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Armazenamento de uvas em câmara fria

Autores

Lucas Pereira da Silvalucassilvapee@gmail.com

Ana Cláudia da Silva Mendonça / Bruna Cristina de Andrade

Engenheiros agrônomos e mestrandos em Agronomia – Universidade Estadual de Maringá (UEM)

Uva – Crédito: Shutterstock

A viticultura brasileira apresenta características únicas em cada região onde é produzida, como por exemplo, ciclos de produção, época de colheita e tipo de produto. Além disso, a atividade representa uma importante fonte de renda para pequenas propriedades e também contribui para a sustentabilidade por meio de investimentos realizados por empresas que geram empregos e renda (Mello, 2019).

Segundos dados disponibilizados pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), no ano de 2018 a produção de uvas no Brasil foi de 1.592.242 toneladas, sendo a região sul a mais representativa na produção do fruto, com 937.989,7 toneladas produzidas, seguido pela região nordeste, com 501.874,67 toneladas do fruto. 

Nos últimos anos ocorreram avanços importantes no setor, tais como a adoção de novas cultivares, uso de práticas e processos mais sustentáveis, diversificação da produção e expansão em novas regiões. No entanto, o setor ainda carece de informações determinantes. Neste contexto, dentre os diversos fatores importantes na cadeia produtiva da uva destaca-se o armazenamento em câmara fria. 

Colheita e pós-colheita

O ponto de colheita é diferenciado conforme o tipo e destino da uva a ser produzida. A uva de mesa, destinada ao consumo in natura, tem seu ponto de colheita determinado pelas normas internacionais de comercialização de uvas, sendo estabelecido um teor mínimo de sólidos solúveis de 14 °Brix.

Já a colheita de uvas destinadas à vinificação, segundo a legislação brasileira que determina as regras para a produção, os vinhos de mesa devem ter entre 10 e 13°GL. Considerando que são necessários 18 g/L-1 de açúcar na uva para a obtenção de 1°GL de álcool, então, para um vinho conter 10°GL ele deverá ser elaborado com uvas contendo pelo menos 180 g L-1, ou seja, 18 °Brix (Antoniolli et al. 2008).

Para a uva de mesa, a fase de colheita do fruto é determinante, uma vez que são recomendados inúmeros cuidados, tais como: reduzir o manuseio das bagas durante a colheita, pois existe sobre as bagas uma cera natural, denominada pruína, cuja função básica é servir de proteção.

O simples contato com as mãos promove a remoção dessa cera, o que torna o fruto mais suscetível à perda de água por transpiração. Outra recomendação é acondicionar os frutos colhidos em caixas de plástico, em camada única e posicionados sempre com o pedúnculo para cima, de forma a impedir que danifiquem outros cachos e a facilitar o posterior manuseio.

Não é recomendada a lavagem dos frutos, uma vez que pode causar danos à cultura ao invés de proporcionar benefícios.

Já a uva destinada à vinificação não requer o mesmo nível de cuidado que a uva de mesa, mas alguns procedimentos são essenciais para que se obtenha um produto de elevada qualidade: colheita preferencialmente manual e no período da manhã, seleção dos cachos, utilização de contentores plásticos limpos, transporte rápido e cuidadoso até a vinícola e curto período de espera para processamento.

Então, os frutos que são selecionados e colocados em caixas devidamente condicionados, antes de serem destinados ao pré-resfriamento devem ser organizados em paletes, uma vez que são ideais para movimentação e estocagem. O palete padrão brasileiro apresenta dimensões de 1,00 m x 1,20 m (Antoniolli et al. 2008).

Pré-resfriamento

O pré-resfriamento consiste em retirar o calor do fruto que vem do campo. Exige equipamentos adequados, tais como túneis de ar forçado, afim de que o fruto atinja a temperatura ideal próxima à de armazenamento.

É uma operação totalmente distinta do armazenamento refrigerado, e serve única e exclusivamente para retirar o calor de campo, que em alguns casos a polpa do fruto atinge temperaturas muito superiores às recomendadas para armazenamento. O pré-resfriamento é recomendado para uvas de mesa por reduzir a desidratação do engaço e o escurecimento e amolecimento das bagas.

Resfriamento em câmara fria

Após o pré-resfriamento, os frutos são encaminhados às câmaras frias, e após submetidos à cadeia de frio, que não deve ser mais interrompida. Assim, posteriormente, os frutos, ao saírem da câmara fria para o carregamento dos contêineres, a execução deve ser rápida e em local construído para este fim, de modo a manter a temperatura de armazenamento o quanto menos instável (Embrapa Semiárido, 2010).

As condições ideais para o armazenamento de uvas de mesa é de 0 a 2°C de temperatura, com uma umidade relativa de 90 a 95%. Vale salientar que, sob temperaturas de aproximadamente -1ºC, a uva pode sofrer injúria e sob valores inferiores, os tecidos da baga serão congelados.

O tempo esperado de armazenamento é de no mínimo 60 dias para uvas finas de mesa. Essas, quando destinadas à exportação, são mantidas em resfriamento até durante o translado no contêiner.

Quando não respeitado ou mantido o resfriamento dos frutos, a qualidade pode ser comprometida, pois pode ocorrer a desidratação do engaço. Além disso, incorrem prejuízos à aparência do cacho, mas sem perda do sabor e de outras características de qualidade, como turgidez e brilho.

Essa desidratação pode ocorrer no período de três a cinco dias, dependendo das condições em que a uva for mantida. Somente quando o engaço estiver totalmente seco é que são percebidas alterações de textura, brilho e sabor (Antoniolli et al. 2008).


Redução de perdas durante o resfriamento

Diversas medidas são cruciais no processo de resfriamento de frutos, de modo que para a garantia do sucesso, todos devem ser seguidos à risca. Aqui citaremos os pontos mais importantes, segundo a Embrapa (2010):

• Evitar o armazenamento de uvas sobremaduras ou com sinais de desidratação (murchas ou com estrias);

• Controlar os limites de temperatura, uma vez que elevações na temperatura favorecem a condensação de água sobre o cacho e, consequentemente, o desenvolvimento de microrganismos que possam vir a degradar os frutos. Já condições de redução drástica na temperatura podem causar o congelamento das bagas, fazendo com o que os frutos percam a aparência translúcida e aquosa.

• Evitar a variação de UR (Umidade Relativa), de modo que fique estável, já que a redução da UR pode vir a acometer o ressecamento do engaço e do pedicelo.

• Controlar os níveis de SO2 (dióxido de enxofre) dentro do compartimento de resfriamento. O SO2 é utilizado comercialmente em uvas de mesa para o controle de podridões em pós-colheita. Entretanto, o simples contato do mesmo com os frutos pode causar perda de coloração das bagas e engaços, reduzindo assim o valor comercial dos frutos.

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• Manter controle dos lotes armazenados, amostrando-os e avaliando-os quanto à qualidade.

Fungos a ser evitados em câmara fria

O fungo causador da podridão-cinzenta, ou mofo-da-uva, é denominado Botrytis cinerea. Este fungo fitopatogênico desenvolve-se em umidade elevada e em uma ampla faixa de temperatura, podendo infectar os cachos desde o campo até o armazenamento em câmara frigorífica.

Condições favoráveis, como 80% de umidade relativa e temperatura em torno de 25°C favorecem o desenvolvimento da doença, seja em campo ou durante a fase de pós-colheita. Entretanto, os problemas causados pelo patógeno na pós-colheita são mais frequentes, uma vez que normalmente ocorrem falhas e oscilações de temperatura e de umidade relativa durante o transporte, favorecendo então que ocorra o desenvolvimento da doença e, consequentemente, que os cachos fiquem totalmente colonizados e apodrecidos (Terao, et al., 2007).

Os danos causados por esse fungo, no que diz respeito ao apodrecimento de frutas, acarretam prejuízos tanto na pré-colheita, pela perda na produção, quanto na pós-colheita, em virtude da rapidez na disseminação para outros cachos adjacentes na embalagem.

Os sintomas e danos mais severos ocorrem nos frutos, observando-se descoloração da casca, que fica flácida e adquire cor cinza, apodrecendo em seguida. Inicialmente, ocorrem manchas circulares arroxeadas nas bagas que, posteriormente, tornam-se pardas. Com a evolução da doença, essas manchas ficam deprimidas e a ocorrência de abundante esporulação do fungo dá às bagas a aparência de mofo-cinzento (Garrido et al., 2008).

O controle da doença no campo se baseia na utilização de fungicidas destinados à cultura. Há, também, a utilização de agentes de controle biológico, como Trichoderma harzianum e Bacillus subtilis, que possibilitam a redução e o uso de fungicidas químicos para metade da dose (Esterio et al, 2000).

Já na pós-colheita, o controle mais eficiente é o monitoramento da temperatura na câmara fria, de modo que não haja oscilação da temperatura e umidade relativa.

Custo do sistema

O custo de implantação de um sistema de resfriamento em uma propriedade é muito variado, devendo ser analisados diversos pontos, tais como: quantidade de frutos produzidos na propriedade, localidade da propriedade, mão de obra especializada, número de câmaras frias demandadas, entre outros fatores.

Existem diversos tamanhos de câmaras frias disponíveis no mercado, porém, os ideais para o armazenamento de frutos são aqueles que comportam o maior número de frutos, por exemplo, aqui no Brasil os mais comercializados são com capacidade entre 20 a 30 toneladas de frutos por câmara fria.

Em média, apenas o aparato da câmara fria que comporta essa quantidade de fruto, sem custos de instalação, adequação de local, projeto e adicionais, custa em torno de R$ 80 mil, porém, existem câmaras frias maiores e menores – tudo depende da necessidade da propriedade.

Viabilidade

Segundo dados de Mello & Tapetti (2011), o argumento mais comum de hortifruticultores e comerciantes para a implantação de câmaras frias é o elevado custo para se implantar tal infraestrutura na propriedade.

No entanto, quando se comparam os custos e os benefícios para o setor como um todo, fica claro que essa técnica é imprescindível para a modernização da hortifruticultura. Uma câmara fria possui a vida útil de até 20 anos, então, o alto valor para a aquisição de vários equipamentos para uma propriedade diluído entre esta vida útil se torna irrisório, valendo o valor investido.

O que se torna mais atraente na adoção de um sistema de resfriamento para o viticultor é o tempo de prateleira de pelos menos 60 dias, segundo a Embrapa, que o fruto adquire quando utilizada a técnica. Quando não adotada a técnica, esse período é reduzido para menos da metade, pois temperaturas mais elevadas, tais como mais de 20°C, aceleram o processo de amadurecimento do fruto, reduzindo a quantidade de água nas bagas.

Além disso, aumenta significativamente a ação de microrganismos. Desta forma, torna-se justificável adquirir câmaras frias para a propriedade, ou então para uma cooperativa, uma vez que quanto mais tempo o fruto mantém sua vitalidade, maiores as chances de vendê-lo ou então reduzir as perdas por apodrecimento.  

Cuidados na colheita e armazenamento

  • O  Ponto de colheita da uva de mesa é com 14 °Brix e a uva para vinho em 18 °Brix
  • Reduzir o manuseio das bagas durante a colheita para não tirar a cera natural (pruína) que protege a fruta
  • Acondicionar os frutos colhidos em caixas de plástico, em camada única e posicionados sempre com o pedúnculo para cima
  • Não é recomendada a lavagem dos frutos
  • O pré-resfriamento reduz a desidratação do engaço e o escurecimento e amolecimento das bagas
  • Após o pré-resfriamento, os frutos são encaminhados às câmaras frias em temperatura de 0 a 2°C de temperatura
  • O tempo esperado de armazenamento é de no mínimo 60 dias
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