Autor
Edson Aparecido dos Santos – Engenheiro agrônomo e professor adjunto – Universidade Federal de Uberlândia – UFU – edsonsantos@ufu.br
Os produtores de grãos do cerrado brasileiro costumam realizar plantios na segunda safra com os propósitos de diversificar renda, otimizar o uso da terra e dos insumos, melhorar a oferta de produtos no mercado, proporcionar a produção de palhada na área, quebrar o ciclo de pragas, doenças e plantas daninhas, dentre outros.
São muito comuns plantios de milho, sorgo, milheto, girassol, feijão, plantas de cobertura, consórcios, etc. Recentemente, alguns produtores têm adotado o trigo como cultura de segunda safra no Cerrado.
As plantas de trigo toleram as temperaturas menores e a menor oferta de água no período da segunda safra ou de inverno. Além disso, as empresas públicas de pesquisa, como a Embrapa e a Epamig, em parceria com diversas instituições, atuam no desenvolvimento de cultivares adaptadas às condições do cerrado.
Entre os objetivos estão a busca pela autossuficiência do Brasil na produção de trigo, tanto em aspectos quali como quantitativos, e a oferta de mais uma opção de cultivo na segunda safra no Cerrado.
Estudos
Os resultados de pesquisa comprovam que as cultivares de trigo apresentam ótima adaptação ao cerrado e podem gerar produtividades superiores a 6.000 kg/ha, quando irrigadas. O uso de área para plantio de trigo na safra 2020 nos Estados de GO, MG, MS, DF, SP e BA é estimado 225 mil hectares.
Nesses Estados, a produção e a produtividade de trigo em 2020, com relação a 2019, deverão ser acrescidas em 2,3 e 16,2%, respectivamente, segundo estimativas da CONAB.
Apesar de se tratar de um cultivo de segunda safra, é fundamental que os produtores cuidem para que os problemas relacionados à proteção vegetal não interfiram de modo significativo nas fases de desenvolvimento da cultura.
O trigo, no Cerrado, é semeado nos meses de janeiro a fevereiro, sob sequeiro, e de abril a maio, sob irrigação. À medida que a época de plantio se distancia do período de chuvas, menores serão a oferta de água e os valores de temperatura média durante o ciclo.
Por outro lado, à medida que a época de plantio fica próxima ao período de mais chuvas, as condições ambientais favorecem a ocorrência de problemas de ordem fitossanitária, especialmente a brusone (Pyricularia grisea) e a ocorrência de plantas daninhas.
O problema das daninhas
As plantas daninhas ocorrem em praticamente todas as etapas de cultivo do trigo, desde o pré-plantio até a colheita. A não realização do manejo pode acarretar em 100% de perdas. Cultivos anteriores, sobretudo da safra de verão, influenciam diretamente no manejo de plantas daninhas na cultura do trigo, pois, muitas espécies produzem sementes na safra anterior ou se beneficiam das práticas de cultivo no verão para germinar e ter acesso aos recursos e condições durante o ciclo do trigo.
O cultivo de trigo no Cerrado está inserido em um sistema de produção. Portanto, o controle de plantas daninhas deve ser realizado em uma forma integrada de métodos. No método preventivo, os agricultores devem executar práticas que evitem a chegada das sementes no local.
Em áreas do Cerrado, é muito comum a trânsito de máquinas e equipamentos entre glebas e propriedades. Máquinas e equipamentos transportam sementes, especialmente em períodos de colheita, quando há muitas plantas daninhas produzindo sementes. A limpeza de máquinas e equipamentos é uma forma eficiente para controle preventivo de plantas daninhas, principalmente quando o produtor depende de máquinas alugadas ou emprestadas.
Os agricultores ainda devem adquirir sementes de trigo com procedência e combater todas as formas de entrada de sementes de plantas daninhas na área.
Alternativa
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Outro método de controle de plantas daninhas nas áreas de trigo tropical é o cultural. Nessa situação, todas aquelas práticas positivas ao bom desenvolvimento da lavoura vão favorecer as plantas de trigo e, consequentemente, diminuir a interferência das plantas daninhas.
Os agricultores devem realizar a adubação de forma correta e ofertar condições ótimas para a germinação e emergência o trigo. Durante o desenvolvimento da cultura, a adubação de cobertura é ótima aliada no controle de plantas daninhas, bem como o combate a pragas e doenças.
Qualquer fator que proporcione diminuição de estande, ou perda de área foliar pelas plantas de trigo, favorece a ocorrência de plantas daninhas. A população de plantas de trigo é alta com relação às outras culturas do Cerrado, o espaçamento também é pequeno, no entanto, o trigo possui arquitetura da parte aérea que permite a incidência de luz no solo, o que favorece a germinação e emergência das plantas daninhas.
Palhada como aliada
Todas as práticas que favorecem o acúmulo de palhada na superfície do solo são ótimas aliadas no controle de plantas daninhas na cultura do trigo. A presença de palhada diminui o distúrbio no solo, o que prejudica a germinação de plantas daninhas. A palhada também é positiva às características físicas e químicas do solo, o que favorece o desenvolvimento pleno das plantas de trigo.
Muitas plantas daninhas gramíneas, como capim-pé-de-galinha (Eleusine indica), capim-amargoso (Digitaria insularis), capim-colchão (Digitaria horizontalis), capim-colonião (Panicum maximum), braquiárias (Urochloa sp.), dentre outras, possuem sementes pequenas que têm o processo de germinação prejudicado pela palhada sobre o solo.
Assim como o trigo, essas espécies também são gramíneas, nesse sentido, reúnem melhores condições para interferência no trigo. A palha é, portanto, ótima aliada para controle de plantas daninhas em trigo. Inclusive aquela gerada pelo próprio cultivo do trigo tropical, uma vez que alguns produtores adotam o pousio, devido à baixa disponibilidade água no período.
Outro eficiente método para controle de plantas daninhas é o químico. Nessa situação, herbicidas são pulverizados em doses convenientes e atuam controlando as plantas daninhas do trigo. No momento, no Brasil, há 19 herbicidas distribuídos em centenas de marcas comerciais, registrados para pulverização em lavouras de trigo de acordo com o Ministério da Agricultura.
Há opções de produtos para aplicações antes e após a semeadura do trigo. Os agricultores também podem utilizar herbicidas seletivos ou não seletivos ao trigo, bem como produtos com ação pré-emergente ou pós-emergente.
Atenção especial deve ser dada àquelas plantas daninhas mais importantes da safra de verão, pois, tais plantas podem representar sérios problemas à cultura do trigo em função do insucesso no controle do cultivo anterior. Como exemplo, cita-se o capim-amargoso: em muitas áreas de soja no cerrado há biótipos resistentes ao glyphosate (principal herbicida da soja).
Uso de herbicidas
O insucesso no controle propicia alta população de capim-amargoso logo na implantação da cultura do trigo, ou durante o desenvolvimento. Em função das similaridades botânicas e fisiológicas entre as espécies, o controle de capim-amargoso em trigo não é simples, mas há alternativas. Nessa situação, o agricultor pode utilizar o clethodim antes da semeadura do trigo.
Além do clethodim, que pode ser utilizado no pré-plantio do trigo, os herbicidas glyphosate, 2,4-D, diurom, metsulfuron-methyl, haloxifop-mehyl, saflufenacil e quizalofop-ethyl são alternativas para o controle de plantas daninhas, de folhas largas ou estreitas ou ambas, antes da semeadura do trigo.
Em função da conveniência do agricultor, das espécies presentes, respeitando-se a rotação de ingredientes ativos (preconizada no programa de controle químico) e em consonância com o receituário do engenheiro agrônomo responsável, o agricultor tem diversas opções, inclusive de misturas de produtos no tanque, para que o trigo germine e emerja sem a interferência das plantas daninhas. É fundamental observar os períodos indicados de intervalo entre a aplicação do herbicida e a semeadura.
Mesmo após um ótimo controle antes da semeadura do trigo, é comum a ocorrência de plantas daninhas na pós-emergência, especialmente em áreas irrigadas ou plantios nos meses de março e abril. As espécies vão germinar juntamente com o trigo ou após. Aproximadamente entre a 2ª e a 10ª semana após a emergência, a interferência de plantas daninhas em trigo é extremamente prejudicial ao rendimento.
Quanto mais o trigo permanece sob interferência das plantas daninhas nesse período crítico, maiores serão as perdas. Por isso, é fundamental que o produtor tenha uma estratégia de controle, que pode se iniciar antes da semeadura, de modo a reduzir o banco de sementes e o número de plantas daninhas na área.
Conforme reforçado, os herbicidas, aliados às outras formas de controle, são ótimas ferramentas para controlar as plantas daninhas nesse período de pós-emergência. Entre os mais utilizados está o 2,4-D.
Tal herbicida apresenta baixo custo e é seletivo ao trigo. Além disso, é eficiente contra plantas daninhas de folhas largas, especialmente aquelas jovens. O 2,4-D deve ser aplicado na lavoura de trigo no período de início de perfilhamento até antes do emborrachamento.
É importante destacar que o perfilhamento do trigo pode iniciar na segunda semana após a emergência, dessa forma, em função das plantas daninhas presentes, uma aplicação de 2,4-D já poderia ocorrer no início do período crítico (2ª semana após a emergência). Outro herbicida, quando se objetiva o controle de plantas daninhas de folhas largas, é o metsulfuron-methyl.
Pertencente ao grupo das sulfoniluréias, tal herbicida é caracterizado por sua alta eficiência em dose extremamente baixa (a partir de 2,0 g/ha) e seletividade para o trigo no perído crítico de interferência. Por fim, outras opções para controle de plantas daninhas de folhas largas na pós-emergência do trigo são: metribuzim, pyroxsulam, bentazom, imazamox (trigo Clearfield®), iodosulfuron-methyl e MCPA.
Daninhas de folhas estreitas
Quando se trata de plantas daninhas de folhas estreitas, na pós-emergência do trigo, o controle químico exige mais atenção em lavouras do cerrado. No entanto, em boa parte das áreas, um forte aliado são as condições ambientais. Plantas daninhas gramíneas no Cerrado, em sua maioria, são prejudicadas pelas condições de temperaturas baixas e diminuição na oferta de chuvas no outono e no inverno.
Mesmo assim, estão disponíveis herbicidas seletivos para o trigo e eficientes contra algumas gramíneas. As opções são: clodinafop-propargil, pyroxsulam, iodosulfuron-methyl e imazamox (trigo Clearfield®).
Atenção
É importante ressaltar que boa parte dos produtos apresentados acima são utilizados em lavouras de trigo em condições edafoclimáticas diferentes daquelas do Cerrado (como as lavouras do Sul do Brasil). As condições influenciam a população de plantas daninhas, o metabolismo das cultivares de trigo e o comportamento dos herbicidas. Dessa forma, é fundamental acompanhar as recomendações técnicas da pesquisa e do engenheiro agrônomo responsável.
Em função dessas diferenças, as empresas de pesquisa trabalham no desenvolvimento das cultivares e em todas as adaptações fitotécnicas exigidas no Cerrado. Ano após ano, são apresentados resultados satisfatórios que contribuem para a expansão do cultivo de trigo no cerrado do Brasil.