Givago Coutinho
Doutor em Fruticultura e professor efetivo – Centro Universitário de Goiatuba (UniCerrado)
givago_agro@hotmail.com
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) deu o primeiro passo no sentido de viabilizar e expandir o cultivo de pitaia em todo Brasil. O lançamento das cultivares é resultado de um trabalho que teve início na década de 1990, a partir da seleção de espécies com maior potencial comercial e, também, de cruzamentos realizados entre e dentro de diferentes espécies.
Assim, a Embrapa lançou cinco novas variedades (BRS Lua do Cerrado; BRS Luz do Cerrado; BRS Granada do Cerrado; BRS Minipitaya do Cerrado e BRS Âmbar do Cerrado), que devem alavancar a produção no país.
Autopolinização
Do ponto de vista comercial, as principais espécies de pitaia são pertencentes ao gênero Selenicereus, sendo: S. undatus, S. costaricensis, S. setaceus e S. megalanthus.
A maior parte das espécies ou clones de pitaia é considerada auto incompatível ou a autopolinização das flores não é suficiente para conferir a produção em quantidade e qualidade, sobretudo em atributos como tamanho e massa, que é importante para a comercialização de pitaias.
Assim, dependendo da espécie cultivada, ou na falta de agentes polinizadores, é necessário o plantio de espécies ou de clones diferentes que favoreçam a oferta de pólen e que floresçam na mesma época, favorecendo a polinização cruzada, ou seja, entre espécies, plantas e flores diferentes para que a produção de frutos seja efetiva.
Em alguns clones de S. undatus e em S. megalanthus ocorre a autopolinização, enquanto que entre as espécies que apresentam autoincompatibilidade e são cultivadas no Brasil estão os clones de Hylocereus polyrhizus, S. costaricensis e S. monacanthus.
Essas espécies apresentam baixa frutificação ou até não frutificam quando ocorre a autofecundação ou quando são polinizadas com o pólen do mesmo clone.
Florescimento
O florescimento das plantas ocorre entre os meses de outubro a abril, com picos entre dezembro e fevereiro. A antese, ou seja, a abertura das flores da pitaia, tem início no fim de tarde e finaliza no período noturno.
Quando abertas, as flores exalam um odor para atração de agentes polinizadores, tais como abelhas, mamangavas, mariposas e morcegos.
Neste sentido, a autocompatibilidade, ou seja, a capacidade de a planta produzir frutos sem a necessidade da polinização cruzada, foi um fator importante considerado na pesquisa para o desenvolvimento das novas cultivares. As cinco cultivares lançadas possuem a característica de autocompatibilidade.
Benefícios práticos
Na prática, a característica da autocompatibilidade é importante, pois permite que os produtores economizem tempo e tenham melhor qualidade de vida, uma vez que não será mais necessário a polinização manual, via de regra realizada no período da madrugada.
Pesquisas
Dentre os principais objetivos da pesquisa, relaciona-se o aumento da produtividade, o vigor das plantas, a resistência a doenças, a precocidade de produção e a adaptabilidade às condições edafoclimáticas brasileiras.
Assim, as cinco novas cultivares apresentam viabilidade de cultivo em todas as regiões e biomas do Brasil, além da melhoria das características físicas e químicas dos frutos nos seguintes aspectos:
– Frutos maiores, com polpa de elevado teor de açúcar – BRS Âmbar do Cerrado;
– Melhor balanço entre o teor de sólidos solúveis e a acidez – BRS Minipitaya do Cerrado;
– Aumento do tamanho do fruto e do teor de sólidos solúveis totais – BRS Lua do Cerrado;
– Frutos vermelhos de polpa roxa, rica em antioxidantes – BRS Granada do Cerrado;
– Aumento do tamanho do fruto e do teor de sólidos solúveis totais – BRS Luz do Cerrado).
– Todas as cultivares demonstraram se adaptar bem às condições de clima e solos brasileiros.
Processo natural de polinização
Em espécies de pitaia, a emissão das flores ocorre nas gemas axilares posicionadas lateralmente ao cladódio, sendo as flores hermafroditas, ou seja, apresentam o órgão feminino e masculino na mesma flor.
Os estames são abundantes (acima de 800) e apresentam diferentes alturas e, em algumas espécies, a exemplo da Selenicereus undatus, são inferiores ao estigma. Contudo, há espécies em que as anteras e os estigmas estão localizados na mesma altura, assim como na S. megalanthus.
O estigma posicionado acima dos estames apresenta, dessa forma, uma separação espacial em relação às anteras. Este fenômeno de separação espacial entre as anteras e o estigma é denominado hercogamia e ocorre em diversas plantas predominantemente alógamas, ou seja, de polinização cruzada, contribuindo para a redução da autopolinização, assim como ocorre em várias espécies de pitaia.
As cultivares desenvolvidas pela Embrapa foram obtidas por meio do melhoramento genético convencional de cruzamentos realizados entre e dentro de diferentes espécies. A ‘BRS GC’, por exemplo, foi obtida a partir do cruzamento entre as espécies Selenicereus undatus e S. costaricensis.
Devido à heterose, apresenta alto vigor e alta produtividade. Nelas, a polinização é natural. Assim que ocorre a antese, concomitantemente ocorrem os processos de polinização e fecundação.
Comparativo
O sabor da pitaia está relacionado às características particulares da espécie, que se diferem entre as espécies, além do sabor, para características como a coloração da casca e da polpa, da presença ou não de espinhos e tamanho dos frutos.
Não há relatos sobre diferenças de sabor entre frutos oriundos de autopolinização e de polinização cruzada. O quadro a seguir mostra algumas das principais características das cultivares de pitaias desenvolvidas pela Embrapa.
Quadro 1. Características das cultivares de pitaias desenvolvidas pela Embrapa.
Cultivar | Morfologia dos frutos | Massa média dos frutos (g) | Sólidos Solúveis (°Brix) | Produtividade anual no terceiro ano (t.ha-1)* |
BRS Lua do Cerrado | Casca vermelha de polpa branca | 600 | 13 a 17 | 18 a 35 |
BRS Luz do Cerrado | Casca vermelha de polpa branca | 600 | 13 a 17 | 18 a 35 |
BRS Minipitaya do Cerrado | Casca vermelha com espinhos e polpa branca | 80 | 15 a 19 | 3 a 10 |
Granada do Cerrado | Casca vermelha e polpa roxa | 250 | 13 a 17 | 16 a 42 |
BRS Âmbar do Cerrado | Casca amarela com espinhos e polpa branca | 150 | 20 a 22 | 7 a 15 |
Os frutos são bem doces, de polpa firme e as plantas apresentam manejo relativamente simples, com boa produtividade e baixo custo de produção. As mudas podem ser obtidas e reservadas através do site: www.embrapa.br/cultivar/pitaya
Integração de cultivos
Conforme dito, devido ao fato de as cultivares apresentares resistência a doenças que acometem a cultura, as novas cultivares são indicadas para sistemas de produção, como o cultivo em sistema orgânico.
Assim, os produtores podem investir em sistemas que gerem menores impactos ao ambiente e viabilizem maior retorno financeiro na produção.
Resistência genética
Com a ampliação ano após ano, as áreas de produção de pitaia no Brasil estão ficando cada vez mais extensas, o que aumenta, consequentemente, os relatos sobre a ocorrência de doenças na mesma proporção.
De acordo com Oliveira et al., (2022), são relatados em torno de 17 gêneros e 25 espécies de patógenos que infectam as espécies de pitaia. A maioria dos agentes etiológicos é composta de fungos causadores de doenças nos cladódios, nas flores e nos frutos, além de doenças causadas por bactérias, vírus e nematoides.
As cinco cultivares desenvolvidas pela Embrapa apresentaram bom desempenho agronômico, mesmo sem a aplicação de agroquímicos, uma vez que apresentam resistência a doenças.
Essa característica as torna aptas para cultivos, a exemplo do sistema orgânico, que geram menor impacto ambiental e financeiro na produção.