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Daniel Cassetari Neto
Engenheiro agrônomo, doutor em Fitopatologia e professor da Universidade Federal de Mato Grosso ” UFMT/FAMEV
As culturas da soja e milho estão sujeitas ao ataque de um grande número de patógenos que podem causar prejuízos tanto ao rendimento quanto à qualidade das sementes produzidas. Entretanto, é possível realizar o controle econômico das doenças pela utilização das tecnologias geradas pelas instituições de pesquisa brasileiras, mesmo estando a cultura sob condições climáticas adversas ao seu bom desenvolvimento e, portanto, favoráveis ao ataque das doenças.
Assim sendo, o sucesso no controle dessas enfermidades vai depender das práticas adotadas pelo produtor, a quem cabe, juntamente com a assistência técnica, a tomada de decisões no momento oportuno.
Manejo integrado
No manejo integrado das doenças da soja e milho não se recomendam métodos isolados de controle. Visando obter uma lavoura sadia e, consequentemente, a produção de sementes e grãos de alta qualidade e livres de patógenos, é preciso investir em: adubação equilibrada, uso de cultivares resistentes às doenças, rotação de culturas, aplicação de fungicidas para o controle de doenças de parte aérea e o tratamento de sementes com fungicidas para o controle de fungos das sementes e, em algumas situações, do solo.
Numa visão mais atual, o tratamento de sementes com defensivos visa reduzir ou erradicar a população de patógenos (especialmente fungos e nematoides) associados às sementes ou presentes no solo. Portanto, devem ser considerados fungicidas e inseticidas como promotores de qualidade fitossanitária.
As sementes na transmissão de patógenos
A maioria das doenças de importância econômica que ocorre nas culturas da soja e milho é causada por patógenos que podem ser transmitidos ou transportados pelas sementes. Isso implica na introdução de doenças em áreas novas ou mesmo a reintrodução em áreas cultivadas nas quais a doença já havia sido controlada pela adoção de práticas eficientes de manejo, como, por exemplo, a rotação de culturas.
Por meio das sementes, esses microrganismos sobrevivem por anos e se disseminam pela lavoura, como focos primários de doenças.
Patógenos-alvos do TS em soja
Um grande número de microrganismos fitopatogênicos pode ser transmitido pelas sementes de soja, sendo o grupo dos fungos o mais numeroso. A ocorrência de fungos em sementes de soja tem sido relatada em diversos países onde a cultura é explorada.
Até 1981 já haviam sido encontradas 35 espécies de fungos transmitidos pelas sementes, sendo que os de maior importância no Brasil são:
ð Phomopsis sojae: este fungo frequentemente reduz a qualidade das sementes de soja, especialmente quando ocorrem períodos chuvosos associados a altas temperaturas, durante a fase de maturação. Este patógeno está frequentemente associado às sementes que sofreram atraso na colheita, principalmente devido à ocorrência de chuvas. Phomopsis spp. é o principal agente causador da baixa germinação de sementes de soja, no teste padrão de germinação no laboratório, à temperatura de 25ºC.
ð Colletotrichum truncatum: é o causador da antracnose, que tem nas sementes o mais eficiente veículo de disseminação. É comum o aparecimento de sintomas nos cotilédones, caracterizado pela necrose dos mesmos, logo após a germinação. Esse fungo pode causar a deterioração das sementes, morte de plântulas e infecção sistêmica em plantas adultas.
ð Cercospora kikuchii: o sintoma mais evidente do ataque deste fungo é observado nas sementes, que ficam com manchas tÃpicas de coloração roxa. Porém, vale ressaltar que nem todas as sementes com este tipo de sintoma apresentam o fungo. Por outro lado, sementes aparentemente sadias (sem a presença da mancha púrpura no tegumento) podem estar contaminadas com este patógeno. Assim, só pelo Teste de Sanidade de Sementes é que se pode ter a certeza da presença ou não desse patógeno nas sementes. Trabalhos têm demonstrado não haver qualquer efeito negativo desse fungo na qualidade da semente.
ð Fusarium semitectum: dentre as espécies de Fusarium, a mais frequentemente encontrada (98% ou mais) em sementes de soja é o F. semitectum, considerada patogênica por afetar a germinação em laboratório. De maneira semelhante à Phomopsis spp., o fungo F. semitectum está frequentemente associado a sementes que sofreram atraso na colheita ou deterioração no campo.
ð Sclerotinia sclerotiorum: causador da podridão branca da haste e da vagem, este patógeno tem nas sementes a sua principal fonte de inóculo primário da doença. A transmissão por semente pode ocorrer tanto pelo micélio dormente (interno) quanto por escleródios misturados às sementes. O fungo, devido à formação de estruturas de resistência (escleródios), é de difícil erradicação após introduzido numa área. Este patógeno produz apotécios sobre seus próprios escleródios, que são as estruturas de sobrevivência.
ð Aspergillus e Penicillium spp.: diversas espécies de Aspergillus e Penicillium ocorrem em sementes de soja. Tem sido observado que, em sementes colhidas com teores elevados de umidade, um retardamento do início da secagem por alguns dias é suficiente para reduzir sua qualidade, devido à ação desses fungos. Quando encontrado em alta incidência, pode reduzir o poder germinativo das sementes. A emergência de plântulas no campo inviabiliza grãos infectados para consumo humano e animal pela produção de micotoxinas.