Autores
Maria Idaline Pessoa Cavalcanti
Engenheira agrônoma, mestra em Ciências Agrárias e Doutoranda em Ciência do Solo – Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
idalinepessoa@hotmail.com
José Celson Braga Fernandes
Engenheiro agrônomo, mestre em Ciências Agrárias, doutorando em Biocombustíveis – UFU/UFVJM e co-fundador da Agro+
celsonbraga@yahoo.com.br
Um dos maiores desafios do cultivo de cana-de-açúcar é aumentar a produtividade, com adoção de práticas adequadas, além do conhecimento do desenvolvimento da cultura se produzir mais açúcar e álcool, sem ampliar tanto as áreas ocupadas pela cultura.
A matéria orgânica é considerada um condicionador de solo, exercendo papel-chave em vários processos que ocorrem no solo, como formação da estrutura dos solos, atividade biológica e, ainda, tem uma relação direta com a qualidade do solo.
Entenda melhor
As substâncias húmicas resultam da decomposição da matéria orgânica que participa dos tratamentos nutricionais e ajudam a otimizar o manejo. Estão associadas à melhora da estrutura do solo devido ao aumento da CTC, o que propicia também a retenção de água e promove um melhor aproveitamento de nutrientes fixados.
A água no solo é extremamente importante para a vida e a produtividade dos cultivos. Portanto, a capacidade do solo em reter água é fundamental para o metabolismo das plantas, participando como reagente ou como meio para que ocorram todos os outros tipos de reações. É o veículo para absorção, transporte via xilema e redistribuição das substâncias orgânicas e minerais. Via floema participa da fotossíntese e responde pela manutenção da turgescência.
Os ácidos húmicos exercem um importante papel na estabilidade de agregados, entre outros importantes efeitos benéficos. Fisicamente, os compostos húmicos melhoram a estrutura do solo, criando espaço para reter oxigênio, armazenar água e melhorar a drenagem. Ainda, podem ter função cimentante das partículas do solo.
Na prática
Em solos argilosos com problemas de infiltração de água, a introdução dos ácidos húmicos pode provocar a união das argilas, formando agregados mais resistentes, o que aumenta a porosidade de solo e a capacidade de infiltração da água, bem como a oferta às plantas.
Os solos arenosos geralmente têm pouca capacidade de retenção de nutrientes e água, além de baixas populações microbianas. Uma aplicação de ácido húmico deve melhorar a eficiência de todos esses processos.
Quimicamente, os compostos húmicos são carregados negativamente e aumentam a capacidade de troca catiônica, ou seja, a capacidade do solo de reter quimicamente nutrientes e reduzir a lixiviação e revestir as partículas do solo em nutrientes carregados positivamente, como cálcio, potássio, magnésio, ferro e micronutrientes.
Como implantar a técnica
Os ácidos húmicos, maiores componentes da matéria orgânica e utilizados principalmente na produção de fertilizantes organominerais, podem ser extraídos de diferentes matérias-primas, como resíduos de animais, lodo de esgoto e deposições geológicas de origem orgânica como turfa. Isto é devido ao grande número de grupos funcionais contidos em suas moléculas e sua estabilidade química.
Diferentes agentes oxidantes podem ser utilizados, seguidos de extração alcalina para obtenção dos ácidos húmicos. Estes, por sua vez, podem variar muito em composição e funcionalidade de acordo com seu material de origem.
Os produtores vão encontrar formulações diversas, como: produtos sólidos, sólidos solúveis ou líquidos. Muitas vezes, na garantia do produto está expresso o carbono orgânico. Porém, é importante que se estejam incluídos os teores de ácidos húmicos e fúlvicos, pois as fontes de carbono orgânico são muito variáveis.
Orientações são fundamentais
A aplicação pode ser entre a aração e a gradagem (quando em área total), localizada (em sulco de plantio), em pulverização ou via fertirrigação, no plantio, e ainda na fase de desenvolvimento. Deve-se considerar e contar com pulverizadores e equipamentos com manutenção adequada, bicos, barras e tanques bem lavados, utilizar pulverizadores específicos para fertilizantes, dosagens adequadas, bem como contar com um bom treinamento do operador e acompanhamento de perto do técnico e/ou produtor.
É relevante ressaltar a importância de estudos prévios com relação à fonte de origem de onde serão extraídos os ácidos húmicos, a estrutura química a ser utilizada e testes preliminares com diferentes concentrações de resposta em plantas de cana, antes da aplicação a nível de campo e também avaliar as condições do solo para ter um melhor aproveitamento da técnica.
Solos com alto teor de argila dificultam respostas imediatas com a aplicação de ácidos húmicos. Entretanto, nutrientes básicos no manejo da nutrição, bem como o uso de fertilizantes nos sulcos, podem ser agregados ao sistema de produção.
Já em solos arenosos é necessário, num primeiro momento, construir a fertilidade de outra forma, além de eliminar a compactação e valorizar a melhoria dos atributos físicos e químicos e, assim, após esse manejo inserir a adubação com essas substâncias.
Produtividade
Tecnologia inovadora, associada a um manejo correto propicia melhoria da qualidade da aplicação, utilizando vazão adequada para fertilizantes, valores de pH de calda e oportunidade de mistura com outros produtos, especialmente na cana-planta.
Estudos mostram que a aplicação de ácidos húmicos pode ser eficiente no manejo da cultura da cana-de-açúcar, porém, deve-se considerar a variedade e a época de colheita. (Rosato; Bolonhezi; Ferreira, 2010) verificaram que 12% de ácido húmico e 3% de ácido fúlvico aplicados no sulco do plantio de cana, em região do cerrado, no mês de março, as respostas variaram de acordo com a variedade e a época de avaliação.
Foi observado incremento no acúmulo de sacarose para a variedade SP91-3011, quando avaliada em junho e julho, e maior teor de sólidos solúveis do caldo (°Brix) para a variedade RB72454, quando avaliada em agosto.
Avaliando duas épocas da cana-de-açúcar na variedade SP81-3250, confirmou-se que os organominerais (H e/ou R) praticamente não diferiram do tratamento contendo torta de filtro (tratamento referência no acúmulo de matéria seca na parte na parte aérea e sistema radicular). Assim, esses produtos indicam uma melhoria do vigor no desenvolvimento da cana-planta na fase inicial. (Souza, C. A. et al. 2016).
Em dois trabalhos realizados com a cultura da cana-de-açúcar, utilizando condicionador de solo na concentração de 300 litros por hectare e mais 1.600 kg ha-1 de adubação mineral (2,5-10-10), houve um incremento significativo na produtividade da cana-planta em relação ao tratamento com uso apenas do adubo mineral.
Ainda, quando se usou em “cana de inverno”, observou-se que as parcelas com o condicionador de solo apresentaram maior curva de crescimento de massa verde em relação às outras parcelas sem este insumo (Beauclair et al., 2010).
Na variedade RB867515, em Alagoas, constatou-se que a aplicação de substâncias húmicas aumentou a produção industrializada de caule e açúcares recuperáveis em cerca de 30%, durante o ciclo da cana-planta (Oliveira, et al, 2018).
Erros
Alguns erros na utilização de materiais húmicos são frequentemente cometidos e podem ser evitados, tais como: evitar doses indesejáveis do material húmico, pois o efeito biológico deles é a dose dependente; evitar valores de pH fora da faixa ótima para o crescimento e desenvolvimento das culturas antes da aplicação; evitar a utilização de ácidos húmicos de origem desconhecida sem saber a composição química dos mesmos; não utilizar ácidos húmicos insolúveis em água,
Viabilidade
Com relação ao custo-benefício, de forma geral os benefícios são superiores. De certo que a utilização dos ácidos húmicos não só beneficia o crescimento e desenvolvimento vegetal, mas também melhora as qualidades biológicas, físicas e químicas do solo.
No entanto, existem poucos resultados de pesquisa que podem dar este indicador, sem considerar outros parâmetros do sistema de produção, tais como idade da planta, solo livre de compactação, manejo correto de plantas daninhas e áreas livres de pragas.
O custo dos ácidos húmicos vai depender do tamanho da área e também da dose de ácidos húmicos que será utilizada. De maneira geral, o rendimento de extração dos ácidos húmicos é baixo (dependendo da fonte de matéria orgânica), mas estão disponíveis frascos de ácidos húmicos no estado sólido (50 gramas, por exemplo) que variam de R$ 200,00 a R$ 1.200,00, dependendo do quão purificado é o material.
Porém, técnicas novas de extração e obtenção dos ácidos húmicos vêm sendo testadas atualmente a fim de minimizar os custos para o produtor.