Ana Claudia Costa Baratti
anaclaudia.costa@ufla.br
Leila Aparecida Salles Pio
leila.pio@ufla.br
Doutoras e professoras do curso de Agronomia – Universidade Federal de Lavras (UFLA)
Os prejuízos causados pelo greening à citricultura são incalculáveis. No fechamento da safra da laranja 2022/23 no Brasil, concluída em 314,21 milhões de caixas produzidas, estima-se que a perda total tenha atingido 85 milhões de caixas.
As condições climáticas contribuíram para que as perdas atingissem 21,3%, entretanto, bicho-furão, moscas-das-frutas e greening foram responsáveis pelo maior impacto, enquanto outras causas, como queda natural, danos mecânicos e rachaduras de casca, também contribuíram para perdas significativas (Fundecitrus, 2023).
Outro evento que aumentou a preocupação na cadeia produtiva da laranja neste ano foi a divulgação do levantamento anual da incidência de greening feito pelo Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus).
Dados apontam um aumento de 56% da doença na região do cinturão citrícola de São Paulo e Triângulo/Sudoeste Mineiro, subindo de 24,42%, em 2022 para 38,06% em 2023, o que corresponde a 77,22 milhões de árvores doentes, do total de 202,88 milhões de laranjeiras em todo o parque.
O estudo indica a necessidade premente de maiores esforços por parte do setor para um controle mais assertivo da doença, pois, apesar deste ser o sexto ano consecutivo de crescimento da incidência da doença, foi o maior aumento de toda série histórica, desde 2008 (Fundecitrus, 2023).
De olho nos sintomas
O greening é causado pela bactéria Candidatus liberibacter, transmitida pelo psilídeo Diaphorina citri, inseto de coloração branca acinzentada, com comprimento de 2,0 a 3,0 mm, e muito frequente nos pomares nas épocas de brotação das plantas.
Os sintomas iniciais consistem no aparecimento de manchas cloróticas distribuídas de forma assimétrica nas folhas, tornando-as mosqueadas, podendo surgir em apenas um ramo, espalhando-se por toda a planta ao longo do tempo.
As plantas contaminadas produzem poucos frutos, que são pequenos e deformados, com tortuosidade inclusive no eixo central, denominado de columela. Plantas novas contaminadas não chegam a produzir e as que já estão em produção apresentam considerável queda de frutos.
Controle
O combate ao greening é baseado no tripé de manejo, que consiste no plantio de mudas sadias, eliminação de plantas doentes e controle do psilídeo. Para eficácia do controle do inseto, é fundamental evitar a seleção de psilídeos resistentes, ou seja, indivíduos capazes de sobreviver às aplicações de determinado defensivo e transmitir essa característica para seus descendentes.
Recentemente, pesquisas constataram que psilídeos coletados em alguns pomares do cinturão apresentaram resistência aos inseticidas bifentrina e imidacloprido, respectivamente dos grupos químicos piretroide e neonicotinoide, possivelmente devido à alta frequência do uso de inseticidas de um mesmo grupo químico.
Para evitar problemas como este, é essencial que seja feita a rotação de inseticidas com pelo menos três grupos químicos diferentes.
Alternativas eficazes
O desenvolvimento de alternativas eficazes aos inseticidas convencionais mais seguros para os agricultores, consumidores e meio ambiente e com custo acessível para o manejo de D. citri é de grande importância.
Uma das alternativas possíveis é o uso de repelentes de insetos de origem vegetal, a partir de genótipos de Citrus resistentes ou hospedeiros menos preferidos para D. citri. Os óleos essenciais de plantas geralmente são atrativos ou repelentes de insetos.
Apesar de os mecanismos de ação dos repelentes de insetos não serem bem compreendidos, eles têm a vantagem de combinar uma ampla gama de substâncias tóxicas, reduzindo a chance de as pragas desenvolverem resistência.
Além disso, dificilmente são encontrados resíduos nos produtos ou no ambiente, porque os óleos essenciais não são persistentes em condições de campo, sendo facilmente degradados pela luz e pelo oxigênio.
Espécies de citrus repelentes
Uma pesquisa desenvolvida na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e financiada pela FAPESP e CNPq analisou a composição química dos óleos essenciais produzidos por 22 espécies do gênero Citrus, que inclui a laranja, o limão e a tangerina com o uso de técnicas de quimiometria.
Nela, constatou-se que o psilídeo D. citri tem preferência por depositar os ovos em algumas espécies cítricas em detrimento de outras. Os pesquisadores identificaram três espécies de plantas do gênero Citrus que produzem um óleo que repele o inseto, sendo duas delas pouco atrativas: Citrus reticulata, conhecida como tangor murcote e o citrumelo Swingle, híbrido de Citrus paradisi com Poncirus trifoliata.
A atração pelos óleos de Citrus reticulata e citrumelo Swingle foi muito baixa, o que indica uma capacidade repelente dos seus compostos e seu potencial para o desenvolvimento de estratégias de proteção das plantas.
Observou-se que os genótipos menos interessantes para o psilídeo têm, em comum, a presença de três compostos encontrados apenas em seus óleos essenciais: fitol, (Z)-beta-ocimeno e beta-elemeno.
Possivelmente, esses compostos agem como repelente, tornando os óleos dessas plantas menos atraentes para o inseto depositar seus ovos.
Ação dos óleos
Esses óleos essenciais funcionam, principalmente, pela liberação de compostos voláteis que afetam o sistema olfativo do psilídeo, tornando a planta de citros menos atraente para o inseto.
Ao perceber o odor dos compostos repelentes, o inseto tende a evitar a árvore de citros e, assim, a transmissão da bactéria causadora do greening é reduzida.
A utilização dos óleos essenciais de plantas de citros que produzem repelentes naturais pode oferecer vários benefícios potenciais para o manejo do greening, como: controle eficiente do vetor, pois a liberação de compostos repelentes no ar pode desencorajar a aproximação e a alimentação dos insetos; redução das infecções em árvores de citros adjacentes, formando uma barreira natural que afasta os insetos vetores; e redução da dependência de inseticidas químicos, pois a utilização de repelentes naturais é uma medida mais sustentável.
Ainda em estudo
Apesar disso, existem vários desafios para o emprego da técnica, pois a eficácia desses óleos pode variar dependendo das condições climáticas, do ambiente de cultivo e da população local de insetos.
Ainda, o uso contínuo de repelentes naturais pode levar ao desenvolvimento de resistência nos insetos, tornando-os menos sensíveis aos compostos repelentes ao longo do tempo.
Outra dificuldade pode estar relacionada aos custos dessa tecnologia, pois a produção e o uso de óleos repelentes podem ser dispendiosos, especialmente se a matéria-prima (folhas de citros) for escassa ou difícil de obter em grande quantidade.
Por fim, alguns óleos essenciais podem ser tóxicos para uma variedade de organismos, incluindo insetos benéficos que desempenham um papel importante no ecossistema agrícola.
Para breve
As próximas etapas para o desenvolvimento e implementação prática dessa estratégia de combate ao greening são:
– Realizar novas pesquisas para identificar e caracterizar outras variedades de citros que produzem os óleos repelentes;
– Investigar os mecanismos moleculares relacionados à repelência para melhorar a compreensão e a otimização da estratégia;
– Avaliar a eficácia dos óleos repelentes sob diferentes condições climáticas e em várias regiões de cultivo e;
– Integrar a estratégia de óleos repelentes em um sistema de manejo integrado de pragas (MIP), estabelecendo protocolos para a aplicação e dosagem.
Viabilidade
O uso de óleos repelentes de citros no combate ao greening tem grande potencial de uso na citricultura, mas requer um esforço coordenado.
Os avanços nessa área dependem de pesquisa contínua, do compromisso dos produtores e da colaboração entre os setores público e privado para enfrentar o greening de maneira eficaz e sustentável, sem prejuízo de outras medidas preventivas e de controle.