Ricardo Steinmetz Vilela – ricardovilela@belavistaflorestal.com.br – Sócio diretor da Bela Vista Florestal e presidente da ProCedro – Associação Brasileira dos produtores de Cedro Australiano.
Há anos os órgãos de pesquisa vêm apontando as vantagens da integração entre culturas florestais, agrícolas e a pecuária, sendo o principal a Embrapa, que há anos estuda o tema. As vantagens dos sistemas agroflorestais já são bastante conhecidas e se traduzem em benefícios ecológicos, agronômicos e financeiros.
Neste artigo quero focar o consórcio entre o café e o componente arbóreo cedro australiano (Toona ciliata), um modelo que adotamos há mais de oito anos na Bela Vista Florestal. As duas espécies têm ganhos significativos quando cultivadas conjuntamente.
Vantagens
Os benefícios ecológicos são relacionados ao aumento da biodiversidade e uso eficiente e racional dos recursos naturais, como solo, luz, água e nutrientes. Os benefícios agronômicos devem contemplar as duas culturas, e estão relacionados à melhora na fertilidade do solo, à redução das variações microclimáticas e, consequentemente, à redução de riscos de perda de produção.
Também há melhor distribuição da mão de obra ao longo do ano e diminuição do controle de plantas invasoras. As maiores vantagens específicas para o café são a diminuição da amplitude térmica, com dias menos quentes e noites menos frias, proteção contra ventos, granizo e veranicos. Tudo isso, somado, acaba reduzindo a bi anualidade característica da cultura.
O cedro encontra como vantagens diretas uma enorme compatibilidade nutricional com o café. Tantos os tratos culturais, quanto fitossanitários e controle de mato-competição, proporcionam, com baixo custo, uma altíssima produtividade por árvore.
Por fim, entre os benefícios econômicos temos a diluição de riscos por exposição ao preço de uma única comodity, a maturação mais lenta e homogênea dos grãos, que têm menor exposição ao sol e, consequentemente, a melhora na qualidade da bebida e no preço do produto.
Não menos importante, há a possibilidade de certificação e diferenciação do café produzido no empreendimento, que vem se tornando uma necessidade frente a um mercado cada vez mais exigente.
Bom para todos
Quando comparado ao plantio florestal tradicional, o consórcio traz antecipação de receita, variedade de produtos e redução dos custos da implantação florestal. O sistema traz ganhos financeiros para ambas as culturas.
O café apresenta aumento de qualidade e preço do produto, sem ter sua produtividade reduzida. O cedro atinge, com baixo custo e menos tempo, um diâmetro médio acima de 50 cm, proporcionando um mix de madeira produzida com maior porcentagem de classe A e B. Essas classes são comercializadas com mais facilidade e alto valor.
Por onde começar
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A implantação do consórcio pode ser feita junto com a implantação da lavoura de café, ou em fase posterior, com a lavoura já adulta, quando se retira o pé de café que vai dar lugar à muda de cedro. Em ambos os casos, é importante levar em consideração o espaçamento das duas culturas, para que o componente florestal não prejudique o café.
O espaçamento utilizado na Bela Vista Florestal é de 20 x 5,0 m para o cedro, com 100 plantas por hectare, e de 4,0 m x 0,5 m para o café, com 5.000 plantas por hectare. A cada quatro linhas de café puro, seguimos com uma linha de café com uma planta de cedro a cada cinco metros.
No passado outros testes foram feitos, e esse espaçamento foi adotado por não prejudicar os tratos culturais do cafeeiro e manter o sombreamento moderado sem comprometer a produção do mesmo.
A colheita mecanizada é uma necessidade cada vez mais premente, frente às dificuldades de se obter mão de obra no campo. Nesse formato, apenas 20% da lavoura deve ser colhida a mão. A cada cinco linhas de plantio, quatro são colhidas de forma mecanizada.
Manejo
Os tratos culturais e manejo do cafeeiro não são diferentes por causa do consórcio, a não ser no detalhe da colheita, explicado anteriormente. Já os tratos culturais do cedro são drasticamente reduzidos, pois este se beneficia dos fertilizantes e defensivos necessários para a cafeicultura.
A poda de galhos, ou desrama do cedro, que normalmente é feita para evitar formação de nós na madeira e diminuir a conicidade dos troncos, aqui também serve para dosar o sombreamento na lavoura. Em experimentos onde o café ficou muito sombreado, a produtividade foi comprometida.
É importante ressaltar que no espaçamento adequado, para não sombrear excessivamente o café, são plantadas cerca de 100 árvores por hectare. Nesse caso, não haverá competição entre elas. Isso é uma vantagem em termos de aceleração de ganho diamétrico, mas a falta de competição não pode prejudicar a forma das árvores.
No caso do cedro australiano, a forma florestal (fuste reto) era constantemente afetada antes do desenvolvimento dos materiais genéticos adequados. Hoje há, no mercado, clones de cedro australiano que mantêm forma excepcional para serraria, mesmo em espaçamentos amplos.
Diversificação
O consórcio de café com cedro australiano é uma excelente alternativa para o produtor que visa diversificar suas atividades dentro da propriedade, principalmente dentro da silvicultura. Apesar do cedro australiano ser uma cultura recente no Brasil (introduzido em 1975) em comparação ao café, é um dos modelos de consórcio que conta com boa produção técnica e científica, atraindo a atenção de pesquisadores e interessados.
Isto é muito importante quando se leva em conta a segurança tecnológica por trás do investimento, seja na parte de cultivo do cedro, na produção de madeira, mercado e de materiais genéticos testados.
Pesquisas
São várias instituições que já desenvolveram trabalhos com o consórcio. A UFV e o Pró-Café desenvolvem pesquisas há pelo menos uma década e os resultados estão disponíveis na internet. A Embrapa Florestas lançou recentemente um importante documento sobre o tema. O trabalho chamado “Estudo da rentabilidade econômica do cedro australiano em plantios puros e consorciados com café” foi conduzido em parceria por pesquisadores da Embrapa, Instituto Ipê e da Caeté Florestal, empresa agroflorestal que aposta na consorciação.
Desenvolvido em um campo experimental implantado em uma fazenda da Caeté Florestal, no município de Nepomuceno (MG), o trabalho comparou a produtividade e rentabilidade do consórcio com o cedro australiano seminal. A pesquisa também testou diferentes materiais genéticos de alta produtividade da linha de clones de cedro BV 1000, desenvolvidos pela Bela Vista Florestal.
A possibilidade de utilizar materiais genéticos superiores de cedro australiano otimiza muito o consórcio entre as espécies, facilita o manejo florestal, aumenta a produtividade da madeira, uniformizando a madeira produzida e o sombreamento do cafezal dentro de uma mesma área. Isto representa um enorme ganho tecnológico dentro do consórcio.
A oportunidade de se produzir madeira junto com o café dentro de uma mesma área, sem aumento significativo dos custos ou redução da produtividade e rentabilidade do café, é um importante fator a ser considerado na geração de renda em propriedades rurais, independentemente de seu tamanho.
A madeira serrada de cedro australiano já está disponível no mercado com bom valor agregado e com difusão em diversos segmentos industriais. Sua utilização junto à movelaria e à produção de esquadrias tem mostrado que a espécie tem um excelente nicho frente à exaustão de outras madeiras consagradas utilizadas no Brasil, como o cedro brasileiro, especialmente devido a sua enorme similaridade.
Custos
Quando comparado com o cultivo convencional de café, o aumento dos custos ocorre basicamente pela aquisição das mudas de cedro, pelo manejo de desrama até o quinto ano e aumento no rigor com controle de formigas.
O custo tende a aumentar também pela colheita manual nas linhas de café com cedro. Tirando a colheita de ambas as espécies, o custo de se implantar o cedro é simbólico e representa apenas 3% do custo necessário para produzir o café desde a implantação durante o período de 15 anos.
Como são implantadas entre 100 e 120 plantas de cedro/ha nas lavouras de café, o custo de plantio do cedro gira em torno de R$ 1.000,00/ha, já considerando o coveamento, insumos e plantio das mudas. Os custos com a colheita do cedro giram em torno de 10% da rentabilidade esperada com a madeira.
Em relação à adaptação na colheita do café, o custo da colheita manual é aproximadamente o dobro do custo da colheita mecanizada e será necessário em 1/5 da lavoura, nas linhas onde as plantas de cedro estão presentes. Este é o maior impacto de custo para a cafeicultura, mas se justifica pela rentabilidade obtida com a madeira dentro do consórcio.
Mais produtividade madeireira
Lavouras de café bem conduzidas também irão proporcionar grande produtividade de madeira. É possível esperar produtividades em torno de 15 m³/ha/ano. Para fins de cálculos, é esta produtividade conservadora que está sendo assumida para clones como o BV 1110 e o BV 1120, apesar de inventários realizados em plantios consorciados com 7,5 anos mostrarem DAP médio de 39 cm e volume por hectare de 199 m3 de madeira, portanto, muito superiores às premissas utilizadas para cálculos de rentabilidade, taxa de retorno e valor presente do investimento.
Aos 15 anos é possível ter um aproveitamento útil de cerca de 80% do volume de toras produzidas para serraria. Plantas com diâmetro de 50 cm de DAP em média irão proporcionar cerca de 50% de conversão na serraria (2,0 m³ de tora para 1,0 m³ serrado). O cedro australiano tem sido comercializado, atualmente, pelo valor médio de R$ 2.500,00 o m³ de madeira serrada.
Dessa forma, é possível obter a produção de cerca de 90 m³ de madeira serrada/ha após o período de 15 anos. Importante ressaltar que a produtividade do cedro dependerá do empenho do produtor para alcançar os valores citados e que, mesmo que no futuro a realidade seja diferente da expectativa (valendo para melhores ou piores cenários), o investimento do produtor no consórcio é considerado baixo, perto dos ganhos possíveis.
Mais lucro para o café
Já em relação ao café, foi considerada uma produtividade média de 29 sacas/ha/ano, com um preço médio da saca em torno de R$ 470,00. A substituição de cerca de 120 plantas no cafezal implicará na redução de uma saca/ha em média durante o consórcio, impactando pouco na margem de lucro, redução já contabilizada na produtividade média citada anteriormente.
Não consideramos aqui a possibilidade de aumento no preço da saca pela maior qualidade do café produzido, como vem acontecendo com produtores que adotaram esse sistema.
O retorno do investimento depende diretamente do sucesso do produtor na cafeicultura, pois é dela que sairá a receita anual dentro do consórcio até a colheita da madeira. Com todo o investimento e despesas feitas na cultura do café, o cedro não apresenta impacto direto no fluxo de caixa do empreendimento. Como é habitual na cafeicultura, as lavouras começam a produzir a partir do 3º ano e o retorno do investimento ocorrerá a partir do 8º ano na atividade.
Atenção!
Uma boa gestão é fundamental durante o processo, pois visa reduzir os custos na produção do café, assim como obter bons valores para venda. O bom controle das pragas e doenças do cafeeiro impactam nos custos e produtividade, aumentando a margem de lucro na atividade.
O manejo nutricional que garante produtividade e sanidade para ambas as espécies deve ser feito com rigor. O conhecimento necessário para o consórcio pesa muito mais para a gestão do café do que do cedro australiano, que tem manejo e custos simplificados nesta atividade. Ou seja, de nada adianta ser um mau cafeicultor, acumulando prejuízos por 15 anos, esperando consertar tudo com a venda da madeira no fim do ciclo.