Érika Cristina Souza da Silva Correia
Engenheira agrônoma, doutora em Agronomia e professora – Centro Universitário Sagrado Coração (Unisagrado)
erika.correia@unisagrado.edu.br
Cristiane de Pieri
Bióloga e pós-doutora em Proteção de Plantas – UNESP
pieri_cris@yahoo.com.br
O Brasil está entre os cinco maiores produtores mundiais de algodão, ao lado da China, Índia, EUA e Paquistão. O País ocupa a primeira posição no ranking de produtividade em sistema de sequeiro. O Estado do Mato Grosso lidera a produção há mais de duas décadas e responde por mais de 67% do total do algodão em pluma nacional.
A cotonicultura tem conquistado mercados e se esforçado para melhorar os aspectos de qualidade, rastreabilidade, tecnologia e sustentabilidade a fim de consolidar a credibilidade da fibra produzida no Brasil.
Contudo, a incidência de insetos-praga em áreas de produção é um fator limitante para a sua exploração. O bicudo-do-algodoeiro, Anthonomus grandis Boheman, (Coleoptera: Curculionidae) é a principal praga em lavouras de algodão, responsável por perdas de até 100%, caso o manejo não seja conduzido de forma eficiente.
Temor da cotonicultura
O inseto-praga é originário do México, chegou ao Brasil em 1983 e está presente em todas as regiões produtoras de algodão. Constitui a praga mais temida pelos cotonicultores, tornando-se protagonista na história do algodão no País.
Estima-se que as perdas econômicas no Brasil causadas pelo ataque do bicudo-do-algodoeiro giram em torno de R$ 1,7 bilhão por ano. A identificação do adulto do bicudo é facilitada em decorrência de suas características típicas. Caminha lentamente e raramente voa, a não ser quando se dispersa para áreas vizinhas. Ao ser tocado, contrai as pernas e se finge de morto (comportamento chamado de tanatose).
Danos
O ataque do bicudo às plantas de algodoeiro se inicia cerca de 30 dias após a emergência, no estabelecimento vegetativo da cultura, e se estende até os 130 dias. A fase crítica do ataque da praga ocorre entre os 40 e 90 dias após a semeadura.
Os principais danos causados pelo bicudo são resultantes de orifícios promovidos nas estruturas reprodutivas da planta durante a alimentação ou oviposição dos adultos, sendo os botões florais e as maçãs as estruturas preferencialmente atacadas pelo inseto.
É importante ressaltar que o inseto ataca todas as fases da planta (florescimento, frutificação e maturação) com elevado dinamismo populacional, sendo capaz de formar entre cinco e sete gerações a cada ciclo de cultivo do algodoeiro.
Manejo
O controle do bicudo-do-algodoeiro é bastante difícil e oneroso, em decorrência de suas características bioecológicas, como diapausa (hibernação), ciclo de vida curto, alta capacidade reprodutiva e mobilidade, sendo necessário a implantação de estratégias baseadas no manejo integrado de pragas (MIP).
Entre as medidas adotadas pelo cotonicultor, destacam-se o monitoramento constante, o vazio sanitário, o controle biológico (com parasitoides e predadores), o controle cultural (com a eliminação de soqueiras e tigueras; rotação com culturas não hospedeiras), o controle químico (pela aplicação de inseticida ao final da safra, juntamente com o desfolhante, visando diminuir a população para a próxima safra; aplicação de inseticidas nas bordaduras, a partir do primeiro botão floral, e em área total) e o controle comportamental (com o uso de armadilhas contendo feromônios, na entressafra).
O monitoramento constante e eficiente é primordial para reduzir a densidade populacional do bicudo em plantios de algodão, pois permite a detecção dos insetos adultos em tempo hábil para uma rápida intervenção.
Esta tarefa pode ser feita por amostragens visuais de monitores no campo ou através da coleta de bicudos em armadilhas instaladas nas lavouras. É importante destacar que as amostragens visuais precisam ser feitas com frequência de no máximo cinco dias entre elas, durante todo o período de cultivo do algodoeiro.
A recomendação é que as plantas devem ser escolhidas ao acaso em número mínimo de 50 por talhão de 200 ha e serem vistoriadas por profissionais treinados à procura de bicudos ou de sinais de danos de ataque. Os dados devem ser registrados em planilhas físicas ou eletrônicas e rapidamente enviados à gerência técnica da fazenda para a tomada das decisões necessárias para controlar os focos de infestação.
Armadilhas
A utilização de armadilhas com feromônios é bastante difundida nas lavouras de algodão, uma vez que o olfato é o sentido mais utilizado pelos insetos. É importante ressaltar que na natureza, tanto as plantas quanto os insetos emitem sinais químicos (odores), que são perceptíveis pelos insetos por meio de suas antenas e outros órgãos sensoriais.
Esta comunicação química nos leva a compreender como as pragas conseguem localizar as plantas hospedeiras, ou até mesmo os indivíduos da mesma espécie. O conhecimento desta comunicação e de quais são os sinais químicos específicos destas relações permite a utilização de tecnologia que denominamos de controle comportamental.
Vazio sanitário
Outra alternativa viável no combate do bicudo é o vazio sanitário, estratégia eficiente no rompimento do ciclo biológico do inseto. O período do vazio sanitário é definido por meio do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC), de modo que cada Estado produtor possui um calendário específico com datas diferentes, que levam em consideração a bioecologia do inseto.
Os órgãos estaduais de sanidade vegetal são entidades de fiscalização do cumprimento das normas legais do vazio sanitário do algodão e têm competência legal para aplicar as penalidades previstas em Lei, que variam de acordo com as regiões produtoras.
O vazio sanitário implica na destruição completa dos restos culturais (soqueiras) e plantas voluntárias de algodão (tigueras) presentes na área de cultivo, por um período de 60 a 90 dias. A destruição mecânica das soqueiras pode ser feita por meio de arado ou grade em toda a área.
Após esta etapa, recomenda-se aguardar alguns dias para verificar a ocorrência de rebrote. Caso ocorra, deve-se realizar a aplicação de herbicidas dessecantes para a eliminação de plantas ainda vivas. Ao conduzir a destruição mecânica e química de soqueiras, a taxa de controle atinge índices próximos a 100%, eliminando assim as fontes de alimento para o bicudo.
Após o manejo físico e químico, é importante monitorar a área de produção para verificar se a eliminação das soqueiras aconteceu por completo. Se necessário, podem ser realizadas aplicações de herbicidas pré ou pós-emergente.