Diouneia Lisiane Berlitz – Bióloga, doutora e sócia administrativa da DLB Soluções Biológicas – dberlitz@hotmail.com
Os fitonematoides se destacam pela sua importância econômica, principalmente em culturas como a soja, o milho e o feijão. As principais espécies-praga são distribuídas em quatro gêneros, que são Heterodera, Meloidogyne, Pratylenchus e Globodera (Davis e Curty, 2011; Moens e Perry, 2009) que acometem várias culturas agrícolas.
Diferentes autores descrevem o ciclo de vida dos fiotonematoides, onde a identificação das plantas hospedeiras ocorre por meio de fatores químicos, que dependem da temperatura e umidade. Os juvenis de segundo estágio (J2) que estão no solo penetram nas raízes das plantas através da região do alongamento da raiz, migrando e atingindo o cilindro vascular onde ocorre a alimentação.
Rosso et al. (1999) indicam que as secreções do estilete dos nematoides, produzidas pelas glândulas esofágicas, são fatores cruciais para a penetração, migração e formação dos sítios de alimentação. Além disso, enzimas secretoras, como pectinases e celulases, estão envolvidas no amolecimento da parede celular da raiz, facilitando a penetração e a migração dos nematoides (Rosso et al., 1999; Doyle e Lambert, 2002).
Esses nematoides fitoparasitas causam perdas que variam de imperceptíveis até a morte de um grande número de plantas, chegando a inviabilizar áreas para o plantio. Em termos financeiros, os danos causados por essa praga ascenderam a US$ 125 bilhões, no mundo (Koenning et al, 1999; Oka et al, 2000).
Hospedeiros
Os nematoides têm uma grande gama de hospedeiros, sendo de difícil controle, já que sobrevivem durante longos períodos no solo ou em restos culturais, os quais podem ser facilmente disseminados por implementos agrícolas, água (irrigação, enxurradas), animais (aderidos às patas e fezes) e material vegetal (mudas e sementes).
O gênero Pratylenchus, ou nematoides da lesão radicular, são migradores, ou seja, visitam diferentes plantas no seu ciclo de vida. Esse gênero se distribui em ambientes frios, tropicais e temperados e compreende 68 espécies distintas, sendo a principal delas o P. brachyurus (Moes e Perry, 2009).
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No caso de espécies sedentárias, o gênero Meloidogyne, conhecido como nematoide-das-galhas, ataca especialmente leguminosas e frutíferas, preferindo áreas de clima tropical e subtropical (Collange et al., 2011), podendo citar duas espécies principais: M. incognita e M. javanica.
Apesar disso, atualmente há mais de 80 espécies reconhecidas (Karssen e Hoenselaar, 1998), embora a maioria dessas espécies estejam associadas a plantas específicas e tenham sido pouco estudadas, em parte devido à sua importância agrícola limitada (Bird et al., 2009).
Já o nematoide do cisto dos gêneros Heterodera e Globodera spp. é a praga de maior importância econômica (Davis e Curtis, 2011). Esses nematoides têm uma pequena variedade de hospedeiros e os traços característicos permitem considerá-los como parasitas evolutivamente avançados (Dyacov e Zinovyeva, 2007).
Danos
Os nematoides das galhas formam galhas que bloqueiam o fluxo de água e nutrientes, atordoando o crescimento, prejudicando a produção de frutos, amarelando a folhagem e murchando e danificando o tecido das plantas (Guerena, 2006).
A fêmea de Meloidogyne põe até 2.500 ovos, chamados de massa de ovos, de onde eclodem as larvas e, após, os adultos. Cada idade adulta é caracterizada por fases de desenvolvimento dos sistemas sexual e digestivo (Dyacov e Zinovyeva, 2007).
O gênero Heterodera confere às plantas uma aparência pouco cultivada ou desnutrida. A folhagem pode murchar e enrolar, enquanto as raízes se tornam grossas e duras e adquirem uma coloração vermelha ou marrom (Guerena, 2006). As fêmeas produzem cerca de 500 ovos e o ciclo de vida ocorre em torno de três a quatro semanas.
Pratylenchus se caracteriza pelo seu hábito migrador, visitando e se alimentando de diferentes raízes durante a fase juvenil. Os ovos são depositados no solo, em diferentes locais, onde a fêmea produz cerca de 150 ovos durante o ciclo de vida. Esse hábito alimentar causa graves lesões ou ferimentos nas raízes das plantas, local onde podem penetrar outros parasitas, como os fungos de solo, por exemplo (Ferrari et al., 2015).
Medidas de controle
O sucesso no controle de fitonematoides está associado à correta identificação desses fitoparasitas em campo e a mensuração estimada de sua população. Os danos causados pelas diferentes espécies possuem similaridade com aqueles causados por fungos fitopatogênicos ou, na maioria das vezes, por deficiências de macro e micronutrientes no solo, o que caracteriza as manchas ou reboleiras de plantas deficientes.
Por esse motivo, os nematoides eram considerados pragas silenciosas, pois somente eram detectados após os danos atingirem níveis irreversíveis.
Com os avanços tecnológicos e o conhecimento científico, hoje se torna mais acessível a identificação, devendo ressaltar a importância na busca de profissionais qualificados e laboratórios certificados para essa finalidade.
No caso de controle, a maioria das sementes podem vir tratadas com nematicidas químicos. Mas, hoje, estão disponíveis vários produtos biológicos à base de fungos e bactérias que são importantes aliados a esse controle. Exemplos são fungos como Pochonia chlamydosporia, Purpuriocilium lilacinum, Trichoderma spp. e bactérias como Bacillus subtilis, B. amyloliquefaciens e B. licheniformis.
Esses microrganismos podem atuar de maneira preventiva por meio da colonização do solo, o que também infere na melhoria das qualidades físicas, químicas e biológicas desse ambiente. Ou seja, ao longo do tempo o produtor agrega em melhorias à produção.
Portanto, podem-se citar diferentes medidas de controle: (I) controle biológico por meio de microrganismos; (II) tratamento de sementes; (III) pulverização a campo; (IV) rotação de culturas (ocorre geralmente com cultivares de Crotalaria sp.); (V) e utilização de cultivares resistentes. Cabe salientar que a utilização de um ou mais métodos de controle torna-se eficiente a longo prazo, especialmente quando incluído o controle biológico.
Soja resistente
Diferentes pesquisas buscam selecionar cultivares de soja com maior resistência ao ataque de fitonematoides e outras doenças, uma vez que seria a alternativa mais eficaz e econômica, além de reduzir o impacto ambiental devido à minimização na utilização de insumos.
Apesar disso, os ensaios de resistência geralmente são realizados com um alvo específico, sendo difícil encontrar uma cultivar com multirresistência, uma vez que precisam ser avaliados diferentes fatores, como: (i) a espécie de nematoide e/ou raça; (II) o ciclo da cultivar; (III) diferentes anos agrícolas devido aos fatores bióticos e abióticos, dentre outros.
Um exemplo é o lançamento pela Embrapa, em parceria com a Fundação Cerrados e a Fundação Bahia, de duas cultivares de soja de alto potencial produtivo e com resistência a nematoides-das-galhas (BRS 7481) e ao nematoide do cisto (BRS 7581RR).
As cultivares têm ciclo precoce e são adaptadas a regiões produtoras do Brasil Central. A cultivar BRS 7581RR apresentou produção acima de 70 sc/ha com a população de plantas recomendada de 220 mil a 260 mil plantas/ha.
A cultivar é indicada para as regiões de GO, MS, MG, MT. Já a cultivar BRS 7481 apresenta resistência aos dois nematoides de galhas (M. incognita e M. javanica). A produtividade alcançou 80 sc/ha, sendo indicada para as regiões de GO, MS, DF e MT.
É importante ressaltar que, ao longo da evolução, esses fitoparasitas desenvolveram mecanismos avançados de colonização das plantas hospedeiras. O sucesso evolutivo dos fitonematoides pode estar relacionado à necessidade de sobrevivência durante longos períodos na ausência de hospedeiro, resultando em adaptações comportamentais e fisiológicas de grande importância.