22.6 C
Uberlândia
sexta-feira, novembro 22, 2024
- Publicidade -spot_img
InícioNotíciasNuvem de gafanhotos está sob controle

Nuvem de gafanhotos está sob controle

José Otávio Menten

Já fragilizados pelo enfrentamento da pandemia causada pelo SARS-COV-2 (Covid-19), a população do sul do Brasil, mais especificamente os produtores rurais do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, estão assustados com a ameaça da chegada de uma nuvem de gafanhotos sul-americanos da espécie Schistocerca cancellata.

 Em 26 de junho de 2020, estes insetos estavam na Argentina, a cerca de 250 km da divisa com o Brasil, vindos do Paraguai. A nuvem está sendo monitorada pelos argentinos desde 11 de maio de 2020; chegou à Argentina em 21 de maio, retornou ao Paraguai, e em 28 de maio novamente atingiu a Argentina.

 O ciclo do gafanhoto apresenta as fases de ovo (15-21 dias), ninfa = saltão (51-89 dias) e adulto = voador (1ª geração, 51-89 dias, 2ª geração, 91-155 dias). Ou seja, cada indivíduo pode viver quase um ano.

 Especialistas estão estudando os fatores que levam ao ressurgimento da praga em sua fase mais agressiva. Possivelmente é decorrência da conjunção de fatores climáticos (alta temperatura, baixa umidade, vento, etc).

 Formam nuvens de até 30 km² (30.000.000 m² ou 3.000 há = 3.000 campos de futebol), compostas de aproximadamente 40 milhões de insetos voadores com cerca de 15 cm cada.

 Esta população consome o equivalente a dois mil bois ou 350 mil pessoas em apenas um dia. São herbívoros e não afetam a saúde do homem e nem são vetores de agentes de doenças em seres vivos.

 Entretanto, esta visão apocalíptica do problema divulgada pelas redes sociais, não condiz com a realidade, de acordo com especialistas: já há protocolos para conter a praga, não havendo motivos para alarde! Além disso, os ventos, a chegada do frio e a falta de opções por alimentos (estamos na entressafra/apenas pastagens disponíveis na região), podem trazer mais tranquilidade à população.

Milho – Crédito: Shutterstock

 Apesar disso, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) já declarou “estado de emergência fitossanitária” no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina (Portaria nº 201, de 24/06/2020) pelo período de um ano, com diretrizes e medidas a serem adotadas. Embora já existam inseticidas registrados para o gafanhoto sul-americano (dois produtos comerciais à base de deltametrina/piretroide) e outros cinco à base de diflubenzurona/benzuilureia para Rhammatocerus spp, o MAPA já dispõe de outras alternativas, incluindo inseticidas biológicos, que podem ser registrados emergencialmente.

 As autoridades brasileiras estão monitorando a nuvem de gafanhotos e, caso necessário, já existem ações que poderão ser implementadas. Estes pesticidas poderão ser aplicados via terrestre ou com aviões agrícolas. O MAPA já elaborou um “Manual de Procedimentos Gerais para o Controle da Praga Schistocerca cancellata – South American Locust (Serville, 1838)”, com o objetivo de reduzir ou evitar danos e possíveis prejuízos no caso de eventual surto no Brasil.

 O monitoramento da praga consiste na detecção da presença de ovos no solo e, posteriormente, de ninfas (não tem capacidade de voo). É necessária a identificação dos diferentes estágios das ninfas e, se necessário, aplicação de pesticidas em faixas. Os adultos podem ser tratados por via aérea ou por terra, na primeira hora do dia.

 O SINDAG (Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola) informou que o Rio Grande do Sul tem número suficiente de aeronaves prontas para operação imediata, caso necessário. Quando os adultos estão no solo é possível fazer a pulverização com inseticidas adequados em pouco tempo (cerca de 15 minutos). Os técnicos argentinos estão tomando providências semelhantes; é importante localizar o ponto de pouso dos insetos a tempo de executar a operação antes do escurecer ou logo pela manhã, antes de levantarem voo.

 O controle é complexo devido a grande capacidade de voo dos gafanhotos: cerca de 150 km em um dia. O intervalo de tempo em que é possível aplicar inseticidas é curto e ocorre quando há pouca visibilidade.

 Existem em torno de 12 mil espécies de gafanhotos e apenas dez são pragas agrícolas. São relatados diversos surtos em todo o mundo. Alimentam-se de plantas nativas e cultivadas. Formam densas “nuvens” migratórias sob condições climáticas favoráveis, com 10 km de comprimento por 3 km de largura, equivalente a 3.000 ha (3.000 campos de futebol). Quando pousam no final da tarde, se amontoam ocupando uma área de até 10 ha para se alimentar e permanece até a manhã do dia seguinte.

 Não é a primeira vez que o fenômeno ameaça um país. Em diversas ocasiões gafanhotos causaram danos. Em 1400 A.C. dizimou colheitas no Egito, sendo considerada a oitava praga bíblica. Há relatos de surtos na América do Sul na Argentina (1538), nos Estados Unidos (1874), Egito e norte da África (2004), México (2006), Israel (2013), Argentina/Bolívia/Paraguai (2015-2017) e leste da África (2019/2020). Em Janeiro de 2020, o Paquistão declarou “Emergência Nacional” devido a surto. A China propôs o envio de 100.000 patos para o combate a 400 bilhões de gafanhotos; neste caso tratava-se de outra espécie: o gafanhoto do deserto, Schistocerca gregaria.

 No Brasil já ocorreram surtos em 1880 (PB, RN), 1917 (RS), 1933-1947 (RS, SE), 1980 (MT) e 1984 (MT). Em MT a espécie presente foi Rhammatocerus schistocercoides. Isoladamente não causam danos expressivos às culturas, sendo consideradas pragas secundárias.

 Esta ameaça pode ser tornar mais frequente. Assim, é conveniente desenvolver uma estratégia permanente contra o problema.

 Em 2 de julho de 2020 está prevista videoconferência envolvendo especialistas e representantes dos Ministérios de Agricultura do Brasil, da Argentina e do Uruguai, com o objetivo de alinhar ações de combate à praga. A FAO/ONU também será envolvida, já que a instituição mantém um programa internacional de combate a gafanhotos. 

Sobre o CCAS

O Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicílio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto.

 O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.

 Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.

 A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website:http://agriculturasustentavel.org.br/. Acompanhe também o CCAS no Facebook:http://www.facebook.com/agriculturasustentavel.

ARTIGOS RELACIONADOS

Influência da alta do dólar na agricultura

Em 2020 o dólar já teve valorização cambial de cerca de 45% sobre o real, chegando a ser cotado em R$ 5,94, trazendo incertezas ao agronegócio brasileiro.

O solo de volta às suas origens

Adoção de técnicas voltadas para a regeneração e produtividade do solo ganham força nos mercados nacional e internacional, trazendo redução de custos em até 70% e benefícios ao meio.

SENAR/SC atendeu cerca de 65 mil produtores rurais em 2021

O Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar/SC), vinculado à Federação da ...

Insetos ameaçam produção de algodão

Elasmopalpus lignosellus e Scaptocoris castânea. Essas palavras estranhas são bem conhecidas para quem cultiva algodão em todo o país, pois são, respectivamente, os nomes científicos da lagarta elasmo e do percevejo castanho, os principais insetos que atacam a plantação e podem causar a perda total da produção brasileira, hoje, estimada em 7 milhões de toneladas, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui
Captcha verification failed!
Falha na pontuação do usuário captcha. Por favor, entre em contato conosco!