Thiago Alberto Ortiz
thiago.ortiz@prof.unipar.br
Silvia Graciele Hulse de Souza
silviahulse@prof.unipar.br
Franciely S. Ponce
francielyponce@gmail.com
Engenheiros agrônomos, doutores em Agronomia e professores – UNIPAR (campus Umuarama-PR)
O crescimento na adesão do controle biológico por parte dos produtores rurais é nítido, seja nas propriedades de pequena ou larga escala. Mas será que ele vem sendo utilizado corretamente?
O controle biológico já foi considerado ineficiente, porém, tal percepção mudou completamente nas últimas décadas. Afinal, as empresas passaram a investir em tecnologia de formulação e aplicação, obtendo produtos de controle cada vez mais efetivos.
A eficácia do controle biológico depende de diversos fatores. Contudo, o monitoramento de doenças e pragas, o planejamento e a aplicação correta são cruciais para o seu sucesso no campo. O controle biológico exige observação da lavoura – o engenheiro agrônomo ou responsável pela área deve conhecer os fatores envolvidos para aumentar a eficácia.
Controle biológico
O controle biológico na agricultura visa otimizar os recursos naturais (como microrganismos benéficos) no desenvolvimento de ferramentas para erradicar e reduzir a ocorrência de fitopatógenos, geralmente insetos que provocam danos e influenciam a lavoura negativamente.
Nesse sentido, as bactérias, especialmente as do gênero Bacillus, são poderosas aliadas da produção agrícola sustentável, pois além de controlar diversas pragas e patógenos de plantas, por meio da produção de toxina letal, também atuam como promotores de crescimento vegetal.
Os metabólitos tóxicos produzidos por microrganismos agentes de controle biológico podem ser específicos contra um determinado grupo de microrganismos, como fungos, bactérias ou vírus, ou atuarem sobre diferentes grupos de organismos causadores de doenças em plantas.
Podem, ainda, atuar por diferentes mecanismos de ação, como competição por sítios de penetração, colonização da superfície da raiz (Figura 1), antagonismo direto por meio de metabólitos nocivos e indução de resistência sistêmica, ao desencadear resposta imune no metabolismo da planta.
Microrganismos – fonte de tecnologia
O entendimento das relações é fundamental para selecionar agentes com maior vigor em laboratório, com aplicabilidade no campo, propiciando a seleção de agentes potenciais ao controle biológico.
Alguns produtos já estão disponíveis no mercado para uso na agricultura, formulados a partir de diferentes microrganismos. As espécies Bacillus subtilis, B. thuringiensis, B. megaterium, B. licheniformis e B. amyloliquefaciens são exemplos já presentes em produtos comerciais recomendados à agricultura para diferentes fins, como controle de doenças da parte aérea e da raiz, controle de pragas, disponibilização de nutrientes, promoção do crescimento das plantas, entre outras aplicações.
Porém, o seu uso deve ser estimulado e priorizado.
Além disso, esses microrganismos têm se mostrado eficientes para uma gama de culturas, como café, batata, tomate, berinjela, beterraba, soja, milho, algodão e feijão.
Vale ressaltar que existe uma crescente demanda de produtos com mistura de microrganismos, que ao contrário de um único agente, possuem um complexo de agentes biológicos que agem de diferentes meios, obtendo assim maior eficiência no controle.
Prós e contras
Infelizmente, a disponibilidade de produtos biológicos ainda é pequena e insuficiente para atender todo o mercado agrícola. Por outro lado, a legislação brasileira prevê a produção de insumos biológicos pelo produtor rural para uso próprio.
No entanto, não existem regras para esta produção e, como consequência, alguns microrganismos têm sido produzidos de forma incorreta e sem qualidade, muitas vezes apresentando cultivos contendo contaminantes perigosos.
Biotecnologia
A biotecnologia tem sido e continuará sendo primordial para a evolução do controle biológico, aumentando a eficiência dos agentes disponíveis no mercado, além da prospecção de novos agentes e da diversificação de produtos disponíveis.
A seleção de novos agentes de controle é realizada com base em testes laboratoriais, casa-de-vegetação e, por último, a campo. Esse trabalho de pesquisa demanda tempo, o que muitas vezes faz com que a descoberta de novos agentes seja um processo excessivamente demorado.
Justamente por isto, a biotecnologia torna-se uma aliada importante, permitindo acelerar a investigação de novos inimigos naturais.
Bacillus thuringiensis
O Bacillus thuringiensis (Bt) é uma bactéria que ocorre naturalmente no ambiente, atacando lagartas. O gênero Bacillus possui uma fase de esporulação característica no seu desenvolvimento, na qual o esporo bacteriano e cristais proteicos são simultaneamente formados.
Tais cristais em Bt, também chamados de delta endotoxinas, são codificados pelos genes cry. As proteínas Cry são tóxicas a um grande número de espécies de insetos, pois a estrutura delas afeta fatores essenciais ao inseto, como por exemplo, o pH intestinal.
A toxicidade de algumas endotoxinas de Bt é similar à de pesticidas organofosforados. Mas, devido à sua especificidade, essas proteínas são relativamente seguras para insetos benéficos e outros animais.
Desta forma, o microrganismo B. thuringiensis representa o biopesticida comercial de maior sucesso no mercado de controle biológico, devido à grande diversidade de cepas isoladas e identificadas.
Além do espectro de ação que abrange diversas pragas agrícolas, nematoides e vetores de saúde pública, a referida bactéria possui fácil reprodução em massa com uso de diferentes tecnologias e ação específica para suas pragas-alvo, sendo inofensivo ao homem, vertebrados, plantas benéficas e insetos, além de ser biodegradável.
Tecnologia Bt
A inserção dos genes Bt, oriundos da bactéria Bacillus thuringiensis, que tem a habilidade de formar cristais proteicos durante a fase estacionária e/ou de esporulação, são responsáveis pela produção das toxinas Cry.
Esses genes, por meio da biotecnologia, podem ser introduzidos em microrganismos que já habitam a planta sem causar prejuízos a esse hospedeiro (endofíticos).
Essa tecnologia possibilita que os microrganismos que já vivem naturalmente na planta (sem causar prejuízos) sejam utilizados como carreadores dessas toxinas para os insetos sugadores, que não são atingidos pelos bioinseticidas aplicados na superfície foliar, devido ao comportamento alimentar dessas pragas.
As proteínas Cry produzidas pelo B. thuringiensis são classificadas em famílias, sendo conhecidas mais de 70, com base na sua identidade de sequência de aminoácidos. Assim, o isolamento e sequenciamento de genes cry devem ser incentivados na busca de novas toxinas que possam ser utilizadas no controle biológico de pragas ou na transformação genética de plantas.
Pesquisas
A Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia tem contribuído para a melhoria de processos de produção de microrganismos e, para isso, tem lançado manuais para produção e controle de qualidade de produtos biológicos à base de Bacillus spp., onde sugere pontos fundamentais como alicerces para que as empresas produzam seus insumos.
Além disso, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em colaboração com a Cardiff University, desenvolveu uma tecnologia que envolve o uso de Bacillus endofíticos para controlar insetos-pragas da agricultura.
Esta tecnologia mostra que, na planta colonizada, o B. thuringiensis é detectado nas raízes, caule, pedúnculo e folha, sendo a sua ação sobre insetos-alvo comprovada em ensaios com diferentes tipos de formulações.
A aplicação do microrganismo pode ser realizada na forma sólida, e/ou líquida monofásica ou bifásica, nas sementes da planta que se deseja proteger contra pragas, especialmente artrópodes, nematoides e moluscos.
A aplicação da composição às sementes pode ser feita por peletização, spray, imersão, impregnação ou qualquer outra técnica apropriada. Também pode ser feita no solo ou água, na rizosfera.
Bt na agricultura
A tecnologia Bt veio para auxiliar na busca por maior produção e redução dos danos pelo ataque de pragas nas culturas. Essa tecnologia é utilizada em função dos genes que produzem uma proteína capaz de causar toxicidade intestinal nos insetos-pragas.
As plantas de potencial agronômico, como o milho, que possui a tecnologia Bt, possuem em seu gene inseticidas eficazes para o controle das principais pragas existentes nas lavouras, como a lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda).
Assim, nas espigas, o milho Bt permite reduzir o ataque de insetos em até 90%, diminuindo, consequentemente, a probabilidade de crescimento de fungos através das perfurações provocadas pelos insetos-pragas.
Por esse fator, o controle obtido pelas plantas Bt é melhor que os métodos convencionais, reduzindo a demanda por produtos químicos, tornando a produção mais barata ao produtor rural, além de mais sustentável, haja vista a diminuição de resíduos tóxicos que podem causar danos ao meio ambiente.
A utilidade de Bt no manejo de pragas tem aumentado com a descoberta e o desenvolvimento de novas cepas da bactéria e por avanços recentes na engenharia genética, os quais permitiram a transformação de plantas cultivadas com a inserção de genes e alto nível de expressão de proteínas de Bt, principalmente em milho.
Desafios
A evolução também traz a resistência à proteína Bt. Por isso, o monitoramento a campo é importante para o manejo da resistência, favorecendo detectar as mudanças dos genes.
Nesse sentido, a utilização da área de refúgio se mostra uma estratégia básica para o manejo da resistência no uso da tecnologia Bt.
Área de refúgio
A adoção do refúgio agrícola serve para retardar e até evitar o desenvolvimento de populações de insetos-pragas resistentes às proteínas inseticidas das culturas Bt (Figura 2). A técnica é pensada para que os produtores rurais continuem usufruindo dos benefícios da tecnologia a longo prazo.
Assim como existem insetos suscetíveis à proteína Bt, há uma minoria que é naturalmente resistente. Se o produtor optar por semear apenas sementes Bt, poderá notar, inicialmente, um controle efetivo dos insetos.
Contudo, a médio prazo, essa escolha faz com que os indivíduos que são naturalmente resistentes à proteína sejam selecionados e, com o passar do tempo, se tornem maioria.
Caso o refúgio agrícola não seja adotado em lavouras Bt, os indivíduos resistentes serão selecionados, resultando na perda de eficiência da tecnologia Bt e, consequentemente, na redução de produtividade.