Rafael Rosa Rocha
Engenheiro agrônomo e mestrando em Ambiente e Sistemas de Produção Agrícola – Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT)
Mozart Sávio Pires Baptista
Biólogo e mestre em Evolução e Diversidade – Universidade Federal do ABC (UFABC)
Filipe Lemos Jacques
Engenheiro agrônomo e doutorando em Produção Vegetal – Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)
A correção de solo tem como objetivo principal estabelecer o equilíbrio entre cátions e íons no solo, disponibilizando nutrientes para que as plantas se desenvolvam de forma saudável, o que possibilita o alcance do seu máximo potencial produtivo, ao mesmo tempo que evita e/ou diminui ataques de pragas e doenças.
Por meio da análise de solo pode-se saber como está a saúde do solo, e assim determinar de forma correta o tipo de correção necessária. Contudo, esta prática tem sido historicamente negligenciada quando se trata de espécies florestais, pois estas são consideradas mais tolerantes.
Atualmente, sabe-se que realizar a correção do solo antes do plantio e periodicamente ao longo dos anos gera aumento de produtividade em termos de biomassa e tempo de uso do solo. Assim, as metodologias de correção do solo têm recebido cada vez mais atenção para culturas perenes.
A correção do solo
Em sua maioria, os solos brasileiros são considerados naturalmente ácidos, basicamente pela presença dos íons H+ e Al+3. Os acúmulos desses íons têm sua origem pela lixiviação dos nutrientes do solo, pela decomposição de resíduos orgânicos e pela liberação de ácidos orgânicos das raízes das plantas, podendo ser causado tanto por processos geológicos quanto contemporâneos.
A maior parte dos solos brasileiros é antiga e intemperizada. Por milhares de anos os nutrientes “escoaram” do perfil do solo, principalmente pela ação das chuvas, tornando-os ácidos e pobres em nutrientes.
De acordo com Eurípedes Malavolta, grande pesquisador brasileiro de Ciências do Solo, a faixa ideal de pH onde os nutrientes do solo tornam-se mais disponíveis para as plantas está entre 6,0 e 6,5. Na região dos Cerrados, por exemplo, onde concentram-se as maiores áreas agrícolas do País, o pH do solo varia de 3 a 6, ou seja, muito ácidos.
Então, para um bom desenvolvimento, as plantas necessitam de um solo que forneça todos os nutrientes essenciais em quantidades suficientes para atender sua demanda durante todo seu ciclo de cultivo. Sendo assim, para suprir essa demanda, a maioria dos solos necessita de correção de acidez e adubação.
A correção dos solos é feita pela calagem e/ou gessagem, que são práticas onde é feita a incorporação de calcário e gesso na superfície do solo. O calcário atua neutralizando íons H+ e Al+3 nas camadas superficiais, elevando o pH do solo, e fornecendo cálcio e magnésio.
Já o gesso agrícola, que nada mais é que um subproduto da produção do fertilizante superfosfato, é responsável pela neutralização do Al+3 nas camadas mais profundas do solo e também por fornecer cálcio e enxofre, nutrientes importantes para o desenvolvimento das raízes das plantas. Então, qual a importância dessa correção?
Benefícios proporcionados
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Ao reduzir a acidez do solo e fornecer suprimento de cálcio e magnésio, há uma melhoria no aproveitamento de nutrientes pela planta. Tais elementos são fundamentais para o crescimento das raízes, incrementando a absorção da água e dos nutrientes presentes no solo. Além disso, a correção do solo agrega uma série de outros benefícios, como a redução dos efeitos tóxicos causados pela presença do alumínio e manganês, que prejudicam o desenvolvimento radicular.
Este processo ocorre em conjunto com a liberação do fósforo (um dos três principais nutrientes exigidos em maiores quantidades pelas plantas) retido pela acidez original do solo. A consequente melhoria na qualidade química do solo contribui para a manutenção e proliferação de uma comunidade biológica mais saudável (e. g., microrganismos, anelídeos, etc.), aumentando o teor de matéria orgânica e alterando propriedades físicas, como a compactação.
Por fim, a prática atua como fertilizante, potencializa o efeito de outros fertilizantes e auxilia na ação dos defensivos agrícolas, que atualmente são um dos itens mais caros na cadeia do agronegócio, melhorando a resposta fisiológica das plantas após ataques de pragas e doenças.
Deste modo, os benefícios da correção do solo atuam diretamente sobre o aumento da produtividade agrícola, resultando em melhores rendimentos para os agricultores.
Manejo
A análise do solo é essencial para estabelecer as quantidades de corretivos e fertilizantes a serem aplicados. Seus principais objetivos são elevar ou manter os teores dos elementos no solo em faixas ideais e diagnosticar problemas de toxidez de alguns elementos, maximizando o retorno econômico.
A amostragem do solo mal conduzida é geralmente o erro mais significativo, porque não pode ser corrigido nas fases seguintes. Desta forma, destaca-se a importância da orientação técnica de um profissional habilitado.
Recomenda-se que a coleta do material seja representativa e a área seja a mais homogênea possível. Primeiramente, deve-se dividir a propriedade em glebas de até 10 hectares, levando em conta aspectos como a vegetação, posição topográfica, características do solo (como cor, textura, condição de drenagem e outros) e o histórico da área.
Em seguida, amostras de solo devem ser coletadas nas camadas de 0 a 20 cm e 20 a 40 cm, evitando proximidade de trilhas, formigueiros, brejos, removendo folhas e outros detritos. Para análise, necessita-se de dois tipos de amostras: simples e compostas.
Amostras simples correspondem ao volume coletado em um ponto da gleba e a amostra composta é a mistura homogênea das várias amostras simples coletadas na mesma gleba. É necessário separar em torno de 500 gramas de solo das amostras compostas para que o laboratório possa realizar as determinações analíticas.
Após a análise laboratorial, o especialista interpretará os resultados e fará as recomendações de correção com o planejamento e execução do programa. Nessa etapa, deve-se fazer cotações dos corretivos e fertilizantes, programar compras, armazenamento, etc. A execução de cada prática (calagem, gessagem, fosfatagem, potassagem, correção de micronutrientes, correção da matéria orgânica) dependerá dos resultados obtidos para cada gleba.
Ponto de partida
O processo de correção geralmente se inicia com a calagem, que é a intervenção mais importante nos solos brasileiros. A calagem deve ocorrer com, no mínimo, três meses de antecedência ao plantio da cultura, sendo que metade da dose recomendada deve ser aplicada antes da aração e o restante após esta operação, incorporada na gradagem.
A aplicação do calcário não deve ocorrer imediatamente antes do plantio, porque demanda tempo para reagir com o solo e corrigir suas características indesejadas. As reações químicas de dissociação e neutralização que ocorrem com o calcário dependem do contato direto entre o corretivo e as partículas do solo e, por isso, não trazem o resultado esperado logo após a aplicação.
A frequência da realização da calagem depende, no entanto, do resultado da análise de solo da propriedade. Com o passar dos anos ou safras, o solo volta a acidificar naturalmente. Desta forma, podem ocorrer aplicações sucessivas em uma mesma área, sempre que necessário.
Na ponta do lápis
O cálculo da necessidade de calagem é feito com base nos teores de saturação por bases (V%) e de cálcio e magnésio da área em que será aplicado. A V% é um excelente indicativo da fertilidade do solo, pois corresponde à porcentagem da capacidade de troca de cátions (CTC) que é ocupada por nutrientes catiônicos (cálcio, magnésio e potássio).
Assim, a recomendação é baseada na V% atual e no que se espera alcançar. Os valores de V% esperados diferem para cada cultura. Por exemplo, para o eucalipto em diferentes ambientes de cultivo tem sido discutida uma variação de 40% (Barros e Novais, 1999) a 50% (Furtini Neto et al., 2004). Além disso, utiliza-se também a CTC do solo e o PRNT (Poder Relativo de Neutralização Total) do corretivo utilizado. O PRNT é um indicativo da qualidade química do calcário e está relacionado a sua eficiência relativa em relação ao carbonato de cálcio (CaCO3), se aplicado puro. Portanto, quanto maior este valor, menor o tempo necessário para sua reação no solo. Em geral, os teores médios de PRNT estão próximos a 80%.