Pesquisa pioneira da Embrapa Semiárido (PE) resultou no desenvolvimento do porta-enxerto BRS Guaraçá, primeira cultivar resistente ao nematoide-das-galhas (Meloidogyne enterolobii), principal patógeno da goiabeira no Brasil.
A tecnologia já está disponível aos produtores, que podem adquirir as mudas por meio dos viveiristas credenciados pela Embrapa.
Seleção
O porta-enxerto foi gerado após dez anos de pesquisas, que envolveram a seleção e a avaliação de centenas de genótipos de goiabeiras e araçazeiros (planta silvestre da mesma família das goiabeiras), coletados por todo o País, bem como o trabalho de cruzamento de plantas e melhoramento genético.
A cultivar BRS Guaraçá, híbrido resultante desse cruzamento, possui alta resistência ao nematoide-das-galhas e compatibilidade com grande parte das variedades comerciais de goiabeira, tais como a Paluma, Suprema, Pedro Sato, Rica, Século XXI e as do grupo Cortibel.
Os estudos foram conduzidos pelos pesquisadores Carlos Antonio Fernandes Santos, José Mauro da Cunha e Castro e José Egídio Flori, da Embrapa.
Os resultados em campo mostraram que a tecnologia apresenta bom pegamento do enxerto e desenvolvimento de copa, além de produção em torno de 40 toneladas de frutas por hectare, em colheitas realizadas 30 meses após o transplantio, segundo explica Carlos Santos.
“Com o porta-enxerto, é possível o manejo da produção em áreas até então infestadas pelo nematoide, viabilizando novamente a exploração da cultura nesses locais. A difusão da tecnologia junto aos produtores pode ajudar o Brasil a retornar a condição de grande produtor mundial de goiaba, contornando o impacto que o nematoide-das-galhas causou à produção nacional da fruta”, considera.
O porta-enxerto BRS Guaraçá já está sendo comercializado por viveiristas credenciados. A lista e os contatos, bem como outras informações sobre o material, estão disponíveis na página da Embrapa.
Nematoide reduz produção da goiaba gradualmente
O empresário José Mauro da Silva, do viveiro credenciado Sítio São João II, em Taquaritinga (SP), acredita que o BRS Guaraçá “poderá salvar a cultura da goiabeira no Brasil”. Ele relata que, na maioria das lavouras atacadas pelo nematoide, a produtividade cai ano após ano, mesmo que ele use métodos paliativos para conter o problema.
“Uma hora, a lavoura se torna inviável. Os produtores que realmente conhecem o problema e já sabem da tecnologia da Embrapa, e não esperam chegar ao fim para iniciar um plantio,” relata o viveirista.
Ele pontua ainda que, mesmo cultivando em áreas onde ainda não há relato de nematoide, o risco de contaminação é grande devido ao trânsito de veículos, maquinários, implementos, material de colheita e dos próprios trabalhadores da área. “Atualmente, é muito difícil conter a praga. Contudo, é possível conviver com ela se o pomar for formado por mudas tendo como porta-enxerto a cultivar BRS Guaraçá”, completa.
Impacto do nematoide
Responsável por prejuízos superiores a R$ 400 milhões nos últimos anos, o nematoide é amplamente disseminado em território nacional, sendo registrado atualmente em todos os Estados onde se produz goiaba.
“Como o próprio nome diz, o nematoide-das-galhas leva ao engrossamento das raízes e formação de galhas, que perturbam a fisiologia da planta e, no caso da goiabeira, levam à morte da planta em um período relativamente curto”, explica José Mauro Castro.
“O nematoide, quando infecta as raízes da goiabeira, injeta substâncias tóxicas, ao mesmo tempo em que suga nutrientes da seiva. Ele passa a ser um concorrente da planta no seu processo de produção de frutos. Além disso, a infecção das raízes pelo nematoide abre porta para a entrada de outros patógenos, como o fungo Neocosmospora falciformis (sin. Fusarium solani), que causa o apodrecimento das raízes”, acrescenta.
Atualmente, o porta-enxerto BRS Guaraçá se apresenta como a única opção viável para o controle do nematoide-das-galhas em goiabeira no Brasil. Os métodos de controle biológico, manejo integrado e aplicação de inseticidas possuem resultados limitados ou ineficientes para controle desse patógeno.
É importante destacar, no entanto, que o porta-enxerto não é imune, mas tem altíssima resistência ao nematoide. “O sistema radicular do BRS Guaraçá não é isento da formação de galhas, mas, quando isso acontece, elas são formadas em número muito menor, que não chega a comprometer a produção”, completa Castro.
Opinião do setor produtivo
Apesar de os plantios comerciais ainda serem recentes, o desempenho das cultivares com o porta-enxerto BRS Guaraçá em áreas contaminadas pelo nematoide tem sido bastante satisfatório, segundo relatos do setor produtivo.
Para Haroldo de Carvalho Neves, proprietário do viveiro São Francisco Mudas, em Petrolina (PE), a tecnologia é decisiva para a região do Vale do São Francisco, “que tem solos predominantemente arenosos, onde os nematoides chegam muito precocemente e degradam com rapidez”.
O viveiro começou a comercializar o BRS Guaraçá no final de 2021, momento em que as plantas matrizes foram adquiridas da Embrapa. Em 2022, foram disponibilizadas 28 mil mudas aos produtores e para 2023, a expectativa é chegar a 80 mil mudas comercializadas.
“O BRS Guaraçá deu um incremento muito grande ao desenvolvimento da produção aqui no Vale. Já existe bastante demanda, o pessoal vem conhecendo o porta-enxerto e a tendência é de crescimento, inclusive, já estamos enviando mudas enxertadas para outros Estados por transporte aéreo”, revela o viveirista.
Um dos produtores satisfeitos é Antônio Carlos Rodrigues, do município de Casa Nova, na Bahia. Ele plantou mudas de Paluma enxertadas em BRS em uma pequena área e já está caminhando para a terceira colheita. “Coloquei, inicialmente, 300 plantas para testar e estou tendo bons resultados. É um material resistente, que tem boa produção e também um manejo similar ao das plantas que não são enxertadas”, relata.
A atividade deu tão certo que o agricultor já iniciou a expansão da área. “Recentemente, plantei mais 400 mudas com o porta-enxerto. Todas pegaram de primeira. Até o momento, não tenho nenhum problema com os nematoides”, declara.
A importância de adquirir mudas de qualidade
Os pesquisadores ressaltam que, para o sucesso da atividade, é muito importante que o produtor tenha a consciência de adquirir mudas enxertadas sobre o BRS Guaraçá. A cultivar foi licenciada pela Embrapa a seis viveiristas, sendo três em Pernambuco, um Espírito Santo, um no Paraná e um em São Paulo.
“A listagem pode ser encontrada no site da Empresa. Esses são os únicos autorizados a fazer a reprodução do material, que é um híbrido e que, por isso, não se multiplica por sementes”, destaca Rodrigo Flores, gestor de ativos da Embrapa.
Para que o produtor tenha a segurança de adquirir mudas formadas sobre o porta-enxerto oriundo da matriz da Embrapa, portanto, com qualidade genética, todo o processo de venda e compra deve ser documentado, acompanhado da nota fiscal e do termo de conformidade.
“Qualquer muda que não tenha essa documentação é passível de multa, apreensão e destruição, valendo tanto para quem comercializa quanto para quem adquire material não oficial”, alerta Flores.
Nesse sentido, a fiscalização é muito importante para reduzir a fonte de materiais não licenciados. Em caso de dúvidas quanto à origem do material a ser adquirido, o produtor deve entrar em contato com a Embrapa por meio do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC).