Roberta Camargos de Oliveira
Engenheira agrônoma, doutora em Fitotecnia e professora – Instituto Federal Goiano (IFGoiano)
roberta.camargos@ifgoiano.edu.br
Rayssa Camargo de Oliveira
Engenheira agrônoma, doutora em Fitotecnia e professora – Instituto Federal do Triângulo Mineiro (IFTM)
rayssaoliveira@iftm.edu.br
Fernando Simoni Bacilieri
Engenheiro agrônomo, doutor em Fitotecnia e professor – UNOPAR
ferbacilieri@zipmail.com.br
A berinjela (Solanum melongena L.) é um alimento funcional, abundante em fibras alimentares, vitaminas, fitoquímicos valiosos, como flavonoides, compostos fenólicos, antocianinas e tiamina.
Tais componentes estão associados ao fornecimento de vários benefícios à saúde, com efeitos anticancerígenos, antioxidantes, antidiabéticos e alguns potenciais farmacêuticos. A espécie apresenta ampla versatilidade culinária (consumo frescos, alimentos congelados e enlatados, em conserva, fritos e grelhados) e custo acessível para a maior parte da população.
Demanda
Nos últimos anos, ampliou a demanda do consumidor para produtos alimentícios, farmacêuticos e cosméticos que contenham agentes naturais e elementos que fortaleçam a saúde, o que atrai possibilidades de investimentos em espécies com propriedades nutracêuticas, como a berinjela.
A planta que origina o fruto da berinjela apresenta hábito de crescimento semi-arbustivo, com presença de caules lenhosos e necessidade de alguns tratos culturais para melhor desempenho de seu potencial genético e evitar danos à arquitetura da planta.
Isso acontece especialmente nos tratos relacionados à sustentação da carga e do peso dos frutos e o número adequado de frutos por planta. Estes tratos culturais benéficos às plantas de berinjela interferem na dinâmica entre a berinjela e a população de plantas espontâneas (daninhas) da área de cultivo, uma vez que alteram fatores ambientais dentro da cultura.
Por exemplo, ao tutorar as plantas de berinjela, realizar a retirada de brotos e desbaste de frutos, para permitir um crescimento equilibrado da planta, os tratos geram melhorias quanto à incidência e penetração da radiação solar, melhorando a sua utilização, amplia a circulação de ar, fornecendo melhor ambiência e melhorias nas trocas gasosas e térmicas.
No entanto, essas melhorias também ficam disponíveis e suprem as necessidades do banco de sementes de espécies espontâneas presentes no solo, o que pode gerar prejuízos significativos à berinjela, devido a agressividade de crescimento das plantas espontâneas, seus mecanismos adaptativos de estabelecimento na área e a dificuldade de controle nesta cultura, pela reduzida quantidade de produtos disponíveis no mercado (herbicidas).
Competição acirrada
Na literatura, há registros de queda de produtividade em berinjela, devido à competição com plantas espontâneas, na ordem de 67 a 96%, a depender do sistema de cultivo, condições de manejo das áreas, identificação da população de plantas na área, sua fase de desenvolvimento (vegetativo ou reprodutivo), momento de ocorrência (de acordo com os períodos de interferência), densidade, frequência relativa, dominância relativa e importância relativa da população presente na área.
Em geral, além de afetarem o suprimento de água, nutrientes e espaço para o desenvolvimento de berinjela, algumas espécies de plantas espontâneas também hospedam insetos e patógenos que podem gerar prejuízos à cultura principal. A maior interferência ocorre entre o transplantio e 50 dias após o transplantio.
Manejo
Para minimizar estes malefícios, o controle pode ser realizado de forma manual ou mecânica, com eficiência operacional relativamente baixa e altos riscos de ferimentos as plantas, o que eleva o custo de produção.
O controle químico de plantas espontâneas disponível para berinjela refere-se à aplicação de: Cletodim (inibidor da biossíntese dos ácidos graxos- ACCase), que apresenta ação graminicida pós-emergente e Trifluralina (inibidores da formação de microtúbulos), aplicado em pré-emergência das plantas, antes do transplantio.
Lembrando que, para melhor desempenho do herbicida no solo, a aplicação deve ser o mais próximo possível da última gradagem, em solo bem preparado e com boas condições de umidade.
Alternativas
As diferenças no acesso à mão de obra e recursos para a gestão de plantas espontâneas entre os agricultores, juntamente com outros fatores ambientais e econômicos, exigem alternativas para driblar o impacto das plantas espontâneas, de forma estratégica e com eficiência.
Com isso, a cobertura morta (mulching) vem se destacando como uma ferramenta interessante. Além de cobrir o solo e suprimir a emergência e dominância das plantas espontâneas, ela oferta serviços de ciclagem de nutrientes, melhoria das propriedades físicas, químicas e biológicas do solo e supressão de patógenos e insetos que causam prejuízos à berinjela.
Ao aumentar a biodiversidade e promover a proteção do solo, a cobertura morta trabalha a favor dos agricultores, de forma estratégica, podendo-se utilizar de espécies espontâneas como a fonte de palhada, transformando o que era ‘daninho’ em algo benéfico ao ecossistema.
Além disso, algumas plantas espontâneas promovem atração de insetos predadores benéficos, favorecendo o cultivo da cultura principal.
Mulching plástico
As coberturas mortas ou cobertura do solo (palhadas) podem ser fornecidas a partir de material sintético, advindo da plasticultura. Os filmes plásticos mais difundidos no mercado são de coloração preta-preta (os dois lados do plástico apresentam coloração escura); preta-prata (uma face escura, outra face prata); preta-branca e, mais recentemente, preto-vermelho.
Há, também, diversas medidas (para atender a largura dos canteiros) e espessuras disponíveis. Os filmes plásticos são flexíveis e contêm aditivos que lhe conferem proteção contra radiação ultravioleta proveniente do sol, maior ou menor resistência e durabilidade.
A escolha da cor é um fator relevante devido ao impacto promovido na temperatura do solo, acelerando ou inibindo o crescimento das plantas, o que pode afetar a colheita (precocidade).
Efeitos na lavoura
A partir dos efeitos positivos da cobertura morta demonstrados nas principais culturas cultivadas, com relatos de contribuição de 20% e 60% do rendimento de grãos de trigo e milho, respectivamente (Wang e Shangguan, 2015), a utilização se expande para hortaliças em geral.
Ainda de acordo com os pesquisadores, o rendimento foi superior quando a cobertura de solo foi realizada com filme plástico, o que provavelmente está relacionado a uma barreira física mais homogênea/uniforme, com trocas gasosas apenas nos orifícios onde os caules das plantas se encontram.
Devido aos benefícios gerais do uso de filmes plásticos: diminuição da incidência de plantas espontâneas, melhoria no uso da água e fertilizantes, melhora os atributos do solo – evita a compactação e erosão, promoção de um crescimento mais rápido e uniforme da parte aérea e sistema radicular das plantas e proporciona melhor estado de saúde nas plantas, agricultores têm ampliado as áreas com utilização deste insumo.
O caso da berinjela
A cobertura do solo (palhada ou filme sintético) reduz muito a evaporação da água da superfície do solo, devido à formação de barreira física, tornando a irrigação ainda mais eficiente, especialmente a irrigação por gotejamento.
O aumento da temperatura do solo promovido pela presença de cobertura sintética afeta a fisiologia das culturas, geralmente otimizando o ciclo, e gerando produções maiores em menor intervalo de tempo (precocidade).
A evaporação reduzida e otimização do sistema de irrigação reflete em otimização no uso da água e também de nutrientes, devido à diminuição no arraste de nutrientes (lixiviação) para fora da zona de crescimento do sistema radicular.
O período crítico de demanda por nutrientes da berinjela, em especial dos macronutrientes NPK (nitrogênio, fósforo e potássio), refere-se ao intervalo entre 10 dias após a floração até pouco dias antes do início da fase de maturação dos frutos.
Como os fatores climáticos e de solo influenciam a floração, frutificação e produção da berinjela e a espécie é muito responsiva à adubação, o impacto da utilização de cobertura reflete na fertilização e, em consequência, no rendimento da berinjela.
Impactos na lavoura
A barreira física (palhada ou filme plástico) não permite que o solo fique exposto. Somado aos tratos culturais adequados à cultura da berinjela, os frutos não têm contato direto com o solo ou indireto, por meio de respingos de água da chuva ou de irrigação.
Com isso, potenciais patógenos de solo que poderiam causar doenças nas plantas não têm acesso aos frutos, aumentando assim a sua qualidade.
O mulching, ao gerar proteção do solo, impede que as plantas espontâneas acessem a radiação solar direta, portanto, há redução de ativação do banco de sementes de daninhas, pela ausência do suprimento básico de estímulo à germinação (sementes fotoblásticas positivas) e posterior suprimento para realização da fotossíntese (após emergência).
Cuidados
Como a fonte energética da maioria das sementes de plantas espontâneas é pequena (sementes com pouca quantidade de endosperma), as reservas são exauridas antes de elas conseguirem romper a barreira física da palhada ou romperem o plástico.
A exceção se dá para espécies que possuem propagação vegetativa e órgãos de reserva (caules modificados, como as batatinhas), como exemplo a tiririca, que mesmo em plásticos mais espessos (maior quantidade de micras), pela quantidade abundante de reservas e agressividade de arranquio, rasgam o plástico e começa a se estabelecer na área, necessitando controles adicionais, caso haja infestação dessa categoria de plantas na área.
Dessa forma, o uso de herbicidas nas lavouras de berinjela com presença de mulching ocorre predominantemente em casos de herbicidas dessecantes. Nesse contexto, utiliza-se de herbicida exclusivamente pós-emergente de ação total, não-seletivo, aplicado antes do transplantio das mudas, para eliminação de toda a cobertura vegetal que será o mulching ‘natural’ ou orgânico.
Em mulching sintético (plástico) após o preparo do solo é realizado a instalação do filme plástico e posterior distribuição das mudas. Tanto no mulching orgânico como no filme plástico, os controles das plantas espontâneas são realizados pela barreira física, não sendo necessário aporte adicional de herbicidas.
Bom para o solo
A erosão dos solos é o movimento da terra de um lugar para outro sob a ação do sol, do vento e, principalmente, da água. A erosão gera redução da produtividade e, em casos mais graves, gera perda das camadas aráveis, solo superficial, nutrientes e matéria orgânica do solo.
Também se refere ao aumento da poluição da água, risco de inundação e fenômenos de eutrofização e declínio da biodiversidade.
O mulching, ao fornecer proteção ao solo, junto às demais técnicas de conservação do perfil, possibilita melhoria na gestão sustentável da terra. A cobertura do solo (mulching orgânico) aumenta a superfície de contato do solo e permite a absorção das gotas de chuva, reduzindo a velocidade de deslocamento do solo e transporte de sedimentos; aumentando assim a infiltração e a capacidade de armazenamento de água.
A eficiência do mulching como agente redutor de erosão é variável com: características da cobertura morta (materiais que formam a cobertura), espessura e extensão da cobertura, período de utilização; intensidade dos fatores ambientais, em especial: precipitação e temperatura; gradiente de declive e tipos de solo.
Resultado de Pesquisas
Estudos mais avançados, visando rendimento do manejo total da lavoura, trazem relatos de redução da lâmina de irrigação, aplicando quantidades que atendam de 80 a 100% da evapotranspiração da cultivar (ETc), com respostas variáveis de acordo com a cultura.
Observa-se que há possibilidade de redução do fornecimento de água, com economia deste recurso, sem afetar o rendimento da cultura. No entanto, é válido considerar que este ajuste deve ser realizado observando-se a dinâmica da cultivar com as condições edafoclimáticas do local de cultivo.