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Manejo da adubação nitrogenada via fertirrigação em cafeeiros

Autores

Ramiro Machado Rezende
Engenheiro agrônomo, doutor em Agronomia/Fitotecnia, consultor técnico e professor da Universidade Vale do Rio Verde (UNINCOR)
ramiromr@globo.com
Anderson William Dominghetti
Engenheiro agrônomo, doutor em Agronomia/Fitotecnia e professor do Instituto Federal do Espírito Santo – Campus Centro-Serrano
Renata Alves Lara Silva Rezende
Engenheira agrônoma, doutora em Agronomia/Fitotecnia – Universidade Federal de Lavras (UFLA)

A aplicação de fertilizantes via irrigação é conhecida como fertirrigação, uma prática já há muitos anos utilizada pelos produtores, consagrada pelos seus benefícios às lavouras, como redução dos custos de aplicação dos nutrientes, aproveitando-se da estrutura de irrigação para, junto com a água, fornecer os nutrientes necessários às plantas; independência de chuvas para aplicação dos fertilizantes, uma vez que os mesmos são dissolvidos em água no processo; rápida incorporação ao solo, inibindo perdas, além da possibilidade de maior parcelamento das adubações, conseguindo sincronizar de forma mais eficiente a quantidade fornecida com os períodos de maior demanda pela planta.

Dentre todos os nutrientes aplicados por esse processo, a aplicação do nitrogênio via fertirrigação proporciona maior eficiência em sua utilização, principalmente por reduzir os processos de volatilização envolvendo os fertilizantes nitrogenados, principal problema relacionado a essa prática de campo.

Em campo

Resultados obtidos por Dominghetti (2016), avaliando perdas de nitrogênio por volatilização em diversos fertilizantes nitrogenados utilizados na cafeicultura, mostram que a aplicação da ureia dissolvida em água reduz mais de 85% das perdas de nitrogênio por volatilização de amônia, em comparação com a aplicação da ureia em grânulos, sob as mesmas condições de solo e clima.

O resultado encontrado simula, em condições reais de campo, as situações que encontramos com a aplicação do nutriente via fertirrigação nos cafezais. Além disso, a dissolução do fertilizante em água proporciona sua incorporação mais rápida ao solo, garantindo contato mais rápido da raiz com o nutriente, logo reduzindo o período para absorção.

Culturas beneficiadas

A fertirrigação é uma prática adotada em diversas culturas, porém, o destaque dessa prática está nas culturas perenes (café e fruticultura, principalmente), devido ao seu ciclo, pois nas mesmas há possibilidade, e ainda a necessidade, de maior parcelamento das adubações, que proporciona melhorias nas produtividades.

Como implantar a técnica

Para implantação da técnica de fertirrigação é necessário, anteriormente, pensar no projeto de irrigação para a lavoura em questão. No projeto, deve-se levar em conta a capacidade de retenção de água do solo (avaliada por meio da curva de retenção, obtida em laboratórios especializados); disponibilidade de água, em que são imprescindíveis todos os procedimentos legais de outorga e licenciamento ambiental que se fizerem necessários para o local; disponibilidade de energia elétrica compatível com as demandas do sistema a ser planejado; avaliação da topografia da lavoura e distância das fontes de água, além da capacidade de investimento do produtor e seu principal objetivo com o empreendimento.

Com os procedimentos iniciais para o planejamento da irrigação, deve-se fazer o planejamento dos sistemas de fertirrigação. Esse fator irá influenciar em equipamentos específicos para tal, como os sistemas de injeção de fertilizantes, tanques para misturas dos fertilizantes, facilidade de entrada de maquinário na área para manipulação dos adubos, além de influenciar no sistema de irrigação propriamente dito, como o tamanho das bombas, material e tamanho dos rotores utilizados, espessura de mangueiras, tipos de gotejadores, etc.

Por isso, sempre é necessário o auxílio de um profissional com experiência na área, para os projetos iniciais e visitas periódicas na área manejada, de modo que não haja desperdícios de recursos.

Particularidades do manejo

Fazer a mudança de posição das mangueiras de irrigação pelo menos uma vez ao ano, de modo que a aplicação dos fertilizantes não seja realizada durante toda a vida da planta em um único local. Esse procedimento é mais comum e mais fácil em lavouras novas, pois em plantas adultas se torna um procedimento complicado.

Com a mudança da mangueira de local, a distribuição dos nutrientes no solo se torna mais ampla, evitando a concentração em determinados locais, o que pode levar à concentração de raízes nesses pontos, que é negativo para o bom desenvolvimento das plantas.

Segundo Matiello et al. (2010), caso a mudança de localização das mangueiras que levam os nutrientes não seja possível, é interessante fazer de uma a duas adubações com adubos sólidos, aplicados em cobertura, que melhoram a distribuição dos mesmos junto às raízes.

Cuidados com o entupimento de gotejadores também são importantes. Nesse quesito, recomenda-se fazer a lavagem do sistema passando água pura após a fertirrigação (por cerca de 15 minutos), para não haver encrustamento de fertilizantes no interior dos gotejadores, assim como cuidados com a penetração de raízes nos gotejadores, que ocorre nos sistemas de gotejamento subterrâneos usados em algumas lavouras, ou até mesmo o entupimento por partículas de solo.

Para isso, anualmente é importante uma revisão do sistema, avaliando a necessidade de trocas de gotejadores ou de mangueiras com vazamentos, que podem provocar perdas significativas de nutrientes. Além disso, recomenda-se a utilização de água de boa qualidade, fertilizantes próprios para fertirrigação, com alta solubilidade, puros, que apresentem compatibilidade no caso de misturas, avaliando-se sempre aquele que apresentar melhor custo/benefício.

Qual escolher?

Existem várias fontes disponíveis no mercado, ocorrendo variações de disponibilidade e custos entre regiões. No caso da fertirrigação com nitrogênio, o fertilizante mais comumente usado é a ureia, devido à sua alta solubilidade em água, alta concentração de nitrogênio, facilidade de se encontrar nos mercados e também ao seu custo, que em relação aos demais fertilizantes tem ficado mais baixo.

Para que a tecnologia seja bem empregada, devem-se adotar metodologias adequadas de cálculos das lâminas de irrigação, bem como o correto dimensionamento do sistema, pois a aplicação de água abaixo ou acima do necessário à planta pode causar sérios problemas ao sistema produtivo, como a lixiviação de nutrientes para longe do alcance do sistema radicular ou a concentração de fertilizantes na área de aplicação.

No dimensionamento correto, deve-se observar, dentre outros fatores, a formação da faixa molhada ao longo da linha de plantio, sendo essa a união dos bulbos úmidos formados por cada gotejador.

Na dose certa

Quando se fala em doses de adubação via fertirrigação, os trabalhos de pesquisa mais recentes têm evidenciado uma necessidade de aumento das doses com a adoção dessa prática, tomando como referência as recomendações para adubação em sequeiro hoje utilizadas.

Como a planta tem fornecimento constante de água pela irrigação, ao longo do ano apresenta maior desenvolvimento vegetativo e, consequentemente, maior estrutura produtiva, demandando assim maior quantidade de nutrientes para a produção.

Em trabalhos de Costa et al. (2010) foi possível observar que para as cultivares Obatã e Iapar-59, em Maringá (PR), as doses de NPK via fertirrigação ideais para a máxima produtividade foram de 154,17 e 151,75% das recomendações de Matielo et al. (2005), respectivamente, para cultivos em sequeiro, afirmando que ocorrem incrementos de produtividade de 20 e 18 sacas, para o Obatã e Iapar-59, respectivamente, por hectare, quando comparados aos cultivados em regime de sequeiro, aumentos estes significativos.

Irrigado x sequeiro

Os aumentos de produtividade já são consolidados pela pesquisa quando se trata da comparação entre cultivos irrigados e sequeiro, e nos últimos anos os cultivos fertirrigados têm possibilitado ainda maior aumento de produtividade, devido à vantagens já enumeradas.

Villela et al. (2015), avaliando doses de NPK em cafeeiros fertirrigados no município de Lavras, no Sul de Minas, em fase de formação, verificaram que a dose de 122,61% da recomendada nas Recomendações para o uso de corretivos e fertilizantes em Minas Gerais – 5ª Aproximação, foi a que possibilitou melhor desenvolvimento e produtividade, nessa fase de cultivo.

No entanto, na atual conjuntura da cafeicultura moderna, não se deve falar apenas em máxima produtividade, mas em produtividade economicamente viável, pois nem sempre o máximo produtivo está ligado às maiores margens de lucro da atividade.

Dessa forma, o produtor deve sempre questionar se uma determinada dose do fertilizante recomendado lhe proporciona maiores retornos econômicos. Visando obter essa resposta, trabalhos em campo de Oliveira et al. (2016), avaliando a relação entre doses de fertilizantes contendo N, P2O5 e K2O aplicados via fertirrigação no cafeeiro, e a máxima rentabilidade ao produtor, concluiu que a dose que proporciona a produção ótima econômica ocorreu no nível de 118,12% da dose recomendada para cafeeiros em regime de sequeiro, segundo a 5ª aproximação de Minas Gerais.

De acordo com o mesmo estudo, a máxima produção ocorreu com 145,57% da dose padrão. Na região do Cerrado Mineiro, município de Monte Carmelo, experimentos de Assis et al. (2018) concluíram que o nível ótimo econômico da adubação NPK via fertirrigação ao cafeeiro foi equivalente a 141,35% da dose recomendada pela 5ª aproximação do Estado, enquanto a dose que possibilitou a máxima produção foi de 178,14% da recomendação para sequeiro, ou seja, uma diferença de 36,79% entre as eficiências técnica e econômica.

E agora?

Por meio dos dados da literatura recente, podemos verificar que não há um consenso para recomendação de uma dose única de nutrientes, dentre eles o nitrogênio, a serem aplicados via fertirrigação, haja vista a grande diversidade de clima, métodos de manejo empregados em cada atividade, nível de tecnologia, tipos de solo, clima e ainda a genética das plantas em cada sistema.

Percebe-se, no entanto, que o aumento das doses em relação às recomendações para cultivos em sequeiro é ponto comum, e que giram em torno de 18 a 52% de aumento, considerando-se as pesquisas já enumeradas.

Para se estabelecer uma metodologia eficiente de manejo da adubação via irrigação, ainda se faz necessário um questionamento: quando devem ser aplicadas as referidas doses? Como já dito anteriormente, o uso da fertirrigação possibilita maior número de parcelamentos, sincronizando melhor a disponibilidade de nutrientes com o período de maior demanda pela planta, sendo confirmado pela pesquisa como benéfico ao desenvolvimento e à produtividade.

Nesse sentido, Guimarães et al. (2010) e Sobreira et al. (2011), avaliando o parcelamento da adubação com N e K em cafeeiros fertirrigados no Sul de Minas, verificaram que o parcelamento da adubação em 12 vezes ao ano, utilizando-se doses iguais em todas, promovem maior desenvolvimento do cafeeiro do que o parcelamento em quatro vezes ao ano, durante o período chuvoso, também em doses iguais.

Para Matiello et al. (2010), o parcelamento da adubação via fertirrigação deve ser feito de oito a 16 vezes ao ano, concentrando-se entre os meses de outubro a março, estendendo-se por maior período em regiões mais quentes. Na região do Cerrado Mineiro, Assis et al. (2018) usou, para determinação das doses ideais de NPK via fertirrigação, 70% das doses dos fertilizantes entre novembro e abril e 30% entre maio e outubro.

Embora a planta apresente pouco crescimento durante o período mais frio e menos chuvoso do ano, o fornecimento de nutrientes nessa época é importante para o desenvolvimento do cafeeiro, em quantidades reduzidas, ajudando inclusive na retomada do seu crescimento com o aumento das temperaturas, prática esta que é possibilitada com o uso da fertirrigação.

Além disso, em várias regiões de cultivo do cafeeiro, as temperaturas nos períodos de inverno se mantêm, em média, próximas ou acima de 20°C, possibilitando o bom desenvolvimento vegetativo nessa época do ano, principalmente quando se disponibiliza água e nutrientes.

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