Autores
Aline da Silva Bhering
Engenheira agrônoma e doutora em Fitotecnia
bheringas@gmail.com
Maria Aparecida Nogueira Sediyama
Doutora em Fitotecnia e pesquisadora – EPAMIG
marians@epamig.br
Carlos Antônio dos Santos
Engenheiro agrônomo e doutorando em Fitotecnia – UFRRJ
carlosantoniods@ufrrj.br Bruno Novaes Menezes Martins
Engenheiro agrônomo, doutor em Agronomia/Horticultura – UNESP
brunonovaes17@hotmail.com
Veridiana Zocoler de Mendonça
Engenheira agrônoma, doutora em Agronomia/Energia na Agricultura
Letícia Galhardo Jorge
Bióloga e mestranda em Botânica – IBB/UNESP
A alface (Lactuca sativa L.) destaca-se como a hortaliça folhosa mais consumida pelos brasileiros, ocupando a liderança nacional nessa categoria. Este é um reflexo da busca constante dos consumidores por alimentos leves, com sabor suave, baixa quantidade de calorias, alto teor de vitaminas e sais, e que apresentam praticidade no preparo.
Aliado a isso, a grande variabilidade encontrada na espécie quanto à forma das folhas, tamanho, textura e coloração, é uma vantagem que tem possibilitado atender a diferentes mercados, o que reflete em aumento do consumo.
A produção nacional de alface é liderada pela região sudeste, que supre com aproximadamente 67% da produção, sendo o Estado de São Paulo responsável por mais da metade da oferta, seguido por Minas Gerais e Rio de Janeiro, respectivamente. Dados do último relatório divulgado pela ABCSEM (2017) indicam que a alface e a 3ª maior hortaliça em volume de produção no Brasil (1,5 milhão de toneladas) e que chega a movimentar anualmente R$ 8 bilhões apenas no varejo. No grupo das folhosas, representa mais de 42% do mercado nacional em movimentação financeira.
Tendências
Dentre os diferentes segmentos disponíveis, vem sendo observado aumento no plantio e consumo de alface do tipo americana, que é caracterizada por folhas crocantes, com sabor agradável, e maior resistência ao transporte e armazenamento. Com isso, além de ser consumida na forma in natura, esse tipo de alface tem também agradado a indústria de processamento mínimo e as redes de “fast foods”, aumentando a sua demanda.
O cultivo de alface americana no ano de 2016 foi feito em 18.879 hectares e, juntamente com a alface crespa, tem obtido crescimento superior a 51% no Brasil (ABCSem, 2017). Na CEAGESP, em São Paulo, o segmento de alface americana representa 47% do total comercializado da folhosa.
Em hidroponia
Como forma de otimizar a produção e alcançar melhores rendimentos nesse mercado potencial, a produção hidropônica deste segmento de alface vem ganhando espaço nos últimos anos. Fatores como a melhor utilização da área, precocidade na colheita, utilização mais eficiente de nutrientes, melhor qualidade do produto final e aumento do número de ciclos por ano são as principais respostas dadas pelos produtores.
Além da alface americana, outros grupos como a solta-lisa, solta-crespa, repolhuda e mimosa podem ser beneficiadas por essa técnica. No entanto, é, geralmente, com a americana que o produtor consegue os melhores preços no mercado.
Mais produtividade
Por ser a alface uma espécie vegetal que tem o sistema radicular pequeno, o cultivo hidropônico é facilitado em sistemas como o NFT (Nutrient Film Technique) o mais utilizado para a espécie em todo mundo. Ainda, devido ao reduzido tamanho da planta, podem ser cultivadas em alta densidade, isto é, com muitas plantas por área de cultivo.
Dessa forma, o cultivo em hidroponia oferece como vantagens o aumento da produtividade, colheita antecipada (o que permite um maior número de ciclos da cultura por ano) e maior uniformidade das plantas, visto que todas recebem os mesmos nutrientes diluídos em água e estão submetidos às mesmas condições climáticas, além de menor ocorrência de pragas e doenças.
No grupo da americana, geralmente se consegue maior peso, diâmetro e número de folhas, que reflete em melhores cotações no mercado. Ainda, a depender do nível de tecnologia empregada pelo produtor na estrutura para o cultivo protegido, serão minimizados os efeitos da temperatura excessiva e umidade relativa no interior da estufa, o que também colabora para ampliação dos períodos de cultivo e redução da sazonalidade.
Para os consumidores, as principais vantagens do consumo de alface americana hidropônica são o menor contato das plantas com contaminantes do solo; menor ataque de pragas e doenças, o que diminui a aplicação de agrotóxicos; melhor aspecto e condições do produto, visto estarem mais limpos e embalados e, ainda, maior durabilidade e manutenção da textura durante a pós-colheita.
Manejo
A produção de mudas de alface para o cultivo hidropônico pode ser feita na própria propriedade, o que irá requer estrutura e cuidados adicionais como forma de garantir a qualidade, ou por meio de viveiristas idôneos e especialistas na produção de mudas.
Nesta etapa, podem ser utilizados diferentes substratos, sendo comum o uso da espuma fenólica, devido a sua leveza, praticidade e capacidade de sustentação das mudas e retenção de água. A espuma, no entanto, deverá ser previamente lavada para a eliminação da acidez e de resíduos de fenóis.
Recomenda-se o uso de sementes peletizadas e dispostas individualmente em cada célula. Posteriormente, as placas deverão ser mantidas úmidas em condições de ambiente protegido e sob temperaturas amenas (18 a 25ºC). Após a emergência, deve-se iniciar a irrigação das mudas com solução nutritiva a 50% e depois 100% da concentração de nutrientes.
As mudas estarão prontas para o transplantio quando emitirem o primeiro par de folhas verdadeira. Deverão ser selecionadas aquelas mais vigorosas, descartando as plantas desuniformes, pouco vigorosas e/ou com problemas fitossanitários.
Além da qualidade das mudas, outros pontos que merecem atenção são a qualidade da água, o preparo e o acompanhamento da solução nutritiva visando suprir adequadamente as demandas nutricionais exigidas pelas plantas nas suas diferentes fases, e promover um bom crescimento das mesmas. A solução nutritiva mais comumente utilizada na hidroponia é a proposta por Furlani e seus colaboradores. No entanto, adaptações podem ser realizadas sob supervisão técnica.
pH e condutividade elétrica
É indispensável que haja o controle do pH da solução, pois este é um importante indicador de qualidade na produção de alface. O produtor deverá verificar o pH da solução diariamente, mantendo-o na faixa de 5,8 a 6,4. Caso o pH estiver muito alcalino, deve-se adicionar um ácido fraco na solução para baixá-lo. E caso esteja muito baixo (ácido), deve-se adicionar a solução uma base fraca para a correção, deixando sempre este índice na faixa adequada, para se obter uma boa produção.
A condutividade elétrica (CE) é outro parâmetro importante e que deve ser monitorado constantemente, juntamente com o pH. Ela fornece uma informação indireta sobre a concentração de nutrientes na solução e permite a tomada de decisão quanto a sua troca ou a reposição de nutrientes. A CE da solução de Furlani é por volta de 1,8 mS cm-1, e deve ser mantida próximo a este valor ao longo do ciclo.
Devem ser priorizadas tubulações de coloração branca ou clara, pois apresentam baixa absorção de energia solar, evitando aquecimento dos tubos e da solução próxima à planta e à zona radicular da alface. A temperatura está relacionada à diminuição do ponto de saturação do oxigênio, que também afeta o crescimento radicular.
O aumento da temperatura, associado à má qualidade das mudas e da água e a falta de limpeza dos tanques e canais por onde percorre a solução nutritiva, pode aumentar a ocorrência de Pythium spp. e outros patógenos radiculares, além de algas, o que causa perdas na produção.
Diferencial no manejo
A colheita é feita com a retirada da planta inteira (parte aérea + raiz), de preferência nas horas mais frescas do dia, e a retirada das folhas baixeiras amareladas ou danificadas, o que diminui a ocorrência de murchamento nas plantas e melhora o aspecto visual do produto. Ainda, como na hidroponia não há terra envolvida na produção, a alface permanece limpa e não há necessidade de lavar antes da comercialização.
Na produção de alface americana em sistemas hidropônicos, da semeadura até a colheita, o ciclo médio costuma ser de 38-47 dias, com variações em função da cultivar, épocas e manejo adotado. Produtores da região de Piedade (SP) que passaram a cultivar alface hidropônica apontam incrementos de cinco a sete ciclos por ano, em comparação ao cultivo convencional realizado no solo.
BOX
Investimento
Pode-se resumir, portanto, que o cultivo de alface americana em sistema hidropônico é um negócio potencial em função da grande demanda do mercado desse segmento de alface e aos benefícios que a técnica proporciona. No entanto, é necessário que os produtores estejam atentos aos cuidados e conhecimento técnico exigido para a implantação e condução adequada do sistema.
Ao primeiro olhar, o investimento inicial de um projeto hidropônico pode parecer alto, no entanto, o retorno obtido pelos produtores costuma ser rápido. Detalhes como a economia de água, mão de obra e de insumos, aumento da produção e do número de ciclos anuais, além da redução da sazonalidade e dos riscos causados por condições climáticos, são benefícios marcantes que essa técnica proporciona e que viabiliza os investimentos realizados.