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Algodão sustentável no Cerrado recorda importância da reforma agrária

Crédito FMC

Durante a pandemia de Covid-19, enquanto milhares de brasileiros entraram para a linha da extrema pobreza e para a zona de insegurança alimentar, 46 famílias da região de Cerrado do noroeste de Minas Gerais celebraram fartura em seus quintais produtivos. A experiência, resultado do Projeto Algodão Sustentável, realizado pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) em parceria com a Copabase e Central Veredas, é inspiração para comunidades de agricultores familiares do Brasil. Os resultados, divulgados em um mini-documentário neste mês, celebram o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária, marcado em 17 de abril. O vídeo está disponível no canal de YouTube do ISPN.

Dezoito comunidades de oito municípios localizados no Cerrado do noroeste de Minas Gerais, ao redor da cidade de Arinos, são protagonistas do mini-documentário. Foram 46 famílias de agricultores familiares beneficiadas pelo projeto, apoiado pelo Fundo de Promoção de Paisagens Produtivas Ecossociais (PPP-ECOS), com financiamento da Laudes Foundation. Com o recurso financeiro e o suporte técnico do ISPN, as comunidades superaram a marca de cinco toneladas de algodão sustentável produzidas na safra de 2021, e comemoraram também a fartura dos consórcios alimentares, que garantiram prato cheio e rico em nutrientes, sem agrotóxicos.

De acordo com o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Brasil, mais de 116 milhões de pessoas se encontravam em situação de insegurança alimentar no ano de 2021, o que representa 55% da população brasileira. Dessas, quase vinte milhões se encontravam em situação de insegurança alimentar grave, ou seja, passavam fome, conforme explica Jessica Pedreira, engenheira florestal, facilitadora e assessora técnica do ISPN. “Esses índices se acentuam ainda mais quando olhamos para as regiões Norte e Nordeste do país, ou ainda para as populações rurais, como agricultores familiares, quilombolas, indígenas e ribeirinhos, que historicamente ocupam posição de situação de pobreza por exclusão do poder público”, destaca.

Além desse grave cenário, parte da alimentação da população brasileira é composta por produtos processados e ultraprocessados que, de acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira, contribui para aumentar a incidência de doenças crônicas não transmissíveis como diabetes e hipertensão, piorando a saúde dos brasileiros. “O consumo desse tipo de produto supera o de produtos mais saudáveis pelo fato dos primeiros terem um valor mais acessível e estarem mais disponíveis”, comenta Pedreira.

A agricultora Andreia Frota, uma das beneficiadas pelo projeto, mostra a felicidade que é ter uma boa colheita de algodão, com fartura e diversidade no quintal. “Só da gente se alimentar sem agrotóxicos, isso já é uma bênção. Na agricultura familiar, tendo assistência, a gente consegue produzir. Nossa terra é a nossa empresa”, compartilha. Nascido na fazenda e contemplado com políticas de reforma agrária, o agricultor Gaspar Gonçalves também comemora o sucesso do projeto, vislumbrando um futuro melhor para a população do campo. “Lembro quando entrei pela primeira vez na minha terra. Foi 22 setembro de 2001 a primeira noite que dormi na minha terra, onde resido até hoje e não pretendo sair”, conta. As comunidades relatam que, no mercado, compram apenas arroz e açúcar. A diversidade da alimentação vem majoritariamente dos próprios quintais.

A produção de algodão ainda fortaleceu a tradição cultural da tecelagem e da cantoria das fiandeiras, um costume que era mantido com a busca do algodão sem agrotóxico em outras regiões já que o produto com veneno intoxica e adoece as tecelãs. Haroldo Mendes, agricultor do projeto, celebra esse resgate. “Há 40 anos, minha mãe tinha uma roda de fiar, mas passou um período que não tínhamos mais isso. Agora, com o algodão sustentável, pode aparecer novamente”, comenta com esperança.

A fiandeira Diva Maria conta que aprendeu a tecer com sua mãe e que deseja que sua filha também possa continuar com a tradição, construindo um futuro bom através dessa arte centenária. A filha, Karianny Gonçalves, é estudiosa, sabe da importância da escolarização, por isso não reclama de ir e voltar da cidade todos os dias. “Não tenho vontade de morar na cidade, aquilo não é vida. Daqui a 15 anos, me vejo formada em veterinária, atendendo todo mundo que me viu nascer e crescer aqui”, compartilha seu sonho.

Para o ISPN, são os povos, comunidades tradicionais e agricultores familiares os verdadeiros protetores do meio ambiente. “O modo de vida dos agricultores familiares são inspiração para o aprendizado sobre como ter um desenvolvimento justo e sustentável”, explica Pedreira. “Como diz aquele ditado, se o campo não planta, a cidade não janta. A experiência do projeto do Algodão Sustentável é um caldeirão de sucesso de produção agroecológica, segurança alimentar, resgate cultural e recordação da importância das políticas de reforma agrária. Estamos falando de fortalecimento das comunidades, para que possam dialogar com o poder público”, finaliza.

Para assistir ao mini-documentário sobre o projeto, além dos quatro vídeos tutoriais para agricultores familiares, sobre orientações de plantio, acesse o canal de YouTube do ISPN.

Sobre ISPN

O ISPN é uma organização da sociedade civil sem fins econômicos com sede em Brasília e um escritório em Santa Inês (MA), que há 31 anos atua pelo desenvolvimento com equidade social e equilíbrio ambiental, por meio do fortalecimento de meios de vida sustentáveis e mitigação às mudanças do clima. Sua principal estratégia é o Fundo PPP-ECOS, um fundo independente gerido pelo ISPN, que capta e destina recursos a projetos de organizações comunitárias de povos, comunidades tradicionais e agricultores familiares que atuam pela conservação ambiental. O Instituto atua nos biomas Amazônia, Cerrado e Caatinga, em diálogo com as comunidades locais.

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