Autores
Paulo Roberto de Camargo e Castro – Professor Titular ESALQ/USP – prcastro@usp.br
Jeisiane Andrade – Mestranda ESALQ/USP
A interação entre insetos e plantas exerce um papel de grande importância para os agroecossistemas, de relevância mútua, que em sua maioria favorece a propagação de diversas espécies de plantas por meio da polinização.
Logo, a interação planta-inseto é dinâmica, podendo oscilar constantemente. Algumas espécies atuam como agentes polinizadores, enquanto outros são denominados pragas, em situações específicas.
Os limites de cada um
A denominação popular praga se refere a uma população abundante da espécie que se alimenta das plantas, interferindo na fisiologia e morfologia do vegetal, por exemplo, e prejudicando o rendimento produtivo, o que tem grande relevância principalmente para espécies de interesse comercial.
Isso fez com que as plantas desenvolvessem diversos mecanismos (exsudação de substâncias voláteis que atraem predadores dos insetos herbívoros, metabólitos secundários, toxinas, além da densidade da cutícula e dos tricomas) para reduzir o ataque de insetos com a ativação de diferentes vias metabólicas no vegetal.
Por exemplo, a aplicação de secreção oral de larvas e também insetos adultos causará pequenos ferimentos mecânicos que serão suficientes para estimular a secreção de compostos como o ácido jasmônico (JA), hormônio vegetal que repele o ataque dos insetos às plantas, ou até para induzir um mecanismo de defesa indireto, como a liberação de outros compostos voláteis que atraem insetos parasitoides que se alimentarão dos insetos-praga.
De acordo com a literatura, foram descritos dois elicitores (indutores de resposta vegetal) conhecidos, os quais estimulam a síntese e liberação de sinais químicos voláteis – são eles a α-glucosidase de lagartas de Pieros brassicae e um derivado de ácido graxo, N– (17-hidroxilinolenoil) -L-Gln (volicitina) de lagartas da beterraba.
Como funciona
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Os glucosinolatos (α-glucosidase) são substâncias liberadas pelas plantas quando essas são submetidas aos danos mecânicos, e estão mais concentradas em tecidos jovens, são conhecidas como substâncias anti-herbivoria. Já as volicitinas são substâncias elicitoras presentes na saliva dos insetos, que aos serem identificadas pelas plantas, estimulam as mesmas à síntese de compostos de defesa.
Porém, os insetos também desenvolveram várias estratégias para transpor as barreiras de defesa das plantas, fazendo com que elas pudessem ser alimentos para seu desenvolvimento e perpetuação da espécie. Por exemplo, ao se alimentar das folhas, a superfície de captação de luz é reduzida e, consequentemente, a fotossíntese será comprometida, fornecendo pouca energia às plantas, logo diminuindo seu rendimento.
Ou então, de forma mais severa, podem atacar o fruto já em desenvolvimento, o que trará prejuízo à produtividade. Pesquisadores da área mostraram que a cultura do algodoeiro, quando atacada por pulgões, sem que sejam tomadas medidas de controle, a produtividade pode ser reduzida em até 44%.
Em campo
Experimentos realizados anteriormente por pesquisadores demonstraram que o efeito de Orthezia praelonga (cochonilha) na fotossíntese de folhas de limoeiro e no efeito de Leucoptera coffeella (mariposa do café) sobre folhas de cafeeiro ‘Obatã’ resultou em correlações negativas crescentes entre infestação (número de escamas por folha ou tecido foliar danificado) e fotossíntese líquida, sugerindo então que quanto maior a lesão, menor a taxa fotossintética.
Outros autores corroboram afirmando que diversas espécies de cigarrinhas causam danos foliares à macieira debilitando de forma permanente a capacidade fotossintética das folhas atacadas. Com isso, faz-se necessário o acompanhamento da infestação das mesmas para realizar um controle eficaz sobre a lavoura, evitando danos futuros.
A análise de crescimento das culturas tem sido amplamente utilizada para a obtenção de parâmetros fisiológicos indicativos de métodos seguros para o aumento da produtividade. Verificou-se que o ataque de Enneothrips flavens em amendoinzeiro provocou redução na taxa assimilatória líquida uma semana após as lesões provocadas nas folhas ainda fechadas.
Além disso, existem espécies que se alimentam das plantas em todos estádios fisiológicos, por exemplo, Myzus persicae e Brevicoryne brassicae, que têm preferência por folhas de diferentes idades em couve de bruxelas, em que colonizam particularmente as folhas novas e velhas, respectivamente. Notou-se que sob déficit hídrico, M. persicae abandona as plantas e B. brassicae passa para as folhas novas.
Atração fatal
Algumas características, como umidade, temperatura e luz, além da abundância de alimentos ricos nutricionalmente e da ausência de inimigos naturais, constituem um ambiente ideal para os insetos. Nesse cenário, os insetos atingem o seu máximo potencial fisiológico para o desempenho de suas atividades biológicas, o que pode levar à destruição completa de lavouras, não somente pelo hábito alimentar, mas também por muitas das vezes serem vetores de doenças.
Pulgões e tripes, por exemplo, podem atuar como vetores de vírus patogênicos de plantas, e nesta situação o uso de coberturas para atrair ou repelir insetos pode ser muito importante para a proteção de plantas contra doenças virais.
Palhada e cor também podem influenciar as espécies de insetos que visitam as plantas. Estudos científicos identificaram que os pulgões podem ser repelidos por cores, como por exemplo, pela cobertura de alumínio, mas em contrapartida, as lesões das frutas aumentaram devido ter atraído a traça-do-tomateiro (Keiferia lycopersicella) e a lagarta Helicoverpa zea.
De acordo com dados da literatura, 17 espécies de cigarrinha pertencentes à subfamília Cicadellinae, são vetores de doenças, além dos Cercopideos, que se alimentam diretamente do xilema das plantas. Esse hábito foi demonstrado em videira e alfafa, que quando submetidas à alimentação por cigarrinhas do agente da doença de pierce no córtex ou floema, não foram infectadas, enquanto a alimentação via xilema contaminou as plantas estudadas.
Decisão assertiva
Com base nesse cenário, fez-se necessário a criação de sistemas que integram diversas atividades para evitar os danos dos insetos às culturas, os quais se tornaram muito importantes para a agricultura brasileira. O método foi denominado Manejo Integrado de Pragas (MIP), cujo princípio é combinar medidas de controle isoladas ou em associação para a condução de uma lavoura sadia pelos agricultores.
A amostragem de pragas é fundamental para o bom funcionamento do sistema, e para tanto, faz-se necessário conhecer as espécies que habitam a lavoura, saber diferenciá-las entre pragas e inimigos naturais, e realizar uma posterior quantificação desses insetos, que são etapas fundamentais para as tomadas de decisões.
Isso permite realizar escolhas assertivas em controlar de forma química (inseticidas) ou com alguma forma alternativa (implantação de armadilhas visuais ou olfativas, com feromônios, por exemplo, cultivares resistentes, controle biológico), selecionar quais são os melhores inseticidas para a situação, visando eficácia de controle, minimizar perdas na produção, além de evitar possíveis resistências dos insetos aos inseticidas.
Cuidado
A maioria dos insetos é bem controlada por pesticidas, porém, em alguns casos especiais os inseticidas permitem escapes parcial ou total de insetos vivos, sendo que o motivo precisa ser analisado, o qual pode ser a aplicação em estádio fisiológico do inseto diferente do recomendado, por exemplo, aplicar um inseticida destinado ao estádio larval dos insetos em insetos adultos, ou também pode acontecer o não controle dos insetos, mesmo seguindo todas as recomendações para a ocasião. Nesse caso, o problema é mais agravante, no qual o inseto está insensível ou resistente ao inseticida.
Esse fato é denominado de resistência de insetos a inseticidas. Na maioria das vezes esse problema é decorrente da aplicação sucessiva do mesmo inseticida (repetindo o mecanismo de ação). Quando constatado o problema, medidas criteriosas e frequentes, como levantamento de pragas semanal ou até diário, aplicação de mais de uma prática de controle, além de rotação do mecanismo de ação de inseticidas, devem ser adotados para um adequado reestabelecimento da sanidade da lavoura.
Em contrapartida, em casos específicos a interação entre inseto e plantas pode ser economicamente favorável aos agricultores, como na fabricação de casulos de seda. O bicho-da-seda, em seu estádio larval, se alimenta exclusivamente de folha de amoreiras frescas para futura tecelagem do casulo. A prática demanda pouco espaço, e o produto obtido é bastante valorizado na indústria têxtil.
Com isso, ressalta-se que, para o sucesso das lavouras, é necessário previamente a qualquer tomada de decisão, levantar todas as hipóteses, como por exemplo, analisar se a infestação causará ou não danos econômicos à lavoura antes de realizar quaisquer pulverizações, por meio da amostragem, identificação e quantificação da população de insetos presentes na lavoura.
Recomenda-se, ainda, analisar posteriormente todas as alternativas de controle, de acordo com a necessidade da área, em função dos insetos infestantes, e também de acordo com a disponibilidade no nível de investimento do agricultor, pois uma técnica altamente sofisticada e dispendiosa não resolverá os problemas para alguém que não esteja disposto ou em condições de custeá-la.
Portanto, vale considerar um amplo espectro de soluções, desde a mais simples à mais elaborada, e para isso o auxílio de um engenheiro agrônomo é fundamental e valioso.