Um acordo para promover o etanol do Brasil no mercado internacional foi assinado entre a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportação e Investimentos (ApexBrasil) durante a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2023, a COP28, em Dubai, no fim do ano passado. O convênio deverá facilitar reuniões, eventos e missões entre o Brasil e países do Sul Global, principalmente da África e Ásia.
As ações devem começar entre o fim do primeiro e o início do segundo semestre deste ano. Os países que o projeto irá priorizar neste primeiro momento são, no continente africano, Angola, África do Sul, Moçambique, Quênia e Etiópia, além dos asiáticos Indonésia, Índia, Tailândia, Paquistão, Filipinas e Vietnã. Alguns países árabes podem ser inseridos em um segundo momento. Assinaram o documento na ocasião Jorge Viana, presidente da ApexBrasil, e Evandro Gussi, presidente e CEO da Unica.
Em entrevista à ANBA, Gussi (foto acima) disse que o etanol tem papel relevante em complementar a descarbonização da matriz global de transportes. “Essa não é uma ideia nossa, isso quem diz é a Agência Internacional de Energia, que diz que a bioenergia – na qual o etanol está inserido – precisa triplicar até 2030 para que possamos realizar a transição energética“, disse.
Para isso acontecer, Gussi afirmou que será preciso ter “várias rotas tecnológicas capazes de entregar redução de emissões, de entregar descarbonização, e, com isso, vencer o grande desafio da humanidade no século 21“.
O CEO diz que os biocombustíveis cumprem um papel muito relevante no Sul Global, em que os países africanos e árabes estão inseridos. “Por quê? O etanol, quando produzido com sustentabilidade, como fazemos no Brasil e como ele tem sido produzido no mundo, ou seja, sem desmatamento e sem competição com alimentos, é extremamente eficaz na redução das emissões, reduzindo até 90% das emissões em comparação com a gasolina”, informou.
Outro ponto importante que Gussi frisou foi o fato de que o etanol não demanda nenhum tipo de investimento ou mudança na infraestrutura já existente dos países, diferente das centenas de bilhões de dólares em investimento necessárias para se ter uma frota de carros elétricos.
“Se hoje eu pegar um país africano, um país árabe, e começar a fazer mistura de etanol na gasolina, eu não preciso mudar a infraestrutura. Aquele mesmo posto de combustível, aquele mesmo tanque de combustível, aquela mesma bomba de combustível que hoje põe uma gasolina sem etanol pode amanhã começar a colocar gasolina com 10% de etanol, com 20% de etanol e já começar a fazer redução de emissões imediatamente, porque nossos estudos mostram que até 20% de mistura [de etanol na gasolina] se pode fazer com carros no mundo inteiro – isso, falando só de veículos que não são flex”, contou o CEO.
A gasolina no Brasil hoje contém 27% de etanol, segundo o executivo. “Então a primeira parte do nosso conceito do projeto da ApexBrasil é que o etanol é uma solução rápida, fácil e barata para trazer a descarbonização imediatamente“, declarou.
A gasolina no Brasil hoje contém 27% de etanol, segundo o executivo. “Então a primeira parte do nosso conceito do projeto da ApexBrasil é que o etanol é uma solução rápida, fácil e barata para trazer a descarbonização imediatamente“, declarou.
A primeira parte do trabalho do acordo, portanto, será exportar o conceito para que os países possam produzir o quanto for possível do seu próprio etanol, segundo Gussi. “Então uma das mensagens que temos levado ao Sul Global é: Você tem condições de produzir etanol? Produza. Você estará reduzindo as emissões, não causará nenhum tipo de dano ao veículo, aos motores. Em geral, se o país é importador de petróleo vai melhorar sua balança comercial, vai gerar emprego, renda no campo, na cidade, e tendo uma solução que não vai importar em bilhões de dólares para a sociedade pagar de infraestrutura”, disse.
Os países árabes não foram inseridos no projeto inicialmente porque “são países em que a produção de etanol é mais desafiadora, por serem países desérticos”, disse Gussi.
O CEO disse que o projeto quer, a princípio, “garantir o mínimo de suprimento no continente africano para que eles tenham o máximo de segurança energética possível, de modo a ter esse segundo ponto, de exportação do etanol brasileiro para esses países”. O Brasil exporta hoje cerca de 3% da produção, sobretudo para os Estados Unidos e Europa, segundo Gussi. “Mas com o caráter emergencial que o tema das mudanças climáticas tem assumido, a tendência é que isso se intensifique”, declarou.
Um terceiro passo seria o de incentivar as indústrias automobilísticas daqueles países a apostarem nos carros flex. “As grandes montadoras [no Brasil] têm apostado nos carros flex [aqueles movidos por etanol e gasolina], como a Toyota, Volkswagen, o grupo Stellantis – que tem marcas como Fiat, Chrysler, Jeep. Essas montadoras já se posicionaram publicamente dizendo que o etanol é parte da solução e em uma parte importante do mundo ele vai ser uma solução complementar extremamente relevante”, disse.
Carros elétricos
“Não sou contra a eletrificação, nós vamos precisar de todas as rotas tecnológicas para fazer a descarbonização. Mas o que eu posso dizer é que o etanol é rápido, fácil e barato”, disse Gussi. Para ele, em muitos países, principalmente na Europa, o carro elétrico vai ser a melhor opção. “Mas vai ter um pedaço relevante do mundo – que é objeto do nosso interesse – que é o Sul Global, que não é uma solução factível ou inteligente para isso”, disse.
No Brasil, segundo o cálculo da Empresa de Pesquisa Energética, seria preciso haver um investimento entre US$ 220 bilhões e US$ 300 bilhões para que o País pudesse ter uma rede de recarga de energia robusta para ter uma parcela da frota de carros elétricos.
“Isso é um desafio para o Brasil, mas é um desafio para todos os países do Sul Global, no qual o continente africano está e no qual uma parte dos países árabes também está. Enquanto o etanol traz descarbonização sem depender de investimento em infraestrutura, ele pode começar a ser utilizado em até 20% na frota circulante, ou seja, nos carros que já estão rodando”, disse.
Gussi lembrou que muitos países africanos e asiáticos sofrem com insegurança energética, com apagões constantes. “Eles já têm dificuldade de eletricidade hoje, então levar mais demanda de eletricidade a esses países não é uma solução inteligente. Por isso que o etanol vai levar a descarbonização sem comprometer e sem aumentar a demanda por eletricidade, que já é um problema”, declarou.
Assinatura na COP28
Para Gussi, a assinatura do acordo foi um momento marcante. “A ApexBrasil e nós [Unica] decidimos fazer essa assinatura por ocasião da COP28 em Dubai, um movimento tão importante em que um dos maiores produtores de petróleo do mundo chamou para si a Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas, mostrando que esse tema da descarbonização, da proteção ambiental, não tem fronteiras, todos somos responsáveis”, disse.
Com o convênio com a ApexBrasil, Gussi disse que o setor vai ganhar força para realizar eventos, reuniões bilaterais e estudos técnicos fora do Brasil, além de receber delegações estrangeiras para mostrar como o Brasil se desenvolveu nesse setor nos últimos 50 anos.
“O acordo vai ser importante para que a gente possa levar a esses países, a partir de eventos, chamados Etanol Talks, e a partir da recepção de missões internacionais aqui no Brasil, para que eles possam entender o que o Brasil fez. Porque o Brasil, hoje, é considerado o principal modelo de utilização de biocombustíveis no mundo, e de etanol no mundo, então nós temos levado essa história e vamos continuar levando, com apoio da ApexBrasil, essa história para esses países que estão no nosso radar, e queremos receber países aqui para mostrar, na prática, como o Brasil tem endereçado esses temas”, explicou.