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Macaúba pode ser aposta ecologicamente sustentável para gorduras industriais

Plantação de milho e macaúba – Divulgação S.Oleum

Pesquisadores da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (FEA Unicamp) desenvolveram uma tecnologia a partir da macaúba, palmeira nativa do Brasil que resultou em um produto capaz de substituir a gordura trans – que teve seu uso proibido no país pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em 1º de janeiro de 2023. O produto final da pesquisa realizada gerou um portfólio de óleos e gorduras que foi licenciado, com apoio da Agência de Inovação Inova Unicamp, para a empresa S.Oleum.

O portfólio possui opções de gorduras que podem ser aplicadas em diversos segmentos, sobretudo na indústria alimentícia: em sorvetes, no âmbito das gorduras mais leves; em recheios, com gorduras de consistência intermediária; e em caldo em tabletes, no segmento de gorduras mais sólidas.

A busca por alternativas à gordura trans, ou gordura parcialmente hidrogenada, gerou uma ação dividida em duas frentes no Laboratório de Óleos e Gorduras da Unicamp: a procura por um método alternativo de obtenção de gorduras e também por uma matéria-prima que pudesse substituir as fontes lipídicas convencionais, como o óleo de palma.

O grupo de pesquisadores da Unicamp composto por Ana Paula Badan Ribeiro (FEA), Larissa Grimaldi (FEA) e Renato Grimaldi (FEA) chegou à macaúba como uma possível substituta da palma e provável candidata aos novos processos de obtenção de gorduras industriais.

A tecnologia conta também com um know-how complementar à tecnologia inicial – também protegido – e que detalha os caminhos para a execução dos métodos de produção dos óleos contemplados pelo portfólio.

De acordo com Ribeiro, professora da Unicamp e inventora responsável pelo desenvolvimento da tecnologia, o grupo vislumbrou, com o desenvolvimento da tecnologia, “uma alternativa à palma e à gordura trans, que fosse nacional, estratégica e sustentável”. Com uma perspectiva para o futuro, os inventores ambicionaram contribuir para o “desenvolvimento de uma nova cadeia” que envolve a macaúba.

Os resultados da tecnologia vão ao encontro das perspectivas da S.oleum, empresa que busca catalisar a economia de carbono negativo produzindo matérias-primas sustentáveis com alta tecnologia e em larga escala. O ponto de convergência entre os dois pares é a macaúba, visto que a empresa também vê na espécie um potencial em ascensão.

Desenvolvimento do óleo de macaúba

A escolha de outra fonte de óleo foi pautada em um movimento global, que busca a produção de gorduras a partir de novas fontes lipídicas, com aspectos de sustentabilidade. O novo meio de produção desse óleo, por sua vez, surgiu da necessidade de apresentar alternativas à hidrogenação parcial, que teve a proteção à saúde dos consumidores como fator de proibição.

“Embora tenhamos a produção de óleo de soja e de outras fontes de óleos líquidos, não é possível aplicá-los isoladamente em um recheio de biscoito, em uma gordura em pó, ou mesmo em uma margarina. Isso justifica a necessidade de processos de modificação lipídica para obtenção de gorduras com consistência”, conclui Ribeiro.

Entre os aspectos que evidenciam a macaúba como uma boa opção, estão o avanço da genética e a ampliação do banco de germoplasma de macaúba, que permitiu importantes ganhos de produtividade. Em adequadas condições de plantio, manejo, colheita e armazenamento, a cultura entrega uma alta produtividade, maior do que a palma e a soja, por exemplo.

Já com a matéria-prima escolhida, o grupo partiu para a procura de uma nova forma de obtenção de gorduras, que conquistou resultados de destaque ao utilizar o processo de interesterificação. O método associa óleo líquido com uma “gordura dura” para chegar ao ponto ideal do procedimento.

Felipe Morbi – Divulgação S.Oleum

Ainda sobre o processo de fabricação, a docente explica: “cada combinação parte de uma mistura de ácidos graxos líquidos e sólidos à temperatura ambiente. Ajustamos as proporções para obter gorduras que tenham a consistência e perfis de fusão desejados e, com isso, criamos uma variedade de óleos e gorduras com características diferentes, que é o que chamamos, no final, ‘portfólio'”.

Conexão com a S.Oleum

A S.Oleum investe há 17 anos no processo de domesticação da macaúba e trabalha para escalar o cultivo da espécie para iniciar os processos ambicionados pelo empreendimento: o uso da matéria-prima fundamental em diversos segmentos. Até 2030, Felipe Morbi, vice-presidente da companhia, explica que deve alcançar 175 mil hectares de macaúba plantada em sistemas agroflorestais.

“É importante mencionar que nenhuma área será desmatada para o plantio de macaúba, justamente por essa adaptabilidade da espécie em áreas já degradadas. E nós entendemos o plantio como um sistema, então, ele tem a macaúba como um dos componentes, mas também tem as culturas agrícolas consorciadas e as plantas de cobertura que fazem parte desse sistema integrado”, diz Morbi.

Com essa dinâmica, cria-se um “sistema agroflorestal ou um sistema de integração lavoura-pecuária-floresta”, comenta o empresário. A agrofloresta, conforme explica o fundador da S.Oleum, associa diversas espécies em um mesmo ecossistema, respeitando a característica de cada uma e também do espaço utilizado. O método surge como uma alternativa à agricultura tradicional e abre espaço para soluções ambientalmente sustentáveis e que conciliam os fatores econômicos, técnicos e ambientais.

Uma das premissas da empresa é operar baseada na economia circular, com zero desperdício, utilizando toda a macaúba, para atender às diferentes demandas do mercado: alimentícia, química e de biocombustíveis. Além disso, ela tem em seu escopo o plano de comercialização das espécies cultivadas em consórcio, como milho, girassol, amendoim, fechando o círculo baseado em moldes ecológicos.

“Agora, nós estamos partindo para um grande desafio, que é escalar esse projeto e tornar, realmente, a macaúba uma cadeia relevante de forma global. Isso é uma perspectiva de longo prazo, projetando o que a macaúba virá a ser”, explica o fundador.

“O foco é disponibilizar matérias primas sustentáveis para os atuais e futuros parceiros da S.Oleum. Por isso investimos muito no desenvolvimento de produtos e aplicações para diferentes mercados”. Foi nesse contexto que S.Oleum e o grupo de inventores da FEA Unicamp se conectaram.

O objetivo, segundo ele, é atender uma parcela específica de clientes cuja demanda é calculada, considerando o contexto atual de busca por alternativas ambientalmente sustentáveis e alinhadas com as resoluções acerca de óleos e gorduras que têm avançado pelo mundo.

Professora Ana Badan – Pedro Amatuzzi Inova Unicamp

“Nós nos entusiasmamos bastante com o projeto e demos todo o apoio que estava ao nosso alcance. O resultado foi muito positivo porque, com isso, eles conseguiram chegar ao desenvolvimento do portfólio de gorduras interessante para o mercado. Isso abriu mais uma frente na S.Oleum para colocarmos a macaúba em destaque – com mais uma solução para os mercados que buscamos explorar”, diz Morbi.

Perspectivas para o futuro

Tanto Ribeiro, quanto Morbi, focam no aspecto de que o cenário envolvendo a cadeia produtiva da macaúba ainda está em estágio inicial no país. O plantio em larga escala, assim como a aplicação em nível industrial, nos mais diversos aspectos, deve ganhar relevância nos próximos anos. Em outras áreas do globo, é possível identificar avanços promissores na implementação da espécie.

No Brasil, a expectativa é de que a macaúba alcance cada vez mais espaço, tanto por conta de seu aspecto compatível com as demandas de sustentabilidade ambiental, quanto pela sua aplicabilidade em diversos mercados.

O método de obtenção dos óleos, por sua vez, é um projeto que agora conta com dois atores: o grupo de pesquisa da Faculdade de Engenharia de Alimentos, na Unicamp, e a S.Oleum, que pretende levar o produto obtido a partir do estudo para o mercado em breve.

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