Hidroponia: produtividade além dos limites

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Glauco Vieira Miranda
Ph.D em Genética e Melhoramento e professor – Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UTFPr), Campus Santa Helena, Paraná
glaucovmiranda@utfpr.edu.br
Rafael Simoni
Engenheiro agrônomo, especialista em consultoria e assistência técnica em hidroponia
rafaelsimoni@agronomo.eng.br

Crédito: Eduardo Miyayaciki

A hidroponia é a técnica de cultivo de vegetais sem solo. Todos os nutrientes que teriam de ser disponibilizados através do solo, na hidroponia são disponibilizados por meio de uma solução contendo água e minerais (conhecida como solução nutritiva hidropônica) de uma forma balanceada para cada tipo de cultura.

As principais características do sistema de cultivo hidropônico são a ausência de solo, e somente a água e o ar atmosférico como veículo dos nutrientes necessários à planta. Os sistemas de cultivo por hidroponia mais comuns hoje são: NFT, cultivo em substrato, floating, aeroponia e aquaponia, e serão brevemente descritos a seguir.

Detalhes

O sistema NFT, cujo nome é uma abreviação do nome em inglês para Nutrient Film Technique, é uma técnica de cultivo que é composta de tubos dispostos horizontalmente, com orifícios na parte superior, por onde a muda é colocada.

A planta fica com parte da raiz no fundo desse tubo, onde passa uma pequena quantidade de solução nutritiva, bombeada a partir de um reservatório e, após irrigar, retorna a esse reservatório.

Existem variações desse tipo de cultivo no tocante aos materiais usados, como por exemplo, o uso de calhas de cobertura ao invés de tubos. Atualmente, é o sistema em hidroponia mais usado no mundo para o cultivo de folhosas.

O sistema de cultivo em substrato consiste em usar algum tipo de material penetrável pelas raízes para dar ancoragem à planta, e irrigar esse substrato com a solução nutritiva hidropônica.

Os substratos usados variam de acordo com a região e, no Brasil, se observa o uso de casca de arroz carbonizada, cinza de casca arroz, fibra de coco, casca de coco moída, pedra brita, pó de serra, turfa, casca de pinus, lã de rocha, vermiculita, perlita, areia, entre outros.

Na maioria dos casos, o substrato é composto de uma mistura dos materiais citados, de acordo com a disponibilidade/custo de cada um e com a cultura a ser produzida.

Em suspensão

No sistema de floating ou DFT (Deep Film Technique) as plantas ficam suspensas em placas de material flutuante, em um tanque com uma quantidade relativamente grande de solução nutritiva hidropônica. Ainda é pouco utilizado no Brasil, devido principalmente à alta robustez exigida na estrutura e ao alto volume de solução necessária para o sistema.

A aeroponia consiste em deixar as raízes das plantas suspensas em uma câmara escura, onde é pulverizada a solução nutritiva hidropônica. Está sendo amplamente pesquisada devido à possível facilitação de cultivo de bulbos e tubérculos, principalmente quando se fala em multiplicação de material de alto valor genético, como por exemplo, a batata-semente de categoria C1, C2 e superiores.

A aquaponia é um sistema floating, em consórcio com a criação de peixes. Parte dos minerais que compõem a solução nutritiva é oriunda da água da criação dos peixes. É um sistema que ainda está em desenvolvimento, mas as pesquisas dessa técnica estão se intensificando a cada dia.

Na maioria dos casos, a horta hidropônica é construída sob cultivo protegido, como por exemplo, estufas e telados, e essa característica beneficia o cultivo visto que o ataque de pragas e doenças é menor, quando comparado ao sistema convencional.

Há uma tendência de construção de unidades de produção hidropônica em áreas urbanas, como em áreas anexas a hipermercados e shopping centers, dado o fato de requerer pequenos espaços e oferecer alta produtividade por área.

Controle do volume de água

O controle da irrigação vai depender do sistema hidropônico adotado, da cultura e também das condições climáticas, como umidade relativa do ar, temperatura e condição de ventos predominantes no local.

No sistema NFT, as recomendações apontam que o sistema não fique mais de 10 minutos sem irrigação, já que o volume de solução recirculante é relativamente baixo.

Normalmente se utiliza 10 minutos de solução circulando e 10 minutos parado, mas isso não é uma regra, já que cada região é distinta em relação às condições climáticas. Essa alternância de acionamento da bomba de irrigação pode ser feita por um temporizador, bem como por centrais de controle.

Cada canal de cultivo nesse sistema deve receber um volume de solução que varia entre 0,8 L/minuto e 1,2 L/minuto para folhosas e entre 1,5 L/minuto e 2 L/minuto para hortaliças de fruto, como tomate e pimentão, por exemplo.

Esse volume de circulação de solução faz a irrigação ocorrer de forma efetiva, sem excessos nos perfis. O produtor deve se atentar para a escolha do reservatório de solução nutritiva, já que as pesquisas apontam que em NFT o volume mínimo de solução circulante é de 1,0 litro para cada planta.

Em alguns casos, esse volume não é atingido devido às limitações relativas entre espaço e tamanho do reservatório. A recomendação, nesses casos, é de que o produtor faça as verificações de parâmetros, como pH e condutividade elétrica da solução, duas vezes ao dia.

Fique atento

No sistema de cultivo em substratos, além de considerar os efeitos do clima, deverão ser observados a textura do substrato, o volume de substrato para cada planta, bem como a espécie e o estágio de desenvolvimento da cultura.

Um tomateiro recém-transplantado, por exemplo, consumirá menor quantidade de solução que um tomateiro que esteja com frutos em ponto de colheita. Poderão ser feitas checagens manuais nos substratos onde as plantas estão, ou também adotar sistemas automatizados, que contam com sensores de umidade de solo, por exemplo.

Estes sensores permitem a leitura da umidade e os mais modernos permitem o acionamento do sistema de irrigação.

Peculiaridades

No sistema de floating, por usar um volume relativamente maior de solução, a preocupação com o nível de solução nutritiva hidropônica é menor. A preocupação nesse sistema está mais relacionada com o suprimento de oxigênio para as plantas do que propriamente com o volume de solução.

Em aeroponia, o suprimento de água e nutrição das plantas se dá pela pulverização de solução nutritiva hidropônica diretamente na câmara onde as raízes das plantas estão alocadas.

Economia de água

No sistema hidropônico, a solução nutritiva é circulante, ou seja, é bombeada através dos tubos ou canais de cultivo, promove a irrigação e nutrição da planta, e o que não for absorvido pelas plantas retorna ao reservatório para ser novamente bombeado.

Aliado a esse fator, na hidroponia as perdas por evaporação se mostram muito abaixo das perdas por evaporação da maioria dos cultivos convencionais.

Mesmo em sistemas abertos, quando não há o reaproveitamento da solução nutritiva, a hidroponia ainda assim se mostra muito mais econômica, já que as irrigações são pontuais, localizadas apenas na região da raiz da planta, e num volume adequado. Isso faz com que a técnica permita redução no consumo de água de até 90%.

Entre um e outro

A principal diferença entre a hidroponia e o cultivo tradicional é que, na hidroponia, a planta cresce sem solo, e no sistema convencional ela obrigatoriamente precisa ser plantada na terra.

Essa é a principal diferença que permite cultivar hortaliças mesmo em locais com condições limitantes ao cultivo convencional, por exemplo, em áreas urbanas ou de solo pedregoso.

Além desse fator, pode-se destacar também que no sistema de produção hidropônico a produtividade por unidade de área é maior, já que permite um maior adensamento de plantas, quando comparado ao sistema convencional.

A produtividade também tende a ser maior, dado o fato de que na hidroponia a nutrição é sempre balanceada e constante, não sofrendo picos e quedas de fornecimento de água e nutrientes de modo tão acentuado, tendo assim um crescimento mais rápido, quando comparado ao sistema convencional.

A produção hidropônica, por estar geralmente associada com cultivo protegido, pode fornecer hortaliças durante todas as estações do ano, não sofrendo tanto com as adversidades climáticas. Soma-se a isso a vantagem do menor ataque de pragas e doenças, diminuindo assim o uso de defensivos agrícolas.

Culturas em destaque

No Brasil, a maior parte da aplicação da hidroponia é usada para a produção de hortaliças folhosas, como alface, rúcula, agrião, salsa, cebolinha e coentro. São produzidos pelo sistema NFT, onde as plantas ficam dispostas em tubos dispostos horizontalmente, com um pequeno desnível, por onde passa a solução com água e nutrientes, através de um sistema de bombeamento previamente programado.

Toda a solução que não for absorvida pelas plantas no momento que passa pelos tubos, retorna a um reservatório para ser posteriormente bombeada. Isso permite economia de água e de nutrientes.

Essa técnica disponibiliza água e os minerais necessários para a planta de forma balanceada e precisa, e quando bem manejado, não há excessos ou deficiências de nutrientes. Além disso, o cultivo em ambiente protegido faz com que a planta expresse o seu melhor potencial de crescimento e produção.

Análises primordiais

No manejo desse sistema, o produtor deverá atentar principalmente para a qualidade da água e da solução nutritiva. A recomendação é de periodicamente se fazer uma análise físico-química e biológica da água que será utilizada para o cultivo. Atualmente, vários laboratórios fornecem esse tipo de análise a custos reduzidos. Para a preparação da solução nutritiva, é necessária a correta pesagem dos sais minerais que são adicionados à água.

O manejo da solução nutritiva deve abordar principalmente os parâmetros pH, a condutividade elétrica e o estado de limpeza da solução. O pH indica se a solução está ácida ou alcalina – é medido com o pHmetro, e deverá estar entre 5,8 e 6,5.

Esse valor de referência é tido como levemente ácido, e é o valor que apresenta a melhor curva de absorção dos nutrientes. Quando o pH apresentar valores que saem do valor de referência, o produtor deve buscar orientação técnica para identificar as causas desta não conformidade.

Por sua vez, a condutividade elétrica, como dito anteriormente, aponta qual a quantidade de minerais dissolvidos na solução. Pode ser medida com o condutivímetro, e deverá apresentar valores entre 1,5 e 1,8 mS/cm-1, para a maioria das hortaliças folhosas.

Para outras cultivares, o produtor deverá buscar informações sobre a cultura. A checagem e correção dos parâmetros da solução nutritiva devem ser realizados diariamente.

Limpeza do sistema

O estado de limpeza da solução é um ponto de extrema importância para o sucesso no cultivo hidropônico. Diariamente, o produtor deverá examinar a solução para identificar a presença de algas, larvas de insetos e sujeiras que porventura possam surgir no reservatório.

Em caso de contaminação por algum destes ou outro agente não desejável, é recomendada a limpeza e desinfecção do sistema.

O hidroponista deve estar ciente de que as mudas que ele pretende cultivar precisam ser de alta sanidade e qualidade. Geralmente, a muda é produzida na propriedade. A observância de cuidados, como o controle de pragas e doenças, bem como a correta nutrição e irrigação na fase de muda, faz com que o resultado final seja um produto com a qualidade desejada.

Desde o semeio até as fases de transplante, deverá ser observada a idade e tamanho mais adequado para cada tipo de perfil. Plantas que são transplantadas prematuramente ou tardiamente ficam muito suscetíveis a problemas de crescimento.

Vale a pena?

Por ser uma técnica relativamente nova e ainda em constante evolução, com alta capacidade de incorporar tecnologias, a instalação de uma horta hidropônica é relativamente mais cara, quando comparada à instalação de uma horta convencional.

Em valores referenciados em junho de 2022, uma estufa com estrutura em aço e com hidroponia para capacidade de produção de 6.000 plantas/mês, custa entre R$ 110.000,00 e R$ 140.000,00, dependendo da região, do fornecedor, acessórios inclusos, entre outras variáveis.

Num cálculo rápido, supondo que o produtor colha 6.000 pés de hortaliças ao mês, vendendo ao preço médio de R$ 3,00, e custo médio de produção de R$ 1,70 (abrangendo insumos, energia elétrica, mão de obra e depreciação da estrutura), o retorno do investimento se dá entre 14 e 18 meses.

Esses números podem sofrer pequenas variações, de acordo com a região.

Toma lá, dá cá

Praticamente qualquer espécie pode ser cultivada em sistema hidropônico, bastando para isso adaptar cada espécie ou cultivar ao sistema que melhor ela responda. Folhosas, por exemplo, são muito rentáveis quando cultivadas em sistema NFT, enquanto morango ou tomate, a recomendação é que sejam cultivados em sistemas com substrato.

Atualmente, as espécies mais exploradas economicamente são as hortaliças folhosas e de tempero, e se observa um aumento constante no cultivo de hortaliças de fruto, como tomate, pimentão e morango. Ainda podemos citar o crescimento do uso da hidroponia para a produção de forragem verde hidropônica, para alimentação animal.

A hidroponia está permitindo cultivar hortaliças de excelente qualidade em locais jamais imaginados antes de sua existência. Já não é mais raro encontrar hortas em pequenos espaços urbanos, onde os consumidores podem ver sua hortaliça preferida sendo colhida na hora.

 Atualmente, diversas novas pesquisas e tecnologias vêm sendo desenvolvidas com o intuito de maximizar o manejo e minimizar os efeitos adversos do clima sobre a produção agrícola. Um exemplo disso é o cultivo indoor, ou seja, em ambientes totalmente isolados das condições climáticas da atmosfera e com iluminação artificial.

Para tal feito, pesquisadores buscam aprimorar a eficiência de sistemas de iluminação, de novos materiais para as estruturas e também buscando materiais genéticos mais adaptados a esse novo modo de produção.

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