A ferramenta revolucionária de biotecnologia conhecida por CRISPR/Cas é uma técnica de edição do genoma que tem o potencial de promover a inovação, melhorando a qualidade das plantas e dos grãos de soja. “Essa técnica de engenharia genética nos permite uma precisão cirúrgica em nossas ações, com rapidez inigualável e maior economia de recursos“, comemora o pesquisador Alexandre Nepomuceno.
Nos laboratórios da Embrapa Soja, em Londrina (PR), há oito meses a tecnologia CRISPR/Cas está ajudando os pesquisadores a desenhar algumas construções gênicas para angariar características diferenciadas à soja. A cultura está presente em 33 milhões de hectares no Brasil, que é hoje o segundo produtor mundial do grão.
Soja melhorada
Um dos usos da ferramenta CRISPR/Cas vem sendo conduzido pela pesquisadora Liliane Henning, da Embrapa Soja, que pretende melhorar a qualidade das sementes. De acordo com a pesquisadora, o objetivo dessa pesquisa é desativar genes que favoreçam a melhoria em características associadas à qualidade de grãos e de sementes de soja. No caso dos grãos, o foco é a alteração de rotas metabólicas que reduzam a ação dos fatores antinutricionais na soja.
A soja é uma leguminosa que apresenta alto valor nutricional. Em média, possui 38% de proteínas, 20% de lipÃdios (óleo), 05% de minerais e 34% de carboidratos. Por causa das suas características, a soja passou a ser amplamente utilizada na alimentação humana e animal.
Apesar de suas características benéficas, os grãos contêm alguns fatores antinutricionais que podem diminuir a disponibilidade de nutrientes e a absorção de aminoácidos. “Utilizando a tecnologia CRISPR/Cas para desligar genes dos fatores antinutricionais, como os inibidores de tripsina, por exemplo, podemos aumentar a digestibilidade da soja“, avalia Liliane Henning.
Qualidade do óleo
Também faz parte das ações de pesquisa previstas pela pesquisadora o aumento dos teores de ácidos oleicos na soja. Nesse caso, a ideia é tentar desligar genes, por exemplo, que alteram a rota metabólica do ácido linolênico e aumentar o teor do ácido oleico, que é reduzido na soja. “Nosso objetivo é melhorar a qualidade do óleo de soja“, diz.
“Com relação às sementes de soja, nosso objetivo será desligar genes que aceleram o processo de deterioração, tanto na pré-colheita quanto durante o armazenamento“, conta.
Tolerância à seca
O pesquisador Alexandre Nepomuneco, da Embrapa Soja, está trabalhando para desativar genes envolvidos no metabolismo do etileno, hormônio vegetal que interfere nos mecanismos de aumento de tolerância à seca. “O gás etileno está envolvido na maturação da soja e quando interferimos nesse metabolismo, podemos ampliar o tempo que a planta suporta períodos de seca“, conta Nepomuceno.
O pesquisador também está tentando desenvolver uma planta de soja não transgênica e que tenha resistência ao herbicida da classe das imidazolinas. “Nossa ideia é lançar mãoda tecnologia CRISPR/Cas para usar os genes ahas da própria soja e não de outra espécie, o que resultaria em uma planta não transgênica“, explica Nepomuceno.
Disponível no mercado desde 2015, a tecnologia Cultivance, que é resistente ao herbicida da classe das imidazolilonas, possui o gene ahas transferido de plantas de Arabidopsis. “Como a característica foi introduzida no genoma da soja via outra espécie vegetal (Arabidopsis), esta é considerada uma soja transgênica“, diz. “Queremos agora ativar o gene ahas que atualmente fica silenciado no genoma soja e assim acelerar um processo que poderia levar muitos anos para acontecer espontaneamente na natureza“, conta.
Ferrugem da soja
A tecnologia pode ainda ser utilizada na Embrapa em pesquisas, cujo foco seja melhorar a resposta da soja aos seus principais patógenos, como, por exemplo, o fungo causador da ferrugem asiática, a mais severa doença da cultura.
Trabalhos conduzidos nesta linha pela pesquisadora Francismar Correa Marcelino, da Embrapa Soja, identificaram genes relacionados à patogenicidade que são expressos pelo patógeno no momento da infecção e transferidos para a soja, que tem como alvo regiões do DNA da planta. “Identificar tais regiões e posteriormente promover alterações pontuais via CRISPR/Cas que impeçam tal ativação ou desligamento de genes da soja pelo patógeno pode contribuir para o desenvolvimento de novas alternativas de controle da doença“, explica a pesquisadora.