Chloris barbata apresentaram branqueamento das folhas, sintomas de intoxicação semelhante a herbicida pós-emergente aplicado via foliar.

Efeitos herbistáticos também são relatados na literatura, além de inibir germinação de uma parcela de plantas espontâneas de ampla distribuição no território brasileiro, reconhecido como papel de herbicida pré-emergente.

A ação do Phi dependente da espécie ainda está sendo levantada pela ciência, o que se tem de informações nesse momento refere-se a mecanismos celulares e enzimáticos (especificidades) em que a presença de Phi prejudica as vias metabólicas, gerando inibição das plantas, sendo, portanto, tóxicos a essas espécies.

Potencial no manejo do trigo

Os Phi são produtos potenciais no manejo de trigo devido aos efeitos benéficos que as estruturas de Phi apresentam, otimizando a ação de componentes associados aos Phi devido ao melhor aproveitamento promovidos pela facilitação na absorção e translocação nos tecidos das plantas.

Somado aos efeitos nutricionais provenientes das reações do elemento P e sua assimilação e aos efeitos na ativação e interação com o metabolismo, desencadeando mudanças dinâmicas na expressão gênica e modulando os fluxos energéticos, que permitem as plantas melhor desempenho.

Além do aspecto técnico, vale levantar os ganhos ambientais do uso racional dos insumos e a economia proveniente da eficiência do manejo.

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