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Por que manter o solo coberto?

Claudinei KappesEngenheiro agrônomo, doutor e pesquisador em Fertilidade do Solo e Adubação – NemaBio Laboratório e Pesquisa Agronômica, Sinop (MT)claudinei.kappes@nemabio.com.br

Rayane Gabriel da SilvaEngenheira agrônoma, mestre, pesquisadora e nematologista – NemaBio Laboratório e Pesquisa Agronômica rayane.gabriel@nemabio.com.br

Solo – Crédito: Shutterstock

A resposta é simples e direta: nem sempre podemos contar com a sorte! Têm sido frequentes os atrasos no início dos períodos chuvosos e a ocorrência de veranicos, que associados às altas temperaturas durante o ciclo das culturas, geram grandes prejuízos ao produtor.

A produção frequente e manutenção de palhada sobre a superfície do solo, além de tornarem os sistemas de produção mais eficientes no aproveitamento dos recursos naturais e insumos, leva-os a serem mais produtivos e menos sensíveis às intempéries climáticas. De bônus, a palhada propicia inúmeros benefícios agronômicos, os quais serão abordados a seguir.

Manutenção da temperatura do solo

A palhada funciona como isolante térmico, pois impede que os raios solares atinjam diretamente o solo, favorecendo a manutenção da temperatura e, consequentemente, da umidade (menos perda de água por evaporação).

Na Tabela 1 é possível verificar que, em todas as profundidades avaliadas, a palhada de braquiária (Urochloa ruziziensis) manteve a temperatura de um solo argiloso em menores valores, quando comparada à sua ausência. A amplitude térmica na camada de 0 a 8,0 cm foi expressivamente menor sob a presença da braquiária.

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Tabela 1. Valores médios de temperatura do solo (°C) às 14 horas na ausência e presença de palhada de braquiária (U. ruziziensis) em solo argiloso.

Palhada no solo Profundidade (cm)
0 2 4 6 8
Ausente 60,2 a 45,2 a 42,9 a 41,5 a 40,0 a
Braquiária 41,0 b 34,2 b 32,9 b 32,5 b 32,1 b

Médias seguidas por letras distintas nas colunas diferem pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.

Fonte: Kappes e Rocha (2014).

Favorecimento no estabelecimento de plantas

A temperatura do solo é considerada um dos fatores mais importantes para obter alta taxa e uniformidade no processo de germinação das sementes, pois está relacionada com a absorção de água. Portanto, elevadas temperaturas e baixa umidade do solo podem afetar o estabelecimento de plantas no campo.

O solo bem coberto retém mais umidade, quando comparado a outro exposto, podendo ser um grande diferencial em anos com má distribuição de chuvas e ocorrência de veranicos nas fases iniciais de desenvolvimento das culturas, a exemplo da soja, mesmo em solo argiloso.

Neste caso, ficou perceptível que a palhada de braquiária foi responsável por assegurar melhor germinação, emergência e estabelecimento de plantas, devido à sua contribuição para a manutenção da temperatura e umidade do solo.

As culturas implantadas em solos com palhada apresentarão maior resistência e serão menos afetadas pelas condições de elevadas temperaturas e escassez de água no solo. Contudo, em anos com boa distribuição de chuvas estes benefícios podem passar despercebidos.

Favorecimento da FBN

Os prejuízos provocados pela alta temperatura do solo não se restringem à germinação das sementes. A temperatura elevada do solo interfere negativamente na absorção de nutrientes pelas plantas e no desenvolvimento das bactérias fixadoras de nitrogênio atmosférico, comprometendo a nodulação do sistema radicular da cultura da soja.

Por outro lado, a presença de palhada na superfície do solo atenua esse problema e favorece a nodulação.

Controle de erosão

A palhada protege o solo da ação desagregadora do impacto das gotas de água das chuvas, reduzindo a erosão e aumentando sua infiltração no solo. Na Figura 3 é possível observar erosão laminar em consequência da ausência de palhada sobre o solo, ao passo que este problema não ocorre com a presença da palhada de milho. Ambas as situações são de um solo argiloso e foram registradas no mesmo dia, após uma chuva de 55 mm.

Ciclagem de nutrientes

Os nutrientes absorvidos do solo são acumulados nas raízes e partes aéreas das plantas (caule, colmo, haste, folha, grão, etc.), cujas concentrações variam de acordo com a cultura e adubação realizada.

Quando a colheita é realizada, parte dos nutrientes absorvidos é retirada do campo pelos grãos (exportação) e outra parte permanece nas raízes e palhadas residuais (ciclagem), sendo consideradas fontes restituidoras para as culturas sucessoras.

Por meio da decomposição da palhada, os nutrientes são devolvidos ao solo, cuja velocidade devolutiva depende de vários aspectos, mas principalmente do manejo da palhada e de sua relação carbono/nitrogênio (C/N). No geral, as gramíneas são ricas em potássio e apresentam maior relação C/N que as leguminosas, que por sua vez são ricas em nitrogênio e sua palhada é rapidamente decomposta.

As gramíneas são muito eficazes na ciclagem de nutrientes residuais, devido ao grande volume de raízes produzido e ao potencial de crescimento em profundidade. Suas raízes são capazes de acessarem camadas do solo nas quais as raízes de soja, por exemplo, dificilmente alcançariam, absorvendo nutrientes e disponibilizando-os na superfície do solo após a decomposição da palhada.

Esse benefício se torna ainda mais marcante quando se trata de nutrientes facilmente lixiviados, como é o caso do nitrogênio, potássio, enxofre e boro. Contudo, vale lembrar que a ciclagem de nutrientes não elimina a necessidade de adubação dos cultivos posteriores.

Melhorias na fertilidade do solo

A palhada melhora consideravelmente a fertilidade do solo ao longo do tempo, principalmente quando se utiliza gramíneas, devido ao sistema radicular profundo, volumoso e fibroso, manutenção e/ou incremento dos teores de matéria orgânica, ciclagem de nutrientes residuais e preservação da qualidade do solo. Neste contexto, a matéria orgânica e a atividade enzimática estão entre os principais bioindicadores da qualidade do solo.

Na oitava safra consecutiva do experimento de rotação de culturas conduzido pela Fundação MT foi possível constatar, mediante determinações de alguns bioindicadores na camada de 0 a 10 cm, que a inserção da braquiária no sistema de produção propiciou 3,0 vezes mais carbono da biomassa microbiana e 8,0, 4,0 e 1,7 vezes mais atividade das enzimas arilsulfatase, β-glicosidase e fosfatase ácida, respectivamente, do que o monocultivo de soja (Tabela 2), com pequena produção de palhada.

Tais resultados mostram, portanto, que a braquiária manteve o solo com maior atividade biológica, o que significa, com o passar do tempo, incremento de matéria orgânica, ciclagem de nutrientes e, consequentemente, maior estruturação e agregação do solo.

Tabela 2. Carbono da biomassa microbiana (CBM) e atividade das enzimas arilsulfatase, β-glicosidase e fosfatase ácida em amostras de solo1, na camada de 0 a 10 cm, em sistemas de produção sob monocultivo de soja e sucessão soja-braquiária em semeadura direta na oitava safra de condução do experimento.

Bioindicador Soja-pousio Soja-braquiária Diferença
CBM2 131 410 3,0 vezes
Arilsulfatase3 28 223 8,0 vezes
β-glicosidase3 64 233 4,0 vezes
Fosfatase ácida3 589 1.005 1,7 vezes

1 Amostragem realizada no florescimento pleno da soja.

2 Valores expressos em mg de C kg-1 de solo.

3 Valores expressos em µg de p-nitrofenol g-1 de solo h-1.

Fonte: Fundação MT; Mendes et al. (2019).

Impactos

As raízes das gramíneas impactam no processo de agregação e reestruturação do solo ao aplicarem forças biofísicas em ambas direções, agindo como ferramentas descompactadoras e aeradoras. Por isso, a tendência é que ocorram melhorias na fertilidade física e biológica dos solos, pelo aumento da taxa de infiltração da água (redução da erosão), capacidade de retenção de água e nutrientes e enraizamento das culturas subsequentes.

Uma boa estrutura do solo é obtida, portanto, pelo aumento da matéria orgânica, produção, permanência e decomposição do sistema radicular e da palhada, além da redução do tráfego de máquinas e redução do impacto das gotas de água das chuvas no solo.

Proteção da sanidade das culturas

A ausência de palhada sobre o solo potencializa a incidência de plantas daninhas e os danos causados por doenças. No primeiro aspecto, a palhada propicia a proteção física do solo, impedindo e/ou retardando a emergência de muitas plantas daninhas, especialmente as que necessitam da luz solar para germinarem, como é o caso da buva (Conyza spp).

No segundo aspecto, a palhada atua como barreira aos propágulos de agentes causais de doenças, reduzindo a chance de inoculação das plantas por patógenos sobreviventes nos resíduos e protegendo a sanidade das culturas.

Na Figura 4 é possível notar maior severidade de mancha parda (Septoria glycines) no terço inferior do dossel da cultura da soja devido à ausência de palhada no solo, ao passo que sob palhada de milheto não se observam sintomas da doença.

Outras doenças na soja podem ter sua incidência diminuída pela manutenção da palhada de gramíneas no solo, como é o caso da podridão cinzenta da raiz, mela, mofo branco, mancha alvo e as responsáveis pelos tombamentos.

Por fim, quando os benefícios agronômicos aqui abordados são alcançados na prática, aumenta-se consideravelmente a chance de incrementos de produtividades das culturas. Portanto, o produtor que investe na produção e manutenção de palhada sobre a superfície do solo não precisará contar com a sorte!

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