O desmatamento do Cerrado nos estados da Bahia e do Piauí aumentou 88% em janeiro de 2023 em relação ao mesmo período em 2022, segundo dados do SAD Cerrado (Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado) divulgados nesta quarta-feira (15). No Piauí, o bioma teve 9,5 mil hectares desmatados, um aumento de 120% em relação ao mesmo período do ano passado, quando 4,3 mil hectares foram derrubados. Já na Bahia, o aumento foi de 64%, totalizando 9,3 mil hectares desmatados contra 5,6 mil hectares no ano anterior.
O crescimento nos estados vem na contramão da tendência observada no resto do bioma. No total, o Cerrado teve 46,5 mil ha desmatados em janeiro de 2023, uma redução de 16% sobre os 55,3 mil ha desmatados no mesmo mês em 2022. E uma redução de 24% em relação a janeiro de 2021, quando 60,9 mil ha foram derrubados.
O SAD Cerrado é uma ferramenta de monitoramento do desmatamento do bioma desenvolvida pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com a rede MapBiomas e com o LAPIG (Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento), da UFG (Universidade Federal de Goiás).
“A divergência das tendências de desmatamento entre o bioma Cerrado e as regiões da Bahia e Piauí chama muita atenção. Observamos grandes áreas sendo abertas no oeste da Bahia que, por ser uma região de agricultura já consolidada, os fragmentos remanescentes de vegetação nativa são cruciais para segurança hídrica e alimentar da região, além de serem importantes para manutenção da biodiversidade e conectividade entre áreas protegidas”, afirma a pesquisadora do IPAM que atua no SAD Cerrado, Fernanda Ribeiro.
Os números do SAD também mostram que, dos dez municípios que mais desmataram o Cerrado em janeiro, seis estão localizados no oeste baiano, região de agricultura consolidada. Juntos, os municípios de Jaborandi, São Desidério, Cocos, Correntina, Baianópolis e Santa Rita de Cássia desmataram 7,6 mil ha, 82% de todo o desmatamento ocorrido no cerrado baiano e 16% de todo o desmatamento no bioma.
Áreas privadas concentram desmate
Os dados do SAD Cerrado mostram que a maior parte do desmatamento no bioma segue ocorrendo em propriedades privadas. Em janeiro de 2023, 85% de todo o desmatamento do bioma ficou concentrado em áreas privadas. O restante das derrubadas ocorreu em áreas sem definição de categoria fundiária (8%), áreas protegidas (4%) e assentamentos (3%).
Na Bahia, 95% do desmatamento esteve concentrado em áreas privadas, com maior concentração na região do extremo oeste baiano. No Piauí, as propriedades privadas têm 81% da área desmatada.
“O desmatamento no Cerrado põe em risco a segurança hídrica, energética, climática e alimentar brasileira. Hoje, a maior parte da vegetação nativa do Cerrado está em áreas privadas, o que reforça a necessidade de articulação entre o setor privado, e os governos Estaduais e Federal. Além disso, as demandas do mercado internacional por uma agricultura sustentável, juntamente com a implementação de novas políticas públicas voltadas para conservação dos remanescentes de vegetação nativa em áreas privadas são essenciais para o sucesso do combate ao desmatamento no bioma”, afirma a pesquisadora do IPAM e coordenadora científica do MapBiomas, Julia Shimbo
Vegetação savânica perdida
De todo o desmatamento observado no Cerrado, 68% atingiu as formações savânicas, um dos tipos de vegetação mais biodiversos do bioma. O restante do desmatamento ficou concentrado em áreas de florestas (20%) e formações campestres (12%). No Piauí, a derrubada das savanas chegou a corresponder a 86% de todo o desmatamento no estado em janeiro.
As savanas ocupam 30% da extensão do Cerrado, mas concentram 78% da área desmatada no bioma diretamente para o pasto e o plantio de soja entre 2010 e 2021, segundo dados do MapBiomas. Esse tipo de vegetação também sofre com a falta de políticas nacionais e internacionais para sua proteção.
“O reconhecimento e a integração das savanas em políticas nacionais e internacionais de redução do desmatamento, e de incentivo à restauração e conservação é um passo fundamental para a proteção do Cerrado. Na realidade brasileira, isso pode ser alcançado a partir do fortalecimento do Código Florestal e da implementação de políticas públicas, em parceria com o setor privado, voltadas para a conservação de savanas”, diz Tarsila Andrade, pesquisadora do IPAM que atua no SAD Cerrado.