Autor
Alessandro Guieiro
Consultor agronômico, especialista em Microbiologia do Solo, Fertilidade e Nutrição de Plantas – alessandro.consultoragro@hotmail.com
No Brasil, durante a última década, intensificaram-se os estudos ligados à microbiologia do solo devido a uma grande demanda por informações e busca por respostas do motivo pelo qual a fertilidade, do ponto de vista químico, já não mais está sendo suficiente para o aumento da produtividade.
Durante anos assistimos serem gastos milhões de dólares em pesquisas ligadas à fertilidade química, buscas por fertilizantes de alto desempenho, além de fórmulas químicas que se ajustassem, da melhor forma possível, a diferentes tipos de solo, clima e região.
Infelizmente, estes altos investimentos foram barrados pelo esgotamento das propriedades físicas e biológicas do solo, desta forma, não sendo suficiente somente a tecnologia de ponta empregada a diferentes fertilizantes químicos.
À medida que os estudos avançam e os resultados das pesquisas começam a aparecer, fica cada vez mais clara a necessidade de se conhecer a fundo esse universo vivo que é o solo.
Para que os estudos se tornem claros e objetivos, torna-se fundamental mapear os solos, não somente em relação à fertilidade química, como também à fertilidade física e biológica. Estes mapas, por sua vez, serão ferramentas fundamentais para o alcance da máxima eficiência agronômica.
O que é mapa biológico – BioMap
O termo BioMAp consiste em mapear e quantificar BioIndicadores positivos ou negativos, que nos dão condições para mensurar a saúde do solo. A qualidade do solo é definida como a capacidade de funcionar dentro dos ecossistemas para sustentar a produtividade biológica, manter a qualidade ambiental e promover a saúde das plantas e animais (Doran; Parkin, 1994).
Por estarem associados à parte viva e mais ativa da matéria orgânica, a maior vantagem dos BioIndicadores é que eles são mais sensíveis do que indicadores químicos e físicos, detectando, com maior antecedência, alterações que ocorrem no solo, em função do seu uso e manejo (Doran, 1980; Mendes et al., 2015, 2017).
Cerca de 5% de toda matéria orgânica presente no solo é formada por biomassa viva. Destes, algo em torno de 70% são microrganismos (Mendes, 2017), portanto, torna-se fundamental o cuidado com o ecossistema solo.
Alguns trabalhos apontam fungos saprófitas do gênero Fusarium como o maior desafio para a cafeicultura atual. Por estarem presentes no solo e fazerem parte da decomposição da palhada, estes estão aumentando de forma exponencial suas populações no solo, causando morte do sistema radicular e, consequentemente, observamos plantas mais sensíveis a intempéries climáticas, doenças de parte aérea, como seca de ramos, cercosporiose e, também, ataques de pragas.
Práticas culturais
Somente com a utilização do BioMap é possível, de fato, conhecer o solo, mapear e quantificar os BioIndicadores positivos e negativos e, desta forma, planejar diferentes formas de controle e manejo.
Algumas práticas culturais que insistem em permanecer na cafeicultura moderna contribuem para que ocorra grande desequilíbrio na microbiota do solo, podendo-se citar o uso de herbicidas agressivos aos microrganismos presentes no solo, como por exemplo, a molécula do Gliphosate.
Para o ambiente, o uso deste herbicida tem afetado diretamente a microbiota do solo, ocasionando desbalanços, principalmente em trichodermas, Bacillus subtilis e, consequentemente, aumentando a incidência de mofo branco, nematoides, além de Fusarium e Rhizoctonia. Para minimizar esse efeito negativo sobre a microbiota, recomenda-se inocular o solo com Bacillus subtilis e Trichoderma spp (Yamada, 2017).
Construção do BioMap
A coleta de solo para realização de análises ainda é um assunto muito discutido, até mesmo na amostragem para construção do mapa de fertilidade química. No entanto, para a construção do BioMap, faz-se necessário adotar um procedimento rigorosamente padronizado e específico, uma vez que em apenas 1,0 g de solo podem estar contidos mais de 20 milhões de seres vivos.
É fundamental que se siga um protocolo e que a amostragem seja feita por um profissional qualificado, apto a realizar não somente a coleta do solo e das raízes, como também que se faça uma avaliação visual do local que será amostrado. Nesta avaliação visual, devem-se relatar algumas caraterísticas que o solo possui, como por exemplo, o tipo de palhada que está manejando, características físicas do solo e das raízes, entre outras.
Prejuízos causados pelo Fusarium
Fungos do gênero Fusarium estão entre os mais importantes patógenos de plantas perenes, inclusive o café. Durante o século passado, foram descritas e registradas no Brasil mais de 20 espécies distintas, causando os mais variados distúrbios em plantas de café.
Enquanto várias fusarioses foram estudadas em outras regiões produtoras do mundo, nenhum estudo conclusivo foi desenvolvido para o nosso território. Tendo em vista tanto a importância do patógeno como a da cultura do café, estudos avançados sobre este patossistema são urgentemente indicados (Pfenning; Martins, 2000).
De posse do BioMap podemos constatar que lavouras com população alta do fungo Fusarium, considerado bioindicador negativo e com quantidades baixas de Trichoderma spp, que é um bioindicador positivo, depara-se com situações de morte do sistema radicular, impossibilitando a planta de absorver água e sais minerais, consequentemente, plantas com sistema imunológico debilitado, forte ataque de pragas e doenças, depauperamento rápido em anos de carga alta ocasionando uma intensa bienalidade e, em alguns casos, murcha das plantas e até mesmo morte do cafeeiro.
Controle
É fundamental que se tenha em mente que o controle de fungos patogênicos do solo é necessário em função do desequilíbrio da microbiota ocasionado por práticas imprudentes ao longo dos anos. Uma vez mapeado e diagnosticado o problema, deve-se, primeiramente, adotar uma mudança cultural, com boas práticas, e que se entenda o ecossistema solo.
Ainda não foi identificado nenhum fungicida químico com registro para a cultura do café e que tenha desempenho satisfatório no controle do fungo Fusarium. Tem-se conseguido excelentes resultados com o uso de fungicidas biológicos das espécies Trichoderma asperellun e Trichoderma harsianum.
Cabe salientar que as doses dos respectivos fungicidas biológicos devem ser mensuradas em função da população de Fusarium, além da relação entre Trichoderma e Fusarium.
Pesquisas
Estudos mais aprofundados sobre espécies de Fusarium associadas ao cafeeiro estão em andamento, visando esclarecer aspectos de nomenclatura, inclusive, com a revisão de nomes antigos e elaboração de uma metodologia eficiente para o isolamento e a identificação correta das espécies e de possíveis efeitos sobre a sanidade da planta e do produto.
A identificação correta das espécies fúngicas é condição imprescindível para conclusões subsequentes quanto ao provável impacto sobre a planta no que diz respeito à biologia, patogenicidade e produção de metabólitos secundários pelos respectivos fungos. Para a visualização das características diagnósticas e identificação confiável das espécies, faz-se necessário adotar um procedimento rigorosamente padronizado.
É de extrema importância que se adote boas práticas agrícolas, conservacionistas e promotoras de diversificação ambiental. O solo hospeda uma enorme biodiversidade microbiana e o manejo deste componente apresenta grande potencial de inovação na agricultura. Solo sadio e biologicamente equilibrado irá proporcionar que se produza de maneira saudável, correta e sustentável.