Autores
Gleison Augusto dos Santos
Doutor e professor – Universidade Federal de Viçosa (UFV)
Juliana Brunetta
Engenheira florestal, doutora e pesquisadora – Renabio
Laercio Couto
Engenheiro florestal, PhD e professor – University of Toronto
lcouto@sbag.org.br
O plantio de espécies florestais no sistema adensado para a produção de biomassa para energia em curta rotação teve sua origem principalmente na Inglaterra, com a utilização de poplar e willow, estendendo-se posteriormente para outros países europeus e depois para os Estados Unidos e Canadá.
A partir de 2010 houve uma demanda muito grande por inovações na produção de biomassa de eucalipto para cogeração de eletricidade no Brasil em face do apoio do MME e da política governamental na época de expandir a produção descentralizada de eletricidade no País por meio de usinas termoelétricas à base de biomassa florestal.
Empresas como a Energias Renováveis do Brasil (ERB), GMR, Ramires Reflorestamento, Energia Florestal S.A. (EFSA), Senergen, Suzano Energias Renováveis, Grupo Bertin e outras, iniciaram pesquisas e trabalhos, e mesmo a implantação de projetos pilotos com o plantio deste tipo de florestas.
Coube à URP de Avaré o primeiro plantio piloto, com três clones no espaçamento de 3,0 m x 0,5 m, cuja madeira foi colhida e exaustivamente estudada pela Duratex aos 2,5 anos de idade, com um crescimento de 80 m3 por hectare por ano.
Foco
Os resultados atraíram a atenção do Grupo Bertin, que instalou em Lins (SP), a maior área experimental do País, com vários clones de eucaliptos plantados nos mais diversos espaçamentos adensados.
Por vários anos a área foi frequentemente visitada por pesquisadores e empresários de vários países do mundo, como Estados Unidos, Espanha, China, Austrália, Uruguai, Suécia, Alemanha e Canadá, bem como por várias empresas florestais do Brasil, como Duratex, Suzano, Fibria e de produção de equipamentos florestais como Caterpillar, John Deere, Komatsu e New Holland, todas interessadas em conhecer pessoalmente o comportamento de plantios adensados de eucaliptos clonais para produção de biomassa para energia em curta rotação.
Em Camaçari a ERB plantou uma área de eucaliptos clonais adensados e uma área com o plantio tradicional e construiu a UTE Aratinga, que atua até o presente momento à base de cavacos de eucaliptos.
A Suzano Energias Renováveis tinha um grande projeto no Maranhão com o objetivo de produzir pellets de eucaliptos para exportação para a Europa, principalmente para a DRAX, na Inglaterra. No entanto, os países produtores de pellets na Europa instituíram as normas DIN e os pellets de eucaliptos não conseguiram atender os requisitos de teores mínimos de cloro, inviabilizando, portanto, toda e qualquer exportação desse tipo de pellet para países europeus, colocando um ponto final nos projetos que estavam em andamento no Brasil.
Existem, no momento, estudos científicos que parecem ter solucionado esse problema, mas ainda não estão sendo utilizados em escala comercial.
A colheita da biomassa
Na Inglaterra, a Coppice Resources Ltd desenvolveu uma colheitadeira adaptando um cabeçote próprio a um trator agrícola CLAAS, que aparentemente funcionou bem para poplar e willow.
Esse conceito foi adotado pela New Holland, que nos Estados Unidos desenvolveu uma colheitadeira específica para os plantios adensados, principalmente de willow, e testada nos plantios e experimentos da Sunny, em Syracuse, no Estado de New York.
Em uma visita técnica acompanhado pelo atual presidente da Duratex, engenheiro florestal Antonio Joaquim de Oliveira, egresso do DEF-UFV, em evento promovido pelo Short Rotation Group na NNY, o presidente da Renabio, naquela época, sugeriu ao diretor da New Holland, John Posselius, testar a colheitadeira em plantios adensados de eucaliptos clonais no Brasil.
A empresa Siltomac, uma das representantes comerciais da New Holland no Brasil, foi encarregada de conduzir os testes e para tal convidou algumas empresas nacionais, como Suzano, Duratex e outras, para realizar o teste do equipamento no campo.
Na época, o presidente da Renabio, em face dos seus contatos e de ter atuado como consultor florestal do Grupo Bertin, conseguiu a autorização para que os testes fossem realizados na sua área experimental de 120 hectares em Lins.
Na ocasião do teste, estava presente o engenheiro australiano Richard Sulman, da BioSystems Engineering, que desenvolveu naquele país a colheitadeira Bionic Beaver para tal tipo de plantio florestal.
Resultados
Conforme já era esperado pelo referido engenheiro, a colheitadeira testada não atendeu os pré-requisitos de realizar um corte adequado na base das árvores de eucaliptos clonais, que proporcionasse a brotação dos tocos na porcentagem desejada.
Logicamente, foi apenas um teste inicial e os engenheiros e projetistas da New Holland, sem dúvida, poderão resolver esse problema. No entanto, nada mais se ouviu da empresa ou de sua representante no Brasil sobre o desenvolvimento de uma colheitadeira específica para plantios adensados de eucaliptos clonais para produção de biomassa para energia em curta rotação.
Uma vez definidos os diferentes parâmetros, tais como espaçamento, clones, adubação e tratos culturais, faltava apenas resolver o sistema da colheita florestal do plantio adensado para bioenergia.
A solução apareceu quando a Renabio e a Tecflora foram contatadas por um representante do engenheiro Richard Sulman e da BioSystems Engineering da Austrália, que apresentou a Bionic Beaver, uma colheitadeira florestal baseada no conceito de colheita da cana-de-açúcar. O primeiro protótipo da Bionic Beaver foi construído na Austrália e lá testado em plantações de eucalipto, com grande sucesso.
Em testes
Por um longo período de tempo, tentou-se estimular as grandes empresas do setor, como Caterpillar, John Deere, Komatsu e New Holland a se interessarem pela Bionic Beaver e produzi-la no Brasil.
Uma outra ideia seria por meio da SIF, em parceria como alguma empresa florestal de grande porte, ou de máquinas e equipamentos florestais, trazer com o apoio do MICTIC a Bionic Beaver, que estava na Austrália, para testes no Brasil. Infelizmente esta tentativa coincidiu com um período de recessão no país e também numa diminuição dos projetos de produção de eletricidade a partir de biomassa florestal.
Desta maneira, esse projeto envolvendo a Bionic Beaver encontra-se em estado de hibernação, esperando um momento mais propicio para ser reativado e implementado no Brasil. Enquanto isso, os plantios adensados estabelecidos no Brasil podem ser colhidos, utilizando-se métodos convencionais que logicamente não tem o mesmo rendimento e eficácia de uma Bionic Beaver.
No sentido de inovar na área de colheita de plantios adensados de eucaliptos clonais no Brasil, estão unidos em um esforço comum, o DEF-UFV, a SIF, a Renabio, a Tecflora, a WBA e a U of T, no Brasil liderados pelo presidente da Renabio e o diretor científico da SIF e da Renabio.
Pesquisa e desenvolvimento
O atual diretor científico da SIF e da RENABIO, Gleison dos Santos, tem dedicado parte do seu tempo como Professor da área de Genetica e Melhoramento Florestal no DEF-UFV, a desenvolver uma série de pesquisas na área de clones de eucaliptos para produção de energia e de resistência a seca e a geadas.
Além disso, ele tem realizado trabalhos em nível internacional, levando para vários países, os seus conhecimentos técnicos, bem como material genético de eucaliptos para essa finalidade.
Dentre os muitos trabalhos realizados e em andamento estão o desenvolvimento e análises de diferentes materiais genéticos e em variadas condições para florestas adensadas para produção de energia na Espanha, Itália, França e Colômbia.
Os resultados iniciais são promissores e direcionam ser possível o plantio de florestas adensadas nesses países, com produtividade superior a 50 toneladas de biomassa/hectare/ano.
Outro ponto que a UFV tem evoluído sobremaneira nesses países é na redução do teor de cloro (Cl) na biomassa. O teor dos elementos minerais na biomassa vegetal varia, principalmente, em função da necessidade da planta, disponibilidades no solo e entre espécies/clones.
Os minerais são encontrados em vários órgãos e tecidos dos vegetais. O acúmulo de alguns componentes minerais no processamento industrial da biomassa desencadeia uma série de problemas na indústria, como entupimentos, corrosões e incrustações. Tais infortúnios podem provocar a redução da vida útil dos materiais e interferir na produtividade industrial, levando ao aumento de custos do processo de produção.
Alerta
O cloro é um dos principais minerais que promove essa corrosão de tubos e caldeiras. Diante da importância da redução do teor deste elemento na biomassa florestal, o professor da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Glêison dos Santos, foi procurado pelo grupo empresarial Forestalia, que se dedica a projetos de energias renováveis (eólica, fotovoltaica e biomassa) na Espanha, França e Itália, para verificar como o melhoramento florestal poderia ajudar a reduzir o teor de cloro na biomassa.
Um dos trabalhos realizados com o objetivo de avaliar a possibilidade de reduzir a quantidade de cloro na biomassa de Eucalyptus foi a lavagem da biomassa em água corrente. Os testes foram realizados em biomassas da copa (galhos e folhas) e fuste provenientes de florestas de Eucalyptus benthamii e Eucalyptus dunnii, ambas com três anos de idade.
As biomassas foram lavadas em água corrente, com diferentes volumes de água em relação ao volume das biomassas. A pesquisa avaliou cinco níveis (tratamentos) de lavagem da biomassa. Os resultados surpreenderam, ao revelarem a possibilidade de reduzir o teor de cloro na biomassa total (galhos, folhas e tronco) em até 91% para a biomassa de E. dunnii e 65% para E. benthamii.
Segundo o professor, essa maior redução de cloro na biomassa total de E. dunnii se deve ao fato de que o mesmo possui copa mais densa (com mais folhas) quando comparado com a biomassa total de E. benthamii, e como a concentração de cloro é maior nas folhas, a biomassa total que contém maior percentagem de folhas e galhos apresenta maior redução no teor cloro.
O professor explica, ainda, que é possível reduzir o cloro lavando a biomassa, porque este é altamente solúvel nas plantas. Isso acontece porque ele não participa de nenhum componente estrutural (formando compostos orgânicos) na formação dos tecidos. Ou seja, ele está livre nas células e não está ligado a outros compostos, de maneira que não pode ser retirado. Assim, a água tira o cloro por “arraste”.
Além disso, a maior concentração de cloro está nas folhas, onde ele participa do controle osmótico (abertura e fechamento de estômatos). Por sua vez, as folhas são tecidos tenros, o que facilita ainda mais o arraste do cloro promovido pelo processo de lavagem com água.
Ademais ao referido trabalho, também se está discutindo com algumas empresas um programa de melhoramento genético específico para selecionar progênies e clones de Eucalyptus que apresentem geneticamente uma menor fixação de cloro em seus tecidos vegetais. Trabalhos preliminares indicam que a seleção na direção de menor percentual de cloro na biomassa é possível.
Perspectivas para os plantios adensados de eucaliptos clonais
No caso de ser possível utilizar cavacos de eucaliptos, com casca, para determinados processos industriais como produção de papel, de chapas e aglomerados de madeira de eucalipto, de pellets e outros produtos baseados na biomassa florestal, não resta dúvida de que plantios adensados de eucaliptos clonais vão se expandir em todo o território brasileiro, em face da sua maior produção volumétrica por hectare e a sua rotação mais curta que a tradicional.
Por outro lado, com o aumento da produção descentralizada de eletricidade a partir de UTEs baseadas em biomassa florestal, haverá também um grande incentivo para o crescimento de áreas plantadas nesse sistema.
Finalmente, com a vinda para o Brasil, de novas empresas como a FI Bioenergia, atualmente com cinco unidades previstas para produzir etanol a partir de milho no Mato Grosso e a produção de ácido cítrico também a partir de milho no Mato Grosso do Sul, todas elas deverão necessitar de biomassa para energia ou vapor, e neste caso, o plantio de eucaliptos clonais adensados em curta rotação, vai ser a solução adequada para todas elas. Isto sem falar em biocombustíveis e na hidrólise enzimática para a produção de etanol a partir da madeira de eucaliptos clonais (http://www.fsbioenergia.com.br/pt-br).