Letícia Galhardo Jorge – Bióloga e doutoranda em Botânica/Fisiologia Vegetal – IBB/UNESP – leticia_1307@hotmail.com
Bruno Novaes Menezes Martins – Engenheiro agrônomo, doutor em Agronomia/Horticultura – FCA/UNESP e professor – Centro Universitário Sudoeste Paulista (UNIFSP) – brunonovaes17@hotmail.com
Independente da cultura a ser conduzida, o manejo da agricultura tem seguido cada vez mais critérios de redução no uso de defensivos agrícolas, diminuindo a possibilidade de causar impactos ambientais significativos. Nesse contexto, algumas alternativas de cultivo podem ser adotadas a fim de possibilitar uma agricultura menos impactante ao meio ambiente e mais eficiente em produtividade.
As substâncias húmicas (SH) são moléculas complexas, encontradas em todos os ecossistemas do planeta, e estão presentes nos solos, sedimentos e ambientes aquáticos. Essas são oriundas da decomposição de resíduos vegetais e animais do ambiente, que podem ser utilizadas como insumos alternativos para o manejo de diversas culturas.
Suas propriedades químicas, microbiológicas e físicas podem garantir um incremento na produtividade em decorrência dos benefícios que promove para a estrutura física e química do solo e para o metabolismo da planta, o que inclui o desempenho fotossintético vegetal.
Ação e reação
As SH são responsáveis por causar uma série de benefícios aos vegetais, dentre eles: aumentar o movimento e absorção de íons; incrementar a respiração e a velocidade das reações enzimáticas do ciclo de Krebs; promover alta produção de ATP nas células radiculares; aumentar os níveis de clorofila e a síntese de ácidos nucleicos; aumentar ou reduzir a atividade de diversas enzimas, afetando a dinâmica do NH4+ no solo, etc.
Ainda, no solo são capazes de produzir efeitos físicos, químicos e biológicos, refletindo diretamente no meio ambiente. Dentre esses efeitos, destacam-se:
• Melhoram a estrutura do solo, ajudando na infiltração e absorção de água, além de facilitar a aeração do perfil;
• Estimulam o crescimento e a proliferação de microrganismos desejáveis no solo;
• Estimulam a atividade enzimática das plantas;
• Melhoram a tolerância natural das plantas contra as doenças e pragas;
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• Estimulam o crescimento de raiz, principalmente em profundidade;
• Promovem o desenvolvimento da clorofila, açúcares e aminoácidos nas plantas, estimulando seu crescimento e o aumento de produção.
• Condicionam o pH dos solos ácidos e alcalinos para neutralidade;
• Melhoram e aperfeiçoam a absorção de nutrientes e água pelas plantas;
• Retêm os fertilizantes inorgânicos solúveis em água nas zonas das raízes e reduzem a lixiviação;
• Promovem a conversão de elementos nutritivos em formas disponíveis para as plantas;
• Melhoram a absorção de N pelas plantas;
• Diminuem a formação de nitratos;
• Reduzem a reação de fósforo com Ca, Fe, Mg e Al;
• Liberam gás carbônico do carbonato de cálcio do solo e habilitam seu uso na fotossíntese.
O fato mais marcante resultante da ação dessas substâncias nos vegetais é o aumento do crescimento radicular, fato este que influencia os processos de absorção de nutrientes. Além disso, as SH são capazes de estimular o metabolismo primário, possuindo efeito direto no crescimento.
Sabe-se que a assimilação de carbono e nitrogênio é fundamental para o crescimento vegetal.
Pesquisas
Estudos mostram que as SH derivadas da decomposição da lignina estimulam o aumento do conteúdo de clorofila, assim como a atividade da rubisco, podendo influenciar positivamente no desempenho fotossintético das plantas.
A atividade das enzimas glutamina sintetase e glutamato sintase também são aumentadas, sendo que estas são chaves para assimilação do nitrogênio. O aumento do teor de clorofila confere à planta maior capacidade de absorção luminosa, o que estimula a maquinaria fotossintética, incluindo a rubisco, conferindo maior ganho de carbono.
Maior ganho de carbono é importante para abastecer a planta com carboidratos, atuando como esqueletos de carbono para a síntese de outros compostos e também para a geração de energia de suas ligações.
Junto com o ganho de carbono, a assimilação de nitrogênio contribui para o crescimento dos órgãos e aumento da massa seca. O crescimento da raiz deverá, a longo prazo, refletir no aumento da produtividade. Sendo assim, as substâncias húmicas podem melhorar o crescimento, em parte por modificar estes processos.
Investimento x retorno
Quanto às recomendações de uso, dependerá do produto escolhido pelo produtor. Existem, no mercado, diversas formulações, podendo ser aplicadas durante o preparo do solo em área total, de forma localizada, por meio de pulverizações ou até mesmo por fertirrigação.
Vale destacar a importância de testes preliminares de doses de respostas em plântulas de beterraba antes da aplicação a nível de campo. O custo dependerá do tamanho da área e também da dose que será utilizada.
Resultados
Existem diversas culturas em que o uso de ácidos húmicos e fúlvicos vem sendo testado. Alguns estudos mostram grande eficiência na produtividade da cana-de-açúcar, por exemplo, visto que promove um maior desenvolvimento vegetativo, proporcionado por um sistema radicular mais vigoroso e amplo, com maior exploração do volume do solo.
Além disso, há evidências de que parcelas que receberam as substâncias húmicas apresentaram menos sintomas dos efeitos da estiagem em relação às parcelas sem este insumo, além de aumento da produtividade, da produção de açúcar total recuperável (ATR) por unidade de área, maior número de perfilhos, maior diâmetro e maior peso dos colmos em relação às áreas sem estas substâncias.
No cultivo de soja e milho, existem alguns estudos que comprovam o benefício do uso dessas substâncias na produtividade destas culturas. Efeitos positivos para a cultura da soja foram observados, quando manejada em solos orgânicos constituídos de substâncias húmicas, demonstrando aumento da produtividade (9-21%), do teor de proteínas (4-9%) e do peso das sementes (5-14%), devido ao melhor uso da água e dos nutrientes disponíveis no solo.
Cultivos beneficiados
Em milho, o tratamento com substâncias húmicas de pequeno tamanho molecular induziu a um maior acúmulo de nitrato nas folhas, em função do aumento de sua absorção pelas raízes e transporte para as folhas.
Com o uso da mistura líquida húmica com ácidos húmicos em solos para o cultivo de batata, em conjunto com adubos minerais, obteve-se ganho produtivo entre 13 e 17% em relação ao cultivo sem o uso destas substâncias, além de promover maior absorção de nitrogênio, fósforo, potássio e magnésio pelas plantas.
Em tomateiro, houve aumento da firmeza dos frutos com aplicações pós-transplantio de substâncias húmicas junto com substratos. O uso de ácidos húmicos (20 mL L-1) via foliar, na cultura do tomate, em cultivo protegido, resultou em maior ganho na produtividade, já que ocorreu um aumento no tamanho das folhas e, consequentemente, aumento do número de frutos por planta, maior diâmetro e peso dos frutos.
Em pimenta, o uso de ácidos húmicos no solo e via foliar resultou em maior peso médio dos frutos e maior acúmulo de clorofila.